Discurso durante a 189ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a crescente tensão entre Venezuela e a Guiana na América do Sul e as implicações de um possível conflito para o Brasil, especialmente para o Estado de Roraima.Defesa da atuação brasileira como mediador para solucionar de forma pacífica a crise da região.

Autor
Chico Rodrigues (PSB - Partido Socialista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco de Assis Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Governo Federal, Relações Internacionais:
  • Preocupação com a crescente tensão entre Venezuela e a Guiana na América do Sul e as implicações de um possível conflito para o Brasil, especialmente para o Estado de Roraima.Defesa da atuação brasileira como mediador para solucionar de forma pacífica a crise da região.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/2023 - Página 47
Assuntos
Outros > Atuação do Estado > Governo Federal
Soberania, Defesa Nacional e Ordem Pública > Relações Internacionais
Indexação
  • PREOCUPAÇÃO, CONFLITO, GUERRA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, GUIANA, CONSEQUENCIA, ESTADO DE RORAIMA (RR), SOLICITAÇÃO, BRASIL, ATUAÇÃO, PACIFICAÇÃO.

    O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR. Para discursar.) – Sr. Presidente, meus caros colegas Senadores, meu caro Senador Eduardo Girão, que, atentamente, é um símbolo de presença neste Plenário, trazendo ideias modernas, ideias muitas vezes discordantes, mas sempre com a sua característica de ter juízo de valor formado, pessoal, a respeito de temas importantes para o país.

    Trago, hoje, como brasileiro e representante do Estado de Roraima, um assunto que muito nos preocupa neste momento. Nós vivemos um momento de escalada e tensão na América do Sul, minha gente. Venezuela e Guiana se enfrentam em uma guerra retórica que pode evoluir para episódios de violência, logo ali, na fronteira com o meu Estado de Roraima. O momento é de alerta e de intenso esforço diplomático.

    A situação não é simples. O Presidente venezuelano, Nicolás Maduro, propôs, no último dia 5 de dezembro, uma lei que prevê a criação de uma província venezuelana em Essequibo, território em disputa com a Guiana. É necessário que tenhamos uma real compreensão do contexto geopolítico desse conflito. Essequibo é uma área de 160 mil quilômetros quadrados de superfície, tem população estimada em 120 mil guianenses e ocupa dois terços do território do país.

    O imbróglio entre os dois países a respeito do território remonta do começo do século XIX, quando a Venezuela se tornou independente da Espanha. Guiana, então, era um território britânico. Houve, no momento, uma partilha do território ao norte do Brasil que foi questionada pelos venezuelanos. Formou-se uma comissão internacional, em Paris, para arbitrar a questão de Essequibo, e, em 1899, um laudo deu posse definitiva da área para os britânicos. A Venezuela nunca aceitou essa decisão.

    Em 1966, a Guiana alcançou sua independência. Durante todo o período, fracassaram tentativas de negociações a respeito de Essequibo. O assunto permaneceu paralisado até 2015, quando foram descobertos bilhões de barris de petróleo nas águas profundas da Guiana, parte delas, justamente, na região em conflito.

    O cerne da questão, portanto, é este: as valiosas reservas naturais de Essequibo. Não nos cabe entrar no mérito da questão. A nós não nos cabe entrar no mérito da questão. Nossa preocupação não é quem tem direito à região de Essequibo, mas precisamos ficar atentos, principalmente, porque o resultado do plebiscito em que 96% dos eleitores venezuelanos teriam se manifestado a favor da criação de uma nova província venezuelana em Essequibo e a concessão da nacionalidade aos habitantes da região trouxe mais tensão a essa disputa.

    Com base nesse plebiscito, o Presidente Maduro ordenou que a petroleira estatal PDVSA conceda licença para exploração imediata de recursos naturais da região. Senadores e Senadoras, um conflito como esse terá repercussões sérias e imediatas para o Brasil.

    Especialistas alertam que as principais rotas de acesso entre Venezuela e Essequibo passam pelo Brasil, mais especificamente por Roraima, já que a fronteira entre os dois países é formada, em sua maioria, por floresta densa e montanhas. Portanto, isso nos preocupa bastante. Por isso, há cerca de duas semanas, estive com o Comandante do Exército, General Tomás Paiva, e com o Ministro da Defesa, José Mucio Monteiro, solicitando avaliação permanente e fortalecimento da presença do Exército Brasileiro nas nossas fronteiras em Roraima.

    Para além do potencial impacto direto de uma possível investida militar na região, o Brasil pode enfrentar importantes consequências da escalada da violência e do fim histórico de um ambiente pacífico na América do Sul.

    Temos desempenhado um papel diplomático importante diante das investidas da Venezuela, e é fundamental que mantenhamos esse ímpeto, sempre com foco na resolução pacífica de conflitos, habitual nas nações dessa região.

    Tenho a honra de ocupar a Presidência do Grupo Parlamentar Brasil-Venezuela e do Grupo Parlamentar Brasil-Guiana e coloco-me à disposição do Governo brasileiro para fortalecer as ações diplomáticas parlamentares em favor da paz na região. O Brasil é um tradicional mediador na América do Sul, e temos o dever de honrar essa função.

    Senhoras e senhores, Senadores e Senadoras, não podemos subestimar os riscos envolvidos no conflito entre Venezuela e Guiana. Para além da superioridade militar da Venezuela sobre a Guiana, há indícios de configuração de alguns alinhamentos Leste-Oeste por trás desse conflito. Se, por um lado, o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos vem manifestando sua preocupação com a crise, com os Estados Unidos iniciando exercícios militares na Guiana, como parte de parceria militar entre os dois países, por outro lado, o Presidente da Venezuela visita o Presidente da Rússia, gerando especulações e, ao mesmo tempo, preocupações.

    O Presidente da Guiana, Irfaan Ali, disse que vai acionar o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas. O líder da Guiana afirmou ainda que a Força de Defesa do país está em alerta máximo.

    A Corte Internacional de Justiça já havia decidido, no início do mês, que a Venezuela deveria se abster de tomar qualquer tipo de ação que pudesse alterar a situação em Essequibo.

    Ainda nesta semana, na quinta-feira, está prevista uma reunião entre os Presidentes da Venezuela e da Guiana, em São Vicente e Granadinas, a convite do Primeiro-Ministro do país caribenho, como tentativa de mediação do conflito, para a qual o Presidente Lula decidiu enviar o assessor especial da Presidência, Celso Amorim. E eu, Srs. Senadores, defendo a presença do Presidente Lula nesse encontro, mediando e encontrando uma solução diplomática.

    Estamos na expectativa de que essa reunião seja bem-sucedida e resulte em um acordo viável para a pacificação da região. Faço um apelo, mais uma vez, ao Presidente Lula para que sejamos protagonistas e nos empenhemos em encontrar, com dedicação e competência, uma solução pacífica para essa crise em nossas fronteiras.

    O mundo, senhoras e senhores, tem os olhos voltados para a fronteira entre a Guiana e a Venezuela, e o Brasil é o único país que tem potencial de liderar um processo de negociação que leve a uma resolução pacífica do conflito. Portanto, Sr. Presidente, eu acredito que esse é o papel do Brasil nesse conflito, um conflito de consequências já anunciadas.

    O Brasil tem toda a responsabilidade, pela sua tradição, pela tradição da sua diplomacia, pela importância geopolítica e geoestratégica que o Brasil representa no concerto das nações da América Latina, Presidente. Portanto, nós entendemos que é necessário que os Senadores e as Senadoras que se preocupam, que prestam atenção no que os seus colegas falam e manifestam aqui deste Plenário... É uma questão extremamente grave.

    Nós sabemos, na verdade, do potencial, do poder econômico também da Venezuela; sabemos da fragilidade, em termos de Forças Armadas, da Guiana; mas, no fundo, no fundo o que nós queremos, Presidente, é que o Brasil, através do seu Presidente da República, através da sua diplomacia, através dos mecanismos diplomáticos e da força que tem na Organização das Nações Unidas, na Organização dos Estados Americanos, possa se postar como um mediador, para que esse conflito anunciado possa se transformar em um acordo que venha, na verdade, pacificar a relação entre os dois países – Guiana e Venezuela – e, obviamente, evitar um conflito anunciado.

    Era esse o pronunciamento, Sr. Presidente, e espero que seja divulgado em todos os veículos de comunicação desta Casa, porque nós conhecemos o problema. Eu vivo o problema. Eu durmo e vivo este problema 24 horas por dia, com esses dois países, que têm 2 mil quilômetros de fronteira com o meu país. Eu convivo com o Presidente da Venezuela, Maduro, em reuniões que já tivemos lá no Palácio de Miraflores; convivo com o Presidente Irfaan em reuniões que já tivemos lá no Palácio do Governo, em Georgetown, menos de dois meses atrás. E nós sabemos que essa é uma questão sensível, a que o Brasil, mediando, poderá realmente trazer uma solução – definitiva talvez não, porque existem as decisões da Corte de Haia, mas uma decisão que possa evitar um conflito, para manter a paz na América do Sul que nós tanto queremos e que vivemos nos dias de hoje.

    Portanto, esse era o meu pronunciamento, Sr. Presidente. E gostaria que o Senado da República se posicionasse também, para que fosse uma forma de, diretamente, auxiliar o Governo Federal a tomar essas iniciativas, que já estão sendo tomadas, mas que podemos fortalecer, sim, com a presença de uma decisão do Presidente desta Casa e, obviamente, do conjunto dos Srs. Senadores.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/2023 - Página 47