Discurso durante a 13ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à suposta politização do tema da demarcação das terras indígenas por meio de diversas ações judiciais. Defesa da tese do marco temporal, que considera terras indígenas aquelas ocupadas por povos indígenas na data da promulgação da Constituição Federal de 1988. Insatisfação com a edição de portaria pela Funai em que constitui um grupo técnico, integrado por antropólogos e outros profissionais, para iniciar estudos multidisciplinares em área reivindicada pelos índios Puruborá no Estado de Rondônia. Apelo ao Congresso Nacional pela aprovação do Projeto de Lei nº 490, de 2007, que altera o Estatuto do Índio e supostamente pacificaria a questão da demarcação das terras indígenas.

Autor
Marcos Rogério (PL - Partido Liberal/RO)
Nome completo: Marcos Rogério da Silva Brito
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Política Fundiária e Reforma Agrária, População Indígena:
  • Críticas à suposta politização do tema da demarcação das terras indígenas por meio de diversas ações judiciais. Defesa da tese do marco temporal, que considera terras indígenas aquelas ocupadas por povos indígenas na data da promulgação da Constituição Federal de 1988. Insatisfação com a edição de portaria pela Funai em que constitui um grupo técnico, integrado por antropólogos e outros profissionais, para iniciar estudos multidisciplinares em área reivindicada pelos índios Puruborá no Estado de Rondônia. Apelo ao Congresso Nacional pela aprovação do Projeto de Lei nº 490, de 2007, que altera o Estatuto do Índio e supostamente pacificaria a questão da demarcação das terras indígenas.
Aparteantes
Paulo Rocha.
Publicação
Publicação no DSF de 24/02/2022 - Página 14
Assuntos
Economia e Desenvolvimento > Política Fundiária e Reforma Agrária
Política Social > Proteção Social > População Indígena
Indexação
  • CRITICA, AÇÃO JUDICIAL, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, DEFESA, TESE, MARÇO, TEMPO, OCUPAÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, PROMULGAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • COMENTARIO, EDIÇÃO, PORTARIA, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), CRIAÇÃO, GRUPO, ANTROPOLOGO, ELABORAÇÃO, ESTUDO TECNICO, INDIO, ESTADO DE RONDONIA (RO).
  • SOLICITAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, ESTATUTO, INDIO, PACIFICAÇÃO, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO. Para discursar.) – Sr. Presidente, nobre Senador Rodrigo Pacheco, Sras. e Srs. Senadores e os que nos acompanham pelo sistema de comunicação da TV Senado, nos últimos tempos, o Judiciário tem se debruçado, Sr. Presidente, sobre o tema das demarcações de terras indígenas. Estão em curso ações civis públicas em vários foros do Brasil e tramita ação de descumprimento de preceito fundamental perante o Supremo Tribunal Federal, mas, por conta do crescente ativismo judicial, a questão é politizada além da conta. Na minha avaliação, não há o que se politizar. A Constituição Federal é clara, e deve ser seguida a tese do marco temporal; isto é, são reconhecidas como terras indígenas aquelas ocupadas por povos indígenas na data em que foi promulgada a Constituição, em 5 de outubro de 1988. Não há o que inventar, basta seguir a Constituição Federal.

    Contudo, Sr. Presidente, diante de toda a questão política que envolve o tema, já recebo relatos do meu Estado de Rondônia de que a Funai, por força de determinação judicial, publicou recentemente a Portaria 469, de 25 de janeiro de 2022, em que constitui grupo de trabalho, grupo técnico, "visando realizar os estudos multidisciplinares de natureza etno-histórica, antropológica, ambiental e cartográfica de área reivindicada pelos índios Puruborá, localizados nos Municípios de Seringueiras e São Francisco [...]", no meu Estado de Rondônia. Veja que a realização de tais estudos gera enorme insegurança jurídica, porque é afastado o critério objetivo e bem delimitado na tese do marco temporal para investigar aspectos históricos e antropológicos. O objetivo é que esses estudos, e não o marco temporal, devem instruir a demarcação de terras.

    É importante ressaltar como essa abordagem prejudica a solução do conflito no campo. Um estudo antropológico, Senador Amin, não é ciência exata!

    Em Rondônia, na região da BR-429, mais de mil famílias, que estão lá há mais de 40 anos trabalhando, produzindo alimentos, riqueza para o Brasil podem ser impactadas por esses estudos, estudos antropológicos. Mais de mil famílias! Pessoas que chegaram lá e desbravaram. Essas pessoas podem perder o direito de propriedade, podem perder a fonte de seu sustento. São pessoas que têm, no campo, a sua atividade econômica e passaram por muita coisa até conseguirem se estabelecer. Nós precisamos ter isso em mente quando consideramos questões delicadas como essa; esse é o nosso papel. Temos que ter esse olhar voltado para a primazia da realidade, a realidade fática, e baseados numa Constituição,...

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – ... que foi aprovada e promulgada no Congresso Nacional.

    Assim, é fundamental que o Poder Legislativo dê um passo adiante e discipline a questão de uma vez por todas. Aliás, tramita na Câmara dos Deputados o PL nº 490, de 2007, ou seja, há 15 anos – há 15 anos! – o Poder Legislativo tem um projeto que pretende regrar o tema, mas ainda não deliberou, não votou para aprovar ou para rejeitar.

    É nosso dever prover segurança jurídica no setor produtivo e também aos povos indígenas, aos povos amazônicos, prevenindo conflitos, pacificando o campo e dando tranquilidade,...

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – ... paz para quem está na terra trabalhando e produzindo.

    Adiar por mais tempo a discussão, no Poder Legislativo, do marco temporal é dar espaço para ativismo judicial e decisões em controle concentrado do STF, que não levam em consideração o produtor rural e tudo aquilo que produzem para o Brasil com todos os sacrifícios, com todas as contingências por que passaram no passado e por que ainda passam nos dias de hoje.

    Temos que aprovar, repito, uma lei que, de uma vez por todas, estabeleça o marco temporal como critério para a demarcação de terras indígenas, pois permitir que o Judiciário decida a questão e baseie o entendimento em estudos antropológicos é um retrocesso e um desrespeito ao homem do campo.

    Este alerta faço, Sr. Presidente, em razão, sobretudo, do que está acontecendo, inclusive neste momento,...

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – ... no meu Estado de Rondônia, onde, por determinação judicial, a Funai cria grupo técnico para fazer essa vistoria: pega de um município ao outro. São mais de mil famílias, que estão, neste momento, apavoradas com esse simples fato de se anunciar um grupo para fazer essa análise.

    Portanto, espero que o Supremo Tribunal Federal...

    O Sr. Paulo Rocha (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – V. Exa. me concede um aparte?

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – ... respeite o marco temporal, respeite a Constituição Federal; aliás, reafirme a Constituição Federal. Não cabe a uma Corte Constitucional uma abordagem que pretenda reescrever a Carta Republicana, mas, sim, fazer cumprir a Constituição Federal e aquilo que previu, aquilo que quis o legislador constituinte.

    Ouço V. Exa., Senador Paulo Rocha.

    O Sr. Paulo Rocha (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA. Para apartear.) – Estou ousando discutir a questão constitucional com um professor da área de Direito Constitucional, etc., Senador.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – Apenas um estudioso, Excelência.

    O Sr. Paulo Rocha (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Eu realmente não ouso discutir isso, mas ouso discutir a questão da Amazônia e a questão desses conflitos.

    Eu acho – viu, Senador Marcos Rogério? – que depende da presença da estrutura do Estado nesses conflitos e da complexidade que é a nossa Amazônia. V. Exa. tem direito e está correto na questão dessa reclamação dos conflitos entre índios e pequenos, entre índios e grandes, etc., etc. Eu acho que é a ausência da política de Estado de fazer cumprir a Constituição, entendeu?

    Hoje, o senhor está reclamando do papel da Funai, mas lá no Pará nós também reclamamos do papel da Funai hoje, que é diferente. De acordo com que o Chefe de Estado que está posto naquele momento, esses órgãos agem assim e assado e tal; essa é a questão fundamental. Então, quem descumpre a Constituição não são os elementos lá, nem os índios, nem o micro, etc. e tal, é a força da estrutura de Estado de fazer cumprir a Constituição.

    Por exemplo, com certeza, lá em Roraima e em toda a Amazônia, que é rica em tudo, há um conflito agora dos pequenos mineradores, chamados garimpeiros.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Paulo Rocha (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Então, essa coisa da ausência do Estado de fazer cumprir o processo gera esse conflito em nossos estados – no seu, principalmente em Roraima e lá no Pará sempre houve esses conflitos – e, à medida que o papel do Estado não faz cumprir a legislação, a Constituição, os pequenos ficam disputando isso, até se matando ou o grande matando o pequeno e vice-versa.

    Então, é uma discussão complexa. Você está reclamando de uma legislação que está há não sei quantos anos aqui. Eu já estou há 32 anos aqui, e há uma legislação que autoriza a exploração mineral em terras indígenas. Nunca nós conseguimos aprová-la...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Paulo Rocha (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – ... porque há essa coisa dos conflitos, dos interesses e tal. Então, ou a gente olha isso de uma forma global... Lá no meu estado, o próprio Governo Federal, em épocas mais idas, estabeleceu o chamado assentamento rural dentro de terras indígenas. Então, o próprio Estado incentiva essa ocupação e esses conflitos, entendeu?

    Como o discurso de V. Exa. tem como fundo a Constituição, eu acho que, se é preciso a gente adequar a Constituição nos momentos, claro que nós – eu, o senhor e tantos outros representantes da Amazônia – queremos desenvolver a Amazônia capaz de dar dignidade para todos: para os índios, para o pequeno produtor, para o grande produtor,...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Paulo Rocha (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – ... porque o grande produtor também gera divisas para o nosso país. Então, eu acho que a gente tem que chamar a atenção e acho que o Congresso Nacional, principalmente nós, aqui do Senado, temos um papel fundamental de dirimir essas questões.

    Ainda bem que nós temos aqui Senadores de todas as regiões, principalmente amazônidas, não só preocupados, mas competentes e sabendo da realidade da nossa região.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – Agradeço a V. Exa. o aparte, Senador Paulo Rocha.

    Eu penso que esse é um tema, independentemente de quem seja o governo de plantão, porque esse é um tema que governos do passado não conseguiram enfrentar e resolver e que hoje também não se conseguiu. Nós temos um passivo de regularização fundiária extremamente grande. O estado de V. Exa., o Estado do Pará, é um dos estados com menores índices de regularização fundiária.

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – O meu Estado de Rondônia também padece da ausência de regularização fundiária. Nos Estados da Amazônia Legal como um todo, o passivo é muito grande, e aí você acaba fomentando ainda mais os conflitos e fomentando algo que, neste momento, é muito visado pelo mundo todo, que é justamente o dano ambiental, os crimes ambientais. O maior programa de controle ambiental que este país pode ter é um programa efetivo de regularização fundiária: é colocar no nome, é botar no CPF a propriedade, a titularidade, porque hoje a situação é muito cômoda para quem tem uma terra de que não há um dono legítimo registrado.

    Então, a ausência do Estado brasileiro vem acontecendo há muito tempo. Nos últimos 20 anos, não se regularizou, não se fez regularização fundiária. Nos últimos três anos, a bem da verdade, nós estamos avançando. Recentemente, lá em Rondônia...

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – ... entregamos milhares de títulos de terra para produtores rurais.

    Agora, dessa questão do marco temporal – e eu concluo aqui, Presidente –, é importante dizer o seguinte: essa história de alguém vir aqui e dizer: "Olha, vai lá na terra, lá no Ceará, terra do meu amigo Girão. E daqui a pouco, numa área lá: 'Aqui, 50 anos atrás, 100 anos atrás, habitou aqui algum indígena. Essa terra, então, com base num estudo antropológico, passa a ser terra indígena''. Ora, como é que você vai estabelecer, como é que você vai garantir segurança jurídica, previsibilidade, paz social, paz no campo, desenvolvimento seguro, nesse nível de insegurança? Qual é o marco temporal? O marco temporal é a Constituição de 1988. Quando da promulgação, aquela área era habitada, ocupada por indígenas? Se era, não há o que discutir, o marco temporal é claro.

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – Agora, tempos depois, porque alguém disse que ancestrais, dezenas de anos atrás, centenas de anos atrás, estiveram ali, uma comunidade indígena que não existe mais, e daí, com base nessa informação, alguém vai lá, faz uma pesquisa antropológica e vai dizer, com base nesse laudo, que essa terra deve ser reconhecida como terra indígena... Onde está a segurança jurídica nisso? Onde está a previsibilidade nisso aqui?

    Então, eu acho que não cabe ao Judiciário se imiscuir naquilo que é papel do Congresso Nacional. Já quis o legislador constituinte estabelecer um marco temporal a partir da Constituição de 1988.

    A matéria infraconstitucional não avançou para o campo da regulamentação, para as especificidades? É verdade. O Parlamento é omisso. O Parlamento é omisso.

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – ... discordando do Senador Paulo Rocha neste ponto.

    Aqui, eu acho que esta é uma discussão do Parlamento. Esta é uma discussão do Parlamento! Eu acho que cabe ao Executivo dar cumprimento àquilo que o Parlamento aprovar.

    O Parlamento, sempre que for discutir uma matéria, seja no campo de demarcação, seja no campo da regularização, seja na questão do controle ambiental, que for tema controverso, encontrará, aqui, pensamentos dos mais distintos, dos mais diversos. Agora, é preciso achar um ponto de consenso que una os dois lados, para estabelecer um marco legal que garanta segurança jurídica, paz no campo, tranquilidade para quem está na terra, tanto para o indígena quanto para o produtor rural.

    Esse é o pensamento que eu tenho, que eu defendo. Acho que temos maturidade para avançar com esta matéria.

    O Sr. Paulo Rocha (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – Vamos formar uma comissão para a gente pensar isso junto, uma comissão de alto nível, para a gente pensar este conjunto...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Paulo Rocha (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PA) – ... ambiental, desenvolvimento, terras indígenas etc. Eu acho que nós temos condições e competência.

    O Senado Federal pode demonstrar isso para enquadrar, quer seja Judiciário, quer seja Executivo, e para a gente formar legislação capaz de assegurar isso que V. Exa. está a reclamar.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – Agradeço a V. Exa.

    Agradeço ao Sr. Presidente a tolerância de V. Exa. no debate deste tema, que é um tema importante não só para a nossa Amazônia, para os estados do Norte que, neste momento, têm essa insegurança, mas é importante para o Brasil inteiro.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/02/2022 - Página 14