Discurso durante a 253ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Homenagem ao patrono da educação brasileira, Paulo Freire.

Críticas ao Presidente da República, Jair Bolsonaro.

Autor
Fabiano Contarato (REDE - Rede Sustentabilidade/ES)
Nome completo: Fabiano Contarato
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM:
  • Homenagem ao patrono da educação brasileira, Paulo Freire.
PODER EXECUTIVO:
  • Críticas ao Presidente da República, Jair Bolsonaro.
Aparteantes
Randolfe Rodrigues, Weverton.
Publicação
Publicação no DSF de 18/12/2019 - Página 53
Assuntos
Outros > HOMENAGEM
Outros > PODER EXECUTIVO
Indexação
  • HOMENAGEM, PATRONO, EDUCAÇÃO, PAULO FREIRE.
  • CRITICA, JAIR BOLSONARO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DECLARAÇÃO, PAULO FREIRE.

    O SR. FABIANO CONTARATO (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES. Para discursar.) – Sr. Presidente, obrigado.

    Eu quero aqui, em breves palavras, falar um pouco sobre o patrono da educação brasileira, Paulo Freire. Paulo Freire, para quem não sabe, recebeu 35 títulos de Doutor Honoris Causa, e, lamentavelmente, o Presidente da República o chamou de energúmeno.

    Eu queria que o Presidente da República consultasse o dicionário porque, se ele etimologicamente analisar a palavra energúmeno, ele vai falar que esse adjetivo cabe muito bem ao Presidente da República, porque ele é totalmente desvairado, ele não tem compromisso. Você querer acabar com a TV Escola e atribuir esse adjetivo de energúmeno a Paulo Freire, eu não posso me furtar, eu não posso me calar. Paulo Freire nos faz pensar, ele nos ensina a pensar.

    Eu queria sugerir ao Presidente da República que procedesse à leitura de algumas obras de Paulo Freire, como Educação como Prática e Liberdade, Pedagogia do Oprimido, Pedagogia da Autonomia, Pedagogia da Indignação. E se mesmo assim o Presidente não se tornar uma pessoa um pouco melhor para difundir mais amor, eu o convido a proceder à leitura dos pensadores. Se ele quiser saber um pouco sobre a função social da propriedade, vá ler Locke; se ele quiser saber um pouco sobre a verdade e as formas jurídicas, vá ler Michel Foucault; se ele quiser saber um pouco da concepção de Estado, leia Maquiavel, Thomas Hobbes, na obra Leviatã. São tantos. Leia Immanuel Kant e o utilitarismo, de Stuart Mill, mas não venha falar que a educação brasileira está um caos, porque ele é o Chefe desta Nação e ele só executou 8% do orçamento para a educação infantil, ele só destinou 7% para a educação profissional e 4% para a educação básica. Então, não venha atribuir ao nosso patrono da educação Paulo Freire, que é citado pelo mundo como um dos maiores doutrinadores na área educacional...

    Energúmeno é um Presidente misógino, preconceituoso, sexista, homofóbico, racista, que passa uma reforma da previdência para aumentar a desigualdade, que só beneficia banqueiros, empresários e a União e que só tem como destinatário tirar direito dos mais pobres. Energúmeno é um Presidente que não age como um verdadeiro estadista; que não sabe respeitar as instituições; que não sabe que os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário são independentes, mas harmônicos entre si; que não sabe ser um bom articulador no sentido bom da palavra, transitando entre o Ministério Público Federal, a Advocacia-Geral da União, entre todos os Poderes constituídos, entre o Tribunal de Contas da União e dos Estados. Energúmeno é um Presidente que viola direitos elementares, como a saúde, como a educação, que não viabiliza emprego e renda, que não diminui a carga tributária. Agora, não chame Paulo Freire, não ouse pronunciar o nome dele. Acho que o Presidente tinha que limpar a boca antes de falar no nosso mestre da educação Paulo Freire e não ficar aprovando um corte no orçamento para o MEC em 2020 de 17%. E ele falando de Paulo Freire como energúmeno? Não, não posso me calar diante disso!

    Um piso salarial ínfimo para os professores no Brasil, de R$2,5 mil, mas há Estados, como o meu, em que professores ganham R$909 para trabalhar 25 horas, e são verdadeiros missionários – são verdadeiros missionários. Energúmeno é um Chefe do Executivo quando nós temos em nosso País apenas 27,3% das escolas públicas de ensino fundamental que contam com biblioteca; apenas 37% com quadras esportivas; e apenas 8,1% dos estabelecimentos têm laboratório de ciências.

    Ah, Senhor Presidente, busque o dicionário, aprenda o que é um energúmeno, tome a postura como um Presidente da República Federativa do Brasil, porque isso o senhor está longe de ser. O senhor faria muito pela Nação brasileira se o senhor renunciasse; não só pela Nação brasileira, mas pela população mundial, porque o desmonte está sendo operacionalizado no Brasil, seja na educação, na segurança, na saúde, no meio ambiente, e nós temos que mudar.

    É necessário que esta Casa marque a sua função, ponha a sua digital para corrigir isso, porque um Presidente que flerta com AI-5, que não reconhece a ditadura e que ainda ousa falar que, se um ministro dele tiver qualquer conduta desvirtuosa, ele deveria ser pendurado num pau de arara, que é comportamento típico de tortura, isso não o credencia a ser um verdadeiro estadista, Presidente da República Federativa do Brasil. Eu tenho vergonha do nosso Presidente da República.

    Com a palavra o Senador Randolfe Rodrigues.

    O Sr. Randolfe Rodrigues (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - AP. Para apartear.) – Presidente, cumprimentando V. Exa., ou melhor, Senador Fabiano, cumprimentando V. Exa. cumprimento o autor da sessão solene que faremos neste Plenário no ano que vem, em homenagem ao patrono da educação brasileira. É simples a comparação: na verdade, o Presidente da República correu o risco de se colocar ao se comparar a Paulo Freire. Que risco Sua Excelência o Presidente da República está correndo! Já que ele próprio se colocou no patamar de comparação, vamos à comparação.

    Quem é, Senador Weverton, o Presidente da República? Quem é Paulo Freire? Paulo Freire é o patrono da educação brasileira. Não adianta o sujeito que está ali no Ministério da Educação tentar tirar o busto de Paulo Freire lá do Ministério da Educação; não adianta tentar colocar o filósofo lá da Virgínia, dos Estados Unidos, com suas ideias exotéricas, que chega a pensar, inclusive, que a Terra não tem circunferência, que a Terra é plana; não adianta colocar no mesmo patamar, porque o patrono da educação brasileira é Paulo Freire. E, por mais bustos que se tirem, há um busto alicerçado no patamar da história para Paulo Freire.

    Quem é o Presidente da República? E quem é Paulo Freire? É o brasileiro mais homenageado de todos os tempos, com 35 prêmios honoris causa em 35 universidades pelo mundo. Não é o Brasil que reconhece Paulo Freire, Senhor Presidente da República, é o mundo.

    Quem é Jair Bolsonaro? Quem é Paulo Freire? É um dos sete grandes senhores dos saberes, ele está consagrado, é um dos poucos, meu caríssimo Weverton, que tem sua estátua alicerçada na sede internacional da Unesco, pois é reconhecido assim.

    Quem é o Presidente da República, o Senhor Jair Bolsonaro? Quem é Paulo Freire? Paulo Freire é reconhecido pela Unesco, não como homem, não somente pela sua condição humana, mas, em especial, pela obra que ele empreendeu para a educação, principalmente dando luz a uma teoria nova da educação, chamada Pedagogia do Oprimido. Este, Senador Fabiano, é Paulo Freire. Quem é o Senhor Jair Bolsonaro? O lugar de um, o panteão dos heróis da história; o lugar de outro, a lata do lixo da história, para que ele caminha a passos largos.

    O SR. FABIANO CONTARATO (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) – Ou para o Tribunal Penal Internacional ou, como já foi denunciado também, para a ONU.

    Senador Weverton.

    O Sr. Weverton (Bloco Parlamentar Senado Independente/PDT - MA. Para apartear.) – Eu queria cumprimentar V. Exa., agradecer a todo o Plenário que, por unanimidade, aprova esse pedido de sessão solene no ano que vem. Em data a ser combinada, iremos fazer essa sessão in memoriam para poder homenagear um homem que dedicou toda a sua vida à causa da educação, à causa dos excluídos, à causa da inclusão.

    Homenagear Paulo Freire é reconhecer a própria história do Brasil. Um homem que, em 1963, em Angicos, no Rio Grande do Norte, alfabetizou 300 pessoas e logo no ano seguinte chega a Brasília, onde coordenava o plano de alfabetização do Presidente Goulart, e é surpreendido por aquele golpe que o deixou 70 dias preso, indo depois ao exílio. Nós sabemos o quanto que ele teve que focar na resistência e nesse foco maior de sempre estar procurando os oprimidos, os que não conseguem olhar no fim do túnel sequer um sinal de luz, porque nós sabemos o que é realmente o cidadão não ter direito a ser alfabetizado. Esta é a escuridão pior que há para qualquer ser humano, para qualquer cidadão: a de não ter o direito de ler, o direito de escrever, o direito de ser incluído numa sociedade que, por si só, já é muito divisionária, já é muito dura com quem realmente tem menos e que, de forma mais privilegiada, sempre ajudou a construir pequenos ou fortes elites, que acham que o mundo gira em torno delas.

    Não é apenas a parte de dentro dos muros das universidades que precisa se indignar com tamanha agressão ao mestre da educação, à referência dessa inclusão, mas, sim, qualquer homem e mulher que sabem que um dia nós podemos ser melhores se nós praticarmos o bem, e praticar o bem é apoiar, de forma intransigente, não só a educação, mas também defender os educadores agora, como V. Exa., nosso Líder Randolfe e toda esta Casa o faz.

    Então, parabéns, Senador Contarato, Senador Randolfe. Nós estamos aqui na luta, na resistência e não vamos aumentar ou elevar esse tom alto, como eles gritam e com o que tentam nos intimidar. Não nos calarão, não nos intimidarão, nós não podemos cair e achar que essa ditadura do pensamento único, que eles querem impor aqui dentro do nosso País, vai funcionar. Vão ter que conviver com uma coisa que foi aprovada já há algum tempo, uma Carta que já está madura, que é a nossa Constituição, é esse regime que nós estamos aqui vivendo, que é o da democracia, é o direito de falar, é o direito de discordar, é o direito de ir e vir.

    Nós temos que aprender mais do que nunca que agora é um trabalho de conscientização que nós vamos fazer com o povo brasileiro para que, se Deus quiser, daqui a três anos – porque já se foi um –, a gente possa corrigir esse grande erro que nós cometemos simplesmente a pretexto de achar que iríamos acabar com uma dicotomia ou com uma disputa de polarização de poderes e aí "voto em qualquer um menos nos que estavam aí". Mas esse "qualquer um" está saindo caro, caro para educação, caro para o trabalhador rural, caro para o mais fraco e para o mais pobre. E nós temos que ter a coragem de estar aqui resistindo e dizendo "temos um lado". O Brizola já dizia: "Na dúvida, fique do lado do povo", e é isso que nós estamos construindo aqui.

    Parabéns, Contarato.

    O SR. FABIANO CONTARATO (Bloco Parlamentar Senado Independente/REDE - ES) – Obrigado, Senador; obrigado, Presidente; obrigado a todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/12/2019 - Página 53