Discurso durante a 50ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Repúdio ao episódio racista, ocorrido em um jogo do campeonato espanhol, contra o jogador de futebol Vinícius Júnior. Elogios ao posicionamento do Presidente Lula em face ao episódio de racismo e à cobrança de providências ao Governo Espanhol.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Assuntos Internacionais, Desporto e Lazer, Direitos Humanos e Minorias:
  • Repúdio ao episódio racista, ocorrido em um jogo do campeonato espanhol, contra o jogador de futebol Vinícius Júnior. Elogios ao posicionamento do Presidente Lula em face ao episódio de racismo e à cobrança de providências ao Governo Espanhol.
Publicação
Publicação no DSF de 23/05/2023 - Página 14
Assuntos
Outros > Assuntos Internacionais
Política Social > Desporto e Lazer
Política Social > Proteção Social > Direitos Humanos e Minorias
Indexação
  • REPUDIO, ATO, RACISMO, COMPETIÇÃO ESPORTIVA, LOCAL, PAIS ESTRANGEIRO, ESPANHA, VITIMA, ATLETA PROFISSIONAL, FUTEBOL, PAIS, COR, NEGRO, ELOGIO, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, COBRANÇA, GOVERNO ESTRANGEIRO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.

    O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PT - PE. Para discursar.) – Sr. Presidente, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, internautas que nos acompanham pelas redes sociais, como não poderia deixar de ser, o assunto que me traz à tribuna hoje é a necessidade de também externar meu profundo repúdio a esse novo episódio de racismo no futebol, mais uma vez contra o jogador brasileiro Vini Jr., do Real Madrid, na Espanha. É um caso vergonhoso, lamentável, que em nada se coaduna com os valores elevados da atividade desportiva de uma competição entre atletas. É uma postura inaceitável e reiterada de torcedores espanhóis que parece ter acolhimento por parte do público e da própria Liga de Futebol da Espanha.

    É triste ver um país de história tão rica, tão desenvolvido econômica, social, cultural e politicamente, com o qual o Brasil tem tantos laços, recepcionar episódios racistas sem as ações necessárias para buscar os criminosos responsáveis pelos atos e punir todos eles pelo crime que praticaram.

    Vini Jr. jogava quando foi xingado por torcedores. Aliás, antes do início do jogo, já o estavam agredindo, e terminou sendo agredido até pelo próprio goleiro do Valência. Protestou. E, mesmo vítima de inaceitável agressão, acabou levando um mata leão de um jogador do time adversário e foi expulso de campo. Corre ainda o risco de ser absurdamente suspenso por quatro jogos.

    Pelas redes sociais, ele criticou o fato de não ter sido a primeira, a segunda ou a terceira vez em que foi vítima de episódios racistas dentro de estádios na Espanha.

    O Presidente da La Liga, a liga espanhola, em vez de anunciar medidas duras contra o caso e punir o time de onde partiram as agressões, preferiu atacar o próprio Vini Jr., numa clara demonstração sobre o lado em que estava: o lado dos agressores.

    O Real Madrid e a Associação de Futebolistas Espanhóis condenaram os ataques e provocaram o Ministério Público espanhol pelo que consideraram uma manifestação clara de crime de ódio, mas nada de efetivo foi feito até agora.

    Do Japão, onde estava até ontem para participar da reunião ampliada do G7, o Presidente Lula foi rápido e extremamente diligente na reação a esse episódio deplorável ocorrido no dia de ontem. Lula fez questão de ressaltar a história belíssima de vida de Vini Jr., suas qualidades profissionais – um dos melhores jogadores do mundo no momento – e apresentar seu total repúdio a essas manifestações de racismo, de fascismo, que têm se repetido em estádios de futebol.

    Mais do que isso, Sr. Presidente, mobilizou todo o Governo brasileiro para que esse caso tenha um desfecho exemplar. Ontem mesmo a Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, entrou em contato com a família de Vini Jr. para prestar a ele a sua solidariedade, a nossa solidariedade. E falou com a Vice-Presidenta do Governo espanhol, para externar o repúdio do Brasil e pedir que a Espanha adote medidas severas sobre o tema.

    Anielle já foi atleta e, em coletiva hoje pela manhã, falou emocionada sobre a dor de ser vitimada pelo racismo.

    O Itamaraty, por seu lado, tomou uma medida profundamente dura: convocou a Embaixadora da Espanha no Brasil para que preste explicações sobre o caso e divulgou uma nota extremamente dura há pouco. Portanto, trata-se de um problema diplomático neste momento.

    O Governo brasileiro alçou questão a um tema diplomático, que precisa ser respondido pelo Governo espanhol. O Governo da Espanha é um governo dirigido pelo Partido Socialista Operário Espanhol, que defende historicamente o combate a todo tipo de discriminação, a defesa de uma sociedade democrática, a defesa de uma sociedade livre e justa. E, portanto, esse Governo não pode se omitir de fazer aquilo que cabe a uma administração pública central numa situação como essa.

    Temos pelo PSOE um apreço enorme, pela luta de décadas, quase século, mais de século aliás, como partido em defesa do povo operário, trabalhador da Espanha, dos pobres e dos oprimidos. Portanto, o Governo espanhol não pode se omitir diante desse quadro e deve, por todas as formas, dar ao jogador, ao Brasil as suas manifestações de desculpas, porque isso é inaceitável.

    Aliás, esse evento acontece pouco tempo depois de nós discutirmos e aprovarmos aqui a Lei Geral do Esporte, onde essa temática foi tratada, e, felizmente, a lei foi aprovada garantindo que manifestações homofóbicas, racistas e semelhantes sejam devidamente punidas e tratadas como infrações graves.

    Aliás, na semana passada, estava eu assistindo ao jogo Corinthians e São Paulo... Eu sou torcedor do Náutico, mas meu segundo time é o Corinthians, porque eu sou paulista. Na verdade, foi o primeiro time que eu tive. Quando eu era criança, com cinco anos, meu primeiro time foi o Corinthians; depois eu fui morar em Pernambuco. Meu time mesmo é o Náutico, mas eu assisto aos jogos do Corinthians. E, no jogo do Corinthians, o juiz suspendeu o jogo suspendeu o jogo – suspendeu o jogo! – porque um grupo de torcedores do Corinthians estava fazendo manifestações homofóbicas contra o time do São Paulo, contra jogadores do São Paulo. E, naquele momento, houve uma manifestação inclusive dos jogadores do Corinthians se dirigindo à torcida para que parassem com aquele tipo de coisa, não só porque é inaceitável, mas porque seria também prejudicial ao próprio clube. Isso é uma demonstração de que o que nós aprovamos aqui tinha sentido de se fazer.

    Mas o Ministério das Relações Exteriores, em nome do Governo brasileiro, afirmou lamentar profundamente que, até o momento, não tenham sido tomadas providências efetivas para prevenir e evitar a repetição desses atos de racismo e instou as autoridades governamentais e esportivas da Espanha a tomarem as medidas necessárias, a fim de punir os perpetradores e evitar a recorrência desses atos. O Itamaraty apelou igualmente à FIFA, à Federação Espanhola e à La Liga a aplicarem medidas cabíveis.

    Isso acontece há muito tempo. Eu aqui não quero fazer a defesa do jogador brasileiro que está preso na Espanha hoje acusado de ter praticado um estupro contra uma mulher, mas ele próprio, quando era jogador do Barcelona, já tinha sido vítima de racismo. Eu me lembro de um dos jogos em que ele foi bater um escanteio e da torcida jogaram uma banana. E a maneira de ele protestar foi descascar e comer a banana e dizer que aquilo ali não o atingia. E isso tem se repetido de uma forma quase que permanente.

    Então, é inaceitável um país que tem, como eu disse, a história da Espanha, que tem a cultura do povo espanhol, que tem as relações que tem com o nosso país hoje assistir a esse tipo de prática naquele campeonato, que é um dos mais ricos do mundo, que tem jogadores da mais alta capacidade não só física, mas de talento futebolístico. Então, esperamos que haja de fato uma resposta.

    E não tenho dúvida de que, se nada for feito, se as autoridades espanholas insistirem em invisibilizar o caso, o nosso Governo usará do poder que lhe cabe do ponto de vista diplomático.

    Não foi uma agressão a um jogador apenas, não foi uma agressão apenas a ele como atleta, mas a nós como brasileiros, que nos orgulhamos de termos os melhores jogadores do mundo em vários momentos da história. Imaginem Pelé, que era um negro, imaginem Ronaldinho, imaginem Ronaldo Fenômeno, imaginem tantos que deram tantas alegrias aos torcedores espanhóis, inclusive do Real Madrid e de outros times, serem vítimas de discriminação por conta da sua raça, da sua cor. Isso é absolutamente inaceitável. Como brasileiros, nós não podemos aceitar que esse episódio passe impune ou que venha a se repetir. Não podemos assistir passíveis a um espetáculo dantesco em que um ser humano é agredido em uníssono por outros, vitimado pelas ofensas mais vis e fazer de conta que não vimos, que nada aconteceu.

    São jogos assistidos em todo o mundo que precisam ter a proporcional punição quando crimes como esses cometidos contra Vini Jr. vêm à tona. Isso inclusive é um aspecto importante. Se não há punição, a tendência é que, em outros lugares, esse tipo de crime volte a acontecer.

    Não sei se vocês se lembram, se V. Exas. se lembram, nós tivemos a final da última Copa da Europa, Itália e Inglaterra, em que a Itália ganhou na cobrança dos pênaltis e dois jogadores ingleses perderam pênaltis, o que é uma coisa natural no futebol, especialmente numa situação daquelas de tensão, de decisão, e foram perseguidos por torcedores, chamados de macacos, porque eram negros, e as suas famílias foram ameaçadas. Ora, se isso começa a se transformar em alguma coisa que não sofre nenhum tipo de sanção, o que vai acontecer é que esses episódios vão se repetir, vão se ampliar, a questão da agressão contra os negros vai se ampliar para os imigrantes, aliás, isso já acontece também, existem episódios dos mais diversos. Portanto, não podemos assistir impunemente a isso aí.

    Agir contra esse tipo de atitude não é só reparar a violência da agressão praticada, mas é sobretudo mostrar que episódios dessa natureza não podem se repetir e muito menos ficar impunes. Então, essa triste e deplorável atitude cometida reiteradamente em estádios de futebol da Espanha, ontem transformada em assunto mais comentado do mundo, não poderá passar sem as punições devidas. E o Brasil vai agir por todos os meios e em todas as instâncias e foros necessários para que o caso vire um exemplo da nossa luta contra o racismo.

    Viva, Vini Jr.! A sua luta é nossa.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/05/2023 - Página 14