Discurso durante a 22ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com os impactos da pandemia da Covid-19 no setor produtivo do País, especialmente com o aumento das desigualdades sociais e o retorno do Brasil ao Mapa da Fome. Apoio às medidas de equidade de gênero no acesso ao crédito e às inovações tecnológicas na produção de alimentos, à agricultura familiar e aos investimentos em infraestrutura de transportes para interligar produtores.

Autor
Chico Rodrigues (PSB - Partido Socialista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco de Assis Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Combate a Epidemias e Pandemias, Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Direitos Humanos e Minorias:
  • Preocupação com os impactos da pandemia da Covid-19 no setor produtivo do País, especialmente com o aumento das desigualdades sociais e o retorno do Brasil ao Mapa da Fome. Apoio às medidas de equidade de gênero no acesso ao crédito e às inovações tecnológicas na produção de alimentos, à agricultura familiar e aos investimentos em infraestrutura de transportes para interligar produtores.
Aparteantes
Zequinha Marinho.
Publicação
Publicação no DSF de 30/03/2023 - Página 72
Assuntos
Política Social > Saúde > Combate a Epidemias e Pandemias
Política Social > Proteção Social > Desenvolvimento Social e Combate à Fome
Política Social > Proteção Social > Direitos Humanos e Minorias
Indexação
  • ANALISE, INFLUENCIA, PANDEMIA, NOVO CORONAVIRUS (COVID-19), AUMENTO, FOME, INSEGURANÇA ALIMENTAR, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE.
  • DEFESA, FOMENTO, INSUMO, PRODUÇÃO, ALIMENTO HUMANO, AGRICULTURA FAMILIAR, INDEPENDENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, FERTILIZANTE, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, TRANSPORTE, GARANTIA, EQUIDADE, GENERO, ACESSO, CREDITO AGRICOLA.

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR. Para discursar.) – . Presidente, colegas Senadoras e Senadores, há muito tempo nos preocupamos com o impacto que o isolamento necessário ao enfrentamento da pandemia teria sobre os processos produtivos e sobre o agravamento da fome em nosso país.

    A providência mais urgente era criar infraestrutura para o tratamento das pessoas e diminuir o contágio. A segunda, garantir uma renda mínima para a população que perdeu seus empregos devido às necessárias medidas de isolamento. Essas ações permitiram o enfrentamento inicial dos efeitos devastadores naqueles anos de 2020 e 2021.

    A vacinação em massa nos permitiu superar o grande desafio e chegar ao dia de hoje, mas, à medida que o tempo avançou, foram ficando evidentes as sequelas da pandemia sobre o processo produtivo, o aumento das desigualdades sociais e da fome no Brasil. No final de 2021, já havia sinais importantes do crescimento da insegurança alimentar no país. Em 2022, com o agravamento das tensões geopolíticas internacionais e os fatos que culminaram com a invasão russa à Ucrânia, piorou o problema de fornecimento de fertilizantes no mercado internacional, criando sérias restrições ao crescimento da produção agrícola.

    O Brasil, que vinha de um longo processo de declínio da insegurança alimentar, saindo do Mapa da Fome em 2014, viu essa tendência de declínio se inverter em função da recessão de 2015 e 2016. Os efeitos da pandemia e da guerra da Ucrânia sobre a economia brasileira trouxeram consequências sérias sobre essa questão e consolidaram o retorno de nosso país ao Mapa da Fome.

    Sr. Presidente, nobres colegas Senadoras e Senadores, o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19, da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania Alimentar e Nutricional, identificou que mais de 33 milhões de pessoas não tinham o que comer no Brasil em 2022, mais de 14 milhões de novas pessoas passando fome em função da pandemia. Não são dados novos, mas importantes e duros de se encararem a qualquer momento, por isso achei importante trazê-los ao tempo em que falo sobre a fome.

    O relatório da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania Alimentar e Nutricional nos mostra a dura face da fome no Brasil. A fome localiza-se mais intensamente no Norte e no Nordeste: 25,7% das famílias da Região Norte e 21% das famílias do Nordeste; atinge mais intensamente as pessoas do campo do que as da cidade. O relatório também nos mostra que a fome tem cor, porque a insegurança alimentar está mais presente nos lares dessas pessoas. Nobre Senadoras, a fome tem gênero, pois existe uma diferença expressiva da fome entre os lares chefiados por homens e por mulheres. E, pasmem, nobres colegas, a fome dobra em lares que têm crianças com menos de dez anos. Isso é doloroso. Olhando esses dados, entendo o acerto da PEC da transição, ao incluir uma renda adicional para lares com crianças de até seis anos.

    Sobre a fome, falei a esta tribuna, no primeiro semestre de 2022, abro aspas: "Desde abril do ano passado (2021) venho alertando sobre a tragédia da fome que grassa em nosso país, atingindo quase 20 milhões de brasileiros em finais de 2020, segundo pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. Sabemos que este quadro se agravou significativamente de lá para cá, o que é inaceitável na condição de 3º maior produtor de alimentos do mundo".

    À época chamei a atenção para o problema nas cadeias de produção de fertilizantes. O zelo com o meio ambiente e os altos custos de mineração e produção de fertilizantes nos levaram a uma dependência quase que absoluta da oferta internacional. A guerra mostrou a todos os países os perigos que tal dependência representa para a segurança alimentar dos povos.

    A fome humilha e mata. E, como diz com muita propriedade a nobre amiga Senadora Zenaide: não há morte pior que a morte da fome.

    Precisamos fazer escolhas equilibradas. Precisamos apoiar a produção de insumos básicos para a produção de alimentos. Precisamos superar a dependência internacional de fertilizantes. Precisamos investir em infraestrutura de transportes para interligar centros produtores, permitindo o aumento da oferta de alimentos nos lares onde a fome ainda é maior.

    Precisamos apoiar medidas de equidade de gênero no acesso ao crédito e às inovações tecnológicas na produção de alimentos; apoiar de maneira inequívoca a produção e a produtividade da agricultura familiar, uma das principais responsáveis pela produção do alimento que chega à mesa de todos os brasileiros.

    Como disse no ano passado, precisamos urgentemente transformar a questão alimentar em assunto do Estado, e não meramente de governo. Para tanto, estou apresentando projetos com o objetivo de delimitar políticas estratégicas de Estado para combater a fome, para os quais peço o apoio de V. Exas.

    Não se supera a fome sem aumento na produção de alimentos. Repito, Sr. Presidente: não se supera a fome sem aumento na produção de alimentos. Não adianta se solidarizar com as famílias que passam fome e apoiar medidas que dificultam a produção de alimentos no Brasil.

    Devemos essa coerência ao povo brasileiro. Essa é uma tarefa de todos nós. O Brasil não pode continuar sendo celeiro do mundo, com cerca de 33 milhões de pessoas passando fome. É preciso transformar a terra em produção de alimentos. Precisamos superar a dependência de insumos básicos para a produção agrícola, além de políticas de preço mínimo e de estoques reguladores, incentivo aos pequenos agricultores do crédito à logística da distribuição, o uso da terra de forma produtiva, a serviço do ser humano.

    É preciso a criação de uma associação ou uma fundação voltada exclusivamente ao combate da fome. Talvez, nos moldes da Rede Sarah, para que os recursos a ela destinados não fiquem sujeitos a contingências orçamentárias e arquivando quase que a esperança das pessoas – arquivando, porque leva ao esquecimento com esses investimentos para a produção da agricultura familiar.

    Nobres Senadoras e Senadores, brasileiros e brasileiras que nos assistem neste momento, não temos o direito de nos omitir. Nossa ação, se bem desenhada, pode levar à superação da fome no Brasil e também ajudar seres humanos a terem o que comer no mundo inteiro. Esse é um grande desafio para todos nós.

    Portanto, Sr. Presidente, acho que esse tema é um tema recorrente, é um tema que domina aqueles que vivem nas áreas mais periféricas, que sabem e conhecem de uma forma absolutamente determinada...

    O Sr. Zequinha Marinho (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA) – Um aparte, Senador.

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) – Mas, acima de tudo, temos que nos comprometer com esse ideal de não deixar a população brasileira, num país tão rico, num país com tanta produção, de não deixar os nossos irmãos viverem à deriva e morrendo de fome.

    Concedo a palavra a V. Exa.

    O Sr. Zequinha Marinho (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA. Para apartear.) – Primeiro, Senador, quero cumprimentá-lo pela iniciativa do projeto e pelo discurso oportuno nesta noite.

    V. Exa. é de Roraima, eu sou do Pará, e nós conhecemos muito bem a Amazônia e sabemos que a Amazônia, com seus quase 30 milhões de habitantes, tem os piores IDHs, os piores indicadores que podemos imaginar.

    Mas na Amazônia também nós temos uma agricultura familiar que, se tratada com o respeito e com a competência que merece, certamente supriria grande parte de outras regiões e de outras pessoas que não têm acesso à alimentação.

    E eu diria, na minha opinião, que a posição de V. Exa. requer duas atenções de forma muito diferenciada.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Zequinha Marinho (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA) – Uma, com relação à agricultura familiar, que é feita ainda na base do machado, da enxada e de ferramentas rudimentares e ainda muito primitivas, que certamente também impactam de forma negativa a questão ambiental, que é um outro debate, não é? A produção é muito pouca, não dá nem para subsistência. No meu estado, mais de 95% da agricultura familiar não produz o suficiente para o consumo da família três meses no ano. Não consegue, não avança. E o Pará tem mais de 250 mil famílias assentadas do Incra. E a gente come jiló e outras verduras aqui do Centro-Oeste ou do Nordeste que descem para lá. Noventa e sete por cento da banana consumida na grande Belém vem de fora.

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

    O Sr. Zequinha Marinho (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA) – Ou o Governo tem um programa para assistir a agricultura familiar e fazê-la produzir... E não é só a terra. A terra já é uma grande vantagem, mas, por si só, não é suficiente. Não é só isso. Em outras regiões do Brasil, onde a terra é mais difícil, não há espaço e não há condições, então o Governo tem que ter uma política de aquisição de alimentos, para que se possam suprir essas necessidades e essa enorme população que passa fome. Não é possível que, num país com tanto alimento, que exporta e sustenta mais de 1 bilhão de pessoas ao redor do mundo, seu Governo não tenha condição de comprar um mínimo desse percentual para estoques que possam atender essas famílias. Isso é falta de iniciativa, tanto para um lado, quanto para o outro.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Zequinha Marinho (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - PA) – É muito simples, é só parar o discurso e começarmos a fazer alguma coisa de concreto.

    Parabéns pelo projeto, parabéns pela iniciativa desta noite.

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) – Muito obrigado, nobre Senador. Eu entendo que V. Exa., Senador Zequinha Marinho, que é Vice-Presidente da Frente Parlamentar da Agricultura, tem se debruçado sobre essa questão sensível, porque é a fome que grassa em milhões de pessoas neste país.

    O Governo poderia, na verdade, se deter sobre esse segmento, que representa praticamente 70% do alimento que vai para a mesa do brasileiro, que vem da agricultura familiar, e desenvolver programas que viessem a fortalecer essa atividade econômica que, acima de tudo, além de ser uma atividade econômica importante, é uma atividade social, de inclusão social fabulosa, não é?

    Então vejo realmente, com a preocupação de V. Exa. nesse aparte, com essas observações, todas pertinentes, e diria, meu caro colega Senador Zequinha Marinho: eu tenho me dedicado muito ao segmento, a esse segmento, procurando ajudar muito a agricultura familiar. Nesses próximos dias – dias, não –, nesses próximos meses, eu tenho praticamente todas as semanas entregas, através das minhas emendas, de centenas de equipamentos, como arados, tratores, grades, carretas, tratoritos, pulverizadores, caminhões para atender à feira da agricultura familiar, etc., no meu estado.

    Eu fico muito alegre, muito orgulhoso, porque vejo que, na verdade, o fruto dessa dedicação está, agora, chegando à agricultura familiar. Há uma verdadeira euforia naqueles projetos de assentamento que não tinham um caminhão sequer para transportar...

(Soa a campainha.)

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR) – ... os produtos daqueles agricultores que vivem ali teimando em produzir.

    Portanto, agradeço-lhe o aparte e diria que nós comungamos dos mesmos ideais.

    Sr. Presidente, muito obrigado. Era este o pronunciamento que gostaria de fazer. É um grito de alerta. Há três anos eu falo nesse problema gravíssimo da fome, que é um problema de Estado, e não um problema de governo, para que possamos, na verdade, cuidar da agricultura familiar para alimentar quase 30 milhões de brasileiros que passam fome, todos os dias.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/03/2023 - Página 72