Discurso durante a 150ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Insatisfação com a decisão judicial que anulou as condenações do ex-Ministro José Dirceu no âmbito da Operação Lava Jato, e reflexão sobre a importância do combate à corrupção para o desenvolvimento do país.

Autor
Sergio Moro (UNIÃO - União Brasil/PR)
Nome completo: Sergio Fernando Moro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Poder Judiciário:
  • Insatisfação com a decisão judicial que anulou as condenações do ex-Ministro José Dirceu no âmbito da Operação Lava Jato, e reflexão sobre a importância do combate à corrupção para o desenvolvimento do país.
Publicação
Publicação no DSF de 30/10/2024 - Página 42
Assunto
Organização do Estado > Poder Judiciário
Indexação
  • INDIGNAÇÃO, DECISÃO MONOCRATICA, GILMAR MENDES, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ANULAÇÃO, CONDENAÇÃO, EX-MINISTRO, JOSE DIRCEU, CRIME, CORRUPÇÃO, OPERAÇÃO LAVA JATO.

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR. Para discursar.) – Senadores, Senadoras, público presente, presidindo a sessão o ilustre Senador Marcos Pontes, hoje o país recebeu atônito a notícia dessa decisão da anulação das condenações do ex-Ministro José Dirceu na Operação Lava Jato – esse que é um dos grandes símbolos da corrupção do PT, dos Governos do PT, dos Governos do Lula.

    E quem diz isso não sou eu, é o Supremo Tribunal Federal. No caso do mensalão, na Ação Penal 470, o Relator, o corajoso Ministro Joaquim Barbosa, deixou muito claro o papel de protagonista e de mentor do ex-Ministro José Dirceu no direcionamento de pagamento de suborno para a compra de votos de Parlamentares federais naquele que, até então, era conhecido como o maior escândalo de corrupção do país. Foi, no entanto, depois superado pela Operação Lava Jato.

    E eu retomo aqui dados da sentença que proferi, Senador Girão, na época, sentença proferida em 2016. E o que dizia a sentença? Que em um contrato da Petrobras com a Engevix, cerca de 0,5% a 1% havia sido pago em suborno, o que dava um valor de mais de R$50 milhões, sendo cerca de R$15 milhões direcionados em benefício do Ministro José Dirceu.

    Quem diz isso não sou eu, não fui eu na sentença. Isso é que se omite em todas as anulações de condenações da Lava Jato, todas essas sentenças confirmadas em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Nessa, em particular, confirmada a condenação por corrupção no Superior Tribunal de Justiça.

    E, de repente, se cria uma fantasia, uma narrativa que não tem base fática nenhuma de que teria havido alguma espécie de perseguição, de conluio em relação ao ex-Ministro José Dirceu. As provas nesse caso não se baseavam apenas na palavra de um colaborador. Havia prova documental. Havia um registro documental dos valores indo do contrato da Petrobras para pagamentos em benefícios do ex-Ministro. Tanto era assim que eu me lembro muito bem, presidi a audiência, de que o ex-Ministro não teve condições de negar que aquele dinheiro o tinha beneficiado, mas, para buscar evitar a condenação e criar um álibi, ele afirmou que era um empréstimo, que ele havia recebido um empréstimo do intermediador de propina, de suborno no caso da Petrobras.

    É claro que era um álibi que não se sustentava, primeiro, porque não tinha contrato, não tinha dinheiro voltando. Era só dinheiro indo para ele. Não era nada declarado em nenhum lugar. E, é claro, também não correspondia à realidade dos fatos, como afirmado pelo intermediador de propina que fez o acordo de colaboração premiada.

    Agora aonde nós vamos chegar com essas anulações por decisões monocráticas aqui, diga-se, contrariamente ao parecer do Procurador-Geral da República, que disse que "esse caso não tem nada a ver com o anterior", que era o caso do Lula – sobre o qual eu também já me manifestei? A meu ver, um baita erro judiciário, que acabou resgatando o ex-Presidente das suas condenações por corrupção, da sua responsabilidade, inclusive política, pelos esquemas de corrupção descobertos, do mensalão, e descobertos na Lava Jato. Aqui falo de responsabilidade política, porque aconteceram durante os Governos dele.

    Mas agora se estende esse mesmo entendimento, com menos base ainda – com base fática nenhuma –, numa narrativa fantasiosa, que seria um passo para se chegar ao ex-Presidente Lula, e se beneficia aquele que o próprio Supremo Tribunal Federal identificou como mentor de um grande esquema de corrupção chamado mensalão. Mas aonde nós vamos chegar com isso? Quando se abdica da justiça, quando se deixa a integridade de lado, quando a honestidade é abandonada, aonde nós vamos chegar?

    Nas últimas semanas, foram premiadas com o Nobel de Economia pessoas como Daron Acemoglu, que tem livros escritos, como, por exemplo, Por que as nações fracassam. E, entre os temas que estão sendo tratados nesse livro – dele também com James Robinson –, fala-se que é importante, para o crescimento econômico de um país, ter instituições de qualidade. E, entre essas instituições de qualidade, nós temos o império da lei, o chamado rule of law, que exige que as pessoas sejam tratadas de maneira igual, tanto para receberem os benefícios sociais, os benefícios do Estado, como também para responderem pelas infrações da lei quando assim agirem.

    Não há crime mais grave do que a corrupção, porque ela atinge a própria noção básica de sociedade, porque ela atinge os fundamentos da democracia, que é baseada na ideia de que os governantes têm que governar para os governados, e não para a busca do seu interesse pessoal ou do seu enriquecimento pessoal.

    E, quando a gente vê, neste Governo Lula, a política do vale-tudo, em que se abandonou por completo a prevenção e o combate à corrupção e em que, inclusive, vitórias pretéritas no combate à corrupção vêm sendo sistematicamente demolidas, sem que haja razões para tanto, a indagação é: aonde nós vamos chegar com este país?

    Como é que você vai defender para o cidadão comum que vale a pena ser honesto, que a lei deve ser respeitada? Quais são as bases e os fundamentos que nós estamos construindo para este país?

    Repito ainda – e eu nego isso – que, se nas minhas condutas houvesse algum vício, alguma parcialidade em relação a esse caso, o que jamais houve... São fatos objetivos, reconhecidos em sentença, com fatos, provas e lei. Essa sentença havia sido mantida pelo Tribunal da 4ª Região, pelo STJ. Nós vamos acreditar que todos estavam envolvidos, então, em uma gigantesca conspiração para perseguir politicamente alguém, para condenar um inocente?

    E vejam esse dado, que é interessante: até hoje, eu não vi nenhuma condenação da Operação Lava Jato ser reformada ou anulada com o argumento de que o condenado era inocente. Não ousam fazer isso, Senador Cleitinho, porque as provas são categóricas; todos nós sabemos o que aconteceu. Não são palavras de colaboradores, há prova documental, há confissões de corruptores, há confissões de corrompidos. Outros países reconhecem esse trabalho: recentemente, ouvimos a notícia, lá do Peru, da condenação do ex-Presidente Alejandro Toledo por ter recebido subornos da Odebrecht. Se fosse no Brasil...

(Soa a campainha.)

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) – ... essa condenação seria anulada, não porque o Alejandro é inocente, mas porque a justiça, hoje, está sendo posta de lado com o reconhecimento de vícios processuais que são inexistentes. E a nossa grande indagação é: aonde nós vamos chegar com isso?

    Agora, nós estamos vendo a resposta. A resposta está vindo por meio do eleitor, da população, que sabe que isso tudo está sendo realizado sob as bênçãos do Governo Lula, em que nós abandonamos o combate à corrupção, estamos destruindo as conquistas do passado. Estamos falando para todo cidadão de bem que não vale a pena ser honesto. Isso ocorre durante o Governo Lula...

(Soa a campainha.)

    O SR. SERGIO MORO (Bloco Parlamentar Democracia/UNIÃO - PR) – ... e o eleitor reconhece.

    No Paraná, o PT conseguiu três prefeituras em cidades pequenas, abaixo de 10 mil habitantes. A punição está vindo e virá pelas urnas, mas, independentemente da questão eleitoral, o fato é que não seremos um país desenvolvido, não seremos um país com prosperidade para todas as pessoas se nós não fomentarmos o império da lei, se nós não defendermos a honestidade e a integridade. E essas decisões – como essa, feita em contrariedade, inclusive, ao parecer do Procurador-Geral da República – nos levam para um caminho errado, nos levam para um mundo sem justiça e sem esperança. Mas tenho certeza de que a chama permanece e de que um dia a justiça ainda vai prevalecer nesta terra.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/10/2024 - Página 42