Discurso durante a 18ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas aos benefícios econômicos usufruídos por agentes políticos no Brasil.

Posicionamento contrário ao foro privilegiado por prerrogativa de função.

Leitura de mensagem de Chico Xavier sobre a confiança.

Autor
Eduardo Girão (PODEMOS - Podemos/CE)
Nome completo: Luis Eduardo Grangeiro Girão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CONSTITUIÇÃO:
  • Críticas aos benefícios econômicos usufruídos por agentes políticos no Brasil.
CONSTITUIÇÃO:
  • Posicionamento contrário ao foro privilegiado por prerrogativa de função.
RELIGIÃO:
  • Leitura de mensagem de Chico Xavier sobre a confiança.
Publicação
Publicação no DSF de 10/03/2020 - Página 51
Assuntos
Outros > CONSTITUIÇÃO
Outros > RELIGIÃO
Matérias referenciadas
Indexação
  • CRITICA, PRIVILEGIO, AUTORIDADE, EXECUTIVO, LEGISLATIVO, REPUDIO, VANTAGENS, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMENTARIO, ORADOR, RELATOR, PROPOSTA, SUGESTÃO, COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS (CDH), ASSUNTO, EXTINÇÃO, REGALIA, REDUÇÃO, FUNDO DE APOIO, CAMPANHA ELEITORAL.
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO (PEC), ASSUNTO, EXTINÇÃO, FORO ESPECIAL, TRAMITAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA, COMPARAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ALEMANHA, CHINA.
  • LEITURA, DOCUMENTO, FRANCISCO CANDIDO XAVIER, CONFIANÇA.

    O SR. EDUARDO GIRÃO (PODEMOS - CE. Para discursar.) – Muito boa tarde, Sr. Presidente desta sessão, Senador Izalci Lucas, Senador Paulo Paim, demais assessores, funcionários desta Casa e todos que estão nos assistindo agora pela TV Senado ou nos ouvindo pela Rádio Senado, nesta tarde, quase noite de segunda-feira, dia 9 de março de 2020.

    Eu subo a esta tribuna novamente com muita gratidão a Deus pela saúde, pelo discernimento, pela oportunidade de estar servindo ao meu País, representando o meu Estado do Ceará, o meu povo, num momento importante desta Nação.

    Eu quero fazer um pronunciamento agora sobre privilégios de autoridades.

    A gente sabe que o Brasil é um país excepcional. Não existe nada parecido com a nossa Nação. É o mais rico do Planeta, quando levamos em conta, além da economia, os recursos naturais, a oferta de energia, a disponibilidade de água, a quantidade de terras agriculturáveis e a biodiversidade. Mas ostenta também um dos maiores paradoxos do mundo: é o campeão mundial no quesito desigualdade social. Aqui, os 2% mais ricos da população concentram uma riqueza equivalente a 80% dos brasileiros. Somos um país maior que a Índia, que tem mais de 1,4 bilhão de habitantes. Porém aqui, com apenas 208 milhões de pessoas, temos 17 milhões de famílias dependendo de programas sociais, como o Bolsa Família e o BPC, pois são famílias que vivem na degradante situação de miséria, totalizando quase 60 milhões – acreditem! – 60 milhões de irmãos e de irmãs nossos.

    Num país tão rico como o Brasil, programas absolutamente necessários como esses deveriam ser emergenciais e temporários, jamais permanentes, demonstrando incompetência ou crueldade da elite brasileira na promoção de mecanismos de distribuição de riqueza que, para terem eficácia, requerem de forma imprescindível o acesso universal à educação de qualidade como bem há pouco falou o Senador que me antecedeu, o Senador Izalci Lucas.

    Como Senador da República, digo com imensa tristeza, que a classe política tem preponderância nessa pequena elite dirigente. Falo aqui desde um Vereador de uma pequena cidade do interior até o Presidente da República. São pessoas que, ao serem escolhidas democraticamente pela população para representá-los nas esferas públicas de poder, deveriam ser as primeiras a fazerem um esforço em dar bons exemplos de conduta ética, mas, infelizmente, não é o que tem acontecido ao longo de toda a nossa história, com raríssimas e honrosas exceções.

    Ao mesmo tempo em que eu falo – e vou dar dados para vocês – com tristeza no coração, eu tenho muita esperança, muita esperança mesmo. Eu vejo com otimismo esse movimento de cada vez mais a população participar da vida política, a população se mobilizar. Isso tem feito a diferença no País. Eu estou aqui por isso.

    E você que está nos ouvindo ou nos assistindo pode estar aqui neste lugar, por mais que ache difícil. "Poxa, mas eleição é uma coisa muito cara." Quando chega a hora, chega a hora. Chega da mesma forma e eu vejo casos de colegas aqui no Senado. O Senador Styvenson é um dos que, com R$30 mil, conseguiu ser eleito Senador da República. Deus multiplica a boa vontade das pessoas e, quando tem que acontecer, acontece. Mas, primeiro, o cidadão tem que se colocar à disposição de uma disputa eleitoral, colocar o seu nome, as suas ideias. E aí o universo se move e, se for para o bem do País, da sua cidade, do seu Estado, coisas impressionantes acontecem para ele ser eleito.

    Eu queria continuar aqui meu discurso dizendo que todo ex-Presidente da República tem assegurado pela lei o direito vitalício de ter oito assessores – você sabia disso? São quatro seguranças, dois motoristas, com salários de até R$13 mil –, tem também o direito de requisitar passagens e diárias para cobrir despesas com hospedagem e alimentação. Além disso, ainda recebem dois automóveis com a cobertura de todos os gastos, incluindo o combustível. Tudo isso é pago pela Presidência da República do Brasil, com o dinheiro suado e sofrido do contribuinte brasileiro, que é massacrado por uma das maiores cargas tributárias do mundo, sem que recebam do Estado sequer uma educação pública de qualidade.

    Somente em 2018, dois anos atrás, os ex-Presidentes, depois da redemocratização do País, custaram ao Estado a bagatela de R$4,6 milhões. Coincidentemente, foi exatamente esse mesmo valor que eu economizei como Senador em 2019, ao abrir mão de muitos privilégios e regalias que um Senador tem de benefício.

    Agora, o que a gente precisa entender e não fechar os olhos é para um exemplo que vem de um recente Presidente da República do Brasil, o Presidente Lula, que, mesmo enquanto esteve preso, condenado por corrupção pela Operação Lava Jato, não abriu mão de suas regalias.

    O Ministério Público pediu a suspensão, mas os advogados do ex-Presidente recorreram e ganharam. O custo total do período de 580 dias em que esteve em Curitiba foi de R$5,8 milhões, ou seja, cada dia na prisão custou R$10 mil, valor equivalente a uma diária em hotel de luxo de qualquer polo turístico do mundo.

    Mas trago também uma boa notícia a respeito desse tema. Tive a grata honra de ser o Relator, na Comissão de Direitos Humanos, da Sugestão Legislativa, a chamada SUG, nº 23, apoiada por mais de 20 mil cidadãos brasileiros, que propõe o fim dessas regalias para ex-Presidentes e ex-Governadores. Esse projeto está tramitando com força na Comissão de Direitos Humanos. Já foi aprovado e já está tramitando em outras. Espero que, neste ano de 2020, a gente possa conseguir a aprovação final nesta Casa para, juntamente com o povo brasileiro, irmos à Câmara dos Deputados e tentar aprovar o mais rápido possível.

     Tenho outra boa notícia: nós conseguimos, na semana passada, aproveitar também uma SUG que procura diminuir em 50%, congelando por 20 anos, o chamado Fundo Eleitoral. Isso é algo que foi aprovado na Comissão de Direitos Humanos, com um relatório nosso, e é outra conquista que mostra que novos tempos estão chegando à nossa Nação.

    Quando aqui cheguei, além de abrir mão dos benefícios relatados anteriormente, como auxílio-moradia, plano de saúde vitalício, aposentadoria, o próprio veículo que é dado a cada Senador, um carro, eu também abri mão de benefícios como... Tentei renunciar a outra excrecência, que é o foro por prerrogativa de função, conhecido como foro privilegiado. Agora, para minha surpresa, descobri que esse direito de renúncia pessoal me é vedado pela Constituição. Então, com o apoio de 30 colegas Senadores, dei entrada na PEC 134, de 2019, que altera a Constituição de forma a permitir a renúncia do foro. Essa PEC também se encontra na CCJ, a Comissão de Constituição e Justiça, aguardando designação de Relator.

    Existe um grande abuso no Brasil na definição de quais autoridades públicas estão contempladas com essa regalia. Nos Estados Unidos, não existe foro privilegiado. Na Alemanha, apenas uma pessoa tem esse benefício. Na China, são 2.987 autoridades, mas, no Brasil – se você não estiver sentado, sente-se –, são 45,4 mil pessoas contempladas com esse privilégio, que é permitido, como se fosse um guarda-chuva da corrupção, que é a grande chaga ainda de nossa Nação.

    Esse abuso na utilização do foro privilegiado, descabido, levou o Senador Alvaro Dias a ingressar com a PEC nº 10, de 2013, propondo o fim desse foro para todos os políticos. A PEC foi aprovada pelo Plenário do Senado em 2017, o Senado já fez a parte dele nesse aspecto – olha que coisa bacana –, mas ela se encontra estagnada na Câmara dos Deputados, desde dezembro de 2018. Está prontinha para ser votada, aguardando apenas que seja pautada pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Rodrigo Maia.

    Penso que sem a pressão legítima da sociedade sobre os Parlamentares, essa PEC continuará dormindo nos arquivos da Câmara. Trata-se de um inadmissível desrespeito ao povo brasileiro que, em sua grande maioria, mesmo pagando tantos impostos, tem enorme dificuldade em ter acesso à Justiça comum. Além disso, tal dispositivo fere frontalmente os princípios de que somos todos iguais perante a lei, princípio esse que deve nortear a vida republicana.

    Ao fazer esse pronunciamento, não estou querendo, de forma alguma, me colocar numa presunçosa condição de superioridade perante meus colegas Parlamentares – longe disso. Somos todos seres humanos ainda muito imperfeitos. Também não desejo alimentar uma falsa ideia de que acabar com todas essas regalias concedidas às autoridades públicas seja um fator decisivo para combater o grande mal que assola esta Nação, a corrupção, em todos os níveis, e que já atingiu um estado de câncer em metástase no Brasil. Mas, ao mesmo tempo, estou plenamente convencido da extraordinária força do bom exemplo, principalmente por parte das pessoas que exercem funções públicas em todas as esferas, seja no Poder Legislativo, seja no Poder Executivo ou no Poder Judiciário. O exemplo tem que vir de cima. Isso é fundamental.

    Todos deveriam ter consciência de sua enorme responsabilidade, pois milhares ou mesmo milhões de olhos estão atentos ao comportamento de nós representantes do povo brasileiro, através da repercussão cada vez mais ampliada das notícias veiculadas nas redes sociais.

    Como podemos esperar que se consolide, em toda a sociedade brasileira, uma cultura que privilegia os valores da honestidade e da integridade de caráter, se essa mesma sociedade assiste, todos os dias, à divulgação de notícias infelizmente verdadeiras, em que parte expressiva da elite dirigente da Nação promove o mau exemplo? São atitudes egoístas, mesquinhas e gananciosas, completamente incompatíveis com a ética esperada daqueles que, numa República, são escolhidos para cuidar dos interesses coletivos da Nação.

    Desde que assumi o mandato, por delegação de 1.325.727 pessoas, venho orando muito para não perder o otimismo com meu querido Brasil.

    Num desses períodos mais ricos da nossa história, a Abolição da Escravatura e a Proclamação da República, pisou o chão desse solo um extraordinário político. Trabalhou como jurista, jornalista, economista, escritor, orador e foi o autor e relator da primeira Constituição brasileira. Oro para que o exemplo que vou deixar para as próximas gerações, ao concluir este mandato, não seja jamais uma contribuição para o famoso vaticínio proferido pelo então Senador Ruy Barbosa, cujo busto está aqui neste Plenário do Senado Federal, abaixo, obviamente, como tinha que ser, do símbolo cristão, Jesus.

    O Senador Ruy Barbosa dizia: "De tanto...

(Soa a campainha.)

    O SR. EDUARDO GIRÃO (PODEMOS - CE) – ... ver triunfar as nulidades; [...] de tanto ver crescer a injustiça; de tanto ver agigantar-se o poder nas mãos dos maus, [...] [o ser humano] chega a desanimar-se da virtude; a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto".

    Eu queria, neste momento, Presidente e Senador Jean Paul Prates, do Estado vizinho ao meu Ceará, o Rio Grande do Norte – vizinho e irmão, como ele está dizendo –, mais um minutinho para eu terminar com uma mensagem que preenche o meu espírito.

    Eu não tenho dúvida de que este Brasil vai dar certo – vai dar certo! A gente precisa trabalhar, confiar e se aprimorar, porque aqui há um aprendizado diário na convivência. Todos nós aprendemos aqui e procuramos ser melhores um pouquinho para poder servir com dignidade ao nosso País.

    Então, leio a mensagem de Chico Xavier, que diz o seguinte:

Confie sempre. Não percas a tua fé entre as sombras do mundo. Ainda que teus pés estejam sangrando, segue para a frente, erguendo-a, por luz celeste, acima de ti mesmo. Crê e trabalha. Esforça-te no bem e espera com paciência. Tudo passa e tudo se renova na terra, mas o que vem do céu permanecerá. De todos os infelizes, os mais desafortunados são os que perderam a confiança em Deus e em si mesmo, porque o maior infortúnio é sofrer a privação da fé e prosseguir vivendo. Eleva, pois, o teu olhar e caminha. Luta e serve. Aprende e adianta-te. Brilha a alvorada além da noite. Hoje, é possível que a tempestade te abata o coração e te atormente o ideal, aguilhoando-te com a aflição ou ameaçando-te com a morte. Não te esqueças, porém, de que amanhã será outro dia.

(Soa a campainha.)

    O SR. EDUARDO GIRÃO (PODEMOS - CE) – Essa é uma mensagem de Chico Xavier, que a gente deve, independentemente da crença, se católicos, se espíritas, se evangélicos, se budistas ou se de outra religião afrodescendente... O Brasil é fantástico porque essas religiões todas dialogam com fraternidade, convivem bem, e a gente sabe que Deus tem um plano para este País, e esse plano é de muito progresso, de ordem, de felicidade. Nós vamos lutar aqui, no limite das nossas forças, com todas as nossas imperfeições e limitações, para trabalhar para que esta Nação chegue, o mais rápido possível, para os nossos filhos e para os nossos netos, porque riqueza aqui há muita, é um país fabuloso.

(Interrupção do som.)

    O SR. EDUARDO GIRÃO (PODEMOS - CE) – E a gente vai fazer a nossa parte, já estamos fazendo, para que este País seja um país cada vez mais justo e fraterno.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/03/2020 - Página 51