Discurso no Senado Federal

DIVERGENCIA DE ALGUNS PRINCIPIOS DO RELATOR DA REVISÃO CONSTITUCIONAL, SR. NELSON JOBIM, PRINCIPALMENTE QUANTO A REDUÇÃO DO NUMERO DE VEREADORES POR MUNICIPIO, A EXTINÇÃO DOS VENCIMENTOS DE VEREADORES E A REDUÇÃO DA REPRESENTAÇÃO ESTADUAL.

Autor
Jonas Pinheiro (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/AP)
Nome completo: Jonas Pinheiro Borges
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • DIVERGENCIA DE ALGUNS PRINCIPIOS DO RELATOR DA REVISÃO CONSTITUCIONAL, SR. NELSON JOBIM, PRINCIPALMENTE QUANTO A REDUÇÃO DO NUMERO DE VEREADORES POR MUNICIPIO, A EXTINÇÃO DOS VENCIMENTOS DE VEREADORES E A REDUÇÃO DA REPRESENTAÇÃO ESTADUAL.
Publicação
Publicação no DCN2 de 18/02/1994 - Página 766
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCORDANCIA, ORADOR, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, NELSON JOBIM, DEPUTADO FEDERAL, RELATOR, REVISÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REDUÇÃO, NUMERO, VEREADOR, EXTINÇÃO, VENCIMENTOS, ALTERAÇÃO, REPRESENTAÇÃO POLITICA, ESTADOS.

    O SR. JONAS PINHEIRO (PTB - AP. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Senadores, embora reconheça a importância do trabalho do Relator do Congresso Revisional, seu grande valor e saber jurídico, me permito, em nome do futuro de nossas instituições políticas, divergir, de forma clara e muito firme, de algumas idéias do Deputado gaúcho, Nelson Jobim. Considero, principalmente, que essas propostas do Relator que, segundo algumas fontes ele apresentará como emenda à Constituição, reduzindo o número de vereadores por município, a que retira o salário dos edis que representam cidades com menos de dez mil eleitores e a que reduz de oito para quatro o número mínimo de deputados por Estado.

    Não entendo as razões que levaram o Relator a aceitar essas emendas embora saiba, como todo o mundo, que se trata de um político experiente e um jurista de capacidade largamente reconhecida, mas que, no caso, está se comportando como alguém que não tem nenhum conhecimento da realidade brasileira. Minha surpresa, por essa estranha iniciativa, é que ela mostra, através desse pensamento, total desconhecimento do que ocorre, efetivamente, em nosso País. Isso parece ser conseqüência da visão política de alguém que nunca saiu, com a profundidade e a acuidade que o assunto merece, dos Estados do Sul.

    Vendo a questão com a ótica do realismo legal, chega-se, sem muito trabalho, à conclusão de que reduzir o número, de vereadores, mandar cortar os salários é subtrair conquistas, direitos assegurados, pois certamente desconhece o ilustre Deputado Relator, que os salários pagos aos vereadores, e essa situação aplica-se ao Brasil inteiro, retornam sob a forma de benefícios sociais. Ele talvez, também não saiba, até agora, que mais de 70% dos municípios brasileiros não têm hospitais, não oferecem qualquer tipo de assistência social, não pagam, sequer, o salário mínimo. Tem elevadíssimos índices de desemprego, não tem produção, por isso não pensam em produtividade e são constituídos por populações que vivem no mais duro e absoluto padrão de pobreza. E os vereadores, esses grandes abnegados da política municipal, com os parcos subsídios que recebem em grande maioria, acabam surgindo como a única forma de socorro dessa gente tão sofrida quanto abandonada. Os vereadores, os prefeitos de municípios que vivem praticamente sem outro tipo de renda a não ser aquilo que lhes destina o Fundo de Participação dos Municípios, e que não ousam cobrar tributos porque a população não tem meios de pagá-los, são os que terminam desenvolvendo importantes programas de assistência aos eternos desamparados. Isso, sem nenhuma cor retórica, é um quadro encontrado, com facilidade, em mais de 70% dos municípios e é uma verdade que e ser desconhecida ou relegada a um segundo plano. Então, por causa desses condicionantes ter um vereador a mais é ter um prestador de serviço à população a mais, porque, em grande maioria, o que percebem dos cofres municipais, não é utilizado, quase sempre, no custeio da sobrevivência de suas estruturas familiares. Geralmente, e isso é outra verdade nacional, eles gastam muito mais do que recebem como edis, com a própria população pobre, as grandes legiões de miseráveis sempre abandonadas pelo poder público.

    Se considerarmos a verdade imutável que o município, o Estado e a União não atendem adequadamente o que estabelece a Constituição, não garantem a educação, a saúde e a segurança, a importância sociológica do vereador cresce muito. São esses cidadãos que se devotam à causa pública, que por isso se encaminham pela política, que cercados pelas tremendas pressões sociais é que passam a dispender seus recursos pessoais e os que ganham através do mandato público, para socorrer os carentes de tudo. Essa é infelizmente a triste realidade de nosso País.

    O mesmo raciocínio se estende para ação dos deputados estaduais, eles também, prestadores de serviços sociais, que ajudam exaustivamente as populações de seus Estados, principalmente naqueles municípios que se constituem na sua base de atuação.

    Já com relação à redução do número de deputados federais o que se vê, e isso faz parte da realidade do meu dia-a-dia político, é que nos Estados do Norte e do Nordeste, que são os mais pobres, sendo, portando, os mais fracos politicamente, de menor expressão no todo da nacionalidade, é ali que se quer mexer. Se além da pobreza, uma constante para as duas regiões, que lhe pesam e amarram, lhe retirarem, como se estaria pretendendo, forças, substância política, é o mesmo que se dar um ponta pé em quem já está morto. Essa é uma constatação dolorosa, exatamente nesses Estados onde a miséria campeia e se impõe, é que se pensa tirar, reduzir bancada e poder de fogo em defesa do povo. É desse quadro de pobreza que tem surgido deputados federais quase sempre ferrenhos lutadores na batalha destinada a conseguir recursos destinados a alimentar a infra-estrutura de suas regiões. Subtrair forças políticas nesse caso é como se tirar sangue de quem já está profundamente anêmico, de forma que um deputado a mais para qualquer Estado do Sul, significa muito menos do que um deputado a mais para um Estado do Norte ou do Nordeste.

    Por causa da representatividade política, há que se considerar, também, que hoje, os Estados, sejam eles ricos ou pobres, não se constituem numa individualidade. eles são uma parte do todo que é o País. Isso fica patente a toda a hora e a todo o momento. Por exemplo, quando no exterior se fala, em Amazônia, uma região de que me orgulho de ser um dos representantes nessa Casa, não se fala num Estado. Se fala em vários Estados que compõem aquela enorme parte do nosso País. Por isso, a defesa dessa Amazônia, tão decantada como cobiçada, se desenvolve através da força das parcelas da representação dos vários Estados que a integram. Tirar força política dos Estados Amazônicos é retirar força política de uma vasta zona brasileira, tão desejada por muitas nações estrangeiras fortes e poderosas, e que está permanentemente sob a ótica cobiçosa dos interesses dos países ricos, dos chamados integrantes do Primeiro Mundo.

    Por causa do que acabo de expor, de mostrar com todas as cores e tons, é que deploro esse pensamento, essa idéia do Deputado Nelson Jobim, por não estar embasada numa reflexão aprofundada do conhecimento da realidade que vivemos.

    Sou, portanto, Sr. Presidente, Srs. Senadores, totalmente contrário à redução das bancadas de vereadores, e a retirada do salário dos edis que representam cidades com menos de dez mil eleitores, e sou contrário exacerbadamente, à redução do número de deputados dos Estados menos populosos, pois em razão de suas muitas necessidades, eles, todos eles, deveriam ter mais representantes na Câmara dos Deputados. A alteração ideal na Constituição, considerando as grandes carências dos Estados pobres, seria a de dar mais força política a quem é pobre economicamente e pobre socialmente. Essa é que é a inteireza de meu pensamento.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 18/02/1994 - Página 766