Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Relato sobre os prejuízos trazidos pela polarização política exacerbada no País. Destaque para o resultado da investigação feita pela Polícia Federal relativa aos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Necessidade de formulação de um plano de segurança pública capaz de enfrentar o crime organizado no País.

Autor
Sergio Moro (UNIÃO - União Brasil/PR)
Nome completo: Sergio Fernando Moro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Atividade Política, Direito Penal e Penitenciário, Segurança Pública:
  • Relato sobre os prejuízos trazidos pela polarização política exacerbada no País. Destaque para o resultado da investigação feita pela Polícia Federal relativa aos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Necessidade de formulação de um plano de segurança pública capaz de enfrentar o crime organizado no País.
Aparteantes
Esperidião Amin.
Publicação
Publicação no DSF de 27/03/2024 - Página 34
Assuntos
Outros > Atividade Política
Jurídico > Direito Penal e Penitenciário
Soberania, Defesa Nacional e Ordem Pública > Defesa do Estado e das Instituições Democráticas > Segurança Pública
Indexação
  • COMENTARIO, PREJUIZO, RESULTADO, QUANTIDADE, DIVERGENCIA, POLITICA, PAIS, REGISTRO, SOLUÇÃO, INVESTIGAÇÃO, POLICIA FEDERAL, HOMICIDIO, VEREADOR, MULHER, MARIELLE FRANCO, MOTORISTA, DEFESA, ELABORAÇÃO, PLANO, SEGURANÇA PUBLICA, OBJETIVO, COMBATE, CRIME ORGANIZADO, BRASIL.

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR. Para discursar.) – Boa tarde a todos, Senadores e Senadoras, Senador Izalci, que preside esta sessão, nós temos visto a polarização prejudicar o país. Eu não quero aqui ser mal-interpretado. Eu sou oposição a este Governo, ao Governo Lula, e continuarei sendo oposição, embora, certamente, havendo propostas que sejam positivas para o país, não tenha nenhum problema em acompanhá-las, mas permanecerei firme na oposição. Mas é inegável que a polarização exacerbada e o ânimo irracional acabam prejudicando a formulação de políticas públicas.

    Não é só isso. Tivemos um exemplo agora, nesta semana, que foram as revelações em torno do assassinato da Marielle Franco e do Anderson. Esse crime brutal, atroz, ficou vários anos sem ser resolvido, e eu tributo essa falta de resolução, Senador Amin, à polarização política, porque eu era Ministro da Justiça em 2019, e, naquela época, eu acompanhei o trabalho da Polícia Federal. A Polícia Federal havia constituído, aberto uma investigação, ainda por solicitação do Ministro anterior de Segurança Pública, o Raul Jungmann, para que verificasse uma hipótese de interferência indevida, uma fraude na investigação que então era realizada pela Polícia Civil do Rio de Janeiro.

    Isso foi feito ainda em 2018, mas os trabalhos dessa investigação da Polícia Federal se estenderam ali no ano de 2019. Eu, como Ministro da Justiça, acompanhei esses trabalhos e, de fato, foi confirmado que havia sido plantada uma testemunha falsa na investigação da Polícia Civil do Rio de Janeiro para levar a investigação para um rumo que era o rumo errado e distanciá-la dos verdadeiros autores materiais e dos mandantes do crime.

    E, naquele ano de 2019, como Ministro, a minha orientação à Polícia Federal foi sempre de elucidar o crime. Era esse o único interesse do Governo de então, fazer justiça, chegar à verdade, chegar aos culpados, e não faltaram ali recursos para a Polícia Federal fazer esse trabalho. E esse trabalho foi essencial para que as investigações, que então corriam na Polícia Civil e perante o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, retomassem o seu rumo correto.

    Naquela época, ainda naquela época, já apareceu o nome, um dos nomes, um dos nomes desses presos desta última semana como provável mandante do assassinato de Marielle Franco. Ainda, em 2019, surgiu o nome de Domingos Brasão como um possível mandante. Não digo aqui, porque isso vai competir à Justiça fazer a avaliação das provas, mas o fato é que esse nome já havia surgido em 2019. E, talvez, se pudéssemos ter prosseguido na investigação, ainda naquele ano de 2019 o crime pudesse ter sido solucionado mais rapidamente.

    Ocorre que, influenciados pela polarização política e infelizmente mal-informados sobre as intenções do Governo de então, a família da vítima se manifestou na época contra a federalização das investigações. Eu tive a oportunidade de falar com eles e coloquei o meu posicionamento, que era importante que a investigação fosse feita pela Polícia Federal, mas, no entanto, houve essa resistência da família. E, claro, não falo aqui em termos críticos, porque é até compreensível a posição da família diante daquele clima exacerbado de polarização política que nós tínhamos em 2019 e que infelizmente se estende até os nossos dias atuais.

    Como Ministro da Justiça, eu respeitei a posição da família da vítima e, embora entendesse que a federalização era oportuna, nós passamos a nos posicionar contrariamente a ela, pelo menos publicamente, já que entendíamos que a vontade da família da vítima deveria ser levada em consideração quanto à realização da federalização ou não.

    Mas não culpo, não se enganem, aqui de maneira nenhuma a família da vítima, o grande culpado desse quadro é a polarização política exacerbada. O grande culpado pelo fato de o crime não ter sido elucidado ainda em 2019 ou 2020 pela Polícia Federal foi essa polarização política, porque agora vimos, pelo menos considerando os resultados provisórios dessa investigação feita pela Polícia Federal, que não havia condições de o crime ser elucidado pelas autoridades do Rio de Janeiro, já que comandando a direção da Polícia Civil na área de homicídios, pelo menos naquele estado, e, segundo o que consta nas investigações, e isso depois vai ter que ser avaliado pela Justiça, haveria um dos próprios algozes ou uma autoridade da Polícia Civil que concordava e havia se comprometido em dar proteção aos mandantes do assassinato de Marielle Franco.

    Eu fiquei feliz pelos resultados havidos esta semana, pelos desdobramentos do caso, e espero que a justiça seja feita. Espero que a família das vítimas, tanto de Marielle, como de Anderson, possam encontrar justiça e paz nesses desdobramentos.

    Registro aqui a importante posição que foi adotada pelo União Brasil nesse final de semana, que acabou expulsando de seus quadros um desses indivíduos que era apontado como mandante desse crime. Claro, ele tem o direito de se defender na Justiça, as provas vão ser avaliadas, a Câmara vai se posicionar sobre a prisão preventiva, mas, naquele quadro que aparece, não seria possível que o partido continuasse a abrigá-lo dentro dos seus quadros. Vamos aguardar os acontecimentos.

    Agora, seria importante que houvesse um desdobramento dessa operação. Eu tive a oportunidade de ler o relatório de inquérito policial que foi apresentado pela Polícia Federal e que embasou essas prisões. Ele vai ser oportunamente avaliado pela Justiça, e esse relatório foi divulgado inclusive na imprensa, e o que nós temos ali, Senador Esperidião Amin, é um retrato tenebroso da segurança pública do Rio de Janeiro. É um retrato amargo do grau de infiltração de organizações criminosas nas instituições do Rio de Janeiro. E aí, nós estamos falando de Tribunal de Contas; e aí, nós estamos falando de Assembleia; e aí, nós estamos falando mesmo de representantes na Câmara Federal desta Casa, e igualmente em altos escalões da Polícia Civil. É uma história tenebrosa de crime e de impunidade.

    E aqui, sim, que nós precisamos, e este é o propósito especial do meu discurso na tribuna, nós precisamos ter um plano de segurança pública consistente para este país, especialmente que leve ao enfrentamento das organizações criminosas. Não pode o Governo Federal se satisfazer exclusivamente com a prisão desses mandantes. Nós estamos vendo a situação em Mossoró, dos fugitivos que simplesmente desapareceram; nós estamos vendo o crescimento do crime organizado no dia a dia, e nos falta, aqui no Brasil, da parte desse Governo Federal, uma política de segurança pública consistente e robusta.

    Pode eventualmente, pode eventualmente, sim, este momento ser utilizado para, quem sabe, ter uma virada, mas uma virada que tenha também a participação do Congresso, porque este Congresso mostrou, nas últimas semanas, tanto o Senado, como a Câmara dos Deputados, que não está do lado dos criminosos, ao aprovar o projeto de lei que acaba com a saidinha dos presos nos feriados, ao aprovar o projeto de lei que torna mais rigorosa e mais difícil a progressão de regime de cumprimento de pena.

    Este Congresso delibera hoje sobre a audiência de custódia e sobre se imporem critérios mais rígidos. Talvez seja este o momento – e aqui fica a minha sugestão a este Governo Federal, embora eu seja de oposição – para se começar a tomar atitudes mais firmes antes que esses exemplos lamentáveis do Rio de Janeiro se espraiem por todo o país, se é que, de certa forma, já não se espraiaram.

    Senador Esperidião.

    O Sr. Esperidião Amin (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC. Para apartear.) – Eu gostaria de cumprimentá-lo pelo pronunciamento, que é um pronunciamento histórico, posto que está sendo feito no momento em que há um aparente alívio pelos fatos apurados até aqui.

    Primeiro, quero o cumprimentar também pela elegância, pelo espírito de humanidade, ao reconhecer que muito mais do que erro de alguém...

(Soa a campainha.)

    O Sr. Esperidião Amin (Bloco Parlamentar Aliança/PP - SC) – ... foi a polarização que determinou a atitude de não se desejar que a Polícia Federal conduzisse, o que certamente seria melhor, teria sido melhor, tanto é que está sendo, o inquérito em relação ao que aconteceu em matéria de investigação, inclusive com infiltração, pelo que se sabe agora, de testemunha e testemunho falsos. Acho que este período teria sido, certamente, abreviado.

    E o segundo, mais importante ainda, é ressaltar que nós não podemos ficar satisfeitos ou considerar encerrado o caso pela identificação dos mandantes. Isso é pouco, porque está comprovado que o processo decisório o contaminou, que o processo de comando das atividades da polícia judiciária, digamos assim, estava comprometido e comprometido com uma metástase que ia além dos quadros da Polícia Civil e, por tudo que se consegue vislumbrar, perpassava vários outros organismos do Estado do Rio de Janeiro. E a investigação deve prosseguir.

    Para aplaudir este seu pronunciamento, é que eu faço este aparte.

    Muito obrigado.

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) – Agradeço, Senador Esperidião Amin, pelas colocações.

    De fato, essas organizações criminosas crescem e são poderosas e se infiltram nas instituições. Se nós não tivermos um plano de segurança consistente, se nós continuarmos nesta posição de leniência com os criminosos, sejam criminosos que nós temos como comuns, sejam os grandes lordes e barões das drogas, sejam aqueles que se infiltram nas instituições para garantir impunidade a esses criminosos, nós vamos acabar perdendo essa luta contra a criminalidade.

    E aí, como eu disse anteriormente, não podemos deixar que a polarização política nos cegue para nossas responsabilidades. Não podemos deixar aqui, como Congresso, como Senado, de nos debruçar sobre as ações necessárias de aprimoramento da legislação e evitar ver um ao outro como um adversário...

(Soa a campainha.)

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) – ... que não existam pontos comuns e cujas divergências não sejam insuperáveis.

    Se nós continuarmos nessa desunião, nessa polarização exacerbada, os únicos vitoriosos serão esses gângsteres, esses criminosos que muitas vezes se infiltram dentro das instituições públicas.

    Muito obrigado, Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/03/2024 - Página 34