Pronunciamento de Zenaide Maia em 04/06/2024
Discurso durante a 72ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Reflexão sobre as limitações do pensamento liberal do Estado mínimo na sociedade brasileira.
Defesa da não privatização dos serviços públicos essenciais e da taxação de grandes fortunas visando evitar a ação de possíveis sonegadores que contribuem para a desigualdade no Brasil.
- Autor
- Zenaide Maia (PSD - Partido Social Democrático/RN)
- Nome completo: Zenaide Maia Calado Pereira dos Santos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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Serviços Públicos,
Tributos:
- Reflexão sobre as limitações do pensamento liberal do Estado mínimo na sociedade brasileira.
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Tributos:
- Defesa da não privatização dos serviços públicos essenciais e da taxação de grandes fortunas visando evitar a ação de possíveis sonegadores que contribuem para a desigualdade no Brasil.
- Publicação
- Publicação no DSF de 05/06/2024 - Página 37
- Assuntos
- Administração Pública > Serviços Públicos
- Economia e Desenvolvimento > Tributos
- Indexação
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- CRITICA, LIBERALISMO, DEFESA, SERVIÇO PUBLICO, ASSISTENCIA SOCIAL, PRIVATIZAÇÃO, COMENTARIO, PORTO ALEGRE (RS), CALAMIDADE PUBLICA, INUNDAÇÃO, AEROPORTO.
- DEFESA, TRIBUTAÇÃO, IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, SONEGAÇÃO FISCAL.
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN. Para discursar.) – Boa tarde a todos e a todas aqui presentes e principalmente àqueles que estão nos assistindo.
Presidente, hoje eu quero fazer uma fala aqui que, no fim, o mérito é falar sobre Estado mínimo, que é algo tão comum que se fala, principalmente com essa reforma administrativa que vem aí. Eu queria falar sobre isso.
Queria aqui já parabenizar todos os meios de comunicação desta Casa, Agência Senado, Rádio e TV Senado.
Nós temos assistido com tristeza e ao mesmo tempo muita solidariedade a calamidade que se abate sobre o povo do Rio Grande do Sul. A união da população brasileira para enviar recursos e socorros aos irmãos e irmãs gaúchos nos aquece o coração em tempos de tanta discórdia e de tanta divisão.
As tragédias climáticas decorrentes da ação predatória do homem sobre os recursos naturais é uma realidade brutal que chegou para ficar no Brasil e no mundo.
A essa altura, os fatos já não nos permitem ficar apenas em mecanismos preventivos e no discurso do alerta, porque o que tem restado muitas vezes é a contenção de danos devido à demora em acordarmos para os efeitos da destruição do meio ambiente. A conta chegou, senhoras e senhores.
Pois essa situação tão triste me leva a uma profunda reflexão sobre o chamado Estado mínimo. O aeroporto de Porto Alegre hoje é privatizado. A empresa que gerencia fica com todo o lucro, mas com a enchente já se especula se vai abandonar a concessão ou pedir para o Estado bancar o prejuízo. Privatização é isso, gente! Quando dá lucro, fica para a empresa; quando dá prejuízo, o povo paga a conta.
Em São Paulo, a maior metrópole do país e da América Latina, a concessionária de energia Enel presta um péssimo serviço e vive ameaçada de perder o contrato, mas o povo sem luz, na hora do aperto, foi reclamar para quem? Para o Estado, o poder público: para o Prefeito, para o Governador. Em Brumadinho, arrasada pela lama da Vale, foram os bombeiros, os funcionários públicos os responsáveis por socorrer os sobreviventes e localizar os corpos das vítimas mortas.
É por isso que defendo que serviços públicos essenciais à população, como água tratada, saneamento básico, energia elétrica, não podem ser privatizados a qualquer custo. O capital quer o quê? Lucro. E o pobre entra nesta conta? Não, não entra nessa conta do lucro. Aqui eu gosto de lembrar que quem ainda está morrendo pelos extremos do clima são os pobres, são as populações ribeirinhas que moram em encostas – de quem tudo é levado pela água –, principalmente os que são soterrados.
Essa cultura liberal do Estado mínimo, pregada por muitos economistas e empresários como se fosse uma religião, precisa ser debatida com transparência e honestidade intelectual. Quem está socorrendo o povo na calamidade é o Estado brasileiro. É aquilo que eu venho dizendo: na hora H vendem tudo porque tem que ser privado, mas na hora da tragédia, da enchente, do acidente de trânsito, do incêndio, do assalto, do homicídio, da cirurgia, do tratamento de saúde, da matrícula na escola, quem tem que correr para lá é o corpo de bombeiros, a polícia civil, a polícia militar, é o Estado presente, salvando vidas.
Eu sempre digo: se eu pudesse escolher como nascer numa outra vida, eu queria ser banqueiro no Brasil. É o verdadeiro paraíso da terra! Os gigantes do capital privado no Brasil sempre são salvos pelo Estado quando estão em apuros. Agora eles também precisam ser cobrados na justa medida do que ganham nesse país tão desigual.
Cadê os bancos dizendo que não vão cobrar juros e que não vão cobrar, no SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) de quem que tem um empréstimo para comprar casa e está debaixo d'água no Rio Grande do Sul? Cadê a linha de crédito dos bancos para quem precisará reconstruir a vida a partir do zero? Ninguém do setor privado levanta da cadeira nessa hora de desespero coletivo. A sociedade civil é que ajuda, o Governo é que tem que comandar a reconstrução. E é isso que o Governo brasileiro tem feito o tempo todo.
E adivinha quem é que faz, quem é que constrói todas essas obras de infraestrutura? Ora, é o Estado brasileiro, com o dinheiro dos impostos pagos pela população. O Estado tem que ser mínimo, quando é para destinar apenas 4% do Orçamento Geral da União para a saúde? O Estado tem que ser mínimo para que, para a educação, só vá 5% do Orçamento desse país? O Estado tem que ser mínimo para a gente botar menos de 5% para a segurança pública, gente? É 2,5%, pasmem! A segurança pública não está também no Orçamento Geral da União.
O país dá 50% do Orçamento Geral da União todo ano para pagar dívidas e serviços de dívidas do Governo Federal com o sistema financeiro. São dívidas que jamais foram auditadas, mesmo tendo essa previsão na Constituição. Ora, falam tanto em ajuste fiscal como um mandamento sagrado, mas, na hora de financiar os grandes e de dar metade do dinheiro do país para os bancos, ninguém fala que isso precisa entrar na conta do ajuste fiscal, é a única coisa que não entra no ajuste fiscal nesse país – e onde não deveriam estar educação, saúde, segurança pública e assistência social, e estão no ajuste fiscal.
Querem acabar com a estabilidade do concurso público, a ferramenta essencial que permite a muitos servidores denunciarem a corrupção, porque há a estabilidade garantida de que não vão ser punidos e perseguidos com a demissão sumária.
Alguma coisa está errada nisso! Nós precisamos jogar luz sobre essas condições. E estas são as Casas: Câmara e Senado Federal, ou seja, o Congresso Nacional é quem tem que ter esse olhar, Presidente.
O que quero dizer com isso? Que nesse país vivemos à mercê de uma modalidade exótica: é o capitalismo estatal. O grande capital quer o Estado mínimo quando se trata de usar os impostos para investir no social...
(Soa a campainha.)
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN) – ... e em políticas públicas, mas, quando é para ser alvo, é o Estado brasileiro que salva o banqueiro, é o contribuinte brasileiro que salva banqueiro da falência.
Lá em 2008, na crise dos Estados Unidos, foi o dinheiro público que foi salvar os bancos da falência, aquela bolha imobiliária falsa que eles criaram caiu no colo do povo e provocou um rastro de destruição e prejuízos mundo afora.
No Brasil e no mundo todo não há liberalismo forte nem a mão amiga do Estado. Os grandes latifundiários e produtores do agronegócio e da indústria dependem de benesses do Estado e de concessões do Estado brasileiro. São todos liberais, mas às custas do capital público, que mantém o grande capital privado nesta nação.
(Soa a campainha.)
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN) – Presidente, eu queria completar a minha fala, nem que eu assuma o compromisso de que amanhã eu não fale.
Temos que chamar às obrigações os privilegiados intocáveis que fizeram e fazem fortuna à base de dinheiro público.
Não se trata aqui de defender um estado paquidérmico, pesado, ineficiente, que explore os impostos do povo sem entregar resultado para a população. Nós estamos falando de um poder público que funciona, que atua minimizando o rastro cruel do capitalismo selvagem, para fazer esses reparos essenciais, garantir o mínimo de justiça social e de igualdade para cada cidadão e cidadã.
(Soa a campainha.)
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN) – O capital estrangeiro quer investir, por acaso, em um país que não tem estrada que não tem rodovia, que não tem ferrovia, que não tem portos nem aeroportos, que não tem uma rede de infraestrutura mínima, que vive numa pobreza abissal? Óbvio que não!
A raiz da violência é a desigualdade: poucos com o prato esburrando, mandando dinheiro para paraísos fiscais no exterior para não pagar impostos aqui, e muitos sem nada para comer.
Dados de relatório da Oxfam apontam que 63% da riqueza do Brasil está nas mãos de 1% da população e que os 50% mais pobres detêm apenas 2% do patrimônio do país. O documento da ONG (organização não governamental) foi divulgado no Fórum Econômico Mundial em Davos na Suíça.
(Soa a campainha.)
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN) – O Brasil tem uma das maiores concentrações de renda do mundo. Como defensora da política de tributar os super-ricos, que apresentei por meio de emenda, na tramitação recente da reforma tributária, somo-me à coragem do povo brasileiro para exigir justiça fiscal e taxar a minoria privilegiada que concentra quase metade das riquezas do país.
Eu lanço aqui um outro exemplo: você imagina se um pequeno empreendedor, dono de um pequeno comércio, lá no seu bairro, na sua comunidade, fica quase 20 anos sem pagar a sua contribuição tributária, o que acontece com ele? No primeiro ano, ele já vai estar preso! Pois empresários abastados conseguiram postergar por 17 anos...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN. Fora do microfone.) – ... na Justiça os ganhos que eles tinham (Fora do microfone.) de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. Isso mesmo, deixaram de pagar impostos em cima da riqueza que ganharam. Recorrem, recorrem e recorrem. Quando perderam no Supremo Tribunal Federal, conseguiram a façanha de, na mesma hora, terem ouvidos sensíveis, aqui no Congresso, para apresentar um projeto de lei – que querem aprovar aqui com urgência – para anistiar esse calote.
CSLL, gente, para vocês que estão me assistindo, é a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido; é quem forma a seguridade social. Aí está a saúde, aí está a assistência social e aí está a previdência social.
Para tudo neste Congresso se pede impacto fiscal, e usam isso como barreira argumentativa para sabotar qualquer política pública para a população mais vulnerável.
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN) – O impacto fiscal desse calote dos sonegadores é de quanto? Nós estaremos aqui legalizando o calote? E o empresário que pagou seus impostos em dia vai ser punido por ter cumprido suas obrigações? E o imposto devido que foi sonegado deixou de alimentar quantas bocas, deixou de financiar quantos leitos de hospital, deixou de dar merenda para quantas crianças pobres?
É uma injustiça sem fim. Isso é um descalabro. Nós não podemos permitir esse tipo de situação.
Podem reinventar a roda, inventar milhões de tecnologias de automatização, de inteligência artificial, mas ninguém, nada substitui a força do trabalho do trabalhador e da trabalhadora. É o trabalho humano que produz riqueza!
(Soa a campainha.)
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN) – Veja se tem cabimento uma coisa dessas!
Na hora de dar R$600 para uma família que não tem nada, nem onde se amparar para comprar arroz e feijão, acham que é assistencialismo dar R$600 para uma pessoa, uma família sobreviver. Agora, por outro lado, o Estado pode ser pesado quando os abastados vão lá no BNDES e pegam fortunas de empréstimos a fundo perdido, muitas vezes.
Eu quero, aqui... Não vou terminar de ler, mas vou dar como lido e dizer o seguinte: estou aqui mostrando que, na Semana do Meio Ambiente e na hora em que se está pregando Estado mínimo e querendo tirar direito de trabalhadores públicos e privados e concursados, eu venho dizer aqui que a gente precisa é de um Estado pujante...
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
A SRA. ZENAIDE MAIA (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSD - RN) – ... com Polícia Federal, com Polícia Rodoviária Federal. (Fora do microfone.)
Obrigada, Sr. Presidente, e desculpe ter avançado aí, mas quando eu ouço aqui, tudo se resume ao que eu estou dizendo aqui: Estado mínimo não; gastos públicos que salvam vidas, todas as vidas, a animal, a humana e o meio ambiente, precisam de recursos, sim.
Isso tem que estar no Orçamento Geral da União.
Obrigada.
DISCURSO NA ÍNTEGRA ENCAMINHADO PELA SRA. SENADORA ZENAIDE MAIA.
(Inserido nos termos do art. 203 do Regimento Interno.)