Interpelação a convidado durante a 19ª Sessão de Debates Temáticos, no Senado Federal

Sessão de Debates Temáticos destinada ao comparecimento do Sr. Ernesto Araújo, Ministro das Relações Exteriores, a fim de prestar informações sobre a atuação do Ministério nos esforços para obtenção de vacinas contra a Covid-19.

Autor
Jean-Paul Prates (PT - Partido dos Trabalhadores/RN)
Nome completo: Jean Paul Terra Prates
Casa
Senado Federal
Tipo
Interpelação a convidado
Resumo por assunto
SAUDE:
  • Sessão de Debates Temáticos destinada ao comparecimento do Sr. Ernesto Araújo, Ministro das Relações Exteriores, a fim de prestar informações sobre a atuação do Ministério nos esforços para obtenção de vacinas contra a Covid-19.
Publicação
Publicação no DSF de 25/03/2021 - Página 60
Assunto
Outros > SAUDE
Indexação
  • SESSÃO DE DEBATES TEMATICOS, DESTINAÇÃO, COMPARECIMENTO, MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), SOLICITAÇÃO, INFORMAÇÃO, ATUAÇÃO, AQUISIÇÃO, OBTENÇÃO, VACINA, COMBATE, PANDEMIA, NOVO CORONAVIRUS (COVID-19).

    O SR. JEAN PAUL PRATES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - RN. Para interpelar convidado.) – Obrigado, Presidente.

    Obrigado, Ministro, por comparecer aqui conosco. É um dia ruim, particularmente ruim, para V. Exa. e para o Brasil: para o Brasil, porque perdeu, chegou a este recorde, mais um número, 300 mil mortes – estamos todos consternados; para V. Exa., porque, pelo que o noticiário deu, esquentaram a sua frigideira aí, pela manhã, e o senhor, assim mesmo – por isso, eu o agradeço – vem a esta Casa, mas eu não posso ter condescendência também, não, porque o cenário brasileiro, infelizmente, não permite mesuras diplomáticas aqui, hoje, com V. Exa.

    Aliás, continuo perturbado pela presença do assessor que fez esses gestinhos, aí atrás do Presidente do Senado. Encontra-se aí, se não me engano, atrás do convidado agora; continua aí, confortavelmente sentado, não sei se esperando. A TV Senado até tirou o foco aqui, desviou um pouco o enquadramento, para tentar tirá-lo, para evitar algum outro gesto. Não sei nem que gesto importa tanto, se é um neofascista, se é uma ofensa depreciativa, o fato é que aqui não é local, nem momento para fazer gracinha, pagar aposta para ninguém. Não sei o que é isso aí, mas vai ser investigado. Certamente, o Presidente não vai deixar isso aí acontecer dessa forma.

    Eu queria me permitir aqui continuar um pouco, tentar entender, já que o senhor gosta de falar muito em ideologia, qual é a sua ideologia.

    Eu compilei algumas coisas aqui dessa teoria antiglobalista e acho que o auge da sua manifestação a respeito disso ocorreu no dia 02/12/2020, em dezembro de 2020, exatamente no epicentro do multilateralismo, na ONU, numa sessão remota com a presença 90 Presidentes e Primeiros-Ministros. Ali, o Chanceler brasileiro fez questão de romper o tom de apoio ao multilateralismo, que grassava justamente entre todos os Governos, e deixar claro que foram Governos nacionais que deram resposta à crise, como se alguma coisa realmente pudesse excluir a outra ou se já tivesse havido realmente solução para a crise.

    Faço aqui as aspas: "Para ele a crise deve ser enfrentada por nações individuais, agindo de forma coordenada. Em sua visão, a ONU é apenas uma plataforma para compartilhar experiências".

    Em outro artigo aqui que coletamos no Nexo Jornal – e aqui eu ressalto que essa é uma palavra escrita, respondida por escrito, portanto com todo o conforto do seu pensamento manifestado –, o senhor alinhou aqui o conceito do que entende por globalismo, destacando a ameaça representada pelo horizonte comunista: "Globalismo é a captura da economia globalizada pelo aparato ideológico marxista, através do politicamente correto, da ideologia de gênero [que até hoje eu não consegui entender o que é; se puder aproveitar a oportunidade para me explicar também], da obsessão climática e do antinacionalismo". E a minha pergunta – eu tinha feito três, mas, na verdade, vou resumir em uma só – é a seguinte: como é que alguém defende essa teoria, com três eixos e tal, e pode imaginar que vai coordenar um esforço de concertação multilateral para uma situação de pandemia como essa?

    Quero aproveitar, porque ainda me resta algum tempo, para fazer o comparativo: esse descritivo seu dos Governos do Partido dos Trabalhadores simplesmente parece um mundo completamente... É outro mundo, não é? É um mundo paralelo. Porque, enquanto nós tínhamos relações pragmáticas e muito boas com os Estados Unidos, aqui, neste Governo atual, há suspeita até de que o filho do Presidente tenha participado de reuniões para conduzir a invasão do Capitólio. Então, o alinhamento a essa ultradireita – que parece que é o sinal que o rapaz fez aí atrás, supremacia branca, sei lá o quê –, essa bobajada aí que assola o mundo e o Brasil, do Steve Bannon, é o que praticamente pontuou a política externa em relação aos Estados Unidos.

    O Mercosul, que foi uma ferramenta que teve grande prioridade nos nossos Governos, virou aí, está virando uma mera área de comércio, inclusive com defecções importantes. A OEA é que volta a subir aí como um grande organismo regional, inócua, como sempre foi, enfim.

    A China, grandemente fortalecida, virou o primeiro principal parceiro comercial do Brasil.

    A criação do Brics, o fortalecimento do Brics... Do Brics ninguém mais ouve falar no Governo e na sua diplomacia.

    Oriente Médio. Nós tivemos aproximação extrema com os países árabes, com os países do Oriente Médio, mesmo assim, mantendo relação com Israel, a ponto de assinar, no Mercosul, o primeiro acordo extrarregional com Israel. Agora, afastamento do Oriente Médio, fortalecimento aí de vínculos com países que têm ainda posturas medievais – para não dizer que não houve uma exceção: Arábia Saudita, Paquistão –, distanciando a gênese da luta dos direitos das mulheres.

    Enfim, quanto à OCDE, o Brasil foi informalmente convidado a entrar. Pediu apoio aos Estados Unidos, na época do Governo do Trump. Trump exigiu que o Brasil renunciasse a determinadas coisas, inclusive que tinha na OMC. O Brasil abriu mão, cedeu, e os Estados Unidos não cumpriram a promessa, preferiram apoiar as candidaturas da Argentina e da Romênia. E agora com Biden pode ser que até retirem o apoio ao ingresso do Brasil.

    Quanto ao protagonismo do Brasil, nem se fale. Não havia fórum internacional em que não se tivesse uma participação decisiva, com o Lula, inclusive, à frente, como líder mundial, símbolo de um mundo mais justo, sem fome, sem pobreza, mais equilibrado. Era o cara! Agora não só somos páreas; como já se mencionou aí, somos considerados ameaça global em virtude do total descontrole da pandemia aqui no Brasil.

    Enfim, eu me pergunto como é que funcionaria essa diplomacia e me somo aos demais. Eu considero que V. Exa., infelizmente, chegou ao fim. Tem que realmente sair, porque é um elemento, diante de uma pandemia, que atrapalha o processo até pelas próprias atitudes que tomou até hoje e por declarações como essa, em plenos fóruns mundiais, que, no mínimo, despertaram nesses países caretas e expressões de espanto.

    Obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/03/2021 - Página 60