Discurso durante a 25ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Crítica à decisão do STJ que absolveu réu acusado de estupro de vulnerável por erro de proibição, alegando a existência de relacionamento da vítima com o réu.

Autor
Eduardo Girão (NOVO - Partido Novo/CE)
Nome completo: Luis Eduardo Grangeiro Girão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Atuação do Judiciário, Direito Penal e Penitenciário:
  • Crítica à decisão do STJ que absolveu réu acusado de estupro de vulnerável por erro de proibição, alegando a existência de relacionamento da vítima com o réu.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2024 - Página 36
Assuntos
Outros > Atuação do Estado > Atuação do Judiciário
Jurídico > Direito Penal e Penitenciário
Indexação
  • CRITICA, DECISÃO JUDICIAL, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), ABSOLVIÇÃO, REU, ACUSAÇÃO, ESTUPRO DE VULNERAVEL, MOTIVO, ERRO, PROIBIÇÃO, ALEGAÇÕES, EXISTENCIA, RELACIONAMENTO, AUTOR, VITIMA.

    O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Para discursar.) – Paz e bem, Sr. Presidente Rodrigo Pacheco, Sras. Senadoras, Srs. Senadores, especialmente ao Senador Sergio Moro, ao Senador Paulo Paim, ao Senador Hamilton Mourão e ao Senador Esperidião Amin, que neste momento aqui estão no Plenário.

    Quero saudar todos os funcionários desta Casa, os assessores e você, minha irmã brasileira, meu irmão brasileiro, que está nos acompanhando pelo trabalho sempre muito correto da equipe da TV Senado, da Rádio Senado e da Agência Senado, do Senado para o mundo.

    Olha, sabe aquela teoria, Senador Hamilton Mourão, do sapo na panela quente? Que você vai ali se acostumando, vai aumentando a temperatura, vai, vai, aí ele morre. Mas, se você pegasse, deixasse a panela quente e jogasse ele, ele pularia e sairia. Mas a gente precisa, aqui, na Casa revisora da República, externar uma angústia da sociedade brasileira com a decisão que foi tomada pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, o STJ, na semana passada, que deixa indignado o cidadão de bem neste país, que defende mulher, que defende criança, que defende o que é correto.

    O STJ absolveu um rapaz, por três votos a dois, que aos 20 anos – repito, 20 anos – havia engravidado uma menina de 12, de 12 anos de idade.

    O caso ocorreu em Araguari, Presidente Pacheco, em Minas Gerais, e chocou o país e continua chocando o país, porque ele foi acusado de estupro de vulnerável, que é um crime previsto no art. 213, do Código Penal, com pena de 8 a 15 anos de prisão, e quem pratica, abro aspas, "conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de 14 anos".

    O rapaz havia sido condenado em primeira instância a 11 anos e 3 meses de prisão, mas sua defesa recorreu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, alegando que o rapaz tinha uma relação com a menina e não sabia que se tratava de crime por causa da idade dela. Brasil, 2024.

    O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, então, o absolveu por, abro aspas, "erro de proibição baseado no art. 21 do Código Penal". Que diz assim – abro aspas: "O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço".

    Diante da absolvição do réu, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais ingressou imediatamente com um recurso perante o STJ para restabelecer a condenação.

    O Relator do julgamento, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, votou contra a condenação. Ele disse que era preciso, abro aspas de novo, "uma ponderação de valores" – fecho aspas – priorizando a criança que nasceu de uma união estável, mesmo que nas condições em que foi gerada precocemente. Apesar de o rapaz não conviver mais com a mãe da criança, ele presta assistência a ela.

    Os Ministros Joel Paciornik e Ribeiro Dantas seguiram o voto do Relator. Para Dantas, o rapaz não tinha, abro aspas, "discernimento sobre o ato ilegal e de fato quis constituir uma família com a menor, e que o caso se tratou de uma exceção".

    Mas a Ministra Daniela Teixeira divergiu do voto do Relator, dizendo que – abro aspas: "Não se pode racionalmente aceitar que um homem de 20 anos de idade não tivesse consciência da ilicitude de manter relação sexual com uma menina de 12 – repito, 12 – anos de idade. O rapaz estava totalmente incluído na sociedade, com acesso aos meios de comunicação e tinha consciência do ato que fez com a menor".

    O erro de proibição se caracteriza quando uma pessoa pratica um crime sem saber que aquela conduta é criminosa. É o caso, por exemplo, do morador da zona rural que pratica caça aos finais de semana sem imaginar que é proibido matar determinados animais.

    Cabe lembrar que o art. 217-A do Código Penal determina que toda relação sexual com menor de 14 anos é crime neste país. O STJ possui, inclusive, uma súmula jurisprudencial, de 2017, confirmando que o estupro acontece mesmo com o consentimento da vítima, independente do seu passado sexual.

    O fato é que o caso indica um risco – e eu chamo a atenção das Sras. Senadoras e dos Srs. Senadores, dos brasileiros e das brasileiras que estão nos assistindo – para uma tendência à relativização de conceitos bem estabelecidos no nosso Código Penal, ainda mais se tratando de situações de vulnerabilidade de criança, Senador Esperidião Amin. Um caso aqui e outro ali vão criando jurisprudência, abrindo exceções. E, quando se vê que certos crimes começam a ser relativizados, isso pode trazer consequências muito danosas para a nossa sociedade, Senador Sergio Moro.

    Vivemos num país que, no ano de 2022, registrou 74.930 denúncias de estupro, sendo 60% em crianças menores de 14 anos de idade, mas a situação é ainda muito mais grave. Segundo o Atlas da Violência, publicado pelo Ipea, no máximo 15% dos casos são efetivamente denunciados. Então, a estimativa é que estejam ocorrendo mais de 400 mil estupros todos os anos, ou seja, um estupro a cada minuto. Desde que eu comecei aqui, a estimativa é que nós tivemos na nossa nação 18 estupros.

    Portanto, decisões como essa do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e do próprio STJ devem ser repudiadas, porque podem transmitir para a sociedade a percepção de tolerância com esse crime tão traumático, principalmente quando praticado contra nossas crianças.

    Sr. Presidente, cumprido o prazo antes do tempo, vou ficar com esse crédito para amanhã.

    Deus abençoe!

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2024 - Página 36