Pronunciamento de Zequinha Marinho em 29/08/2023
Discurso durante a 118ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal
Indignação com a suposta truculência nas operações do Ibama no Estado do Pará, que culminaram no falecimento do Sr. José Garcia Vieira, garimpeiro da região do Tapajós. Censura à demora nos processos de lavra garimpeira no âmbito da Agência Nacional de Mineração e alerta para a defasagem do quadro de servidores da aludida agência
- Autor
- Zequinha Marinho (PODEMOS - Podemos/PA)
- Nome completo: José da Cruz Marinho
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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Administração Pública Indireta,
Meio Ambiente,
Mineração,
Servidores Públicos:
- Indignação com a suposta truculência nas operações do Ibama no Estado do Pará, que culminaram no falecimento do Sr. José Garcia Vieira, garimpeiro da região do Tapajós. Censura à demora nos processos de lavra garimpeira no âmbito da Agência Nacional de Mineração e alerta para a defasagem do quadro de servidores da aludida agência
- Publicação
- Publicação no DSF de 30/08/2023 - Página 116
- Assuntos
- Administração Pública > Organização Administrativa > Administração Pública Indireta
- Meio Ambiente
- Infraestrutura > Minas e Energia > Mineração
- Administração Pública > Agentes Públicos > Servidores Públicos
- Indexação
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- CRITICA, OPERAÇÃO, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS (IBAMA), ESTADO DO PARA (PA), JACAREACANGA (PA), TAPAJOS, MORTE, GARIMPEIRO, COMENTARIO, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE, ENTIDADE, AUDIENCIA PUBLICA, Comissão de Meio Ambiente (CMA), REPUDIO, DEMORA, PROCESSO, AGENCIA NACIONAL DE MINERAÇÃO (ANM), REGISTRO, DEFASAGEM, QUADRO DE PESSOAL, AUTARQUIA FEDERAL.
O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PA. Para discursar.) – Muito obrigado, Presidente.
Eu venho à tribuna nesta oportunidade, com muita tristeza e até com um certo constrangimento, mas não posso ficar calado diante do que está acontecendo, ou do que aconteceu, no meu estado. Dizem que dois mais dois vai dar sempre quatro, não é? Quer dizer, um abismo chama um outro abismo, e assim sucessivamente.
Na última quarta-feira, 23 de agosto, por ocasião da vinda da Ministra Marina Silva à Comissão de Meio Ambiente desta Casa, questionei a titular do MMA a respeito das operações truculentas do Ibama lá no meu estado, o Estado do Pará. O Presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, que acompanhava a Ministra naquela oportunidade foi quem me respondeu sobre as operações desumanas do Ibama no Pará.
E aqui eu gostaria de reproduzir, na íntegra, o que disse o Presidente do Ibama.
Ele disse o seguinte, abro aspas:
O Ibama realizou 13.820 ações de fiscalização neste ano; 642 em terras indígenas; 109 terras indígenas abrangidas pelas ações de fiscalização do Ibama. Em muitos locais [disse ele] a gente tem a parceria com o ICMBio, com a Polícia Federal, com a Polícia Rodoviária Federal e com a Força Nacional.
[Continua o Presidente] Nós estamos agora trabalhando na região do Tapajós, na região da Terra Indígena Mundurucu, e estamos tendo um bom sucesso no combate ao garimpo ilegal naquelas terras.
Mas eu gostaria de perguntar: bom sucesso? Dois dias após a fala do Presidente do Ibama, um trabalhador do garimpo, da região do Cantagalo, no Município de Jacareacanga, no Pará, foi morto a tiros, foi atacado por agentes do Ibama numa dessas operações desastrosas que costumam acontecer na Amazônia. Dessa vez, a vítima do Ibama foi o Sr. José Garcia Vieira, garimpeiro que morava na região do garimpo do Tapajós, há 40 anos, sem nenhum antecedente criminal e com processo de pedido de legalização de garimpo. O Sr. José Garcia... E aí mandamos entrar num sistema e recebemos ali, Presidente... acessamos dois requerimentos de PLG. Estão aqui nas minhas mãos para mostrar aos senhores, ele tentando se regularizar para exercer a sua atividade dentro daquilo que a lei lhe permite como cidadão.
Na audiência pública da quarta-feira, aqui na Comissão de Meio Ambiente, o Presidente do Ibama chegou a negar as ações de pirotecnia e afirmou que o órgão tem atuado apenas para acabar com a ilegalidade. Eu conheço um pouco o Presidente do Ibama, um rapaz legal, decente, que trata bem, mas ele precisava ir com o Ibama no Estado do Pará para ver exatamente como é que isso acontece lá: um helicóptero por cima jogando bomba no chão, e o povo correndo para se esconder como se fosse bandido. Os bandidos do Rio de Janeiro, lá dos morros, traficantes que matam, que destroem todo mundo com a droga, são respeitados, mas um trabalhador que luta para ganhar o pão de cada dia e que não está legal porque o estado, porque o Governo, porque a sua agência não consegue, não tem nem gente para trabalhar... Será que antes de chegar atirando os agentes não tiveram a ideia de pedir a documentação do Sr. José Garcia? Eu acho que não. Se tivessem dado esse tempo ao trabalhador, provavelmente, ele teria entregue aos agentes os dois pedidos, os dois requerimentos de lavra garimpeira que foram protocolados na Agência Nacional de Mineração aqui, na ANM.
O primeiro requerimento é de 2020, mais exatamente de 1º de outubro de 2020. O número do processo é 851.164/2020. Requeria uma área de 49,92 hectares para minerar ouro no Município de Jacareacanga. Desde que deu entrada nesse processo, a única movimentação ocorreu em fevereiro de 2021 e se trata de um protocolo de recebimento do órgão ambiental.
Dados da ANM revelam que, em todo o Brasil, são mais de 20 mil requerimentos que estão dependendo da análise do órgão licenciador. No Pará, só no meu estado, são mais de 12,2 mil, mais precisamente 12.217 requerimentos.
Infelizmente, senhores, essa situação revela a forma com que o Estado tem lidado com a atividade produtiva no país: empurra um trabalhador para a ilegalidade, exige dele a permissão da lavra garimpeira, mas não dá condições para que essa documentação chegue à mão do trabalhador.
A ANM está aí, em greve, depois de tentar negociar com o Governo sobre o seu plano de reestruturação. Cruzaram os braços, estão parados, literalmente – e têm razão. Um servidor da ANM ganha menos da metade do que o servidor de qualquer outra agência de regulação.
Em 2017, o antigo DNPM – como todo mundo lembra – deu lugar à Agência Nacional de Mineração. Foram atribuídas 17 novas funções à ANM, além daquelas que já eram conhecidas. Robusteceu-se a agência em responsabilidades, mas, e as condições necessárias para a atuação, para o trabalho dessa gente? Nada, absolutamente nada.
Em vez de aumentar o quadro de pessoal, a ANM se enfraqueceu. De acordo com o Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação, o Sinagências, existe uma defasagem de pessoal na ANM em torno de 70%. Isso quer dizer que, dos 2.121 cargos disponíveis naquela agência, só 664 estão ocupados, 30% desse total.
Enquanto isso, trabalhadores garimpeiros na Região Amazônica são postos na condição de criminosos. O Estado se exime de suas responsabilidades, é omisso, e quem tem a culpa é o trabalhador? Esse Estado chega lá, matando com bala alguém que não tem nem um canivete na mão só porque, ao ver o seu equipamento sendo destruído, corre para cima, desesperado? Ali está a sua vida, ali está tudo que ele tem. É desse jeito. Até quando? Eu não estou falando do Governo atual, porque os outros também, anteriormente, foram, de igual forma, omissos com relação a esse tema.
Até quando o Governo continuará se pautando única e exclusivamente na atuação da repressão? Nós precisamos ter um mínimo de condição para trabalhar. Agora reprimir, reprimir, reprimir, reprimir... mas onde esse cara vai se legalizar? Não tem onde. Que coisa esquisita, que decepção!
As operações repressivas...
(Soa a campainha.)
O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PA) – ...custam muito dinheiro ao Estado. Não é fácil manter todo aquele aparato de inúmeras caminhonetes, helicópteros, gente de tudo quanto é lado. Se uma pequena parte desse dinheiro usado na repressão fosse para trabalhar, através da ANM, para poder fornecer a legalidade, o documento a essa gente que pode, que tem condição, que está numa área que pode ser licenciada, teríamos evitado a tragédia que aconteceu recentemente.
A ANM tem direito a 7% da arrecadação do Cfem. Não lhe passaram, no ano passado, nem 1%. Segundo informações, o repasse foi de 0,84%; mas as operações são robustas, verdadeiras operações de guerra, com gente, equipamento, tecnologia e tudo...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PA) – ... e agora com autorização para matar. Onde já se viu isso? Até quando nós vamos suportar esse tipo de coisa?
Eu quero aqui, neste momento, Presidente, repudiar essa forma de atuação e lamentar a morte do Sr. José Garcia Vieira. Aqui, quero me solidarizar com a família desse trabalhador que teve sua vida ceifada pelo Estado. O Estado, que deveria lhe dar proteção, o Estado, que deveria deferir seus pedidos de PLGs para que ele pudesse trabalhar, não faz isso, mas o Estado, esse Estado vai ao seu encontro e o metralha, destruindo sua vida, acabando com a família. Está lá!
Estamos acompanhando passo a passo para que o inquérito seja fechado nos próximos dias. A distância é longa da cidade de Itaituba, mas as cinco pessoas que estavam juntas lá, eram seis pessoas, mas uma morreu, então temos cinco, essas cinco virão à delegacia de Itaituba prestar seu depoimento, e a gente precisa punir esse tipo de atitude de forma exemplar. É preciso que essa turma perca a sua função na instituição e vá para o banco dos réus para receber a devida recompensa pelo crime cometido. Mas o que me impressiona é que, se tivesse acontecido de a polícia matar um bandido, um traficante, no Estado, o negócio estaria fora de controle: a imprensa, os jornais, todo mundo atrás...
(Soa a campainha.)
O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Juntos pelo Brasil/PODEMOS - PA) – ...mas mataram um trabalhador. Ninguém escreve absolutamente nada, além dos pequenos blogues, independentes, ninguém diz absolutamente nada. É como se tivesse matado um cão, um inseto, alguma coisa, mas foi um ser humano trabalhador, que não tem o documento da sua área para garimpar, porque esse Estado que o matou não lhe deu oportunidade de trabalhar na legalidade.
Aqui fica o meu repúdio, a minha revolta, Presidente, e nós vamos acompanhar isso milimetricamente, para que fatos semelhantes não ocorram, não só no Pará, mas no resto do Brasil.
Muito obrigado.