Discurso durante a 209ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre a origem e a importância social do FGTS. Preocupação com a perda da função social do FGTS ante a possibilidade de privatização da Caixa Econômica Federal, que realiza a gestão desse fundo. Expectativa de aprovação da Medida Provisória nº 889, de /2019, que modifica determinadas regras de utilização do FGTS.

Autor
Paulo Rocha (PT - Partido dos Trabalhadores/PA)
Nome completo: Paulo Roberto Galvão da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL:
  • Reflexão sobre a origem e a importância social do FGTS. Preocupação com a perda da função social do FGTS ante a possibilidade de privatização da Caixa Econômica Federal, que realiza a gestão desse fundo. Expectativa de aprovação da Medida Provisória nº 889, de /2019, que modifica determinadas regras de utilização do FGTS.
Aparteantes
Rogério Carvalho.
Publicação
Publicação no DSF de 01/11/2019 - Página 7
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL
Indexação
  • ANALISE, ORIGEM, IMPORTANCIA, POLITICA SOCIAL, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), APREENSÃO, PERDA, FUNÇÃO, SOCIALIZAÇÃO, POSSIBILIDADE, PRIVATIZAÇÃO, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), REALIZAÇÃO, GESTÃO, FUNDO FINANCEIRO, EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ALTERAÇÃO, NORMAS, UTILIZAÇÃO, BENEFICIO.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, hoje eu quero falar sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, conhecido como FGTS.

    O FGTS tem uma história muito importante para a classe trabalhadora, porque na década de 60, mais precisamente em 1966, foi criado pela Lei nº 5.107, para proteger o trabalhador demitido sem justa causa. Ele tem a função de garantir uma verba para emergência e ajuda de custo para assuntos importantes, como saúde, habitação etc. É um fundo de garantia do trabalhador quando ele perde o seu emprego ou se aposenta.

    Mas, na verdade, esse fundo veio substituir a estabilidade que o trabalhador havia conquistado desde a década de 40, por volta de 1943. Àquela época, o trabalhador que completasse 10 anos no emprego adquiria a estabilidade. Essa Lei do FGTS, portanto, veio a acabar com a estabilidade e, em substituição a essa estabilidade depois de 10 anos, foi criado o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.

    O FGTS, como o nome diz, é um fundo de garantia e é um depósito mensal referente a um percentual do salário do empregado que o empregador fica obrigado a depositar em uma conta bancária, que deve ser aberta na Caixa Econômica Federal em nome do empregado. Portanto, é um patrimônio do trabalhador; mas nós não nos enganemos: ele surgiu porque os militares quebraram o direito à estabilidade. 

    O fundo é composto por depósitos mensais correspondentes a 8% da remuneração dos empregados regidos pela CLT. Esse dinheiro vem fazendo uma poupança para que o trabalhador saque quando for demitido, quando da sua aposentadoria ou quando comprar a casa própria, entre outros motivos.

    O FGTS tem uma importância social muito grande. Quando se criou o FGTS, a classe trabalhadora tinha um certo questionamento, porque ele veio exatamente surgir com a quebra da estabilidade no emprego. Contudo, ao longo do tempo, foi criada uma engenharia financeira que, ao mesmo tempo em que se mantém um fundo, cria condições, a partir da Caixa... A Caixa, portanto, é um banco social que o Estado brasileiro possui para gerir esse fundo. Não só o montante vai valorizando ao longo do tempo, como uma espécie de caderneta de poupança, mas esse fundo serve para também retornar, em função de financiamento, qualidade de vida para o trabalhador. Por exemplo, no financiamento da habitação, no financiamento do saneamento básico nos bairros ou nos Municípios muito pobres.

    E o fundo tem ainda o condão de financiar a indústria da construção civil, que, como todo mundo sabe, é uma fonte geradora em massa de emprego e formadora de mão de obra muito grande no nosso País.

    Portanto, essa engenharia financeira usa o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço do trabalhador para, ao final, retornar para o próprio trabalhador a geração de emprego e a construção de casa própria e saneamento básico. Portanto, é um fundo muito importante que o Estado brasileiro usa para fazer esse tipo de investimento.

    Atualmente, o FGTS é regido, entre outros, pela Lei nº 8.036, de 1990, que define sua estrutura institucional, sua administração, que envolve o conselho curador. O conselho curador faz parte da estrutura da gestão do fundo. É um conselho tripartite: o Governo, na ponta do vértice, os empregadores e os trabalhadores. Portanto, é uma estrutura para gerir esse fundo, que faz também a grande operação do fundo, quer seja no financiamento da casa própria, quer seja, enfim, nos investimentos, principalmente na indústria da construção civil. Essa é uma política complexa, que envolve diferentes interesses e agentes: os empregadores, que fazem as contribuições; os trabalhadores, que vêm no seguro social; um auxílio para momentos de dificuldades; e, por fim, o Governo, que utiliza o fundo para financiar as políticas sociais.

    Mas vem de longe a tentativa de acabar com o FGTS ou mudar a sua natureza. Alguns acham que ele eleva o custo Brasil, mas, na verdade, o FGTS ajuda o Brasil a se desenvolver. Aqui no Congresso Nacional, tramitam diversos projetos que visam modificar a lógica do fundo. Eu tenho uma relação histórica pessoal, quando eu virei Deputado Federal, em relação a esse tema. Eu criei uma Subcomissão na Comissão do Trabalho da Câmara para promover uma revisão completa da legislação e, principalmente, para proteger o fundo, porque, naquela época, havia uma enxurrada de projetos de lei que eram um verdadeiro ataque ao fundo, porque tratavam de saque. Era saque para tudo, para pagar mensalidade escolar, para comprar instrumentos para o filho aprender a tocar música. Enfim, talvez os objetivos dos saques tinham a ver com interesse, mas o problema é que atacavam a natureza do fundo. Fundo de Garantia não tinha esse papel. O que modificamos, na época, foi assegurar que o Fundo de Garantia poderia ser sacado para a cura de doenças graves, quer seja do dono do fundo, quer seja da sua família, doenças mortais, como câncer e outros tipos de doenças que poderiam causar mortalidade para a família daquele dono do fundo. Então, autorizamos especificamente essa questão do saque.

    E, como sempre, estive ao lado e busquei fazer com que o fundo pudesse proporcionar não apenas a proteção do trabalhador, mas também a melhoria da qualidade de vida por meio de investimentos sociais – como já disse – no saneamento e na habitação. Por exemplo, no Governo Lula, houve a criação, modificando, inclusive, o sistema de habitação que veio da experiência do BNH e das Cohabs, do projeto Minha Casa Minha Vida, que não só avançou muito nessa questão da proteção de investimentos sociais ao trabalhador, mas também proporcionou uma geração de emprego muito grande. Portanto, esse é o papel do fundo que a Caixa Econômica gesta para esse tipo de financiamento, mas que, ao mesmo tempo, vai valorizando ao longo do tempo o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço do trabalhador.

    Houve sempre uma discussão muito forte sobre a valorização do fundo, a sua correção, o tamanho dos juros, porque o tamanho dos juros era uma engenharia financeira que não só valorizava o fundo ao longo do tempo, mas também poderia ser emprestada, com juros baixos, juros subsidiados, para a indústria da construção civil para gerar emprego e produzir saneamento, habitação nas áreas mais pobres do nosso País.

    Portanto, o Congresso Nacional tem que levar em consideração esse papel, esse caráter do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço do trabalhador.

    A reforma trabalhista recente, aprovada em 2017 contra o meu voto e o de diversos outros partidos, diversos companheiros e Parlamentares do PT, retirou diversos direitos dos trabalhadores e o direito que foi flexibilizado justamente com direito ao FGTS, isso porque a nova lei trabalhista trouxe a possibilidade de demissão por comum acordo, o que significa que a demissão é por acordo entre patrão e empregado, e o empregado receberá apenas a metade da multa de 40% sobre o saldo do FGTS.

    Estou chamando a atenção para isso porque está em discussão – e ontem houve uma discussão muito profunda – a medida provisória que trata exatamente do fundo. O atual Governo quer autorizar o saque de até R$500 para que o trabalhador retire esse dinheiro. Na verdade, a intenção do Governo é alavancar o consumo para ver se injeta esses saques na economia e dá um calor no processo da economia. Se este é o objetivo, é importante, até para o aumento do consumo e, como consequência, a geração de emprego, mas não haver um ataque profundo ao saque do FGTS para o trabalhador, uma vez que esse fundo tem essa engenharia financeira que se preserva ao longo do tempo, com condições de financiar, de fazer investimentos sociais importantes para o povo mais pobre do nosso País. Por outro lado, não pode – e esta é a desconfiança – enfraquecer o fundo e, como consequência, enfraquecer a Caixa Econômica, pois, atrás do enfraquecimento da Caixa Econômica, estão alguns interesses, principalmente da área econômica do Governo: a privatização da Caixa Econômica.

    Quanto a isso nós vamos radicalizar a nossa posição na defesa da valorização do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço para também valorizar a Caixa Econômica, que, todo mundo sabe, é um banco social importante, criado pelo Estado brasileiro e que cria essas condições de gestar fundos sociais que têm um papel fundamental nos investimentos, principalmente nas áreas sociais, como era o caso da habitação.

    Hoje são mais de 800 milhões de contas, de 4,6 milhões de empresas cadastradas. O patrimônio total do FGTS é aproximadamente 530 bilhões. Portanto, é um fundo importante até para alavancar a economia. Em apenas um dia útil são registrados, em média, 150 mil saques. Em 2017, o fundo foi responsável pela injeção na economia nacional de mais de 182 bilhões, além do montante de 44 bilhões referente a saques de contas inativas, aprovadas por este Congresso.

    Os números alcançados pelo FGTS mostram a importância do fundo para o Brasil e para os brasileiros. A Medida Provisória nº 889, da qual eu falei há pouco, está em tramitação no Congresso e, portanto, chamo a atenção exatamente neste pronunciamento para que os Senadores e Deputados – ainda está na comissão mista –, terça-feira o relator apresentou um relatório inicial. Eu acompanhei bem isso lá. Fizemos alguns diálogos com o relator para que fizesse algumas modificações, o relator atendeu na promessa de retornar um novo relatório na segunda-feira, para que na terça-feira a gente se debruce inicialmente sobre o projeto do relator para ir para a Câmara e depois vir para este Senado e, ao final, aprovar estas medidas provisórias.

    Portanto, são modificações que querem fazer e que temos que estar atentos, para que o FGTS continue sendo um fundo importante, não só para alavancar a economia, mas para manter o seu caráter principal, que é um fundo de financiamento social e que é gestado pela Caixa Econômica, que, junto com um conselho curador, tem gestado o fundo ao longo do tempo, de uma maneira muito importante para o desenvolvimento do nosso País.

    O fundo, portanto, não é um problema, é um patrimônio do trabalhador. Certamente tem condições de ajudar o nosso País na economia, na questão do desemprego, na questão dos investimentos na área social. Pode voltar a alavancar o Minha Casa, Minha Vida; voltar a ter financiamentos no saneamento, quer seja no saneamento básico, mas também na questão da Água para Todos.

    São programas importantes, que não só mantém o caráter do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço para financiamento sociais, como também pode alavancar, voltar a aquecer a economia, principalmente da indústria da construção civil, que é uma grande geradora de emprego no nosso País.

    Portanto, o FGTS foi sempre usado em benefício dos interesses do povo, do trabalhador, e temos que lutar para que permaneça seguro e garantido sob a gestão da Caixa Econômica, continuando a cumprir uma função social importantíssima para o nosso País.

    Era isso que eu tinha a falar hoje, Sr. Presidente.

    O Sr. Rogério Carvalho (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – Concede-me um aparte, Senador?

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Pois não.

    O Sr. Rogério Carvalho (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE. Para apartear.) – Exmo. Sr. Senador Paulo Rocha, essa figura querida por todos aqui, no Senado Federal, queria cumprimentar o Presidente Izalci Lucas, que é um grande defensor da educação e um excelente companheiro.

    Eu queria dizer que a gente corre o risco de inovações desnecessárias. Às vezes, a gente tenta inovar com a intenção de melhorar, de criar novos caminhos, mas, no caso do FGTS, tirar da Caixa e pulverizar esse recurso em vários bancos pode não significar inovação e, sim, descontrole, isso pode significar inclusive a impossibilidade de a Caixa cumprir o papel social que tem no que diz respeito à moradia, no que diz respeito a políticas de habitação, da qual sempre foi pioneira. Ela sempre foi fundamental no quesito das obras de saneamento, das obras de infraestrutura, que melhoram a vida das pessoas.

    Portanto, queria parabenizar V. Exa. por trazer esse tema aqui e dizer que as inovações são bem-vindas, mas nem sempre significam um avanço. Manter os recursos do FGTS na Caixa, dando a transparência do volume de recursos que a gente tem, saber qual é potência dessa poupança para que a gente possa aqui, no Congresso, fazer o debate de como aplicar esse recurso...

    Porque, veja, Senador Paulo Rocha, o problema do Brasil é a transparência com os recursos dos diversos fundos que a gente tem. A gente não consegue saber qual é o montante, a gente não consegue saber se está sendo utilizado ou não para fazer superávit primário, qual é a aplicação. Nós, o Congresso, não participamos do debate central que deveria estar aqui tomando conta de todos nós, que é o que fazer para a gente gerar emprego, renda, alavancar a economia com a nossa própria poupança. O FGTS é uma poupança do povo brasileiro, dos trabalhadores brasileiros, e há outros fundos que são poupanças do povo brasileiro e precisariam, de forma transparente, estarem à disposição para o debate político, para que a gente pudesse fazer políticas de geração de renda, de crescimento econômico, que é o que as pessoas querem. As pessoas querem ser amparadas, elas não querem ser amparadas por ninguém, querem ser amparadas com seu próprio trabalho, com sua própria capacidade de empreender.

    Obrigado, Senador.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Senador Rogério, é claro que concordamos que nós concordamos que uma nação tem que ter também um sistema financeiro forte. O problema é que o sistema financeiro nacional não precisa de um fundo como esse e também não precisa que haja a intenção de enfraquecimento da Caixa Econômica Federal, que é uma estrutura do Estado brasileiro criada com essa função social de pegar esses fundos dos trabalhadores e criar... Que ele tenha o caráter... Repito: a defesa aqui é do caráter do fundo. Ele tem um caráter não só de fundo de garantia de tempo de serviço, portanto de garantia para o trabalhador, mas também é um fundo grande que financia o próprio bem-estar do trabalhador, através da habitação, do saneamento. E, como alavanca a indústria da construção civil, retorna também a questão do emprego para o trabalhador desempregado.

    Então, é uma engenharia financeira muito importante, e só quem tem esse interesse é um banco social do Estado brasileiro. Se cair num banco privado, cujo condão principal é a lucratividade, o grande lucro, através dos grandes juros, então perde a função de fundo de garantia do tempo de serviço do trabalhador.

    Portanto, a nossa defesa é exatamente essa. Nada contra fortalecer o sistema financeiro do nosso País, mas não pode ser em detrimento do enfraquecimento da Caixa e do uso do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço para obtenção dos grandes lucros do sistema financeiro.

    O Sr. Rogério Carvalho (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - SE) – V. Exa., se me permite, trata de um tema de grande relevância, que é a Caixa Econômica Federal. De forma tangencial, a Caixa Econômica Federal passa a figurar na fala de V. Exa.

    É importante dizer que a Caixa é muito mais do que um banco. A Caixa é uma agência de governo que tem papéis diversos, desde auxiliar na execução de obras públicas, desde gerenciar programas como o FGTS, a liberação de recursos, a gestão desses recursos do trabalhador, como de financiar projetos de habitação, de saneamento, e outros projetos de grande relevância. Portanto, nós não estamos falando de um banco com finalidade específica e estrita; nós estamos falando de uma agência de fomento, de uma agência de governo que tem um papel muito mais diverso que o papel de um banco comum.

    Muito obrigado, Senador Paulo Rocha.

    O SR. PAULO ROCHA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Muito obrigado, Senador Rogério. Acrescento ao meu pronunciamento a sua intervenção.

    Presidente, muito obrigado.

    Eu queria aproveitar e saudar a meninada que veio nos visitar e mostrar que aqui nós estamos num período de debate. Por isso que aqui, neste momento, só estão presentes aqueles que se inscreveram.

    Hoje, a sessão está sendo presidida pelo Senador Izalci, que é daqui, de Brasília. Eu sou Senador pelo Pará, o Rogério Carvalho é Senador por Sergipe e o Zequinha Marinho é Senador pelo Pará também.

    Sejam bem-vindos. Aprendam, porque aqui pode haver um futuro Senador ou Senadora!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/11/2019 - Página 7