Pronunciamento de Chico Rodrigues em 02/09/2024
Discurso durante a 126ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Considerações sobre as decisões do Ministro do STF Alexandre de Moraes que determinaram o bloqueio temporário da rede social X, antigo Twitter, e das contas da empresa Starlink. Destaque para a importância da interconexão via satélite fornecida pela Starlink para as áreas mais remotas da Região Norte.
- Autor
- Chico Rodrigues (PSB - Partido Socialista Brasileiro/RR)
- Nome completo: Francisco de Assis Rodrigues
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
Atividade Política,
Atuação do Judiciário,
Atuação do Senado Federal,
Defesa do Estado e das Instituições Democráticas:
- Considerações sobre as decisões do Ministro do STF Alexandre de Moraes que determinaram o bloqueio temporário da rede social X, antigo Twitter, e das contas da empresa Starlink. Destaque para a importância da interconexão via satélite fornecida pela Starlink para as áreas mais remotas da Região Norte.
- Publicação
- Publicação no DSF de 03/09/2024 - Página 36
- Assuntos
- Outros > Atividade Política
- Outros > Atuação do Estado > Atuação do Judiciário
- Outros > Atuação do Estado > Atuação do Senado Federal
- Soberania, Defesa Nacional e Ordem Pública > Defesa do Estado e das Instituições Democráticas
- Indexação
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- CRITICA, ATUAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), MINISTRO, ALEXANDRE DE MORAES, BLOQUEIO, MIDIA SOCIAL, ELON MUSK, ABUSO DE PODER, SENADO, IMPEACHMENT, RODRIGO PACHECO, DEMOCRACIA, LIBERDADE DE EXPRESSÃO, ACESSO, INTERNET, SATELITE, REGIÃO NORTE, DIREITOS HUMANOS.
O SR. CHICO RODRIGUES (Bloco Parlamentar da Resistência Democrática/PSB - RR. Para discursar.) – Caro Senador Izalci Lucas, agradeço a V. Exa. por ter assumido a Presidência desta sessão neste momento, ao tempo em que faço um pronunciamento que considero extremamente relevante pela importância do tema e, acima de tudo, pela expectativa que tem sido criada na sociedade brasileira.
Primeiro, quero dizer que estamos vivendo tempos em que o papel das redes sociais na vida pública se torna cada vez mais central. Plataformas como X, anteriormente conhecida como Twitter, se consolidaram como espaços de expressão, comunicação e debate para milhões de brasileiros. No entanto, esse mesmo poder de influência das redes sociais traz, inerentemente, maior necessidade de combater a desinformação, o discurso de ódio e a incitação à violência, temas que têm sido alvo de crescente preocupação nas esferas judicial e política.
A recente decisão do Supremo Tribunal Federal que determinou o bloqueio temporário da rede social X no Brasil gerou intensos debates e controvérsias tanto no âmbito jurídico quanto no âmbito público. Críticos da decisão apontam o impacto sobre a liberdade de expressão argumentando que tal bloqueio poderia configurar uma forma de censura. Por outro lado, a legislação brasileira exige que plataformas de internet e de redes sociais que atuem no Brasil tenham representantes legais no país, e essa determinação não foi cumprida pelo X.
É importante lembrar que, em um Estado democrático de direito, as decisões judiciais devem ser respeitadas mesmo que se discorde delas. A rede social X, portanto, tem o dever legal de cumprir a determinação do STF. E esse cumprimento não implica uma aceitação passiva e inquestionável, mas, sim, o respeito às leis e ao processo legal em andamento. Se a empresa considera a decisão equivocada, o caminho apropriado é recorrer. O ordenamento jurídico brasileiro oferece mecanismos para que as decisões judiciais sejam revisadas, de modo que a justiça possa ser feita com base em análises profundas e ponderadas. A rede social X deve, portanto, utilizar os recursos cabíveis, respeitando o Poder Judiciário e a legislação brasileira, demonstrando seus argumentos dentro das regras estabelecidas pela Constituição e pelas leis do nosso país.
Ao mesmo tempo, é crucial ressaltar que o STF, como guardião da Constituição, tem o dever de assegurar que o contraditório e a ampla defesa sejam plenamente garantidos a todas as partes envolvidas. Não se pode admitir que decisões judiciais, ainda que motivadas por preocupações legítimas, sejam tomadas sem que todos os direitos processuais sejam respeitados. A transparência do julgamento e a possibilidade de defesa são pilares fundamentais para a credibilidade das instituições e para a confiança da população no Judiciário.
Nesse sentido, a decisão do Sr. Ministro Alexandre de Moraes, que bloqueou as contas da empresa Starlink no Brasil, traz à tona questões fundamentais que envolvem não apenas a liberdade econômica e a segurança jurídica, mas também o respeito ao Estado democrático de direito e ao devido processo legal.
Diversos juristas apontaram um ponto preocupante na decisão do Ministro Alexandre de Moraes: a confusão entre entidades jurídicas distintas e a generalização do bloqueio de bens de uma empresa como forma de coação em relação a outra.
A decisão do Ministro está vinculada ao pagamento de multas aplicadas à rede social X pelo descumprimento de decisões judiciais brasileiras. Entretanto, a Starlink, embora seja de propriedade do empresário Elon Musk, é uma empresa completamente distinta, com objetivos, estrutura, sócios e atuação próprios. Starlink e X são pessoas jurídicas independentes, com personalidades e responsabilidades separadas perante a lei.
A legislação brasileira até permite a responsabilização de empresas do mesmo grupo econômico, mas diante da comprovação de fraude ou desvio de finalidade, além de exigir procedimentos legais para isso e a garantia do direito da defesa. Sem a observância das hipóteses legais e do devido processo legal, não se pode desconsiderar a personalidade jurídica de uma parte do processo e atingir outra pessoa jurídica que não integra aquele processo. Portanto, qualquer medida restritiva imposta por uma autoridade pública deve ser estritamente dentro dos limites da lei.
O respeito à personalidade jurídica é essencial para a segurança das relações econômicas e comerciais. Punir uma empresa pelos atos de outra, ainda que sob o controle do mesmo proprietário e fora das hipóteses legais, cria um precedente perigoso, que gera insegurança jurídica e compromete o ambiente de negócios no Brasil. E segurança jurídica é essencial para a manutenção da confiança dos investidores, tanto nacionais quanto internacionais.
Decisões abruptas e sem a devida transparência afetam negativamente a imagem do país como um ambiente seguro para negócios. O Estado precisa atuar de forma previsível e estável, garantindo que as regras sejam claras e aplicadas de maneira equitativa a todos e, sobretudo, sem retrocessos na busca por inovação, inclusão social, investimentos estrangeiros e desenvolvimento social e tecnológico.
O princípio da proporcionalidade deve sempre ser observado em decisões que envolvam restrições de direitos e impacto social. O bloqueio das contas de uma empresa sem que todos os requisitos processuais sejam devidamente respeitados pode ser considerado uma medida excessiva e desproporcional.
Finalmente, cabe ressaltar que o direito à liberdade de expressão e comunicação também poderia ser impactado por decisões que limitam a atuação de empresas de telecomunicações. A Starlink tem como missão expandir o acesso à internet em áreas remotas e subdesenvolvidas, como é o caso da Região Norte do Brasil. Ao impedir a operação de uma empresa que pode trazer melhorias significativas para a inclusão digital no Brasil, corremos o risco de prejudicar o direito da população ao acesso à informação e conectividade, infringindo direitos fundamentais e direitos humanos.
Destaco que a ONU consagrou o acesso à internet como direito humano, e esse grave impacto social só foi dissipado porque a Starlink – consciente de sua função social e reconhecendo que muitas escolas e até hospitais em áreas remotas, como é o caso da Região Norte, dependem da conexão ofertada pela empresa, comprometeu-se a continuar oferecendo a conexão à internet, mesmo sob o impasse de não poder cobrar pelo serviço diante do bloqueio de suas contas.
Não é razoável que questões de tamanha relevância para a economia e para o desenvolvimento social do país sejam decididas de forma monocrática, sem a participação colegiada dos demais integrantes do Supremo Tribunal Federal. Penso que decisões com tamanho impacto social e com o potencial de agravar desigualdades sociais e regionais deveriam se submeter ao princípio da colegialidade, com base em debates amplos e no consenso dos Srs. Ministros.
É por isso que, por mais sensível e controversa que seja a questão, o devido processo legal deve prevalecer, guiado pelos princípios constitucionais que nos regem. Somente assim, com respeito às leis e aos direitos de todos, poderemos fortalecer nossa democracia e garantir um ambiente em que as liberdades fundamentais coexistam com a responsabilidade social.
Portanto, Sr. Presidente, eu, sobre um tema que está em voga nos dias de hoje na sociedade brasileira e que tem afligido a todos, indistintamente a todos os brasileiros, que, obviamente, está sob a decisão do Sr. Ministro Alexandre de Moraes e que deve ser submetida ao Colegiado... nós entendemos que o X, o antigo Twitter, bem como esse braço do satélite que dá o poder de comunicação para as populações mais remotas, nas condições mais adversas possíveis, onde não há possibilidade de retransmissão de sinais, causam uma perplexidade enorme e, ao mesmo tempo, uma preocupação gigantesca.
O Exército e a Marinha do Brasil, que têm acordos com a Starlink, sabem, e o Brasil inteiro sabe, e as autoridades nacionais sabem, e os próprios Srs. Ministros do STF sabem: é fundamental a interconexão via satélite com esse sistema para que se possa ter a comunicação em tempo real, porque, senão, ficar-se-á à deriva, sem nenhuma comunicação, dificultando todas as atividades de ordem técnica para que se possa garantir a segurança do nosso país, daquelas embarcações e daqueles equipamentos militares que utilizam, em tempo real, esse sistema.
Sem falar, também, de nós que vivemos na Amazônia. Hoje, praticamente, a Starlink é um sistema que faz com que nós nos comuniquemos com o mundo, com o mundo real, 24 horas por dia, em qualquer lugar que estejamos, seja no meio da floresta, seja nos rios, seja nas áreas de serra, seja nas comunidades indígenas distantes; através da Starlink nós temos a única forma de comunicação em tempo real.
E, apesar dos pesares, apesar das decisões tomadas recentemente, que no mérito cabem apenas ao Supremo, nós entendemos que nós não podemos hoje, na era cibernética, na era da tecnologia avançada, na era das comunicações, obviamente, ficar sem esse instrumento poderosíssimo que nos dá, na verdade, o direito de, em tempo real, nos comunicarmos com o mundo.
Portanto, imaginem o desastre que não será para todo o país, mas especialmente para a Amazônia, onde as distâncias são gigantescas, onde as dificuldades de comunicação são enormes, onde nem sempre as torres com as antenas de comunicação de satélites estão disponíveis. Starlink, basta você instalar um equipamento de menos de 1kg de peso, pode ser instalado numa viatura, pode ser instalado em um barco, pode ser instalado em uma comunidade indígena, em uma escola que seja, em um hospital. E nós ficarmos, na verdade, sem essa possibilidade de uso.
Portanto, nós acreditamos que haverá um consenso, que haverá um entendimento. É necessário que haja unidade no essencial, que é exatamente esse entendimento entre empresa e o Poder Judiciário brasileiro, para que, na verdade, instrumentos tão importantes como o Twitter também e a Starlink possam ficar em funcionamento, para ajudar toda a população brasileira.
Portanto, é um momento de extrema preocupação. Deixo aqui este registro. Conclamo as autoridades brasileiras, o Presidente da República, o Presidente do Supremo, o Presidente do Congresso Nacional, em uma verdadeira parceria e entendimento, porque, como já disse, é necessário que haja um entendimento e que haja uma convergência. Afinal de contas, para que vale o peso e a energia que se gasta com uma briga? É a mesma energia que se gasta com o entendimento.
Então nós acreditamos que para o bem do Brasil, é necessário que a população brasileira não fique 24 horas sobressaltada com essas decisões. Conclamamos os dois lados para chegarem a um entendimento, e podermos normalmente voltar à normalidade com o sistema de comunicação através do Twitter e através da Starlink.
Muito obrigado, Sr. Presidente.