Discurso durante a 104ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas ao pedido de extradição do ex-assessor do TSE, Sr. Eduardo Tagliaferro, acusado de vazar informações sigilosas do Judiciário, e questionamento sobre possível perseguição política e conflito ético entre sigilo institucional e direito da sociedade à informação.

Autor
Marcos Rogério (PL - Partido Liberal/RO)
Nome completo: Marcos Rogério da Silva Brito
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Atuação do Judiciário, Direitos Individuais e Coletivos, Processo Penal:
  • Críticas ao pedido de extradição do ex-assessor do TSE, Sr. Eduardo Tagliaferro, acusado de vazar informações sigilosas do Judiciário, e questionamento sobre possível perseguição política e conflito ético entre sigilo institucional e direito da sociedade à informação.
Publicação
Publicação no DSF de 02/09/2025 - Página 38
Assuntos
Outros > Atuação do Estado > Atuação do Judiciário
Jurídico > Direitos e Garantias > Direitos Individuais e Coletivos
Jurídico > Processo > Processo Penal
Indexação
  • CRITICA, PEDIDO, EXTRADIÇÃO, EX-CHEFE, ASSESSORIA ESPECIAL, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), EDUARDO TAGLIAFERRO, ACUSAÇÃO, DIVULGAÇÃO, DOCUMENTO SIGILOSO, REPUDIO, ATUAÇÃO, MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), ALEXANDRE DE MORAES, AUSENCIA, IMPARCIALIDADE, DESOBEDIENCIA, DEVIDO PROCESSO LEGAL, DENUNCIA, USURPAÇÃO, COMPETENCIA, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, DEFESA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO. Para discursar.) – Sr. Presidente, Senador Eduardo Girão, Sras. e Srs. Senadores, os que nos acompanham pelo sistema de comunicação do Senado Federal... Também faço uma saudação àqueles que nos visitam na tarde desta segunda-feira.

    Sr. Presidente, o tema que me traz à tribuna hoje é novamente essa escalada de crise que o Brasil está vivendo e que envolve especialmente o nosso Judiciário brasileiro, e aqui quero chamar a atenção para a extradição, o pedido de extradição desse ex-servidor, ex-funcionário do Tribunal Superior Eleitoral. O Brasil acompanha com atenção o caso envolvendo o ex-assessor Eduardo Tagliaferro e o Ministro Alexandre de Moraes.

    Recentemente, o Ministro solicitou ao Ministério da Justiça e ao Itamaraty a extradição de Tagliaferro, hoje residente na Itália, sob a acusação de ter repassado à imprensa conteúdos de conversas privadas e documentos considerados sigilosos.

    Aliás, essa semana, Tagliaferro deve...

    O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Fora do microfone.) – Amanhã.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – ... prestar depoimento numa Comissão aqui do Senado Federal. Amanhã, terça-feira, vai participar de uma audiência pública do Senado Federal tratando desse assunto e demonstrando ali evidências sobre aquilo que ele denunciou.

    O SR. PRESIDENTE (Eduardo Girão. Bloco Parlamentar Vanguarda/NOVO - CE. Fora do microfone.) – Amanhã, às 11h da manhã.

    O SR. MARCOS ROGÉRIO (Bloco Parlamentar Vanguarda/PL - RO) – Amanhã, às 11h da manhã, na Comissão de Segurança Pública, portanto, a participação dele.

    Agora, o pedido de extradição contra Tagliaferro se fundamenta em denúncia da Procuradoria-Geral da República, que aponta crimes como violação do sigilo funcional, obstrução no curso do processo, no curso de investigação e coação no curso do processo.

    A Itália, como todos nós sabemos, com quem o Brasil mantém tratado de extradição desde 1989, deverá analisar se o caso se enquadra nos critérios legais. E, quando se fala aqui de enquadrar nos critérios legais, é porque, quando tiver na lei que trata dessas condicionantes para o processo de extradição entre Brasil e Itália... entre os critérios está a motivação. Se a motivação for motivação política, algum tipo de perseguição política de natureza jurídica, há vedação à extradição conforme essa norma entre os dois países.

    Mas há um ponto central que precisa ser debatido. Será que nós estamos diante de um criminoso comum ou de alguém que trouxe a público informações de interesse coletivo, informações de interesse da sociedade brasileira? Estamos diante de um conflito ético? Estamos diante de uma situação em que se deve verificar aquilo que é objeto da investigação, o conteúdo vazado, e o que ele representa no mundo jurídico. E qual é o conflito ético aqui? O que pesa mais. O que pesa mais: o sigilo institucional ou o direito da sociedade de conhecer os bastidores de decisões que afetam a democracia e que, portanto, afetam a vida de milhões e milhões de brasileiros? O que pesa mais? Porque, se você está diante de duas situações, é preciso fazer esse julgamento, esse cotejo.

    As revelações conhecidas como "vaza toga" expuseram práticas internas do Judiciário que jamais deveriam ser tratadas à margem da lei. Isso é um fato que não apenas aqui da tribuna do Senado Federal, vez ou outra, um Parlamentar denuncia, mas que a mídia nacional, o noticiário brasileiro, a imprensa brasileira denunciou. E aqui, em vez de olhar para os fatos e de se verificar a veracidade e a gravidade daquilo que está sendo denunciado, não, procura-se um mensageiro para enquadrar, ameaçar e punir. E aí eu pergunto: onde é que está a base legal disso dentro de um Estado democrático de direito, dentro do devido processo legal?

    E, nesse ponto, surge a grande controvérsia. O Ministro Alexandre de Moraes, nesse caso, além de vítima direta das revelações, é também o responsável direto pelo pedido de extradição e pela condução do processo. E aí, o primeiro questionamento: trata-se de um vazamento criminoso ou se trata de uma denúncia de fatos relevantes e que a sociedade merece saber, porque ofende o devido processo legal, porque há ali caminhos que não são caminhos do direito? E outro ponto: aquele que está a denunciar e que está, ao mesmo tempo em que denuncia, também processando e agora determinando a extradição é vítima. Mas em que situação de normalidade institucional, democrática, legal isso seria possível, isso seria aceito? Veja, eu repito: o Ministro que pede a extradição é vítima das revelações, mas ele também é o responsável por tocar o processo, tocar o inquérito, determinar providências, e providências que podem chegar ao ponto de se colocar na cadeia o denunciante. E, não menos grave do que isso, está o pedido de extradição.

     Vem cá, convenhamos: qual é o pano de fundo da extradição neste momento? É uma extradição apenas para trazer para o Brasil: "Olha, esse ex-servidor tem que voltar para o Brasil, porque o Brasil é um país maravilhoso, tem praias maravilhosas, tem cidades maravilhosas, e melhor do que ficar na Itália é ficar no Brasil". É isso? Não. Quer trazer para o Brasil porque quer colocar na cadeia, porque quer determinar uma prisão preventiva. E o que é isso? É coação? É ameaça? É a cultura do medo? É a imposição do medo como mecanismo de controle?

    Veja, Sr. Presidente, eu estou trazendo esse fato para debate no Plenário, porque está se tornando regra. Isso aconteceu em relação aos acusados de envolvimento no 8 de janeiro, na ocupação, depredação, vandalismo que aconteceu nos espaços públicos do Parlamento, do Judiciário e do Palácio do Planalto, e aí você tem novamente alguém que denuncia sendo tratado como criminoso.

    Em qualquer sistema republicano, é inadmissível que alguém seja simultaneamente parte interessada e juiz do próprio caso. Aliás, o Código de Processo Civil do Brasil – e o Código de Processo Penal, da mesma forma – vai deixar claro esse impedimento. O juiz que tem interesse na causa, ou o cônjuge, não pode participar do processo. Isso é um princípio basilar do direito. Agora, ao mesmo tempo, é importante indagar: o uso da extradição nesse caso seria um tipo de perseguição ao denunciante? Isso não afastaria denunciantes? E aí eu estou trazendo uma advertência, porque o que se faz agora a esse ex-servidor do tribunal, a esse ex-assessor é também uma mensagem a qualquer denunciante.

    E aí você tem aqui o Estado, através de um dos seus braços, o Poder Judiciário, dizendo claramente: "Olha, a depender de quem denuncia, o Estado, que deveria proteger o denunciante para apurar o conteúdo que trouxe a público, esse Estado vai inverter: ao invés de olhar para os fatos, ele vai olhar para o denunciante, para desqualificá-lo ou para trancafiá-lo nas grades"!

    E aí eu pergunto: isso não afastaria denunciantes, jornalistas ou cidadãos que se disponham a revelar irregularidades na administração pública e, sobretudo – aqui advirto –, no Judiciário?

    Nós estamos diante de um questionamento que é preciso ser colocado no debate. Mas, além desse aspecto, eu queria trazer aqui que, além disso, essa situação do Tagliaferro revela uma incoerência do nosso sistema de justiça acusatória. Vejam que eu estou trazendo aqui, eu estou cunhando uma frase que não é do dia a dia: Justiça acusatória, porque não é esse o papel do Judiciário.

    Nós entendemos e sabemos, à luz do direito, à luz da Constituição, que o papel de acusação... Dentro da persecução penal, o titular da ação penal pública é o Ministério Público, que se vê, a cada dia, diminuído, com o seu papel relativizado, apequenado, em razão da usurpação desse papel por outro Poder sem legitimidade. Aquilo que era uma exceção nos quadrantes da Corte em razão de um mandamento regimental para crimes cometidos dentro da Corte – não é exceção, portanto – se torna uma prática que vai além das quatro paredes do tribunal, determinando providências a qualquer canto do Brasil. E aí não se importa mais com o que diz a Constituição Federal, com o que diz o Código de Processo Penal ou com o que dizem as legislações especiais que temos. Tudo relativizado – tudo relativizado!

    Mas eu volto a insistir: essa situação do Tagliaferro revela uma grande incoerência do nosso sistema de justiça acusatória. Enquanto se pede a extradição de um homem acusado de repassar informações de interesse público, assistimos a vazamentos de conversas privadas entre o Pastor Silas Malafaia e a família Bolsonaro, diálogos pessoais, sem qualquer caráter público ou institucional, que foram expostos sem autorização judicial, em flagrante violação da intimidade e da legalidade.

    Ora, por que, em um caso, a lei é usada para perseguir ou para reprimir e, em outro, o silêncio das instituições encobre os abusos?

    Não é uma pergunta legítima? Não é uma pergunta coerente?

    Por que, num caso, os rigores da lei, o enquadramento e, em outro, não, está tudo certo, está tudo normal? "Os fins justificam os meios, está tudo certo, nós temos que expor. Falou alguma coisa ali que o seu público, que a sua base não vai gostar, então, vamos soltar, está tudo certo. O negócio aqui é desmoralizar".

    Veja, não se pode permitir, não se pode aceitar com naturalidade que um magistrado, e especialmente um que compõe a mais Alta Corte de Justiça do país, se valha de um expediente de exceção para invalidar a norma constitucional.

    Mais do que o destino de um ex-assessor, este caso coloca em xeque princípios fundamentais: a liberdade de imprensa, a proteção da privacidade, a transparência dos atos públicos e os limites da atuação judicial. São princípios, são questões que precisam ser verificadas, que precisam ser analisadas. Se, de um lado, é dever do Estado proteger informações sigilosas; de outro, é igualmente essencial resguardar o direito da sociedade de conhecer a verdade sobre os seus governantes e as suas instituições, sem seletividade, sem proteção, sem dois pesos e duas medidas.

    O que está em jogo, Sr. Presidente, portanto, não é apenas a extradição de um cidadão brasileiro, mas, sim, a credibilidade do sistema de justiça, a confiança na democracia e o equilíbrio entre poder e liberdade. E isso é um fato relevante!

    Então, cabe a nós, como sociedade e como Parlamento, exigirmos que esse processo seja conduzido com o total respeito ao devido processo legal, sem perseguição e sem abusos de autoridade. O Brasil precisa dar exemplo de que não teme a verdade e de que não confunde denúncia legítima com crime político. O futuro das nossas liberdades depende dessa distinção, depende dessa cautela, desse cuidado.

    Eu repito, esse servidor Eduardo Tagliaferro... Repito questionando, que é o que a gente pode fazer aqui, não podemos fazer muito mais do que isso, mas ainda temos a possibilidade de parlar, de dizer o que pensamos sob duras penas, mas essa é uma prerrogativa Parlamentar. Esse moço, esse servidor, é réu? É acusado? Ou colaborador denunciante? Qual é a posição dele? Qual é a posição desse servidor?

    Quando interessa, o vazamento é permitido; quando atinge adversários, o vazamento é normal e tolerado; mas quando expõe o próprio sistema, aí o vazamento é crime. Nós estamos diante de uma situação que é absurda. Isso não é justiça, isso é seletividade, isso é quebra do sistema acusatório. É a prática dos dois pesos e duas medidas, e essa incoerência destrói a confiança no Judiciário.

    Eu concluo com uma advertência, Sr. Presidente, dizendo que, quando a Justiça se torna parte, perde a condição de julgar; e, quando o silêncio é imposto pela força, a democracia se transforma em mera formalidade. Repito, cabe a todos nós, como sociedade e como legítimos representantes do nosso mundo e da nossa gente, zelar para que isso não aconteça no Brasil.

    Eu, na semana passada, falei, usei uma frase aqui e volto a repetir: não é prática das democracias usar a cultura do medo como mecanismo de controle. O medo como mecanismo de controle é instrumento das ditaduras, não das democracias. E o que me parece muito claro, muito evidente no Brasil, ultimamente, é a busca incessante de se implantar no Brasil a cultura do medo, ora pela condução de processos por vias impróprias, extravasando os limites do devido processo legal, ora com a aplicação de penas desproporcionais, penas exageradas, imputação de crimes inexistentes e com a chancela da mais Alta Corte, o que é ainda mais grave porque aqui você não tem a possibilidade de revisão em nenhuma outra instância.

    Então, eu faço essas advertências.

    Nós vamos ter essa semana o início de um julgamento emblemático – eu vou voltar a esse assunto na tribuna do Senado Federal, trazendo aqui algumas advertências –, e o que está acontecendo hoje no Brasil é algo que vai, no curso da história, nos cobrar um preço muito caro, muito alto, do Brasil e dos brasileiros. Por isso, todo o cuidado, toda a cautela, toda a prudência em momento grave como este que nós estamos atravessando exige de todos, daqueles que estão com a caneta de julgador e daqueles que estão na trincheira da política, a compreensão da complexidade de tudo e, sobretudo, de que acima de todos nós está o Brasil, estão os brasileiros, e sobre todos nós, a nos vincular, está o livrinho da capa verde, a nossa Constituição Federal. Enquanto nós tivermos a Constituição como baliza, como norte, ainda temos ou ainda teremos esperança; mas, quando identificamos, vemos, observamos que essa Constituição é usada quando interessa, mas descartada quando não interessa, aí nós estamos diante de uma situação de uma gravidade sem parâmetros para a história do Brasil.

    Ou nós obedecemos à nossa Constituição e observamos o devido processo legal como instrumento do Estado democrático de direito, ou nós estamos perdidos e o Brasil vai de mal a pior.

    Deus abençoe o nosso Brasil!

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/09/2025 - Página 38