Discurso durante a 218ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Expectativa com o julgamento pelo STF da suspensão das investigações que utilizaram dados do antigo Coaf. Relato de experiência pessoal de cooperação com o antigo Coaf durante a investigação de irregularidade em sorteios das loterias federais administradas pela Caixa Econômica, no ano de 2005.

Apelo ao Presidente do Senado para que coloque na Ordem do Dia, desta terça, o projeto, de autoria de S. Exa., que evita que expedientes protelatórios levem à prescrição de ações. Comentário sobre a importância do Parlamento votar PEC que regulamenta a prisão em segunda instância. Pedido para que a Câmara dos Deputados vote o projeto que acaba com a prerrogativa de foro de autoridades públicas.

Autor
Alvaro Dias (PODEMOS - Podemos/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PODER JUDICIARIO:
  • Expectativa com o julgamento pelo STF da suspensão das investigações que utilizaram dados do antigo Coaf. Relato de experiência pessoal de cooperação com o antigo Coaf durante a investigação de irregularidade em sorteios das loterias federais administradas pela Caixa Econômica, no ano de 2005.
LEGISLAÇÃO PENAL:
  • Apelo ao Presidente do Senado para que coloque na Ordem do Dia, desta terça, o projeto, de autoria de S. Exa., que evita que expedientes protelatórios levem à prescrição de ações. Comentário sobre a importância do Parlamento votar PEC que regulamenta a prisão em segunda instância. Pedido para que a Câmara dos Deputados vote o projeto que acaba com a prerrogativa de foro de autoridades públicas.
Publicação
Publicação no DSF de 19/11/2019 - Página 15
Assuntos
Outros > PODER JUDICIARIO
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL
Indexação
  • EXPECTATIVA, JULGAMENTO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ASSUNTO, SUSPENSÃO, INVESTIGAÇÃO, VINCULAÇÃO, DADOS, CONSELHO DE CONTROLE DE ATIVIDADES FINANCEIRAS (COAF), COMENTARIO, EXPERIENCIA, ORADOR, REFERENCIA, SORTEIO, LOTERIA FEDERAL, GESTÃO, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF).
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE, SENADO, INCLUSÃO, PAUTA, ORDEM DO DIA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBJETIVO, COMBATE, PRESCRIÇÃO, AÇÃO JUDICIAL, COMENTARIO, IMPORTANCIA, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), CONDENAÇÃO, SEGUNDA INSTANCIA, DEFESA, VOTAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROPOSTA, REDUÇÃO, FORO, PRIVILEGIO.

    O SR. ALVARO DIAS (PODEMOS - PR. Para discursar.) – Sr. Presidente Jorge Kajuru, Srs. Senadores presentes ou que nos ouvem neste momento, Sras. Senadoras, esta é uma semana muito importante na agenda da atividade pública brasileira. Decisões fundamentais poderão ser adotadas. E é preciso não ignorar as manifestações gigantescas de ontem nas ruas do Brasil. População indignada, mais uma vez, transportou a sua revolta para os grandes centros urbanos do Brasil para protestar contra decisões que afrontam as aspirações nacionais e que elevam o grau de indignação do povo brasileiro.

    Na próxima quarta-feira, provavelmente, se não ocorrer protelação, o Supremo Tribunal Federal deve decidir no plenário a respeito de uma providência adotada pelo Presidente Toffoli, há algum tempo, impedindo que as informações encaminhadas pelo Coaf – o então Coaf, que depois foi fulminado pela Presidência da República – à Polícia Federal e ao Ministério Público, pudessem ser utilizadas em inquéritos que aprofundam investigações de crimes cometidos no País. Essa foi uma decisão monocrática que surpreendeu.

    Nós conhecemos o Coaf, a legislação que o instituiu, que é de 1988, como decorrência de acordo celebrado pelo Brasil com outros países, em Viena, com o compromisso de combater a corrupção internacional. E, na esteira do surgimento do Coaf em nosso País, outros conselhos semelhantes foram criados em outras nações da América Latina. E eu quero testemunhar a competência, a lisura e a legalidade das ações desenvolvidas nos últimos anos desde então pelos técnicos do Coaf.

    Recentemente, em mais uma decisão considerada estapafúrdia do Presidente do Supremo Tribunal Federal, houve o requerimento de relatório sobre movimentação financeira alcançando 600 mil pessoas físicas e jurídicas – entre cidadãos e empresas, 600 mil. Foi surpreendente, porque não há como justificar. Respondendo ao Procurador-Geral da República, o Presidente do Supremo afirmou tratar-se da maior autoridade judicial do País, mas não pode tudo! Pode ser a maior autoridade judicial do País, mas não está acima da lei, não está acima da Constituição. O arbítrio não deve ser o caminho. Afrontar direitos individuais não se confere prerrogativa nem mesmo à maior autoridade judicial do País. Os direitos individuais consagrados na Constituição do País são inalienáveis, intocáveis e devem ser respeitados por todos os brasileiros.

    Repercutiu mal, evidentemente, aqui e no exterior. Antes, os auditores da Receita Federal já haviam comunicado ao Gafi – órgão instalado em Paris, na França, que reúne países conjugando esforços no combate ao terrorismo, ao narcotráfico e à lavagem de dinheiro –, com repercussão negativa, o comprometimento das ações da Receita Federal, por intermédio dos seus auditores, contribuindo notavelmente para que investigações ocorram no combate à corrupção.

    Ainda agora, durante a presença nesse encontro do Brics aqui, na Capital do País, membros da OCDE informaram que repercutem mal e comprometem a presença do Brasil na OCDE essas ações que envolvem o comprometimento do combate à corrupção no Brasil, como um retrocesso deplorável daqueles que querem a prevalência da impunidade, enquanto o povo brasileiro, que vai às ruas protestar, deseja a consagração de uma nova Justiça neste País.

    Eu preciso testemunhar a respeito do Coaf. Participei aqui, Senador Paulo Paim, de várias Comissões Parlamentares de Inquérito, inclusive presidindo duas delas. E pudemos sempre recorrer ao Coaf, que cumpre rigorosamente a lei. O art. 15 e o art. 17-B da lei que instituiu o Coaf estabelecem que esse conselho, ao constatar movimentações financeiras atípicas, informa à Polícia Federal e ao Ministério Público para o aprofundamento das investigações. E, nesse caso, não ocorre a quebra do sigilo bancário, o que só ocorrerá se as autoridades judiciárias entenderem necessário. Vamos à experiência pessoal. Senador Kajuru, nós requeremos informações do Coaf, por exemplo, na CPI do Futebol, que eu presidi e foi da maior importância, e até na CPI da Terra, que presidi, mas, na CPI dos Correios, na CPI dos Bingos, foram sempre fundamentais as informações recolhidas do Coaf.

    Agora, eu quero lembrar aqui uma experiência pessoal que vivi. Denunciava, desde 2005, a suposta irregularidade em sorteios das loterias federais administradas pela Caixa Econômica. Desde 2005, vinha denunciando. Sem resposta, requeri ao Coaf informações e as recebi. Relato agora como procede o Coaf, respeitando a legislação. Chegando isso à Mesa do Senado Federal e à Secretaria da Mesa, o Senador é convocado para receber um envelope lacrado, com uma tarja escrito "sigiloso", e um documento a ser assinado pelo Parlamentar, assumindo a responsabilidade pelo sigilo, sob pena de responsabilização. Assinei o documento aqui, junto à Mesa do Senado, abri o envelope e fiquei estarrecido: um cidadão havia ganhado mais de 600 vezes na loteria; o outro, mais de 250 vezes; um outro, mais de 100 vezes; um ganhador, no mesmo dia, foi premiado em várias loterias, em várias localidades, fazendo inveja ao João Alves.

    Muitos se lembram do Deputado João Alves que foi indiciado pela CPI do Orçamento e, depois, responsabilizado criminalmente. Ele justificava a robustez da sua conta bancária aos prêmios ganhos nas loterias, como se fosse um abençoado de Deus.

    Pois bem, esses alunos do João Alves superaram o mestre. E eu não poderia ficar calado. Refleti sobre as consequências, mas concluí que eu não poderia ser um baú a esconder crimes. Vim para esta tribuna – exatamente esta tribuna – e denunciei, vazando, portanto, as informações fornecidas pelo Coaf.

    Senador Telmário, a Polícia Federal instaurou inquérito para apurar eventual lavagem de dinheiro, porque a suposição seria lavagem de dinheiro, um conluio: alguém da Caixa em conluio com alguém da lotérica e o malandro corrupto que comprava o bilhete premiado. Por isso, comprava muitos bilhetes premiados. Não importava o valor – poderia ser valor menor –, não era necessário ser o primeiro prêmio, ao contrário, e, por isso, a quantidade de prêmios. Comprava o bilhete premiado e lavava o dinheiro junto à Caixa Econômica. Apresentava-se com o bilhete premiado, recebia o dinheiro limpo da Caixa Econômica, e o dinheiro sujo ia para as mãos do verdadeiro ganhador do prêmio. Essa é a hipótese que nós aventamos, e pedimos que a Polícia Federal instaurasse o inquérito. A Polícia Federal o fez, mas houve um inquérito também em relação ao vazamento. Eu fui alvo de investigação também: passei a ser investigado, porque fui acusado de vazar informações sigilosas do Coaf.

    Eu estou fazendo essa narrativa exatamente para demonstrar como funciona esse conselho ou como funcionava esse conselho: com absoluta legalidade, respeito à lei. Um Senador da República que faz a denúncia é alvo de inquérito, porque supostamente vazou as informações do Coaf. Eu fui intimado a depor e fui à Polícia Federal. O delegado se surpreendeu: "O que você veio fazer?". Respondi: "Eu vim depor, eu fui intimado". Ele falou: "Não, mas nós iríamos ao seu gabinete. Parlamentar tem essa prerrogativa". Eu disse que não, que eu abria mão dos privilégios dos Parlamentares e ia até lá para dizer: "Fui eu que vazei. Vim aqui para confessar. Não perca o tempo. A Polícia Federal tem muito a fazer. Há bandido demais solto neste País, há corrupto demais a ser perseguido pela Polícia Federal. Não percam tempo comigo, não gastem papel. Fui eu!". E assinei. Isso foi para o Procurador-Geral da República. A Subprocuradora assumiu e denunciou o vazamento. Conforme a legislação, caberiam três anos de prisão. Eu até gostaria de ser preso por ter denunciado um escândalo de corrupção. Às vezes, eu fico imaginando: muitos querem prender quem denuncia e soltar quem roubou ou quem cometeu ilícitos. Esse seria o caso, mas isso não chegou ao Supremo, porque prescreveu.

    Aliás, há um projeto de minha autoria que está aqui exatamente para evitar prescrições apressadas.

    E eu gostaria muito de ver esse debate no Supremo Tribunal Federal. O meu advogado à época, Dr. René Dotti, estava muito estimulado a participar desse debate. Qual deve ser a ação de um Senador da República: guardar o segredo do crime, transformando-se em verdadeiro baú a esconder falcatruas ou denunciar, mesmo correndo o risco da responsabilização por vazar uma informação sigilosa? Eu gostaria muito de ter visto esse debate no Supremo Tribunal Federal, mas isso prescreveu.

    Por isso, hoje, eu apelo ao Presidente Davi Alcolumbre para que coloque amanhã na Ordem do Dia o meu projeto que trata exatamente da prescrição, para evitar que expedientes protelatórios levem à prescrição ações promovendo a impunidade, libertando réus da condenação. É muito importante esse projeto, que foi elaborado e sugerido pelo Ministro Edson Fachin e que eu tive a oportunidade de apresentar em 2015. Agora, como o Presidente do Supremo, Toffoli, sugeriu um projeto dessa natureza, nós temos a oportunidade de votar um projeto que já está tramitando no Senado Federal desde 2015.

    Fiz esse relato sobre o Coaf, para lamentar a sua extinção, mais uma vez. Há aqui uma medida provisória que ainda não votamos e que cria a Unidade de Inteligência Financeira para substituir o Coaf – e não substitui. Hoje ainda, o Procurador-Geral da República, Aras, declara a sua preocupação com a possibilidade de transformarem o Brasil num paraíso fiscal, já que estamos eliminando mecanismos fundamentais de fiscalização e controle, de investigação e combate à corrupção no nosso País. Querem transformar esta grande Nação num paraíso fiscal! Que lástima, Senador Kajuru!

    Nós ainda temos esperanças de que a reação ocorra nesta Casa em relação a essas questões essenciais. Não podemos invadir competência e exigir do Supremo Tribunal Federal ações que correspondam às aspirações nacionais levadas, ainda ontem, às praças públicas deste País, mas podemos dizer, em resposta à sociedade, que o Congresso Nacional não vai faltar. Fomos convocados, temos que assumir a responsabilidade! É urgente votar, sim, a prisão em segunda instância, seja o projeto de V. Exa., Senador Kajuru, que altera o art. 283, seja o do Senador Alessandro, seja o do Senador Lasier, que também altera o art. 283 do Código de Processo Penal, seja a proposta de emenda à Constituição do Senador Oriovisto.

    A minha proposta de emenda à Constituição, que é de 2017, está preterida, porque ela dormiu nas gavetas. Mais sorte teve o Senador Oriovisto, porque a sua proposta caiu nas mãos hábeis da Senadora Juíza Selma, que proferiu o seu parecer em regime de urgência, colocando-o à disposição da Comissão de Constituição e Justiça para deliberação. Regimentalmente, eu poderia requerer apensamento, e prevaleceria o projeto anterior, que é de minha autoria, que foi reapresentado em 2018, levando o número 13, mas isso não importa, nós não faremos isso. Nós queremos celeridade, queremos que o projeto do Senador Oriovisto possa ser debatido e possa ser votado nesta quarta-feira, na Comissão de Constituição e Justiça.

    E não é só esse projeto. Está na Câmara dos Deputados à espera de deliberação o projeto que acaba com o foro privilegiado, que é mais importante do que muitos imaginam. E eu vou dizer por quê. Com o foro privilegiado, só os ministros do Supremo Tribunal Federal podem julgar e eventualmente condenar Senadores – em razão do foro privilegiado. E só os Senadores podem, eventualmente, julgar e condenar, decretando seu impeachment, ministros do Supremo Tribunal Federal. E aí se estabelece uma espécie de conluio, um sistema de reciprocidade de proteção, com uns protegendo os outros. E, por isso, o sistema não funciona, funciona a favor da impunidade, mas...

(Soa a campainha.)

    O SR. ALVARO DIAS (PODEMOS - PR) – ... não funciona a favor do Brasil, não funciona a favor da justiça.

    Por isso, ao concluir, Sr. Presidente, mais uma vez, apelo para que compromisso público assumido seja respeitado, e a Câmara dos Deputados vote imediatamente o projeto que acaba com o privilégio de mais de 55 mil autoridades neste País, da tal prerrogativa de foro, que nós chamamos de foro privilegiado, porque é um guarda-chuva protetor da malandragem no Brasil, é o paraíso da impunidade, é o estandarte daqueles que querem, de colarinho branco, corromper e ser corrompidos.

(Interrupção do som.)

    O SR. ALVARO DIAS (PODEMOS - PR) – Nós queremos que o Brasil mude para valer. E este País precisa de reformas. O Congresso está preocupado em promover reformas, mas certamente, a reforma maior, a primeira, a superior é a reforma moral, é a reforma ética. Sem ela, as demais não lograrão êxito.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/11/2019 - Página 15