Discurso durante a 208ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apreensão com cortes orçamentários pelo Governo Federal em desfavor especialmente da saúde e da educação.

Autor
Rose de Freitas (PODEMOS - Podemos/ES)
Nome completo: Rosilda de Freitas
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA:
  • Apreensão com cortes orçamentários pelo Governo Federal em desfavor especialmente da saúde e da educação.
Aparteantes
Zenaide Maia.
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/2019 - Página 60
Assunto
Outros > ECONOMIA
Indexação
  • APREENSÃO, CORTE, ORÇAMENTO, GOVERNO FEDERAL, PREJUIZO, SAUDE, EDUCAÇÃO, TECNOLOGIA.

    A SRA. ROSE DE FREITAS (PODEMOS - ES. Para discursar.) – Sr. Presidente, eu queria falar sobre um tema que, na verdade, tem sido objeto de muita preocupação. Acho que na galeria pode haver algumas pessoas que ainda estudam, que estão fazendo cursos, procurando a sua formação profissional, e nós sabemos, Sr. Presidente, que reformas estruturais são urgentes, e este Senado tem contribuído efetivamente para que ela se torne realidade.

    Em diversos campos, saindo da área governamental da atuação do Governo, aquilo que é salutar e importante para a população nós temos discutido e aprovado. Nós fizemos isso com a reforma da previdência, com responsabilidade, embora não agradasse a nenhum de nós aprovar medidas restritivas, como aconteceu na reforma.

    Entretanto, Sr. Presidente, remédio que não é aplicado da forma certa e na dose adequada, Senador Trad, ao invés de dar a cura – já que o senhor é médico –, pode matar. É preciso ouvir atentamente quem tem experiência técnica, mas também quem tem vivência política, Senadora Leila. O País é complexo, o Brasil é assim. Ao lidar com problemas de curtíssimo prazo, não se pode perder de vista as grandes prioridades nacionais.

    Entre esses temas – e quero chamar a atenção do Plenário, Senador Carlos Viana –, está a educação, está a saúde, está a ciência. É preciso agir com equilíbrio e serenidade, lidando com as restrições orçamentárias amplamente divulgadas, debatidas, mas com sabedoria, com responsabilidade, sem perder a visão de País, a curto e a longo prazos.

    É impositivo observar que estamos sob o impacto da Emenda – quem não se lembra? – da Constituição, que ajudei a escrever, nº 95, de 2016, que impõe um teto, Sr. Presidente, aos gastos públicos. De caráter restritivo, tornou mais difícil a aplicação do Plano Nacional de Educação.

    No que diz respeito à saúde, igualmente está em curso a fragilização do sistema nacional, do Sistema Único de Saúde (SUS). De um lado, há cortes significativos do financiamento; do outro lado, Sr. Presidente, há a redução das instâncias de participação do cidadão do setor como as conferências, os conselhos de saúde.

    Portanto, Sras. e Srs. Senadores, nós não queremos que estes anos que vêm pela frente sejam lembrados como os anos de cortes insensatos no financiamento público da educação e da saúde no Brasil. Esses cortes, ambos, nos orçamentos das universidades federais, levaram ao cancelamento, inclusive, de bolsas de pesquisa, já registrado aqui por inúmeros Senadores.

    No Brasil, a ciência tem a sua principal fonte de financiamento em dois órgãos, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Mesmo que tenha havido uma reavaliação por parte do Governo, restabelecendo parte das bolsas que se planejava cortar, o impacto – e é isso o que o Governo não quer enxergar – no desenvolvimento da ciência, da tecnologia, no Brasil, vai ser enorme, imenso, e pode ser irreversível, o que significa atraso. É um impacto no desenvolvimento do País.

    Além disso, na fusão desses dois importantes órgãos financiadores com o objetivo de reduzir os gastos administrativos, estão duas agências que possuem missões diferentes, e, segundo os pesquisadores, sua junção significaria um retrocesso no desenvolvimento científico do País.

    Destaco aqui um trecho extraído do Jornal da USP publicado no dia 16 de outubro. Vou abrir aspas.

A proposta do Governo para 2020 é cortar o orçamento de fomento à pesquisa do CNPq em quase 90% (restando-lhe apenas recursos para bolsas) e reduzir ainda [Senadora Leila] o orçamento geral da Capes em quase 50%. Já o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), cujos recursos são gerenciados pela Finep, deve começar o ano com 80% dos seus valores já contingenciados.

Pesquisadores [e não são alguns; são muitos] temem que esse esvaziamento das agências seja um prenúncio de fechamento do próprio Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, e isso vai nos fragilizar extremamente numa próxima reforma ministerial, [muitas vezes insinuada, mas que agora temos convicções de que acontecerá].

    Por isso, Sras. e Srs. Senadores, eu pergunto: a quem interessa, já com o atraso que nos circunda o tempo todo, fragilizar a pesquisa no Brasil? Que interesses são esses? Não me perguntem porque eu também não sei essa resposta, mas espero que ninguém de maneira sub-reptícia, de maneira equivocada, de maneira descompromissada possa ter o interesse de prejudicar o País desta maneira. É fácil pregar o desenvolvimento, fazer reformas, ficar discutindo permanentemente que tal reforma vai melhorar o Brasil, mas comprometer a educação?

    Alguém tem dificuldade de perceber a conexão entre os temas de educação, das ciências com as questões cotidianas, com as questões ambientais, por exemplo? E até agora, com relação à contaminação das praias, ao óleo derramado, ninguém tem uma resposta? Por quê? Faltou base científica? Faltou pesquisa? Faltou equipamento? Faltaram cientistas? O que aconteceu na verdade?

    Para ficar dentro desse tema, Sr. Presidente, que eu considero atual, será muito difícil, talvez impossível, preservar as nossas florestas se não incentivarmos fortemente a produção científica sobre as questões ambientais e para preservar os nossos recursos naturais nós precisamos de conhecimento aprofundado a respeito dos ecossistemas, das pesquisas em nossos centros mais avançados. Se é que teremos investimentos para construir centros avançados, cientificamente falando. Daí virão soluções que nós precisamos. Não podemos abraçar a ideia do Ministro Guedes de cortar recursos da educação, de cortar recursos da saúde, e da tecnologia nem se fala. A educação, se eu disser aqui vou ser repetitiva ao longo desses oito mandados, é a base de todo o desenvolvimento!

    Temos países e países, Senadora Zenaide, para citar, porque foi no desenvolvimento da educação que desenvolveram o País. Quer desenvolver o País sem educação? Preservar a nossa educação é uma luta que temos que ter nesta Casa a todo custo, temos que protegê-la de restrições descabidas, de cortes que justifiquem... Porque, hoje, tudo neste País tem que cortar para ajustar a economia, para voltar o emprego. E vão gerando sofismas que não se sustentam. Não há hoje, você pode procurar economistas fundamentados, de todas as cátedras, para perguntar se é com cortes, sem planejamento, sem compromisso, sem olhar para o futuro...

    Uma das mais importantes missões nesta Casa, que nós temos agora, Senadora Zenaide, é lutar contra esses cortes.

    Concedo o aparte a V. Exa.

    A Sra. Zenaide Maia (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PROS - RN. Para apartear.) – Fico feliz vendo a Senadora Rose de Freitas falar em educação, ciência e tecnologia, que tem sido atacada sistematicamente.

    A gente sabe que, com retirada de recursos, ninguém tem educação, ciência, tecnologia e muito menos saúde.

    E dizer o seguinte. Nós não estamos inventando a roda. No mundo todo, os países que se desenvolveram foi investindo em educação de qualidade para todos e não só para um grupo privilegiado que pode pagar essa educação de qualidade. E a gente sabe que, para ter até democracia, Senadora, a gente precisa de educação, ciência e tecnologia, porque normalmente os ditadores se acham os donos da verdade e aí chega a ciência e a tecnologia e mostra que não é aquilo. Então não existe desenvolvimento, não existe preservação de natureza, não existe nem democracia sem ciência, tecnologia e educação. E não se pode fazer educação, ciência e tecnologia sem investimentos.

    Então, quero parabenizá-la por chamar a atenção para esse tema que ultimamente não temos discutido. É como você diz, é o ajuste, é a reforma, mas o investimento nas áreas que são de interesse da população como um todo... E, sem inventar a roda, quem desenvolveu foi com educação, ciência e tecnologia. Por isso que eu quero parabenizá-la pela abordagem tão importante neste momento.

    A SRA. ROSE DE FREITAS (PODEMOS - ES) – Senadora, sei que a senhora é médica, sei o quanto preza a bandeira da educação e quero lembrar que, nos discursos reformistas que estão aqui, muitas dessas reformas participamos e aprovamos, quando se faz o discurso de que o País vai demorar dez anos para se desenvolver e, por isso, as reformas são importantes e necessárias, eu presumo que nesse contexto esteja a intenção de fazer os cortes, sangrando a educação de tal maneira que comprometa até mesmo as reformas que hoje tanto são apregoadas e pelas quais nós lutamos muito.

    E também, Senadora, na saúde, as notícias são igualmente um desalento para todos nós. Levantamento, inclusive eu comentei isso com um colega Senador, recentemente da Folha de S.Paulo, de 23/9, mostrou que mesmo o cumprimento do mínimo constitucional que deve ser investido na saúde está ameaçado.

    Eu me lembro que foram muitos anos, Senador Jaques, em que nós lutamos aqui para ter esse mínimo constitucional, dado o abandono da saúde neste País. E eu queria que ouvissem esse trecho da reportagem da Folha, abrindo aspas: "O orçamento da pasta para 2020 prevê corte em algumas ações de saúde. Para compra e distribuição de vacinas, houve redução de quase R$400 milhões nos valores para o próximo ano, de R$5,3 bilhões para R$4,9 bilhões".

    Nós estamos falando do quê?

(Soa a campainha.)

    A SRA. ROSE DE FREITAS (PODEMOS - ES) – Nós estamos falando de um país que não tem medicina preventiva, mas cujo calendário de vacinação importa muito na manutenção pelo menos da prevalência do mínimo de saúde que a população ainda tem. Então, desse total, R$1,4 bilhão, aliás, R$44 bilhões, me desculpem, viriam via crédito suplementar, sujeito à aprovação do Congresso. Quer dizer, depende de que eles mandem, chegue aqui e nós venhamos a votar. Se não mandarem, também não podemos ter iniciativa de gastos no orçamento. Eu já presidi essa Comissão.

    Então, meus colegas, nobres colegas, eu não quero exaurir esse discurso em números. Nós todos sabemos que gastos essenciais em saúde e educação estão sendo comprimidos pela atual filosofia do Governo.

    Por isso, reforço o que tenho dito: nós precisamos ajudar o Governo a ajustar as contas públicas...

(Soa a campainha.)

    A SRA. ROSE DE FREITAS (PODEMOS - ES) – ... mas nós precisamos, Sr. Presidente, de um pouco de paciência sobre como será. Nós precisamos ajustar as contas públicas. Nós precisamos ser responsáveis com o dinheiro do contribuinte. Precisamos ter responsabilidade inclusive de encaminhá-lo, de saber que nós temos compromissos dos quais nós não vamos abrir mão: educação, saúde e ciência e tecnologia, mas não podemos fazer isso a custo de menos educação, menos saúde, menos pesquisa, já que o Brasil já vive assim.

    E, afinal, economizar... Se nós não podemos dar escolas e hospitais à população, como é que nós vamos fazer essa economia? Essa economia não se justifica. Contas devem ser ajustadas, Sr. Presidente – sei que o senhor governou Minas Gerais, sei do seu compromisso como Senador –, mas não produzem por si só nem riqueza, nem crescimento, nem desenvolvimento. Produzem no máximo uma contabilidade cujo resultado é soma zero.

    Eu concluo dizendo que cabe a este Parlamento, Sr. Presidente, que tem o planejamento financeiro da União entre suas funções precípuas, debruçar-se sobre os temas e sobre as preocupações que aqui trouxe, que são cruciais. Nós vivemos uma situação de crise sim, mas não podemos deixar que ela se transforme no futuro, sem que nós percebamos essa galopada a uma catástrofe da qual nós teremos vergonha de ter participado.

    Muito obrigada, Sr. Presidente. Obrigada pela tolerância também.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/2019 - Página 60