Discurso durante a 139ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários acerca do marco temporal das terras indígenas no Brasil. Críticas à operação Eraha Tapiro, realizada em agosto pela Funai, em parceria com forças de segurança. Insatisfação com atuação de ONGs na Amazônia.

Autor
Zequinha Marinho (PODEMOS - Podemos/PA)
Nome completo: José da Cruz Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Desenvolvimento Regional, População Indígena:
  • Comentários acerca do marco temporal das terras indígenas no Brasil. Críticas à operação Eraha Tapiro, realizada em agosto pela Funai, em parceria com forças de segurança. Insatisfação com atuação de ONGs na Amazônia.
Publicação
Publicação no DSF de 28/09/2023 - Página 32
Assuntos
Economia e Desenvolvimento > Desenvolvimento Regional
Política Social > Proteção Social > População Indígena
Indexação
  • CRITICA, FUNDAÇÃO NACIONAL DOS POVOS INDIGENAS (FUNAI), PARCERIA, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS (IBAMA), POLICIA FEDERAL, POLICIA RODOVIARIA FEDERAL, AGENCIA, DEFESA, AGROPECUARIA, ESTADO DO PARA (PA), SEQUESTRO, GADO, REGIÃO.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), REGIÃO AMAZONICA, INDUÇÃO, DOAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, INDIO, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL.
  • DEFESA, APROVAÇÃO, MARCO TEMPORAL, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, GARANTIA, SEGURANÇA JURIDICA, REGULAMENTAÇÃO, POSSE, TERRAS, BRASIL.

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA. Para discursar.) – Muito obrigado, Sr. Presidente.

    A gente retorna à tribuna para comentar sobre o assunto que, todos os dias, praticamente, está sendo ventilado. Trata-se da questão do marco temporal e da história indígena no Brasil, história contemporânea, que, de fato, chama a atenção de todo o mundo. É preciso dar uma paradinha para poder prestar atenção no que está acontecendo.

    Sobre essa discussão a respeito do marco temporal, gostaria de aproveitar o momento para falar um pouco sobre a situação do município paraense da região do Xingu, próximo a Altamira, chamado Senador José Porfírio. Localizado na região do Xingu, Senador José Porfírio tem uma área de 1.441.991ha, um município relativamente grande em termos de território; população de 22.576 habitantes, segundo o IBGE do ano passado. Senador José Porfírio é cercado por terras indígenas. São seis, considerando a pretensa Terra Indígena Ituna/Itatá. Digo pretensa porque, desde 2011, 12 anos atrás, portanto, essa terra tem sido alvo de portarias de restrição de uso dessa área, a pedido do Instituto Sociambiental (ISA), uma forte, uma das grandes e fortes ONGs que atuam na Amazônia, de forma muito truculenta, inclusive, e que quer, porque quer provar a existência de índios isolados. Interessante isso. Essa região de Ituna/Itatá... Ituna e Itatá são nomes de dois rios que cortam essa terra. Querem inventar índio isolado nessa região.

    Lá atrás, no Governo da Governadora Ana Júlia, do Estado do Pará, ela assentou nessa região 142 famílias que ela havia tirado de uma outra região para ceder para uma determinada etnia indígena. E esse povo está lá. Os índios isolados que tem nessa região são exatamente essa turma, que veio nessa época, colocados por decreto, pela Governadora Ana Júlia.

    Em 2021, a Funai concluiu a impossibilidade de transformar a gleba Ituna/Itatá em terra indígena pelo simples fato de não conseguir comprovar a existência de indígenas naquela região. Não tinha.

    Nesse entorno, nós temos duas terras, duas grandes terras. São mais de 4 milhões de hectares para duas etnias. E eles são os primeiros a dizer que nessa região não tem índio. Estão lá a vida toda. Não querem mais terra, porque acham que não tem sentido tanta terra. Por mais que a Funai tenha admitido a inexistência de indígenas, essa terra continua sendo palco para conflitos provocados pelas forças do Estado. O que acontece nessa região é inacreditável.

    No último mês de agosto, a Funai, em parceria com o Ibama, a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, a Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (Adepará) e a Força Nacional de Segurança Pública, deflagrou uma grande operação, chamada Operação Eraha Tapiro. Sabe o que significa? Significa na língua asurini, daquela região lá, "levar boi". Por que "levar boi"? Deixa eu explicar. De forma covarde e criminosa, os agentes do Estado estão sequestrando o gado daquela região, e já levaram mais de 2 mil cabeças – presta atenção! –, mais de duas mil cabeças, de produtores que estão lá, ou naquela região, desde a década de 70, quando foram incentivados pelo Governo Federal para povoar a Amazônia como parte da política de integrar para não entregar. Vejam que clima de tensão e insegurança é provocado em razão da falta de um marco temporal. Olhe só, e ainda tem gente que defende que a gente não precisa votar, que tem que deixar como está. Que coisa mais maluca.

    Tornamo-nos, senhores, alvo de ONGs que dizem defender os indígenas e que os obrigam a lutar por mais terras. A CPI das ONGs – que, neste momento está em operação, está avançando aqui no Senado Federal, presidida pelo Senador Plínio Valério – tem sido bastante elucidativa sobre essa péssima influência de muitas ONGs da Região Amazônica.

    O compromisso dessas ONGs não é com o povo indígena. Basta ver a situação de muitas tribos no Brasil: sem saúde, sem abastecimento, sem saneamento, sem dignidade, sem nada. Essas ONGs querem terras para impedir o desenvolvimento do Brasil. Esse é o alvo. Elas captam financiamento lá fora, trabalham para grupos lá fora para barrar o avanço do país, sob todos os aspectos – não é só do agro, não. Muitos outros projetos estão sendo tolhidos exatamente por isso.

    Só um caso aqui: no Estado do Amazonas, no Município de Autazes, tem uma reserva de potássio que dá para resolver, por alguns anos, o problema da dependência internacional do Brasil do potássio, mas está a 10km de uma reserva indígena e, por causa desses 10km de distância, o empreendedor não continuou, não conseguiu avançar, porque as ONGs embargaram junto ao Ministério Público e suspenderam a operação. O Brasil continua dependente da importação de potássio em grande quantidade. Nós precisamos resolver isso. A ONG trabalha exatamente para atravancar o desenvolvimento do país.

    Voltando a Senador José Porfírio, como disse, são 22.576 habitantes. Vocês sabem quantos indígenas existem no município? Vamos lá: na Terra Indígena Arara da Volta Grande do Xingu, de acordo com as informações do Siasi/Sesai, são 143 índios numa área de 25.534ha; na Terra Indígena Araweté/Igarapé Ipixuna, são 467. Se você somar aqui, dá seiscentos e poucos índios, pela contagem, também, do mesmo órgão, para uma terra de 941 mil hectares, sendo 37.480ha no Município de Senador José Porfírio. Além dele, essa terra pega as cidades dos Municípios de Altamira e de São Félix do Xingu. Olhe só, quase 1 milhão de hectares para 600 índios. É simplesmente um absurdo.

    Na pretensa Terra Indígena Ituna/Itatá, não existe índio isolado, mas bloquearam uma área de 142 mil hectares, sendo 63,74% no Município de Senador e o restante no Município de Altamira.

    Na Terra Indígena Koatinemo, o último levantamento do sistema indica uma população de 182 índios vivendo em uma área de 388 mil hectares, sendo 19.722ha em Senador José Porfírio e o restante no Município de Altamira.

    Na Terra Indígena Paquiçamba, que ainda não foi homologada, um grupo de trabalho da Funai...

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) – ... aponta para uma população de 83 índios, em uma área de 16 mil hectares, sendo: 12,29%, em Senador José Porfírio; 52,56%, em Anapu; 37,58%, em Vitória do Xingu. Quer dizer, pega três municípios uma área só.

    Na Terra Indígena Trincheira/Bacajá, dados da Funai de Altamira revelam a existência de 746 indígenas, espalhados em um território de um milhão... Prestem atenção: 746 indígenas espalhados em um território de 1.650.939 hectares. Destes, 51% está no Município de Senador José Porfírio; 31% encontra-se em Anapu; 14,30%, em São Félix do Xingu; 3,92%, em Altamira. Olha o tamanho dessa terra, atingindo os mais diversos municípios daquela região!

    No começo da minha fala, comentei que Senador José Porfírio tem 1.441.991 hectares, certo? Se somarmos as porções de terras indígenas e da pretensa Terra de Ituna/Itatá, que ocupa uma parte do território de Senador José Porfírio, são 1,19 milhão de hectares. Ou seja, 71 % do território de Senador José Porfírio está bloqueado como terra indígena.

    O que esse povo vai fazer? Onde é que eles vão trabalhar para produzir? É uma coisa maluca. E eu quero dizer a vocês que isso não é uma iniciativa de nenhum indígena, de nenhuma liderança e nenhum cacique! É tudo liderado por ONGs, principalmente o ISA, e o Brasil não desconfia disso? Que coisa mais maluca, não é?

    Quer dizer, eu vou asfixiar o não índio: não vai ter onde produzir, não vai ter onde morar, não vai ter onde trabalhar, porque eu preciso entregar, para meia dúzia de indígenas, todo um território absurdo. Você ficar com um município com 71% do território todo transformado em terra indígena, e, quando você vai somar a população indígena, não dá mil, dá mil e pouquinho? Que coisa maluca, que contrassenso.

    Se o marco temporal não for estabelecido – se Deus quiser, hoje! Nós aprovamos, ainda há pouco, na CCJ, um requerimento de urgência para ele vir para a pauta, hoje, aqui –, nós vamos deixar acabar com a cidade de Senador José Porfírio e tantas outras, não é?

(Soa a campainha.)

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) – Só um minutinho mais, meu Presidente.

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Kajuru. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - GO) – Mais dois, pode ser?

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) – Mais cinco? Está folgado aqui hoje.

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Kajuru. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - GO) – Não, com mais cinco, vai para dezessete...

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) – O Cleitinho está ali esperando, tranquilo.

    O SR. PRESIDENTE (Jorge Kajuru. Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - GO) – Tudo bem, não concordo, mas vou aceitar.

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) – O que a gente precisa fazer? O dever de casa.

    Essa questão do marco temporal muita gente acha que é uma briga da oposição contra a situação ou contra o Governo. Não existe nada disso. É uma briga da esquerda contra a direita? Também não tem nada a ver com isso. É uma luta do produtor rural contra os indígenas? Também não tem nada a ver. É o simples fato de esta Casa cumprir o seu papel, que é votar matérias, dar segurança jurídica ao cidadão e assim por diante.

    Essa decisão do Supremo Tribunal Federal com relação a Santa Catarina acabou com dois municípios, acabou com a vida de quase 200 famílias, num pedacinho de terra, porque lá tudo é pequenininho.

    Eu estava vendo a média das áreas lá em Santa Catarina, Senador. Não dá 20ha se você dividir 2,7 mil por cento e cacetada. Terrinha pequenininha, que lá no Pará...

    O Sr. Esperidião Amin (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) – A média é meia colônia, 12,5 hectares.

    O SR. ZEQUINHA MARINHO (Bloco Parlamentar Democracia/PODEMOS - PA) – Pois é. Lá no Pará, a gente chama de chacrinha, porque tudo é espaçoso lá.

    Esses caras estão lá nessa região com escritura, com documento que tem mais de cem anos. Como é que a gente não vota o marco temporal para botar um freio nisso? Que coisa terrível! Que loucura! Que absurdo! Que contrassenso! Mas é isso.

    Muito obrigado, meu Presidente.

    Eu queria, neste momento, aqui, dizer ao Brasil que conte com esta Casa. O Senado Federal está devendo a este país muita coisa. Muita coisa. Esse projeto está aí há 17 anos. Enrola daqui, enrola dali, fica para depois, "não vamos mexer com isso agora", "está tudo tranquilo"... Está tudo tranquilo? Não está tudo tranquilo.

    Então, nós não estamos fazendo nada mais do que o arroz com feijão, Senador Cleitinho, a obrigação de casa. Não é para estabelecer confronto, absolutamente. "Ah, vamos enfrentar o Supremo!" Que nada! O Supremo cuide da vida dele, que nós vamos cuidar da nossa aqui. Correto? Não queremos briga com ninguém. Nós queremos paz, e o marco temporal vai dar paz no campo. Ninguém vai brigar com ninguém, porque cada um vai ficar no seu devido quadrado.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/09/2023 - Página 32