Pronunciamento de Flávio Dino em 07/02/2024
Discurso durante a 2ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Defesa das prerrogativas constitucionais do STF e apelo para que haja ponderação nos debates legislativos sobre eventuais alterações no atual modelo da Suprema Corte brasileira.
- Autor
- Flávio Dino (PSB - Partido Socialista Brasileiro/MA)
- Nome completo: Flávio Dino de Castro e Costa
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
Atuação do Judiciário,
Poder Judiciário:
- Defesa das prerrogativas constitucionais do STF e apelo para que haja ponderação nos debates legislativos sobre eventuais alterações no atual modelo da Suprema Corte brasileira.
- Aparteantes
- Esperidião Amin, Plínio Valério, Randolfe Rodrigues.
- Publicação
- Publicação no DSF de 08/02/2024 - Página 16
- Assuntos
- Outros > Atuação do Estado > Atuação do Judiciário
- Organização do Estado > Poder Judiciário
- Indexação
-
- AGRADECIMENTO, WALDEZ GOES, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA INTEGRAÇÃO E DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL, LIBERAÇÃO, RECURSOS PUBLICOS, RECONSTRUÇÃO, CASA PROPRIA, MUNICIPIO, BURITICUPU (MA), CONSEQUENCIA, EROSÃO, CHUVA.
- DEFESA, PRERROGATIVA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), TEMPO DE SERVIÇO, MANDATO, MINISTRO, COMPATIBILIDADE, DEMOCRACIA, CONTROLE, CONSTITUCIONALIDADE, LEIS, MANUTENÇÃO, INDEPENDENCIA, PODERES CONSTITUCIONAIS.
O SR. FLÁVIO DINO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - MA. Para discursar.) – Sr. Presidente, minha saudação a V. Exa., aos nobres pares, a todos aqueles que nos acompanham, e é claro, ao nosso ilustre visitante.
Começo falando de um tema ameno, já que eu falarei de um tema difícil, complexo que interessa a toda bancada maranhense no Senado, na Câmara e, especialmente, àqueles que se vinculam à cidade de Buriticupu. O Ministro Waldez Góes muito gentilmente me informou que amanhã está liberando o recurso para a recomposição de moradias atingidas por aquele triste fenômeno da erosão das voçorocas, e isso vai permitir que haja uma ação emergencial ali naquela cidade. Sabemos que a ação estrutural é necessária, mas, sem dúvida, essa é uma grande conquista que compartilho com os cidadãos e as cidadãs da cidade de Buriticupu e da região. E publicamente agradeço, tenho certeza de que em nome de toda a bancada, ao Ministro Waldez Góes pela gentileza e pela presteza no atendimento a este pleito.
Sr. Presidente, tal como descrevi ontem, vou falar hoje sobre o Supremo Tribunal Federal. Começo com um convite: imaginemos um país em que juízes do Tribunal Supremo permanecem no exercício dos seus cargos por mais de 30 anos; imaginemos um país em que os juízes da Suprema Corte possam declarar amplamente a inconstitucionalidade de leis, as interpretem e, às vezes, por décadas, até modifiquem tais interpretações; imaginem um país em que o Poder Legislativo seja invadido e o Judiciário tenha até aqui, em face disso, proferido 750 sentenças com 450 penas de prisão, com 350 réus por agressão e resistência à prisão, com 11 réus que agrediram jornalistas, com 935 réus acusados de entrarem ou permanecerem ilegalmente em prédios públicos, com 61 réus acusados de destruição de propriedade do Governo Federal, com 49 réus acusados de se apropriarem de propriedade do Governo, com 310 réus acusados de obstruírem o trabalho dos policiais, com 55 réus acusados de conspiração. Esse país existe; esse país se chama Estados Unidos da América.
Nos Estados Unidos tudo isso ocorre; não, no século pretérito; não, há décadas; acontece hoje, acontece ontem. E a pergunta que faço: esse Tribunal Supremo nos Estados Unidos é ditatorial? O fato de haver justices da Suprema Corte que ficam 30 anos no tribunal configura uma ditadura? O fato de haver controle de constitucionalidade das leis é uma anomalia? Se algum dos ilustres integrantes deste Parlamento e da sociedade assim pensarem, claro que é legítimo, mas será algo, sem dúvida, inédito: alguém dizer que esse modelo de estruturação do Poder Judiciário é um modelo em si mesmo antidemocrático.
A conclusão que extraio, Sr. Presidente, é que não é a mera existência de mandato, num tribunal supremo, que define se ele é compatível ou não com a democracia, porque se houvesse esse automatismo, esse absolutismo no diagnóstico, significaria, por dedução lógica, dizer que o Tribunal Supremo dos Estados Unidos é um tribunal antidemocrático.
Respeito quem eventualmente assim pense, mas não me parece ser propriamente a melhor conclusão consentânea com o estudo do direito constitucional no mundo, tampouco é deplorável que haja uma corte suprema que julgue atos antidemocráticos que eventualmente tenham sido perpetrados.
Não é também incompatível com a democracia que exista o controle de constitucionalidade das leis e, portanto, um controle jurisdicional sobre o conteúdo de atos praticados pelo Poder Legislativo e pelo Poder Executivo.
De outro lado, imaginemos um país em que um Congresso Nacional, um Parlamento, aprovou uma Constituição analítica, expansiva, ampla, vasta, ampliando, por conseguinte, o rol das controvérsias constitucionais. Imaginemos um país em que o Congresso Nacional aprovou um sofisticado controle de constitucionalidade, com várias ações constitucionais, aprovou inclusive a possibilidade da concomitância do controle concentrado e difuso. Imaginemos um país em que o Congresso Nacional aumentou em cinco anos o tempo máximo de permanência dos Ministros da Suprema Corte. Esse país também existe e se chama Brasil.
A conclusão, senhoras e senhores, é que é falsa a perspectiva de querer imputar vícios e defeitos ao Supremo Tribunal Federal brasileiro, que está conformado e em funcionamento, de acordo com as normas votadas pelos Deputados e pelos Senadores.
Vejo, às vezes, estranhamento com o fato de o Supremo Tribunal Federal julgar Parlamentares. O Senador Esperidião Amin, que é o mais antigo, junto com o Paim, dos que aqui estão, lembrará que, na Constituinte de 1987/1988, houve a aprovação de uma imunidade quase que absoluta para os Parlamentares, de modo que só era possível a existência de processos criminais se a Casa Parlamentar aprovasse.
Quem pôs fim a isso, a meu ver corretamente? Foi o Supremo? Não, foi o Congresso Nacional. O Congresso Nacional que permitiu que o Supremo processasse e julgasse Parlamentares sem a necessidade de autorização da Casa respectiva.
Então como, a estas alturas da vida, nós, diante dessas situações, queiramos responsabilizar o Supremo por decisões políticas adotadas por décadas pelo Senado e pela Câmara.
O que fazer? É claro que nós temos um cenário difícil, que não é inédito. Quem conhece a história da Suprema Corte dos Estados Unidos vai lembrar que entre a Independência, em 1776, ou a Convenção da Filadélfia, em 1787, até a primeira decisão, da lavra de John Marshall, afirmando o controle de constitucionalidade, em 1803, houve décadas. E depois outras tantas decisões, respondendo a questões como se o Governo Federal poderia ou não criar um banco central, que Alexander Hamilton então defendia; ou se a Suprema Corte poderia julgar a constitucionalidade de leis estaduais; ou seja, décadas de controvérsias entre a Suprema Corte e os poderes políticos.
No pós-guerra, quando o modelo de tribunal constitucional se afirma nos países da Europa Ocidental, na França, na Itália, houve, do final dos anos 40, anos 50, até quase o limiar da década de 70, uma série de impasses entre esses tribunais constitucionais e o Parlamento; entre os poderes políticos.
Portanto, não é de se estranhar, não é de se rejeitar o fato de que a tripartição funcional do Estado abrange, sim, momentos de atritos. A questão, portanto, a questão que se segue é como lidar com as inevitáveis lides derivadas desse modelo de repartição funcional do Estado.
Eu creio que debater é necessário. Na democracia e na vida, há poucos dogmas. Dogmas que estão mais no terreno da fé religiosa, como a que eu professo; dogmas que estão na metafísica. Mas claro que no mundo da cultura, no mundo sensível, Líder Randolfe, no mundo da história, o Congresso Nacional pode, sim, debater o que quiser. Óbvio que sim. E não pode haver fechamento de canais e de diálogo em face disso.
Eu caminho para o final, Presidente Weverton, dizendo que se é legítimo o debate, por outro lado, nós temos que compreender zonas de ilegitimidade, zonas que não contribuem para o principal, que é servir bem à nossa pátria. Por exemplo, a busca de estigmatizações pessoais; as fulanizações do debate; agressões que desbordam do razoável.
Nós temos um imperativo constitucional relativo à independência e à harmonia. E a questão é como se densifica, como se concretiza o sentido de harmonia. Digo aos meus colegas que aqui estão, ao mundo da política e também, claro, ao mundo ao qual em breve me integrarei que é ínsito ao conceito de harmonia ponderação. Só é possível haver harmonia com ponderação entre os Poderes. E isso não é uma exigência apenas ética, não é uma exigência apenas de boa educação; é uma exigência de direito positivo, é uma exigência normativa. E eu, particularmente, procuro me manter fiel a esse preceito.
Nós precisamos compreender que cada Poder tem suas funções típicas, entre as quais está a de controlar os outros Poderes, desde Aristóteles, é milenar. Só é possível exercer essa forma, que não é única no mundo. Há países, como a China, que adotam um mandato no Tribunal Supremo, mandato para o Presidente. Na China, quem escolhe o Presidente do Tribunal Supremo é o Congresso, com mandato de cinco anos. É uma forma. Há alguém que não gosta do modelo dos Estados Unidos e gosta do modelo chinês. Muito que bem! Há vários modelos possíveis, mas nós precisamos entender que não pode haver afastamento do conceito de controles recíprocos entre os Poderes.
Vejo com muita preocupação falsas soluções: a ideia, por exemplo, de que o Senado é quase que obrigado moralmente a votar o impeachment de um Ministro do Supremo. Impeachment por quê? Impeachment porque não gostou da decisão? Isso não é impeachment; impeachment é uma sanção por crime de responsabilidade tipificado em lei: Lei 1.079, de 1950. Não existe impeachment por gosto, não existe impeachment pelo conteúdo da decisão judicial. E como que isto é perigoso! É perigoso porque leva o debate para o território do extremismo e do impasse.
Imaginemos que, em algum momento, prezados Senadores e Senadoras, houvesse a instauração de um processo de impeachment contra Ministro do Supremo. Quem sentará naquela cadeira para presidi-lo? Art. 52, parágrafo único, da Constituição, votado por este Congresso, não pelo Supremo: quem senta para presidir o processo de impeachment é o Presidente do Supremo. E quem conhece a história dos dois impeachments que houve no Brasil lembra que o controle acerca do procedimento é feito por quem? Pelo próprio Supremo. Então, vejam que essa ideia a nada conduz, a não ser a um novo impasse, se ela não for lastreada em legitimidade.
Nós precisamos afastar certos termos do debate. Eu ouvi, muitas vezes aqui, na minha sabatina do dia 13 de dezembro, a expressão "ditadura judicial". Onde está essa ditadura judicial que ninguém vê? É porque decisões tais ou quais são proferidas, todas recorríveis? O Congresso está funcionando plenamente, com todas as suas prerrogativas constantes da Constituição, assim como o Executivo governa, assim como os Governadores e os Prefeitos. Não há ditadura judicial no Brasil. Essa é uma expressão não só equivocada, não só destituída de ponderação; ela é uma expressão que atrapalha o bom debate acerca desse inevitável acerto ou dessa inevitável concertação entre os Poderes do Estado.
Do mesmo modo, é injusto e perigoso ataques de natureza pessoal, e isso está se vulgarizando no Brasil.
Eu vejo, por exemplo, ataques pessoais a vários ministros, mas, com mais frequência, ultimamente, ao Ministro Alexandre de Moraes. E pergunto: as decisões do Ministro Alexandre são irrecorríveis? Não. Qual a decisão do Ministro Alexandre de Moraes que foi revista pelo Plenário do Supremo? Nenhuma.
Então, por que fazer ataque pessoal a um ministro, se as decisões estão respaldadas pelo colegiado? Aonde isso conduz? Conduz a bons termos o debate? E refiro-me a ele, mas poderia me referir a outros ministros.
Ouvi aqui desta tribuna a ideia de que os inquéritos não acabam. Senhoras, senhores, os inquéritos e os processos relativos à invasão do Capitólio, nos Estados Unidos, tampouco acabaram. E será que os Estados Unidos se converteram agora, aos olhos de alguns, em modelo de ditadura?
E pergunto mais: qual o juiz que arquiva inquérito de ofício? É possível a um juiz, a um relator, pôr fim a um inquérito porque quer, porque acha que está demorando? Não, é impossível. Enquanto há fatos, indícios e provas a serem produzidas, o inquérito evolui. E quem pode pedir o arquivamento do inquérito? Apenas e exclusivamente o Ministério Público, princípio acusatório.
Então, se alguém acha que o inquérito está demorando muito e deveria ser mais rápido, como se isso fosse uma nota inédita no direito brasileiro, por que imaginar que o relator vai – ou os relatores, sejam eles quem forem – ter poderes que, aí, sim, seriam ditatoriais, para pôr fim a inquérito? Isso não existe.
Claro que os inquéritos têm que terminar. Acesso à Justiça é entrar e sair do Poder Judiciário. Óbvio que ninguém deseja a eternização de investigações, mas isso não é imputável à autoridade judicial. Esse é o ponto. É preciso, portanto, olhar o sistema e, eventualmente, votar leis, votar emendas constitucionais que corrijam certos aspectos institucionais, mas sem desbordar o debate para maus caminhos, caminhos que não são construtivos.
E eu vim aqui, respeitosamente, a esta tribuna para dividir esses sentimentos e, ao mesmo tempo, Presidente Weverton, colocar-me à disposição, hoje como integrante deste colegiado, outrora integrante da Câmara e, futuramente, em breve, a partir do dia 22, integrante de outro Poder, para auxiliar, no que eu puder, como integrante de tantos, tanto daqui como de lá, para que nós tenhamos luz neste debate. Luz que não se dá no extremismo, porque o extremismo é o território da escuridão. É como se fosse uma sala cuja lâmpada está ao centro. A luminosidade está no meio termo, filosofia grega. E o que é que nós temos nas pontas? Escuridão, trevas, impasses. E esses impasses servem a quem? Aos democratas? Esses impasses servem aos mais pobres do nosso país, que precisam de políticas públicas? Esses impasses servem aos jurisdicionados? Não.
Por isso, creio que todo debate é bem-vindo, desde que haja trilhos – que não são definidos ao alvedrio ou à discrição de A ou B –, trilhos definidos pela Constituição. E esse é o imperativo, como disse, do princípio da harmonia entre os Poderes.
Finalizo com uma lembrança: a independência do Judiciário é um valor que interessa a todos. Só há Judiciário independente. Se o Judiciário tiver medo de decidir, ele não serve como Poder. E a independência serve à oposição de hoje, que será o governo de amanhã, e assim reciprocamente. A independência serve ao empresário ou contribuinte em geral que esteja sendo vítima de uma imposição tributária injusta; a independência serve ao estado que queira litigar contra a União; a independência serve ao cidadão, à cidadã que busca um direito previdenciário.
Então o Judiciário claro que erra, mas não erra querendo errar, de um modo geral. O Judiciário deve ser corrigido, como qualquer Poder, como qualquer ser humano; mas não pode ter esse atributo fundamental eliminado, porque os habeas corpus vão continuar, interpostos por Parlamentares, inclusive! E um Parlamentar, quando ingressa com habeas corpus, o que é que ele deseja? Que ele seja julgado de modo justo. E só é possível haver julgamento justo se houver independência do Poder Judiciário! Não existe judicialidade sem independência dos magistrados.
Por isso, lembrando que há alternância nos poderes políticos, nós não devemos nos deixar levar pelas paixões momentâneas.
Eu tomarei posse no dia 22. Se vigorassem as regras da Constituição de 88, eu ficaria no Supremo por 14 anos – alinhado com as melhores práticas internacionais. Quem me deu mais cinco? O Supremo? Eu? Não, o Congresso! Numa conjuntura política, numa situação política, datada, determinada, para impedir uma Presidente da República de fazer nomeações, o Congresso resolveu ampliar de 70 para 75 anos. Então as conjunturas mudam. Eu fui contra, naquele momento; dei entrevistas. Vejam os paradoxos da vida: essa emenda constitucional – não sabia eu – me daria, em vez de 14, 19 anos no Supremo. Esse é o perigo de decisões contingenciais, de decisões datadas, de decisões que são levadas pelo calor do momento.
Este Senado tem esse formato exatamente porque é uma Casa da ponderação, é uma Casa que reflete. E hoje, respeitosamente, como integrante deste Colegiado, é o único apelo que faço: não interessa o conteúdo do debate, não interessa o conteúdo da decisão; qualquer que seja o conteúdo: é claro que é legítimo, mas interessa o procedimento, interessam os termos do debate e interessa a visão de harmonia, para que com isso nós possamos, com ponderação, como a arquitetura de Niemeyer sugere, encontrar pontos de equilíbrio adequados, que sirvam ao povo brasileiro.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – Concedo a palavra ao Senador Randolfe.
O Sr. Randolfe Rodrigues (S/Partido - AP. Para apartear.) – Senador Flávio Dino, se V. Exa., Sr. Presidente, permitir, só um rápido aparte, se assim me permite, e ao caríssimo orador da tribuna, se assim me permite, um aparte, primeiro, para saudar. A gente tem que se acostumar, neste rápido interregno de Senador Flávio Dino, porque teve a primeira parte de Ministro Flávio Dino; e, daqui a pouco, Senador Renan, novamente Ministro, agora da Suprema Corte, Flávio Dino. Temos que nos acostumar a chamar V. Exa. de Senador, e aproveitar, no melhor sentido da expressão, esses dias que V. Exa., designado pelo generoso povo do Maranhão, partilha de sua convivência no Senado aqui conosco. Até estava buscando o calendário, sua posse é no dia 22, então o senhor tem ainda, dia útil, uma quarta-feira para usar a tribuna, e eu rogo ao senhor que o faça. Aos pronunciamentos ontem não tive a oportunidade de assistir, porque, junto com o Senador Renan, estávamos em reunião com o Ministro Haddad, mas tive conhecimento deles e vi depois o seu pronunciamento no dia de ontem e no dia de hoje.
Os seus pronunciamentos trazem luz a um debate que é necessário ser travado no ambiente da Casa da Federação e com o papel histórico que a Casa da Federação, que neste ano completa 200 anos, tem a cumprir. É importante... Por esta Casa aqui, pelo Senado, Ministro Flávio Dino, Senador Flávio Dino, por esta Casa passaram os momentos mais destacados da história de nosso País. Esta Casa foi vanguarda no papel da mulher na política, mesmo antes de ter sido consagrado o direito das mulheres ao voto. A primeira Senadora do Brasil foi a Princesa Isabel e cumpriu ela, no exercício ainda da Regência, um dos papeis mais importantes da história nacional, quando assinou a Lei Áurea, em 13 de abril de 1888.
Esta Casa, no seu período republicano, deixou de funcionar, quando a democracia foi usurpada. Esta casa deixou de existir durante uma ditadura, a do Estado Novo...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O Sr. Randolfe Rodrigues (S/Partido - AP) – Esta Casa teve suas atribuições...
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – Não, estou aproveitando aqui... Desculpa, Senador Randolfe, é porque eu já havia pedido, e peço aqui a licença dos colegas Senadores, mas esta Presidência, em homenagem ao momento, todos aqui têm oito anos para falar à vontade, e o Senador Flávio Dino vai ter praticamente só mais duas semanas...
O Sr. Randolfe Rodrigues (S/Partido - AP) – Duas semanas...
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – Os dias 20 e 21.
O Sr. Randolfe Rodrigues (S/Partido - AP) – A partir de agora, só mais uma semana.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – Então, estou dando o tempo que ele achar necessário para ele poder fazer sua fala...
O Sr. Randolfe Rodrigues (S/Partido - AP) – Mais uma semana, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – Que eu tenho certeza que é de interesse não só do Senado, mas também de todo o país. Então...
O Sr. Randolfe Rodrigues (S/Partido - AP) – Agradeço a chancela de V. Exa., Presidente, porque eu acredito que o pronunciamento de hoje se insere para a reflexão do Plenário desta Casa sobre o papel que ela tem que cumprir. Eu estava dizendo que esta Casa é sinônimo de existência – não é sinônimo do período de democracia –, é sinônimo de existência nos períodos democráticos. Durante duas ditaduras, numa, a Casa deixou de existir, durante a ditadura do Estado Novo; em uma outra, as suas atribuições foram limitadas. Desta Casa, desta tribuna, levantaram-se as vozes mais ativas para a redemocratização em 1985. Cito dois deles: Teotônio Vilela, autor da Lei da Anistia, e Marcos Freire, só para citar dois de tantos e tantos outros daquele triste período de nossa história. E, nesta Casa, coube a nós, neste momento, ouvir a sua ponderada voz sobre as reflexões que temos que fazer num momento em que a democracia não está de salvo-conduto.
Lembremos que faz um ano que este Plenário... O Plenário que foi invadido no 8 de janeiro não foi o Plenário vizinho, foi este Plenário. O Plenário que foi violentado, que foi vilipendiado e que foi utilizado como símbolo dos atos terroristas – atos terroristas, sim, porque não tem outro nome para o que aconteceu naquele 8 de janeiro – foi este Plenário.
Por falar no 8 de janeiro, eu faço questão – já falei isso várias vezes – de destacar em relação a V. Exa.: a democracia brasileira tem um pleito de reconhecimento e de gratidão a V. Exa. Deus me possibilitou ser testemunha dos fatos e do ocorrido naquela data da infâmia, naquele 8 de janeiro. Eu tive a oportunidade de ver a indignação de V. Exa., naquele dia, com o que estava acontecendo. Tive a oportunidade de acompanhar o papel que V. Exa. cumpriu nos momentos seguintes para impedir que a democracia brasileira tivesse uma debacle, sobretudo naquela madrugada de 8 a 9 de janeiro. Nos escritos da história haverá de ser registrado o papel que V. Exa. cumpriu naquele dia 8, indispensável, fundamental, para que continuássemos vivendo sob a égide do Estado democrático de direito.
Por fim, V. Exa. se insere em uma condição que somente um outro brasileiro cumpriu: Epitácio Pessoa. Epitácio Pessoa foi o único brasileiro – agora V. Exa. também o fará – a passar pelos três Poderes da República. Epitácio Pessoa foi Ministro de Estado de Obras Públicas, Ministro de Estado da Justiça e Negócios Interiores e Presidente da República, a partir de 1920. Antes disso, de 1902 a 1912, foi Ministro do Supremo Tribunal Federal. Aliás, foi Presidente da República após ser Ministro do Supremo Tribunal Federal. Rogo à juventude de V. Exa. para que a coincidência também não fique somente apenas nesse aspecto.
O SR. FLÁVIO DINO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - MA) – Presidente Weverton, quero agradecer a deferência de V. Exa. e, claro, agradecer o aparte fraterno do Senador e Líder Randolfe, que traz fatos históricos de enorme importância acerca mesmo dessa conjuntura em que os Poderes precisam dialogar. V. Exa. aludiu a Marcos Freire, a Teotônio Vilela, duas figuras veneráveis da democracia brasileira, e eu acresço mais um, poder dever cívico, que é figura de Paulo Brossard, que foi Senador nesta tribuna em momento difícil e, posteriormente, Ministro do Supremo Tribunal Federal. Não sei se S. Exa. exerceu alguma função executiva. Lembro-me de Nelson Jobim, que exerceu funções nos três Poderes.
Mas, independentemente dessas conjunturas, acho que é fundamental nós todos estarmos imbuídos dessa ideia de que quando nós erigimos uma Constituição é para não usarmos a força. Quem tem o monopólio do uso da força, em certas conjunturas, são as instituições voltadas àqueles que descumprem a lei. Ora, fazer o debate político, democrático, não é descumprir a lei. Por isso, não é necessário que haja coerção entre os Poderes ou tentativa de emparedamento entre os Poderes.
Onde eu estiver, estarei professando esse sistema de crenças em torno da ideia de diálogo, de ponderação que V. Exa., Senador Randolfe, tão bem pontificou.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – Quero, Presidente, Senador Flávio Dino... Já ia chamá-lo de Presidente. Ministro, eu tenho a honra de ser o Relator, não sei se é honra porque é uma responsabilidade grande, mas foi incumbido a mim, pelo Presidente da CCJ, relatar a Lei nº 1.388 – ela é de 2023 –, que trata do crime de responsabilidade.
Essa lei foi estudada, coordenada pelo ex-Ministro Lewandowski, ainda então Ministro do Supremo Tribunal Federal, hoje Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública, cargo que V. Exa. até outro dia ocupava, e tivemos a oportunidade, na instrução desse projeto, que é de 1950, a lei do impeachment, tida como lei do impeachment, crime de responsabilidade...
É óbvio que, de lá para cá, muita coisa mudou, muitas coisas evoluíram, como, por exemplo, houve o advento da internet, da rede social e vários outros fatores. Naquela época não existia CNJ, não existia CNMP, várias autoridades não estavam no escopo em que nós estamos hoje vivendo, então, essa lei, obviamente, precisa ser aperfeiçoada, melhorada. Desse grupo de juristas, participaram técnicos aqui da Casa, vários outros juristas do Brasil, e ele foi presidido e coordenado pelo Ministro Lewandowski. Eu tive a oportunidade de realizar já na CCJ, no ano passado, três audiências públicas muito importantes, porque nos ajudaram a tirar várias dúvidas. Fiquei de apresentar o relatório logo no final do ano, mas justamente entendendo a seriedade com que tem que ser tratado o tema, porque não é um projeto da época do Governo do Lula, ou do Bolsonaro, ou de quem quer que seja. Tem que ser um projeto de Estado, até porque nós temos que prever a possibilidade de ter problemas no futuro, independentemente de qual seja a quadra, e você tem que ter, como foi colocado, trilhos justos, republicanos para que seja feito o bom debate.
Então, eu quero aproveitar, neste tema, e também comunicar que vou pedir à CCJ mais uma audiência pública para, dentro do que nós já estamos querendo apresentar, colocar para outros convidados que não participaram desse estudo junto com a Comissão de Juristas. O Ministro Lewandowski veio para a audiência, participou da primeira, colocou todo o espírito do que se estava imaginando.
Então, quem tiver interesse nesse debate basta acessar aqui os canais, os Anais da Casa, porque está tudo lá registrado, essas audiências, essas falas. E eu tenho certeza de que neste semestre, segundo as prioridades que o Presidente Rodrigo Pacheco já determinou, uma delas vai ser a apreciação desse importante aperfeiçoamento de que trata o projeto de crime de responsabilidade, a lei do crime de responsabilidade.
Então, isso, sem dúvida nenhuma, vai dar uma segurança para todos, não só para os Poderes, mas para a sociedade como um todo e lá na ponta, porque, lá na ponta, por exemplo, hoje, infelizmente, acontece muito o terceiro turno no tapetão. O que mais tem são casos de Câmaras de Vereadores em que, às vezes, chegam e caçam um Prefeito de uma hora para outra, sem regra nenhuma. Assim como foi trazido neste debate, como é que aqui no Senado, no Congresso, no Poder Executivo pode, no momento da instrução, no momento do processo de impeachment, ser o Presidente de um outro Poder quem o dirija. Lá no município, se está tendo esse processo, por que não seria o juiz da comarca ou alguma outra autoridade de um outro Poder que pudesse dar o mínimo de condição para se dizer que foi independente aquela instrução?
Enfim, nós iremos tratar esse assunto e eu não poderia deixar aqui de registrar isso, porque em breve V. Exa. vai estar lá no Supremo Tribunal Federal e o estaremos convidando para participar desse diálogo.
O SR. FLÁVIO DINO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - MA) – Desde logo, convite aceito, Presidente, porque, de fato, é uma necessidade, uma lei que foi feita sob a égide da Constituição de 1946. Nós estamos na Constituição de 1988 e, evidentemente, é preciso adequar, e é uma lei reclamada pelo art. 52, incisos I e II, da Constituição. O art.52, I e 52, II, ao tratar das competências do Senado, tratam exatamente do julgamento do crime de responsabilidade, e isso é necessário, esse é um preceito necessário que precisa, sem dúvida, dessa atualização e, desde logo, atenderei com muita alegria o convite para debater um projeto de imensa relevância, para que nós não continuemos, inclusive, com desatualizações a exemplo da inelegibilidade ou suspensão dos direitos políticos por cinco anos, quando a Constituição fala em oito anos.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – O Senador Esperidião Amin...
O Sr. Esperidião Amin (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Para apartear.) – Eu agradeço a oportunidade e serei muito conciso no aparte, até porque também estou inscrito, mas este eu faço questão de que seja um aparte cumprimento o Senador, futuro ministro do Supremo Tribunal Federal – já tive a oportunidade de saudá-lo nessa condição ontem –, mas eu não posso deixar que o seu pronunciamento de hoje se encerre sem que o senhor avalie este modesto aparte que vou oferecer.
O senhor foi muito eloquente ao dizer que só quem pode arquivar – e eu até retificaria –, quem é que pode pedir o arquivamento de um inquérito é o Ministério Público, e fê-lo bem. Mas eu quero lhe dizer que o inquérito do fim do mundo, e o senhor sabe disso, mas quero deixar aqui patenteado, esta excrescência que se chama 4.781 foi criada – e quero lembrar que o Senador Randolfe, na época, chamou isso de novo AI-5, de outro microfone, mas nesta Casa...
A Chefe do Ministério Público do Brasil requereu, em menos de um mês, o arquivamento. Ele foi instituído no dia 19 de março de 2019. No dia 16 de abril a Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge – e eu vou ler só um pequeno trecho – pediu o arquivamento imediato do inquérito. O Ministério Público, portanto, cumpriu com seu dever, e disse:
O sistema penal acusatório estabelece a intransponível separação de funções na persecução [penal, aliás,] criminal: um órgão acusa, outro defende e outro julga. Não admite que o órgão que julgue seja o mesmo que investigue e acuse.
E vai adiante:
E que, no Supremo Tribunal Federal [portanto, eu não estou fulanizando, eu estou circunstanciando; bata no pecado, não bata no pecador, é a nossa regra de Santo Agostinho], o ministro relator, aleatoriamente escolhido pelo sistema de distribuição regular, é o juiz natural [não o juiz escolhido pelo Presidente do Supremo. E agora vou fulanizar: na época, o Ministro de Dias Toffoli].
Portanto, a transgressão constitucional do chamado inquérito do fim do mundo foi apontada pelo Ministério Público. E o que aconteceu, Senador Plínio? Foi indeferido pelo ministro relator e subsiste, vai fazer cinco anos. E eu não tenho medo de repetir: é uma inquisição. O meu avô materno italiano virou anticristão por ter trabalhado na restauração de casas que serviram à inquisição. Ele era um artesão, um artista. Italiano não é pedreiro. E ficou... Isso me passa de vez em quando. Isso é uma inquisição que está aberta há cinco anos. Eu posso entrar, o senhor pode entrar, qualquer um pode entrar, desde que lá o Torquemada se lembre de você.
E agora, para terminar, quando nós fizemos, quando a CCAI, então ainda não presidida pelo Senador Renan Calheiros, que aqui está. Mas ele estava lá e votou conosco o pedido daquelas informações do dia 25 de outubro. A CGU dizer, por escrito na resposta, no dia 27 de novembro, que não pode dar a resposta ao Senado Federal porque aguarda uma manifestação do Supremo sobre a interferência daquele pedido de informação com o Inquérito 4.781... O 4.781 virou a inquisição para qualquer coisa que interesse. Isso é muito preocupante.
Então, não posso deixar de trazer a lume, primeiro, que o Ministério Público pediu. Foi indeferido. E segue a banda. E está seguindo. E como dizia Francisco Rezek – ontem eu o mencionei e hoje vou repetir: isso não vai dar certo.
Então me perdoe se eu me alonguei, mas eu não poderia deixar de permitir que V. Exa. dê a última palavra a respeito desse meu aparte. Agora, ele é consistente, porque fundamentado naquilo que o senhor falou – com que eu concordo – que quem pode pedir é o Ministério Público, e, num exotismo, na bizarrice do indeferimento diante do flagrante descumprimento da Constituição na sua criação.
Obrigado.
O SR. FLÁVIO DINO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - MA) – Senador Esperidião, eu agradeço muito o aparte de V. Exa., que permite a elucidação de alguns temas fundamentais e que são decisivos para a aquilatação da juridicidade desse inquérito.
A pergunta que não foi feita por V. Exa., mas que é necessária: o inquérito no Brasil tramita exclusivamente entre a autoridade policial e o Ministério Público? Não. E quem diz isso é o Supremo? Não, é o Código de Processo Penal, o vigente, de 1941, de qual o senhor pode propor a revisão. Mas neste Código de Processo Penal vigente há três personagens no inquérito: a autoridade policial, o Ministério Público e o juiz que faz o controle judicial e não é vinculado ao pedido de arquivamento. Quem diz isso? O código vigente. Então, se o senhor deseja o modelo em que o Ministério Público sozinho decida arquivar o inquérito, tem que mexer no Código de Processo Penal.
Sobre a questão da resposta dada pela CGU, eu não conheço a resposta. Não me cabe defender aqui qualquer ato de qualquer governo. Mas lembro ao senhor, disse isso ao senhor ontem: o art. 20 do Código de Processo Penal define que peças de um inquérito policial em curso só possam ser reveladas a critério da autoridade judicial para não frustrar a investigação. Quem diz isso? O art. 20 do Código de Processo Penal. O ilustre Senador pode concordar ou discordar, mas não pretender que o juiz descumpra a lei. O Senador Esperidião, homem público experiente – eu era criancinha e ele já era Governador, no longínquo ano de 1982 –, com certeza sabe que pode apresentar um projeto para rever e dizer que todos os inquéritos são públicos o tempo inteiro. Quem não vai gostar disso são os investigados. Mas, enfim, é uma decisão legislativa.
O que eu discordo, eminente Senador Romário – o senhor, que foi um dos maiores personagens do futebol mundial, especialista em jogar perto do gol –, é que você não entenda onde você está jogando. Você tem que entender. Se você é centroavante, você tem que fazer gol. Se você é zagueiro, se você for fazer gol, provavelmente será gol contra, ou seja, você tem que entender o território onde você está. Quero dizer, em suma, que se há fatos que não são desejáveis e usar... Eu não estou dizendo que o Poder Judiciário brasileiro é perfeito. Eu o conheço profundamente por dentro, porque fui magistrado 12 anos. Mas há coisas que são imputáveis ao Judiciário, ao juiz, que dependem de mudanças legislativas, ou seja, o pedaço do campo onde esse jogo se dá não é no Supremo, é aqui, para, por exemplo, atualizar o Código de Processo Penal, que é de 1941. É esse que está em vigor. Se resolver, no Brasil, aprovar o sistema acusatório puro – que não vige no Brasil hoje –, se quiserem o sistema acusatório puro, que o façam. Mas não é o Judiciário que pode fazer. Esse é ponto, Líder Renan, fulcral que trouxe aqui: o de que nós precisamos colocar o debate no lugar certo e nos termos possíveis de ponderação para que nós não olvidemos o princípio basilar da harmonia entre os Poderes, que é cláusula pétrea – art. 60, §4º, da Constituição. E aí eu acho que a gente caminha bem.
No Brasil, nós temos mandato no Supremo Tribunal Federal? Sim! Eu jamais defenderia o sistema dos Estados Unidos, em que vigora a cláusula do enquanto bem servir. Lá, Senador Chico, Senador Paim, um justice pode ser nomeado aos 50 anos e ficar até os 85 anos, por exemplo. Há casos. No Brasil, não. Há um limite temporal. As senhoras e os senhores sabem – alguns felizes, outros tristes – que eu só poderei ficar no Supremo até o momento em que Deus me chamar ou por 19 anos. Esse é o mandato, outrora 14.
Ontem o Senador Weverton me dizia... E eu caminho para finalizar mesmo, agradecendo muito a paciência de todos. O Senador Weverton me questionava sobre idade mínima. Eu fui juiz aos 25 anos. Aos 25 anos, me parecia acertado. Hoje, aos quase 56, Senador Plínio, isso me parece errado. Hoje eu tenho a visão, porque tenho um filho de 29, que vai fazer 30... Em que momento da vida você está apto a julgar o seu semelhante?
Então, há países que adotam idade mínima não de 35. Adotam de 45, adotam de 48, de 50.
Se você eleva a idade mínima e diminui a idade máxima, há países em que essa idade máxima é 68, você encurta o tempo de permanência. Portanto, vai na direção correta da temporariedade, que é inerente ao conceito de República, sem entrar em contendas vãs e sem que se crie mais uma tipicidade.
O nosso modelo, queiramos ou não, é presidencialista, forma federativa de Estado, separação rígida entre os Poderes, Supremo Tribunal Federal vitalício. Esse modelo foi feito por quem? Pela República, 1891. E está tudo isso definido como cláusula pétrea.
Pode ter uma nova Constituinte? Pode. Para aprovar a parlamentarismo? Pode. Pode ter um plebiscito? Pode. Mudar o desenho entre os Poderes? Claro que pode. Mas nós não pretendemos, não podemos misturar os sistemas.
Tribunal constitucional com mandato na Europa tem uma lógica, que é diferente da nossa.
E eu fico me perguntando assim... Alguns dizem, Senador Weverton: "Não, vamos aprovar o mandato daqui para frente" – e faço questão de dizer que não há nada de pessoal nisso, porque a minha vida mostra que eu não tenho apego a estas coisas, espaços de poder –, eu fico pensando: vai aprovar o mandato retroativo, ou seja, imaginemos um mandato de 11 anos, então, os que já têm mais de 11 anos serão aposentados compulsoriamente? Não. Isso não é possível, claro.
O Senador Plínio faz assim com a cabeça, e sei o pensamento dele.
Mas, então, significa o seguinte: até a minha indicação, não haverá mandato ou haverá esse mandato dado pela aposentadoria compulsória; e, daqui para frente, haverá mandato, ou seja, nós teremos, no mesmo tribunal, ministros de primeira e segunda classe, ministros com direitos e prerrogativas diferentes.
Isso já aconteceu em algum país do mundo? Não. Pode acontecer? Pode. Só é estranho.
Por isso é preciso ter calma no debate, exatamente para refletir sobre todas essas questões.
O Sr. Plínio Valério (Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - AM) – Senador, permita-me um aparte antes de encerrar?
O SR. FLÁVIO DINO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - MA) – Será uma honra, Senador Plínio.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – Nessa conjuntura, o Senador Flávio Dino será ministro de primeira classe.
O SR. FLÁVIO DINO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - MA) – Ou de segunda, não é?
O Sr. Plínio Valério (Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - AM. Para apartear.) – Como eu vou para a tribuna depois, tem muitos pontos em que eu estou divergindo e falarei. Mas eu não posso deixar de citar um agora.
Lá atrás, o senhor falou dos motivos para impeachment, que tem que ter motivo. E, na sua percepção, parece que não tem motivo para impeachment de ministro. Em seguida, falou do Código Penal vigente, de 1941, para justificar e contrapor o Senador Amin.
Eu vou ler aqui a lei que está em vigor, de 1950.
Enquanto não vier essa lei de que o Presidente Weverton falou, para melhorar, que, para mim, está blindando o Supremo. Discordo do que foi feito aqui, sob a revelia dos Senadores.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – É a Lei 1.388.
O Sr. Plínio Valério (Bloco Parlamentar Democracia/PSDB - AM) – O que está vigorando, art. 39:
São crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal:
1 - alterar, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou o voto já proferido em sessão do Tribunal [eu posso lhe dar cinco a oito nomes de ministros que desobedeceram isso aqui.];
2 - proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa [tem ministro cuja esposa está agindo na causa];
3 - exercer atividade político-partidária ["Perdeu, mané", "ajudamos a derrubar o Presidente", dito por um ministro.
4 - ser patentemente desidioso no cumprimento do dever e do cargo [Tem Ministro com pedido de vista de oito, doze anos. Todos eles têm pedido de vista com atraso. O que menos tem está com três anos.];
5 - proceder de modo incompatível com a honra dignidade e decoro de suas funções.
Um ministro do Supremo que diz "perdeu, mané", na cara dos "manés", está faltando com o decoro.
Em 1941, o Código Penal é legal, está valendo. Em 1950, a Lei do Impeachment não está valendo.
Então, é só isso que eu quero registrar, como bom jornalista que sempre me considerei. E depois eu vou para a tribuna, realmente, ponderar os pontos dos quais eu discordo.
O SR. FLÁVIO DINO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - MA) – Senador Plínio, eu considero que a Lei 1.079 está plenamente em vigor.
Eu nunca disse que ela não vale. Apenas alertei para o fato de que, se o senhor acha que determinada circunstância configura o crime de responsabilidade, isso deve estar tipificado em lei, de modo inequívoco, e ser apreciado por esta Casa em um processo presidido pelo Presidente do Supremo, e sob controle do Supremo, porque há certas ideias falsas de que o impeachment é um ato de vontade, apenas. Não é.
Há quem pense que impeachment pode ser algo banal. Não é.
Aliás, os constitucionalistas dos Estados Unidos dizem que o impeachment foi colocado na Constituição, lá, para não ser usado, para não acontecer. É uma ultima ratio do sistema.
Então, se o senhor imagina que a solução para esses impasses, daqui e de acolá, seja a vulgarização do impeachment, eu discordo.
A lei está em vigor?
Sim, claro.
O senhor aludiu a determinadas condutas. Quem sou eu para julgá-las? Não sou Deus e também não sou Senador, mas, com toda certeza, se fosse julgar aqui, como Senador, não consideraria que isso configura crime de responsabilidade; nenhum dos fatos que o senhor descreveu aí, agora.
Há outros fatos! Bom, teria que examinar. Se aqui estivesse, como julgador, não consideraria, exatamente porque crime de responsabilidade demanda uma sanção de índole penal. E essa sanção extrema tem que ser proporcional.
No Brasil, foi feito o impeachment, Senador Plínio, por um conceito jurídico chamado pedaladas fiscais. Esse conceito apareceu e desapareceu. Eu não sei até hoje dizer o que significa. Não sei. Limitação técnica minha. Mas, um processo de impeachment pode ser feito como se vai ali na esquina? Não. Tanto é que, na pátria criadora do impeachment, isso não ocorre – nos Estados Unidos da América.
Veja, Senador Plínio, o que a história nos propicia. Nós estamos fazendo um interessante debate em que eu estou sustentando um modelo de independência judicial lastreado na experiência dos Estados Unidos e o senhor defende um maior controle político sobre o Judiciário, que é típico de regimes, friso, tidos por ditatoriais.
Então, paradoxalmente, eu estou mais próximo da democracia liberal do que o senhor. Veja como a história é bela e o debate político é belo. Eu acho que, se o senhor fizer uma visita à China, o senhor vai gostar do modelo do Tribunal Supremo da China, e é um direito seu, como eu tenho o direito de não gostar. Mas acho que nesta quadra histórica, um controle político, como alguns preconizam, sobre o Judiciário, é um desserviço à pátria. É olhar o hoje e não olhar o amanhã. E isso já foi feito no Brasil, e não deu certo.
Então, eu creio que... Há anomalias? Há. Há erros a corrigir? Há, mas não com caminhos extremistas. Essa é a ponderação que faço, agradecendo, Presidente, e dizendo que, nesta minha curta passagem pelo Senado, sem dúvida, este foi um dos debates mais instigantes e mais prazerosos que eu tive a honra de fazer com os queridos Parlamentares. Talvez, nos dois últimos discursos, não tenha essa oportunidade, mas, como eu vou ouvir V. Exas., quem sabe, na terça-feira, dia 20, haja uma tréplica em relação ao discurso de V. Exa.
O SR. PRESIDENTE (Weverton. Bloco Parlamentar Democracia/PDT - MA) – E terá direito de aparte também, não é? Vai ter direito ao aparte, Senador Flávio Dino. V. Exa. vai ter direito ao aparte.
O SR. FLÁVIO DINO (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - MA) – Eu já concluí, Sr. Presidente.