Pronunciamento de Aécio Neves em 05/10/2023
Discurso durante a 21ª Sessão Solene, no Congresso Nacional
Sessão Solene destinada a comemorar os 35 anos da Constituição Federal de 1988.
- Autor
- Aécio Neves (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MG)
- Nome completo: Aécio Neves da Cunha
- Casa
- Congresso Nacional
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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Homenagem:
- Sessão Solene destinada a comemorar os 35 anos da Constituição Federal de 1988.
- Publicação
- Publicação no DCN de 06/10/2023 - Página 19
- Assunto
- Honorífico > Homenagem
- Indexação
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- SESSÃO SOLENE, COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
O SR. AÉCIO NEVES (Bloco/PSDB - MG. Para discursar. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, senhoras e senhores membros da Mesa Diretora destes trabalhos, Sras. e Srs. Parlamentares Constituintes e demais convidados desta sessão histórica, caro Presidente, permita-me lembrar muito rapidamente um ex-Governador do nosso Estado, as Minas Gerais, que teve por muito tempo também uma cadeira aqui no plenário desta Casa, o Francelino Pereira, que costumava dizer que, quando a autoridade maior, no caso, ele, o Governador, estava presente, todos os demais oradores estavam dispensados de ler a nominata.
Então, peço licença a V.Exa., Sr. Presidente, para na sua pessoa cumprimentar os demais membros da Mesa Diretora destes trabalhos e passar a fazer aqui uma reflexão extremamente pessoal de alguém que viveu — e viveu intensamente — como um jovem, um dos mais jovens Parlamentares que aqui chegava, o mais sublime momento do Congresso Nacional. Nós certamente assistimos a uma inédita reconciliação da sociedade brasileira com os seus representantes.
Eu começo fazendo também um registro histórico de que a ideia inicial do Presidente Tancredo Neves, que havia sido eleito, com um discurso nesta mesma tribuna que eu ocupo hoje no colégio eleitoral, era de que a Assembleia Nacional Constituinte se iniciaria com uma espinha dorsal, com um pré-projeto que seria a base das discussões que aqui se dariam.
Depois, com o falecimento do Presidente Tancredo, o Presidente Sarney — e aqui é importante que se faça um justo registro, muitas vezes omitido, da importância do Presidente Sarney, que foi, na verdade, quem convocou a Assembleia Nacional Constituinte para que os trabalhos se dessem daquela forma, daquela maneira — optou por iniciar do zero.
Isso, se trouxe alguns desencontros, o acirramento dos ânimos em alguns debates, e vão se lembrar disso os Senadores Renan Calheiros e Paulo Paim, que aqui estavam, possibilitou que esta a Casa, Senador Rodrigo Pacheco, fosse literalmente ocupada fisicamente, pelos mais diversos movimentos da sociedade brasileira, de direita, de esquerda, movimentos ambientais, movimentos sociais, o agronegócio, enfim, todos tinham espaço para debater os mais variados temas e faziam isso com certa harmonia. Essas galerias, hoje ocupadas por jovens estudantes, eram permanentemente lotados por setores da sociedade brasileira que queriam influenciar de forma definitiva na construção dos nossos destinos.
Certamente, longe disto, não fizemos uma Constituição perfeita. Ao contrário, ela trouxe desencontros, ela é por demais detalhista, mas foi ela que nos permitiu superar, nos anos recentes, momentos graves para a democracia brasileira, com o impeachment de dois Presidentes da República, com os inomináveis atos do dia 8 de janeiro, sem que as nossas instituições de qualquer forma fossem abaladas.
Foi essa Constituição, foram esses debates que permitiram que nós passássemos a ter uma jornada de trabalho de 8 horas diárias e 44 horas semanais, o 13º salário, o direito ao aviso prévio, a licença-maternidade de 120 dias, a licença-paternidade, o direito de greve. O cidadão que entrou no mercado de trabalho após a promulgação da Constituição, colega Valmir, talvez achasse que esses direitos já estavam incorporados na sua vida sem que houvesse qualquer esforço para isso, mas eles só ocorreram porque os debates nesta Casa vieram de forma extremamente calorosa, franca e ampla.
Portanto, Sr. Presidente, todos nós, que de alguma forma tivemos o privilégio de testemunhar aqueles momentos, sentimos um certo orgulho, uma certa ponta de satisfação ao ver que aquela Constituição, tão combatida e tão atacada nos seus primórdios, é hoje quase uma unanimidade nacional.
Certamente, os avanços na área da saúde, que é pela primeira vez considerada um direito social, um direito do cidadão brasileiro, ou os avanços na educação que estabeleceram os limites de participação de cada ente federado na construção de uma educação de melhor qualidade no Brasil, tudo isso contribui para que nós hoje estejamos, de forma geral, através dos mais variados espectros ideológicos da vida brasileira, celebrando a nossa Constituição.
Mas não foi sempre assim. Eu me permito, com enorme franqueza, Sr. Presidente, em respeito à história, fazer aqui alguns registros. A vida dá a nós homens públicos oportunidades extraordinárias, muitas vezes até a de escrever um novo destino ou um futuro para a nossa sociedade, como aconteceu na Assembleia Constituinte, mas ela não dá a nenhum de nós, nem àqueles que se acham circunstancialmente e excessivamente poderosos, o poder de reescrever a história. Não. A história está lá com os seus fatos, a história está lá com os seus registros para nos ensinar a não cometer os erros do passado novamente.
Caro Senador Renan, triste é o povo ou a sociedade que não conhece a sua história, porque terá muito maiores dificuldades, Deputado Marcel, de construir o seu futuro.
E faço aqui um registro histórico, uma lembrança que me parece oportuna, porque eu estava sentado nessas cadeiras, eu via quão frágil era a Constituição nos seus primórdios, nos seus primeiros meses, nos seus primeiros anos. O combate a ela era muito grande. Nenhum dos setores aos quais eu me referi, senhoras e senhores, jovens que nos acompanham, estava plenamente satisfeito com o desfecho da nossa Carta Magna, o que era positivo. Não poderíamos ter uma Constituição que atendesse a determinado segmento totalmente em detrimento de outro. Ela era, na verdade, a busca da síntese, do equilíbrio entre as várias proposições. Mas, desde o seu início, demonstrava de forma clara que tinha uma prioridade, que era os avanços sociais. Inclusive, o Capítulo dos Direitos Sociais, diferentemente de todas as Constituições anteriores, passa a ser o segundo dessa Constituição, atrás apenas dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, como uma sinalização à sociedade brasileira de que aquela era a nossa prioridade absoluta.
Mas infelizmente, Sr. Presidente, no momento mais difícil de afirmação daquela Constituição que os analistas não sabiam se duraria 6 meses, se duraria 1 ano ou 10 anos, ela caminha hoje para ser a mais longeva de todas as Constituições da nossa era republicana, já que a primeira delas, a Constituição da República de 1889, completou 43 anos, não muito distante dos 35 anos que comemoramos hoje.
E lembro de algo aqui — peço licença a todos para fazer este registro como uma reflexão histórica: no dia 22 de setembro de 1988, reunimo-nos neste plenário — ele estava lotado. Estavam aqui todos os Srs. Constituintes e as galerias repletas — para encaminharmos a votação do texto final da nossa Carta Magna. Todos compreendiam as suas limitações, os equívocos que poderiam constar do texto, mas todos sabiam também da relevância e da importância de aprovarmos a nossa Constituição.
Houve uma voz dissonante, Sr. Presidente — e deixo aqui o registo histórico, principalmente para as novas gerações. Um importante Líder partidário subiu nesta tribuna que ocupo hoje e disse: "Ainda não foi desta vez que a classe de trabalhadora pôde ter uma Constituição efetivamente voltada para os seus interesses. Ainda não foi dessa vez que a sociedade brasileira, a maioria dos marginalizados vai ter uma Constituição em seus benefícios". E, dessa forma, encaminhou o voto "não" e levou o seu partido a ser o único a votar contra a Constituição que hoje todos homenageiam. Essas palavras foram do, então, Líder do PT nesta Casa, Luiz Inácio Lula da Silva, hoje Presidente da República.
Reconhecer os erros e equívocos do passado é o caminho mais sensato, é o caminho mais curto para não voltarmos a cometê-los no futuro.
E faço aqui este registro, porque, naquele momento, o PT incorreu novamente em um erro que havia cometido há 3 anos, quando o Presidente Tancredo Neves — repito —, nesta tribuna, anunciou ao Brasil: "Esta será a última vez que o colégio eleitoral se reunirá". Falava de forma premonitória, porque já faz quase 40 anos em que as eleições diretas prevalecem no País. Pedia o apoio e a compreensão de todos os atores políticos aliados ou não. E, naquele momento, infelizmente — e essa mágoa ele levou pelo restante da sua vida —, o Partido dos Trabalhadores não só não votou pela conclusão do processo de redemocratização, como expulsou os Parlamentares que ousaram votar a favor de Tancredo, cuja eleição garantiu a convocação da Assembleia Nacional Constituinte.
Deixo aqui, Sr. Presidente, este registro. Todos nós erramos. A Constituição certamente tem muitos erros. É natural que, em qualquer obra humana, os erros estejam presentes. Mas quem sabe, nesta oportunidade de tantas homenagens à Constituição e à própria Assembleia Nacional Constituinte, não tenha chegado o momento, mesmo que tardiamente, de o Presidente da República, Líder até então do seu partido nesta Casa — hoje ele está convalescente de uma recente cirurgia e desejamos-lhe pronta e plena recuperação —, dirigir-se à sociedade brasileira e ao País e pedir desculpas pelo equívoco que seu partido cometeu. Quem sabe?! Deixo aqui uma sugestão neste momento emblemático em que o Congresso Nacional se reúne para saudar a nossa Carta Magna. Se houvesse vencido essa posição, nós não teríamos esta Carta Magna que garante a democracia no Brasil e que todos nós respeitamos e hoje aplaudimos.
Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)