Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Preocupação com o crescente índice de feminicídio no País. Defesa do Projeto de Lei nº 4196, de 2020, de autoria do Deputado Fábio Trad, que tem por objetivo enquadrar o feminicídio como tipo penal autônomo para evitar equívocos quanto à tipificação do crime e ampliar as políticas públicas de prevenção e repressão à violência de gênero.

Autor
Soraya Thronicke (UNIÃO - União Brasil/MS)
Nome completo: Soraya Vieira Thronicke
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Direito Penal e Penitenciário, Mulheres:
  • Preocupação com o crescente índice de feminicídio no País. Defesa do Projeto de Lei nº 4196, de 2020, de autoria do Deputado Fábio Trad, que tem por objetivo enquadrar o feminicídio como tipo penal autônomo para evitar equívocos quanto à tipificação do crime e ampliar as políticas públicas de prevenção e repressão à violência de gênero.
Aparteantes
Damares Alves, Nelsinho Trad, Rodrigo Cunha.
Publicação
Publicação no DSF de 14/04/2023 - Página 25
Assuntos
Jurídico > Direito Penal e Penitenciário
Política Social > Proteção Social > Mulheres
Matérias referenciadas
Indexação
  • PREOCUPAÇÃO, CRESCIMENTO, INDICE, FEMINICIDIO, PAIS, DEFESA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, DEPUTADO FEDERAL, FABIO TRAD, DEFINIÇÃO, CRIME AUTONOMO, AMPLIAÇÃO, POLITICA PUBLICA, PREVENÇÃO, REPRESSÃO, VIOLENCIA, GENERO.

    A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - MS. Para discursar.) – Sr. Presidente, senhoras e senhores, no Dia Internacional da Mulher, vários dos senhores e das senhoras subiram a este Plenário para denunciar, como eu também o fiz, a assustadora taxa de feminicídios a que este país chegou em 2022.

    No ano passado, aproximadamente, quatro brasileiras foram mortas todos os dias apenas por serem mulheres – quatro brasileiras por dia! Isso é algo inaceitável! Esses números revelam uma coisa: nós não podemos nos dar por satisfeitos apenas com as alterações promovidas pela Lei 13.104, de 2015, que incluiu o feminicídio entre as qualificadoras do homicídio. Não há dúvida de que a criação dessa agravante representa, sim, um marco histórico na luta contra a violência de gênero, mas a história recente tem demonstrado que, para romper com a cultura persistente de agressão às mulheres, nós precisamos de muito mais.

    É preciso reconhecer, sobretudo, que o feminicídio...

    Não saia, não, Senador, porque eu vou citar o seu irmão. Ah! O.k., vou citar o Fábio.

    É preciso, sobretudo, reconhecer que o feminicídio é, no contexto atual, mais do que uma mera qualificadora do homicídio; é uma forma autônoma de crime contra a vida, que merece ser destacada do art. 121 do Código Penal. É o que faz, por exemplo, a legislação do Chile, da Costa Rica, da Guatemala, de El Salvador, para citar apenas alguns dos nossos vizinhos. Em todos eles os crimes contra as mulheres constituem tipos penais independentes.

    Fazer do feminicídio uma norma incriminadora própria é um sinal claro, ostensivo de que este Congresso Nacional não tolera a violência de gênero. E tipificar o assassinato de mulheres como um crime específico evita classificações incorretas, com punições mais brandas em que a questão de gênero é posta em segundo plano.

    Essa demanda, senhores, não é nova. O Fórum Nacional de Juízes e Juízas de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher (Fonavid) já nos pediu para tratar o feminicídio como um tipo penal autônomo. Também essa é a posição da ONU Mulheres, a Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e da equidade de poder feminino. Busca-se dar visibilidade e relevância a um crime que hoje, por mais que seja destacado, tem ainda a importância subsidiária.

    Na Câmara dos Deputados, já tramita um projeto de lei sobre o tema. É o PL 4.196, de 2020, de autoria do irmão do nosso amigo Senador Nelsinho Trad, o Deputado Fábio Trad, que é meu conterrâneo, elaborado juntamente com o Juiz do Tribunal do Júri, o Carlos Alberto Garcete, Nelsinho. O projeto aperfeiçoa consideravelmente o tratamento penal especializado ao feminicídio, mas foi apensado a outros projetos e dormita nas gavetas, nos escaninhos da Câmara dos Deputados, há dois anos. E nós não podemos esperar.

    No último dia 30 de março, eu submeti à apreciação do Senado Federal uma nova proposta que se apoia nos mesmos fundamentos do projeto do Deputado Fábio Trad com algumas alterações técnicas, ainda com o apoio do Juiz Carlos Alberto Garcete, Juiz do Tribunal do Júri da nossa capital Campo Grande. Trata-se agora do PL 1.548, de 2023, que dá nova redação ao feminicídio e o torna um crime autônomo, independente ao crime de homicídio. A norma amplia o aspecto dissuasório e preventivo do sistema penal em relação aos feminicídios; contribui para a precisão estatística, porque nós ficamos, Senadora Damares, com subnotificações – sendo uma agravante, uma subsidiária do crime de homicídio, nós não conseguimos ter exatamente os números em mãos para podermos trabalhar, então, por extensão, para políticas públicas de prevenção e repressão à violência de gênero –; e tem irrecusável efeito simbólico sobre uma cultura que, infelizmente, ainda é sexista, misógina e machista.

    Peço a todos os Senadores e Senadoras o apoio para a rápida tramitação dessa proposta. A medida constitui resposta urgente, contundente e necessária a este aumento absurdo e inaceitável de assassinato de mulheres. Não é normal e não pode ser normal, senhoras e senhores, que o gênero feminino represente uma oportunidade de violência e agressão. O Brasil, Sr. Presidente, não pode seguir matando as mulheres brasileiras.

    Pela aprovação do 1.548 e por uma firmeza e um empenho desta Casa para a tramitação disso, porque nós já deveríamos ter agido há muito tempo.

    Muito obrigada.

    O Sr. Rodrigo Cunha (Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - AL) – Senadora Soraya, V. Exa. me permite um aparte?

    A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - MS) – Claro, sim.

    O Sr. Rodrigo Cunha (Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - AL. Para apartear.) – Primeiro, é para parabenizar V. Exa., que, de maneira muito legítima, mais uma vez levanta a voz para o Brasil para defender as mulheres. Infelizmente, ainda acho que serão necessárias várias outras sessões como esta, vários outros depoimentos, discursos e mais do que isto: união.

    Então, quando vejo V. Exa. tratando do feminicídio – e os dados mesmo demonstram: quatro mulheres são vítimas por dia –, isso nos remete à nossa responsabilidade, primeiro por considerá-lo um dos crimes mais covardes que se pode ter. A violência já deve ser banida, já deve ser rechaçada. Agora, a violência contra a mulher não pode de maneira alguma ter qualquer tipo de tolerância, porque é uma violência que, na grande maioria das vezes, em quase 70% dos casos, é cometida por alguém com quem ela dorme na sua cama, ao lado, da sua casa, da sua confiança, e não como acontece na maioria dos casos com o homem, que é uma briga de trânsito, uma briga de bar, do futebol, uma discussão, um assalto.

    Tudo que for possível fazer para chamar a atenção deste país e dizer que não vamos tolerar nenhum tipo de crime e muito menos o crime mais grave que tem, que é o feminicídio contra a mulher... E esse caso, criando um tipo penal autônomo, não só tem uma simbologia no mundo jurídico, mas tem uma simbologia de importância que é demonstrada pelo Congresso Nacional, e isso repercute em todas as situações. Então, o envolvimento da ONU Mulheres é necessário também para divulgar as consequências para quem agride uma mulher.

    E aqui eu faço um pedido a V. Exa., como vou fazer também a todas as Senadoras, à nossa Senadora Damares aqui. Com muita felicidade nós contribuímos – eu fui autor, V. Exa. sabe, mas participou diretamente nesses quatro últimos anos – para que se tornasse realidade uma lei, que foi aprovada na semana passada, que faz com que as delegacias de combate à violência contra a mulher funcionem durante os finais de semana e à noite. E por que isso? Porque, em 69% dos casos registrados, as mulheres dizem que foram agredidas à noite ou no final de semana, e justamente à noite e no final de semana as delegacias estão fechadas. Então, é um desestimulo, e nós sabemos disso, já há uma subnotificação. É difícil a mulher sair para fazer uma denúncia porque ela tem medo do agressor, ela tem vergonha da sociedade. E, se não tem a delegacia aberta, ela volta para casa.

(Soa a campainha.)

    O Sr. Rodrigo Cunha (Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - AL) – Finalizando, Sr. Presidente.

    E o agressor, que deveria sair de casa... Acaba ela saindo da sua casa. Então, isso está errado. E nós ainda temos enraizada uma cultura de que a mulher é um objeto e que o marido tem o poder sobre ela, que pode fazer o que quiser. E não pode prevalecer isso, mas no ano de 2023...

    Então, faço esse pedido a V. Exa. para que busque uma radiografia, para que peça, faça um pedido de informação ao Governo do estado de V. Exa. para saber quantas delegacias da mulher existem, quantas funcionam 24 horas e quantas estão também preparadas para realizar um treinamento nos seus policiais, nos municípios que não tiverem essa delegacia especializada, para que eles realizem um atendimento humano e um atendimento acolhedor que não revitimize uma mulher, porque, na grande maioria dos casos, quando não há estranhamento, quando a mulher vai registrar uma denúncia, a primeira pergunta que um policial faz...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Rodrigo Cunha (Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - AL) – ... se não tem o treinamento, é se ela tem certeza de que quer fazer essa denúncia; em outras situações, se ela não prefere voltar amanhã e pensar melhor. Então, são inaceitáveis situações como essa.

    Parabenizo V. Exa., que repudia todo tipo de violência contra a mulher. O que aconteceu com V. Exa. no início do mês é, sim, para ser noticiado no país inteiro, não é um crime de menor importância. Está fazendo o seu papel como Senadora da República, que é prestar informações sobre o seu mandato e ser transparente e acessível à sua população numa rede de rádio, e alguém buscou agredi-la verbalmente ou de alguma outra forma. Tem que haver consequência, o Senado tem que exigir uma punição rápida e célere, não apenas pelo fato de ser Senadora, o que já é uma autoridade constituída pelo seu povo, mas também por ser mulher.

    Então, estão aqui os meus parabéns a V. Exa.

    A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - MS) – Obrigada.

    A Sra. Damares Alves (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF. Para apartear.) – Senadora, aparte.

    Quero parabenizá-la pela iniciativa e quero lembrar à senhora: com menos de três meses de mandato, nós nos reunimos e fomos à ONU. Eu fui junto com a senhora, e ali a gente identificou, em 2019, a subnotificação no Brasil do feminicídio. Trabalhamos muito, nos últimos dois anos, enquanto eu estive dirigindo a pasta da mulher, para que a notificação fosse de verdade. A gente encontrou, nas delegacias, muitos feminicídios não classificados como feminicídios.

    Então, em 2022, isso explode por conta do nosso trabalho, da orientação lá na base. Os delegados começaram, na delegacia, a tipificar o feminicídio. E nós vamos nos surpreender, Senadora, porque, nos próximos anos, esses números vão aumentar, mas é por conta da notificação agora, a tipificação certa do crime de feminicídio. E nós vamos precisar dar respostas.

    Nós entregamos, em 2021...

(Soa a campainha.)

    A Sra. Damares Alves (Bloco Parlamentar PP/REPUBLICANOS/REPUBLICANOS - DF) – ... o Plano Nacional de Enfrentamento ao Feminicídio, com R$500 milhões. É muito pouco, temos que aumentar muito isso.

    Parabéns pela iniciativa legítima! Que bom que veio de sua autoria!

    Vamos trabalhar, Senadores, para a aprovação e para a gente erradicar, de fato, o feminicídio no Brasil. Ainda somos o quinto que mais mata mulheres, mas aqui pode ser o melhor país no mundo para se nascer mulher.

    Parabéns pela sua iniciativa e conte com o nosso apoio!

    A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - MS) – Muito obrigada.

    Sim, Senador.

    O Sr. Nelsinho Trad (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MS. Para apartear.) – Senadora Soraya, realmente, V. Exa. foi muito feliz no encaminhamento dessa proposta. Nosso estado tem a Casa da Mulher Brasileira, que funciona muito bem. A Ministra Damares é testemunha disso, porque já, inclusive, visitou várias vezes Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Nós temos uma cultura muito forte no sentido de proteger e garantir às mulheres uma vida plena, saudável, livre, feliz.

    Então, esse projeto vem num momento muito oportuno. Nós tivemos o enriquecimento, nesta Casa, com a chegada de Senadores sensíveis a esse tema e, com certeza, V. Exa. não vai ser uma voz única e terá o apoio de todos nós.

    Eu queria compartilhar com todos, caro Presidente Veneziano...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Nelsinho Trad (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MS) – ... que estou debruçado, estudando até legislações de outros países, no sentido de darmos aqui também uma resposta para essa situação terrível que nós presenciamos de violência nas escolas, contra crianças e adolescentes.

    Esta Casa não pode ficar sem dar uma resposta para a sociedade brasileira. É algo que precisa ser combatido de uma forma bastante intensa porque é inaceitável o que aconteceu e o terror que está no ambiente de quem tem filho na escola, de quem está numa situação que leva, muitas vezes, a pânico e a desespero.

    Nós precisamos fazer esse enfrentamento, e eu conclamo os colegas Senadores que possam somar esforços conosco no sentido de construirmos um canal legislativo eficiente...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Nelsinho Trad (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - MS) – ... firme e que possa combater isso que foge de qualquer razão, de qualquer situação de bom senso dentro da nossa sociedade.

    Muito obrigado e parabéns mais uma vez, Senadora Soraya.

    A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - MS) – Muito obrigada, Senador Nelsinho.

    Só para terminar, eu gostaria de dar uma notícia aqui em primeira mão. Infelizmente, o Brasil tem poucas Casas da Mulher Brasileira. A nossa de Campo Grande é a referência nacional. Mas eu sou nascida em Dourados onde tem, inclusive, a maior aldeia urbana indígena do mundo e ali há uma violência – a Ministra Damares esteve conosco –, uma violência absurda contra a mulher. E, no ano passado ou ano retrasado, eu e a então Deputada Rose Modesto assumimos o compromisso para a construção da Casa da Mulher Brasileira, cada uma se responsabilizando com metade do investimento, mas vão faltar recursos.

    Então, eu estou me comprometendo aqui...

(Soa a campainha.)

    A SRA. SORAYA THRONICKE (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - MS) – ... em primeira mão, com toda a população de Dourados: eu vou cumprir e vou mandar todo o recurso agora que falta para a construção da segunda Casa da Mulher Brasileira no Mato Grosso do Sul – o Mato Grosso do Sul dando exemplo para o país, porque todas as casas devem funcionar como um espelho da Casa da Mulher Brasileira de Campo Grande, para quem mando um abraço a todos os delegados, delegadas e a todos os servidores de lá.

    Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/04/2023 - Página 25