Discurso durante a 33ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Elogios ao trabalho desempenhado pela CSP. Manifestação contra a ampliação, indicada nos votos já proferidos no âmbito de "habeas corpus" em julgamento no STF, dos casos submetidos ao foro por prerrogativa de função. Aplausos à PEC 333/2017, que promove a extinção do foro especial por prerrogativa de função nos casos de crimes comuns, aprovada pelo Senado Federal. Censura ao alegado desequilíbrio institucional provocado pela atuação do Supremo.

Autor
Eduardo Girão (NOVO - Partido Novo/CE)
Nome completo: Luis Eduardo Grangeiro Girão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Atuação do Judiciário, Atuação do Senado Federal:
  • Elogios ao trabalho desempenhado pela CSP. Manifestação contra a ampliação, indicada nos votos já proferidos no âmbito de "habeas corpus" em julgamento no STF, dos casos submetidos ao foro por prerrogativa de função. Aplausos à PEC 333/2017, que promove a extinção do foro especial por prerrogativa de função nos casos de crimes comuns, aprovada pelo Senado Federal. Censura ao alegado desequilíbrio institucional provocado pela atuação do Supremo.
Publicação
Publicação no DSF de 04/04/2024 - Página 15
Assuntos
Outros > Atuação do Estado > Atuação do Judiciário
Outros > Atuação do Estado > Atuação do Senado Federal
Indexação
  • CRITICA, PARTICIPAÇÃO, JOSE DIRCEU, SESSÃO, DEMOCRACIA, CAMARA DOS DEPUTADOS.
  • CRITICA, REVISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), LEGISLAÇÃO, AMPLIAÇÃO, ABRANGENCIA, PRERROGATIVA DE FUNÇÃO, CONSEQUENCIA, AUMENTO, IMPUNIDADE, CRIME, CORRUPÇÃO.
  • CRITICA, EXCESSO, QUANTIDADE, PROCESSO, JULGAMENTO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).

    O SR. EDUARDO GIRÃO (Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Para discursar. Por videoconferência.) – Muitíssimo obrigado, Sr. Presidente.

    Estou acompanhando o debate aí de vocês e lembrando que a justiça precisa ser para todos. É muito importante que a gente tenha esse olhar humano sempre, mas sem vitimismo. É importante que a justiça seja para todos.

    E eu fico muito triste de, na semana passada, ter tido a minha voz calada, por exemplo – e eu não vi nenhuma solidariedade de alguns colegas na sessão dos 200 anos do Senado –, e ontem ter visto aí o José Dirceu, condenado desde a época do mensalão, algo assim surreal, na tribuna do Senado, falando sobre democracia. Parece surreal o que acontece no Brasil, os dois pesos e duas medidas.

    Então, eu sou muito feliz em participar da sessão... de todas as sessões da Comissão de Segurança Pública, que tem feito um grande trabalho, sim, no combate à corrupção. Ontem mesmo, aprovamos projeto para que se devolva em dobro o corrupto... o dinheiro roubado. E tem que ser punido, tem que se aumentar as penas, como também, em outros casos, a gente precisa endurecer, porque a justiça tem que ser para todos. E quem está preso, hoje, no Brasil, muitas vezes é um cidadão de bem.

    E, Sr. Presidente, nós vamos agora ao cerne da questão, o senhor até tocou neste assunto: nós estamos assistindo a mais uma aberração jurídica, imoral, no Supremo Tribunal Federal. Está sendo revisada uma decisão sobre o foro de prerrogativa de função, mais conhecido como foro privilegiado – e eu acrescento, por minha conta, como foro para garantia da impunidade. Provarei isso, baseado em dados oficiais, ao longo deste pronunciamento.

    O último julgamento desse tema ocorreu em 2018 e definiu que o foro só poderia ser aplicado em crimes cometidos no exercício do cargo e em razão da função a ele relacionada. Agora, apenas seis anos depois, o Ministro Gilmar Mendes suscitou a questão de ordem para a Corte revisar o assunto, com o objetivo de ampliar sua abrangência. Não quer nada o Supremo Tribunal Federal, só quer mais poder, mais gente ficando na mão dele. A partir de agora, o investigado só perderia o foro se os crimes tivessem sido praticados antes de assumir o cargo ou, então, se não tiverem relação nenhuma com o exercício da função. A votação foi suspensa quando o placar já indicava 5 a 0, com o pedido de vista feito pelo Presidente da Casa, o Ministro Barroso. Quatro Ministros já votaram acompanhando o voto do Relator, o Ministro Gilmar Mendes, são eles: Dias Toffoli, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Flávio Dino.

    Faço questão de citar alguns pequenos trechos do extenso voto de Gilmar Mendes, que podem nos dar uma luz para tentar entender o tamanho desse retrocesso. Abro aspas: "o foro é uma prerrogativa do cargo e não um privilégio pessoal. [...] por isso, deve permanecer mesmo com o fim do mandato". Outras aspas: a prerrogativa de foro é "fundamental para a estabilidade das instituições democráticas" e serve "para evitar perseguições e maledicências", além de impedir a insegurança jurídica pela – abro aspas de novo – "flutuação de competência". Outra citação, abro aspas: é preciso "recalibrar os contornos do foro" e "estabilizar a interpretação da Constituição".

    Antes de analisar o mérito desse voto, que foi rapidamente seguido por quatro Ministros, precisamos relembrar os números indecentes do foro privilegiado no Brasil em relação ao mundo inteiro. São mais de 45 mil autoridades, Presidente, contempladas. Vai desde o Presidente da República e seu Vice até juízes, promotores, Prefeitos, procuradores, passando pelos Senadores, Deputados, ministros de Estado, embaixadores e integrantes dos tribunais superiores e do Ministério Público.

    Em democracias sólidas como Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos, nem sequer o Presidente da República tem direito a um foro privilegiado, em todos os países da Europa é restrito a pouquíssimas autoridades. Até mesmo a China, com 1,5 bilhão de habitantes, são 2.937.

    Outra grande anomalia do sistema judicial brasileiro é a quantidade de processos que chegam ao Supremo. A revista Veja publicou um estudo comparativo do número de processos pendentes de julgamento nos tribunais superiores de muitos países. No ano de 2015, por exemplo, nos Estados Unidos, com nove juízes, havia apenas 82 processos; na França, também com nove juízes, havia 156 processos; na Itália, 15 juízes, 276 processos, mas no Brasil, no nosso Brasil, com 11 juízes, existiam 92 mil processos. Eles querem tudo para eles, absolutamente tudo. Está aí o poder cada vez maior na mão, e o Brasil entrando no caos, numa insegurança jurídica por causa desses abusos, inclusive invadindo competências dia sim, dia não, do Congresso Nacional.

    Em seu último relatório oficial de 2023, Presidente, o STF informou a existência de 24 mil processos aguardando julgamento. Só isso seria um motivo muito forte para não haver mais ampliação desse famigerado foro privilegiado. Para mim é o guarda-chuva, é a trava do mecanismo que faz um Poder proteger o outro e a impunidade prevalecer na nossa nação.

    Agora, o Senado é a instituição mais afetada, pois esse foro mantém o ciclo infinito, como eu falei, da impunidade, na medida em que só os Senadores têm a prerrogativa constitucional de abrir processo de impeachment de Ministros do STF, mas, como todos os Senadores só podem ser julgados no Supremo, pelo Supremo, temos a explicação do porquê, em 135 anos de República, de nunca ter ocorrido impeachment de nenhum Ministro do STF. Só nos últimos cinco anos, foram mais de 60 pedidos, Senador Styvenson, inclusive alguns deles o meu e o do senhor.

    Existem muitos Parlamentares com processo de corrupção ativa e passiva paralisado no Supremo há mais de dez anos, sem nenhuma movimentação, aguardando talvez a sua prescrição. Isso vai piorar ainda mais com essa nova decisão de ampliação de foro, que já tem cinco votos favoráveis no STF.

    Portanto, o caminho justo e correto para melhorar o enfrentamento da corrupção e principalmente a impunidade é o fim desse famigerado foro privilegiado. E eu quero dizer aqui que já foi aprovado o fim do foro pelo Senado, olha a boa notícia, antes de a gente chegar aí, Senador Styvenson. A PEC 333, de 2017, do Senador, nosso amigo e irmão, Alvaro Dias, foi votada e aprovada por unanimidade no Senado, há mais de cinco anos, mas está completando seis anos parada, desde 2018, lá na Câmara dos Deputados.

    Antes de concluir, aproveitando que o assunto é o STF, eu não tenho como deixar de registrar essa notícia importante veiculada hoje, nos meios de comunicação como um todo. Grande empresa multinacional suíça é multada em US$127 milhões por pagamento de propina no Brasil. Um grande e bom exemplo de justiça imparcial, enquanto aqui, no nosso país, a Odebrecht e a J&F tiveram suas multas bilionárias perdoadas mesmo sendo réus confessos. Repito: mesmo sendo réus confessos, no Brasil, no STF do Brasil, as multas foram suspensas. É brincadeira a inversão de valores, mas nós vamos continuar fazendo a nossa parte da melhor forma possível para a construção de uma nação desenvolvida e verdadeiramente justa, onde os melhores exemplos de retidão moral venham, sobretudo, daqueles que detêm temporariamente o poder neste país.

    Senador Styvenson, essa ampliação de foro – e o senhor foi o primeiro a tocar no assunto hoje – é uma vergonha. É uma vergonha completa! E você vê aí o STF com essa questão do dia 8 de janeiro... e nós somos absolutamente contra quem vandalizou, que foi uma minoria que estava nos arredores do Congresso Nacional, que adentrou a sede dos três Poderes, e que tem que ser punida, mas não com o STF arrolando todo mundo para si, porque essas pessoas não têm foro privilegiado. O STF além de querer ampliar o foro para deixar as pessoas na mão – essa é que é a grande verdade –, ainda coloca gente que nem tem foro ainda. Já está botando dentro do julgamento do STF.

    É uma aberração o que a gente está vendo. A população brasileira, seja de direita, seja de esquerda, seja quem é contra o Governo, a favor do Governo, já entendeu que o grande problema do caos institucional que a gente vive no Brasil hoje é o STF, são esses abusos do STF, e isso tem feito a imagem dessa casa do STF ir ladeira abaixo, junto com o Senado.

    Infelizmente, não podemos dourar a pílula, não podemos fazer de conta que não. É ruim, basta você andar na rua. Você conversa com as pessoas também, Senador Styvenson. A opinião que elas têm do Congresso e do STF é de que estão morrendo abraçadas juntas essas duas instituições, que são fundamentais para a democracia do Brasil, mas precisamos que as pessoas de bem façam reflexão e tomem as medidas de acordo com a lei e não de acordo com as suas vontades de poder pelo poder.

    Um grande abraço, muita paz e que Deus abençoe a todos nós!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/04/2024 - Página 15