Discurso durante a 137ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Relato da participação de S.Exa. em reunião do Grupo Liberdade e Democracia, em Buenos Aires, no último final de semana. Crítica à decisão do CNJ que determinou abertura de investigação sobre a conduta de S.Exa. durante o período em que foi juiz responsável pela Operação Lava Jato.

Autor
Sergio Moro (UNIÃO - União Brasil/PR)
Nome completo: Sergio Fernando Moro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Assuntos Internacionais, Atividade Política, Crime Contra a Administração Pública, Improbidade Administrativa e Crime de Responsabilidade:
  • Relato da participação de S.Exa. em reunião do Grupo Liberdade e Democracia, em Buenos Aires, no último final de semana. Crítica à decisão do CNJ que determinou abertura de investigação sobre a conduta de S.Exa. durante o período em que foi juiz responsável pela Operação Lava Jato.
Aparteantes
Eduardo Girão.
Publicação
Publicação no DSF de 26/09/2023 - Página 21
Assuntos
Outros > Assuntos Internacionais
Outros > Atividade Política
Outros > Crime Contra a Administração Pública, Improbidade Administrativa e Crime de Responsabilidade
Indexação
  • REGISTRO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, ENCONTRO, GRUPO, LIBERDADE, DEMOCRACIA, LOCAL, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, BUENOS AIRES, CRITICA, DECISÃO, CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), ABERTURA, INVESTIGAÇÃO, SENADOR, PERIODO, JUIZ FEDERAL, RESPONSABILIDADE, OPERAÇÃO LAVA JATO.

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar União Cristã/UNIÃO - PR. Para discursar.) – Senador Dr. Hiran, é um privilégio tê-lo na mesa, presidindo, durante a minha exposição.

    O SR. PRESIDENTE (Dr. Hiran. Bloco Parlamentar Aliança/PP - RR) – Muito obrigado.

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) – Quero cumprimentar os Senadores e Senadoras presentes e fazer um relato breve.

    Estive em Buenos Aires, neste final de semana, e tive também o privilégio de estar na companhia do Senador Girão, da Senadora Maria Cristina – Tereza Cristina, perdão –, e do Governador Ronaldo Caiado. Existe esse grupo, chamado Grupo Liberdade e Democracia, que é formado por ex-Presidentes latino-americanos de direita e de centro-direita.

    Essa foi a segunda reunião do grupo. Era um grupo inicialmente formado apenas por ex-Presidentes. Então tinha lá Felipe Calderón, do México; Iván Duque, da Colômbia; Mauricio Macri, da Argentina; Sebastián Piñera, do Chile; Tuto Quiroga, da Bolívia; Miguel Ángel, da Costa Rica e vários outros.

    E o que eles pretendem exatamente, esse grupo? Eles querem fazer um contraponto ao Grupo de Puebla ou ao Foro de São Paulo, que representa aqui, no continente latino-americano, não só o populismo de esquerda, mas um populismo de esquerda com viés autoritário, retratado principalmente no fato do apoio que é dado por esse grupo a regimes ditatoriais, tirânicos na América Latina, como Venezuela, como Nicarágua, como Cuba.

    Vejam que eu sempre tenho dito: o Brasil é um grande país, mas que tem os seus próprios problemas. O Brasil não precisa ficar se envolvendo em todas as questões de todos os países. Existe a questão da soberania – é claro que temperada aqui pelo respeito sempre aos direitos humanos, que orientou a nossa diplomacia –, mas, quando a gente fala da América Latina, nós estamos falando de países que são nossos irmãos, que têm uma história muito similar, e muitas vezes o que acontece neles reflete na nossa realidade. É o caso, como foi muito bem colocado aqui pelo Senador Hiran, da Venezuela. É o Brasil um dos países que sofre esse fluxo imigratório e, como nós temos essa natureza de solidariedade, de acolhimento, o Brasil tem recebido os venezuelanos foragidos; mas isso tem um custo e, no fundo, é um paliativo a um sofrimento que os levou a deixar os respectivos países.

    Então, a ideia da nossa participação nesse Grupo Liberdade e Democracia é para que o Brasil tenha uma presença ali. Nós não podemos virar nossas costas à América Latina. Nós somos um país continental e nós falamos uma língua diferente das dos demais países do continente, mas o que acontece nesses outros países é igualmente relevante para nós.

    Foi importante, Senador Hiran, fazer esse evento na Argentina, porque em outubro nós não sabemos qual vai ser o exato resultado dessa eleição; mas nós temos certeza de uma coisa, pelo que nós pudemos observar na Argentina: de que o kirchnerismo, que é a vertente populista, de esquerda, autoritária e corrupta, que apoia esses regimes da ditadura, o kirchnerismo se vai. Não existe a menor, remota chance de uma vitória do atual Governo, que foi desastroso em todos os aspectos, do Alberto Fernández. Esse Governo se vai e será substituído por candidatos que estão dentro do espectro político ou da direita ou da centro-direita, que são o Javier Milei e a Patricia Bullrich. Então, essa é uma boa notícia, e fazer o evento na Argentina tem esse caráter simbólico, porque ali começa o vento da mudança.

    No Equador, da mesma forma, é provável um resultado favorável, que repudie também a esquerda populista e autoritária.

    Assim, cada Estado, cada país... Bolívia, mais adiante; Chile, mais adiante; Brasil, em 2026, quem sabe nós possamos virar essa página tenebrosa de uma esquerda populista, que tem sido um sinal de atraso, na América Latina, em relação ao bem-estar e à garantia das liberdades fundamentais.

    Agora, algo que me chamou muita atenção, Senador Girão – claro que, com a presença dos Presidentes, ex-Presidentes, pessoas de vasta experiência política, nós sempre aprendemos com a presença deles –, algo que me chamou muita atenção foi a presença de pessoas perseguidas politicamente ou dos seus representantes.

    Tive a honra de conhecer a filha da ex-Presidente da Bolívia, que hoje está como prisioneira política naquele país, que é Jeanine Áñez. Quando Evo Morales fugiu da Bolívia, deixou o seu cargo, houve um vácuo de poder e Jeanine Áñez assumiu como Presidente. Era Senadora, como se fosse um de nós aqui, não havia quem quisesse, praticamente, o cargo de Presidente e ela assumiu. Realizou eleições livres e acabou sendo vitorioso um aliado do Evo Morales, que, assim, pôde retornar ao país. Em uma reviravolta tremenda, foi chamada de golpista e hoje está presa lá na Bolívia. É uma verdadeira presa política, porque ela, simplesmente, cumpriu os regramentos constitucionais e garantiu a realização de novas eleições.

    Conheci Fernando Camacho, que é filho do Governador da Província de Santa Cruz, na Bolívia, uma província, aliás, que tem uma presença significativa de imigrantes brasileiros e investimentos brasileiros relevantes. Ele também é preso político. Ele foi vítima de um verdadeiro sequestro, foi sequestrado, retirado da Província de Santa Cruz e levado preso a La Paz, onde permanece até hoje.

    Conheci um jovem extremamente valente, Félix Maradiaga. Ele é nicaraguense. Era candidato à Presidência contra Daniel Ortega e ganharia, porque Ortega é outro que só tem o poder em suas mãos, na Nicarágua, por meio da coação e da força. Pude ouvir a sua história: era candidato, foi preso por 21 meses, seguidos de 19 meses de prisão domiciliar, até que foi expulso, agora, neste ano de 2023, da Nicarágua, com o ato arbitrário, Senador Hiran, de ter a sua nacionalidade revogada. É claro que nós sabemos que esse ato arbitrário não significa nada, porque ele é um nicaraguense e não vai abandonar as suas raízes e o seu orgulho, mas, quando se vê, Senador Confúcio, que um tirano chega ao ponto de privar o cidadão do seu país meramente por ser oposicionista, de privá-lo da sua nacionalidade, é que nós vemos o nível de arbitrariedade a que se pode chegar.

    Também conheci Rosa Maria Payá, cubana, filha de um dos mais famosos dissidentes da ditadura de Cuba, Oswaldo Payá, que foi assassinado em 2012 pelo regime cubano. Durante muito tempo ficou acobertada a participação do Estado cubano nesse assassinato político, e, neste ano, finalmente, a Corte Interamericana de Direitos Humanos reconheceu a responsabilidade do Estado cubano pelo assassinato de Oswaldo Payá e pelo acobertamento das circunstâncias do seu assassinato.

    Estava lá sua filha, Rosa María Payá, defendendo o legado do pai, e defendendo, talvez, naquele país da América Latina que mais sofreu com a ditadura, porque é a mais longeva, porque já está aí desde a década de 50, do século passado, mas, ainda assim, carregam cubanos corajosos essa chama da liberdade.

    O exemplo dessas pessoas é inspirador, e eu quero trazê-las, Senador Hiran, assim como trouxemos María Corina Machado, para falar perante o Senado brasileiro, para que nós joguemos uma luz e para que nós possamos deixar claro que nós repudiamos tiranos, que nós não damos as mãos para ditadores, que o Brasil, nessa política internacional que nos aproxima de autocracias, que nos aproxima de assassinos, não está com eles, que existe um Senado independente e que a maioria da população não tolera esse tipo de comportamento. Mas o exemplo também desses combatentes da liberdade serve de exemplo aqui para nós, Senador Hiran, porque esse viés autoritário da política internacional reflete um viés autoritário da política interna. Senadores e Deputados ameaçados porque criticaram uma resolução do Governo, uma resolução infeliz, que tem que ser mais bem debatida perante a sociedade, ameaçados com a procuradoria da verdade. Um clima de intimidação e um clima de censura. Processos que a gente não consegue entender direito.

    Na semana passada, tivemos a notícia de que a Corregedoria do CNJ iria abrir uma investigação contra um Senador da República. Quando que o CNJ tem competência ou atribuição para investigar um Senador da República? Tem, sim, sobre o Judiciário. Pois bem, não sou mais juiz – tenho que dizer isso –, deixei a toga, que carreguei com muito orgulho, Senador Girão, e tenho orgulho do que eu fiz na Operação Lava Jato. Deixei em 2018 porque vi a possibilidade de trabalhar para o país, de continuar trabalhando para o país em outras posições. Mas larguei, e doeu aquilo, porque foram 22 anos de dedicação, e deixei todos os benefícios corporativos para trás. Não tenho direito à aposentadoria de magistrado, como alguns, às vezes, se equivocam. Deixei isso para trás para olhar para a frente. E, de repente, agora, um corregedor, que não tem competência, que não tem jurisdição, que não tem atribuição para tratar desse tema, resolve abrir uma investigação. Se não fosse surreal o suficiente, quando a gente vai ver o objeto da investigação, é porque, Senador Girão, graças ao meu trabalho na Operação Lava Jato, nós devolvemos mais de R$2 bilhões à Petrobras, só de dinheiro que entrou em contas judiciais da 13ª Vara e foi repassado para a Petrobras; mas os valores que a Petrobras recebeu foram muito maiores, ultrapassam R$6 bilhões, só que ela recebeu diretamente, por ações lá na 13ª, por outras ações de outros locais, inclusive por acordos de colaboração e leniência. Agora, deve ser um fato inédito no mundo um juiz ser investigado porque cumpriu a sua missão e devolveu o dinheiro que tirou dos bandidos, devolveu à vítima.

    Claro que não comparo aqui – não tem comparação – a situação específica com o caso dos presos políticos da Bolívia; não tem comparação com a situação do Félix, que perdeu a nacionalidade e que busca, de alguma forma, continuar lutando pela democracia no seu país; não tem comparação em relação à Rosa María, que perdeu o seu pai, assassinado por um regime cubano. Mas, quando a gente começa a ver esses absurdos aqui no Brasil e as pessoas muitas vezes quietas, silentes, com medo, e um Presidente, com todo o respeito, que não dignifica a tradição da diplomacia internacional brasileira, ao adular ditadores, ao fechar os olhos para os assassinatos políticos, ao aplaudir perseguição política, porque se omitir nesse caso é a mesma coisa que aplaudir, que dar o aval... E é essa a visão que o grupo tem, inclusive, Senador Hiran, sobre o Governo Lula, que é uma má influência para a América Latina. Quando a gente vê esses sinais autoritários e um Presidente que tem essa postura internacional, não podemos deixar de ficar receosos – não por nós, mas por nossa liberdade.

    Agora, eu tenho certeza de que este Senado, paulatinamente, progressivamente, talvez não hoje, talvez não amanhã, mas ele vai reafirmar a liberdade e a democracia do Brasil quando o momento for necessário.

    Concedo o aparte.

    O Sr. Eduardo Girão (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Para apartear.) – Muito obrigado, Senador Sergio Moro. Cumprimento-o pelo seu pronunciamento aqui nesta tarde.

    E uma coisa que me chamou muita atenção nessa visita lá a Buenos Aires, do evento da Fundación Libertad, muito bem organizado, que, no próximo ano, se não me engano, será no Chile, e já tem uma articulação para vir ao Brasil – serão muito bem-vindos os Presidentes e Parlamentares de outros países –, foi o respeito ao senhor, como esses ex-Presidentes, Parlamentares e o público que lá estava, lotando praticamente todos os painéis, respeitam o trabalho que o senhor fez, como juiz, como integrante, naquele momento da força-tarefa, que elevou o Brasil perante o mundo como um símbolo positivo de enfrentamento à corrupção e à impunidade e em que a justiça era verdadeiramente para todos. E lá eu fiquei impressionado, no que eles chamam de caso Odebrecht, e nós aqui, de Operação Lava Jato, em como o mundo aplaude e acompanha o seu trabalho nesta Casa.

    Eu quero dizer que, na oportunidade que eu tive de falar, no painel em que eu falei... A nossa colega Senadora Tereza Cristina, Senador Hiran, fez um pronunciamento muito bonito. O Governador Ronaldo Caiado – que, aliás, faz aniversário hoje também; mando meus parabéns para ele... A palestra que nós ouvimos lá dos ex-Presidentes foram muito reveladoras de dados sobre o avanço, principalmente, do narcoterrorismo, dos narcoestados, nesses países alinhados à esquerda, alinhados ao populismo, desses ditadores que são amigos do Lula. Muito preocupante o que a gente ouviu lá nas palestras. E eu tive a oportunidade, na minha fala, de abordar a questão dos presos políticos do Brasil, porque poucos sabem que nós temos presos políticos também na nossa nação, começando por aquela aberração: não concordo com nenhuma palavra que disse o Deputado que perdeu o mandato, o Deputado Federal do Rio de Janeiro, mas ele foi preso; invadiram a Câmara dos Deputados. E agora um Senador da República, Marcos do Val, também teve o celular apreendido, com equipe da Polícia Federal entrando no Senado, violando o local de trabalho dele, algo completamente sem noção, sem obediência à lei, sem obediência ao parlar, ao nosso trabalho aqui.

    Nós temos presos políticos no Brasil, e o 8 de janeiro está aí mostrando isso: policiais militares aqui do Distrito Federal, Senador Hiran – nós estamos acompanhando na CPI da pandemia –, com salários cortados, meses presos, passando todo tipo de dificuldade sem direito à defesa, ao devido processo legal, sumariamente condenados publicamente. Isso nos deixa muito tristes, e o mundo está tomando conhecimento do que está acontecendo no Brasil. E nós não vamos parar até que a lei deste país seja obedecida, principalmente por aqueles que deveriam ter a responsabilidade, o dever de resguardar nossa Constituição, e que infelizmente são os primeiros a desobedecer, por interesses politiqueiros. Porque hoje o Brasil tem tribunal político! STF e TSE, para mim – respeito quem pensa diferente –, é politicagem pura. O marco temporal está aí para dizer: usurparam o que é prerrogativa desta Casa e, está aí, correram para dar uma justificativa de militância ideológica, em desrespeito aos Senadores e Deputados. Aborto está aí, legalização de droga está aí. E o engraçado, Senador Hiran: tudo alinhado ideologicamente com o Governo Lula. Já parou para perceber? As mesmas pautas do STF, as mesmas pautas do Governo Lula. É muita coincidência! Ninguém é bobo, ninguém é tolo. Existe esse alinhamento, e isso é ruim para a democracia. É muito ruim para a democracia esse consórcio entre Governo Lula e Corte Suprema do Brasil.

    Muito obrigado.

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) – Eu agradeço as palavras.

    Teve uma expressão que me chamou muito a atenção, e era até o tema de um dos painéis, Senador Confúcio: narcopopulismo. Eu diria que, se nós não tomarmos cuidado, nós caminhamos para uma espécie narcopopulismo misturado com cleptopopulismo. São essas as características. Se nós não tomarmos cuidado, caminharemos para ter uma situação dessa no país.

    Mas, como eu disse, nós temos que confiar nas instituições brasileiras, e este Senado, ao meu ver, tem um papel enorme para colocar freios nessa política, que está sendo desastrosa. Agora há pouco mesmo, o Senador Izalci colocou com muita propriedade a ofensa que foi feita pelo Ministro da Fazenda ao empresariado, ao contribuinte brasileiro. É claro que se pode dizer: "não; foi um ato falho". E acredito que o Ministro vai pedir desculpas, mas, dentro ali, Senador Hiran, me parece que tem uma certa percepção da hostilidade profunda que este Governo tem, este Governo Lula, em relação ao setor privado, reforçando aquilo que a gente tem visto, de que esse é um governo de revanche. E uma revanche a gente até vê como começa, mas a gente nunca sabe como termina. É nosso papel colocar um freio nesse tipo de atitude e nesse Governo movido a rancor.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/09/2023 - Página 21