Discurso no Senado Federal

CRITICAS AO BANCO DO BRASIL, QUE PERDEU O SEU PAPEL HISTORICO DE BANCO DO AGRICULTOR, EXECUTANDO PEQUENOS LAVRADORES.

Autor
Ronan Tito (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MG)
Nome completo: Ronan Tito de Almeida
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
AGRICULTURA.:
  • CRITICAS AO BANCO DO BRASIL, QUE PERDEU O SEU PAPEL HISTORICO DE BANCO DO AGRICULTOR, EXECUTANDO PEQUENOS LAVRADORES.
Aparteantes
Darcy Ribeiro, Jarbas Passarinho.
Publicação
Publicação no DCN2 de 10/02/1994 - Página 634
Assunto
Outros > AGRICULTURA.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, BANCO DO BRASIL, EXECUÇÃO, DIVIDA AGRARIA, PEQUENO AGRICULTOR.
  • DEFESA, NECESSIDADE, SUBSIDIOS, ATIVIDADE AGRICOLA, PAIS, RESPONSABILIDADE, GOVERNO FEDERAL.

    O SR. RONAN TITO (PMDB - MG. Pela ordem. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, na verdade devo registrar com alegria que "toda" a Bancada do PT já adentrou no plenário do Senado Federal; de maneira que, precisamos completar as outras Bancadas, para que possamos ter quorum para a votação da matéria.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, vamos falar de agricultura, enquanto não conseguimos o desejado quorum? Será que agrada?

    Nesses dias, tivemos a aprovação pela Câmara dos Deputados de Decreto Legislativo determinando que o Banco do Brasil pagasse as viradas dos planos. A "virada do plano" significa o mesmo que, às vezes, vemos na lapela dos paletós e nos vestidos das donzelas funcionárias públicas - URP. Isso que a agricultura sozinha está pagando e que trouxe desespero e pânico ao Banco do Brasil.

    Embora o Banco do Brasil tenha sido, no passado, banco de fomento; hoje, é o único banco que não fez acertos até agora com os seus inadimplentes.

    Aliás, inadimplência virou crime. Normalmente, Sr. Presidente, quando há inadimplência junto aos bancos brasileiros, em 90% dos casos - não deixo por menos - a culpa é dos juros altos, do sistema bancário. Mas, pela primeira vez, descobrimos uma inversão de valores: os agricultores brasileiros são párias, e o agente financeiro, herói. Que coisa bonita essa inversão da história!

    Outro dia, ouvi um comentarista político de uma importante rede de televisão dizer "tomar dinheiro do Banco do Brasil para perdoar fazendeiros...". Eu queria pedir para esse comentarista que ele pensasse um pouquinho, todos os dias, depois de acabar de comer o arroz com feijão, o bife, o ovo, nesse dito fazendeiro que produziu aquela comida e mandou para ele, para o seu gabinete de ar refrigerado, em sua comodidade de viver na “Ilha da Fantasia.”

    Todo o sistema brasileiro montado desfavorece o agricultor. A agricultura, em todos os países do mundo, a começar pela China Comunista até os Estados Unidos, país super capitalista, é subsidiada e protegida pelo Governo. No Japão, não existe profissão mais nobre do que a de agricultor, nem a de professor. E, olhem, professor lá é tido como profissional de primeira linha do sistema. Os japoneses devem ter razão: eles pensam que sem comida a pessoa não vive; nem aprender, aprende. São os japoneses que pensam assim. Aqui no Brasil, não! O importante é o banco, o importante é o Banco do Brasil.

    Nobre Senador Darcy Ribeiro, ontem citei o desabafo de V. Exª quando se referiu à Universidade de Brasília, que V. Exª ajudou a criar, mas V. Exª estava falando com muita raiva dessa universidade que ajudou a criar. Lembro-me quando V. Exª disse: é como se uma filha querida fosse para o prostíbulo.

    Esse Banco do Brasil que tantos serviços prestou à comunidade brasileira - foram 180 anos de serviço - , agora virou propriedade de uma corporação e de um partido corporativista.

    Outro dia vi na televisão, no programa Globo Rural - que acredito que muitos dos Srs. Senadores não assistiram porque o horário é para roceiro, creio que é às 9 horas da madrugada de domingo, mas eu carrego essa praga de madrinha, o cheiro da terra, sou agricultor, padeço desse mal de maneira congênita, meu avô foi agricultor, meu pai também e meus filhos continuam nessa mesma senda - descobri que a culpa de tudo é, sem dúvida nenhuma, dos agricultores; a culpa não é dos economistas que fizeram a virada de nenhum dos planos.

    Todos os funcionários deste País já pediram a sua URP, a virada dos planos e a recomposição dos planos. Ah, mas o agricultor, só no Plano Verão, levou uma facada de 47%. Sabem como foi? Na virada do plano o preço mínimo foi rebaixado de acordo com o tabelamento, mas o financiamento, a correção monetária e os juros, não. Então, muitos, a partir dali, ficaram inadimplentes. Criminosos, não é?

    No entanto, nenhum banco particular aceitou aquela condição. Chamou os seus clientes, acertou com todos, sabem por quê? Por uma questão de inteligência. Ontem conversei com um banqueiro, nosso Colega Senador José Eduardo, e pergunte para ele: Você tem algum caso? Ele respondeu: De jeito nenhum. Chamei o pessoal, acertei com eles e reintegrei esse pessoal na questão produtiva, o que trouxe ganhos para o banco também.

    No Banco do Brasil eles foram excluídos. Sabe qual é o processo, nobre Senador Jarbas Passarinho? É expulsar esse pessoal do campo e para as beiradas das cidades e fabricar aquelas famosas coroas de espinhos de Dom Paulo Evaristo Arns; depois, é faz uma reforma agrária. Engraçado, não é? Pegamos a pessoa que está quase que antologicamente enraizada na terra e tomamos a terra dessa pessoa.

    Vi um agricultor no programa Globo Rural, a que me referi ainda há pouco, chorando. Um homem de cerca de 60 anos. Também, quem mandou: dois anos antes, ele havia ganho um prêmio de produtividade de feijão no interior de São Paulo e ficou inadimplente porque ousou.

    Vejam só, agricultor também é muito pretensioso. Ele viu uma linha elétrica passar por dentro da sua propriedade e quis colocar eletricidade em sua casa. E o custo daquele transformador, a correção monetária e mais a inadimplência o que fizeram? Fizeram esse homem ir para a beirada da cidade porque foi tomada sua propriedade, que foi a leilão. É possível que, no leilão, um grande industrial de São Paulo a compre para fazer reserva de capital porque a terra é uma reserva de capital segura - ou, no futuro, vão fazer uma reforma agrária, isto é, colocar lá dentro pessoas que nunca fizeram agricultura, para desacreditar a reforma agrária...

    O Sr. Jarbas Passarinho - Permite V. Exª uma incursão desprimorosa no belo discurso de V. Exª?

    O SR. RONAN TITO - Ouço V. Exª com muita honra. Aliás, hoje de manhã, queria saudar a volta de V. Exª à tribuna. Como faz falta a fala de V. Exª nesta Casa!

    O Sr. Jarbas Passarinho - Muito obrigado. V. Exª é um gentil-homem. Mas, veja, a minha audácia, nesta primeira parte dessa minha incursão, é tentar modificar o queixume do nobre Senador Darcy Ribeiro. Audácia minha porque, pobre membro da Academia Paraense de Letras ou da Academia Brasiliense, vou falar sobre uma frase dita - como V. Exª revelou - pelo membro da Academia Brasileira de Letras. Não diria, nobre Senador Darcy Ribeiro, que está me ouvindo através de um aparte que dou ao Senador Ronan Tito, que era como - como V. Exª disse - uma filha que estivesse indo para um prostíbulo; penso que era melhor que ele dissesse: "uma filha que estivesse indo para o patíbulo". Seria mais grave. Seria bem mais grave. O segundo ponto, é com relação a essa questão da agricultura e da pecuária subsidiada. O Ministro Cabrera diria a nós - no período em que eu servia o meu príncipe malogrado - que a vaca, na França, tem um subsídio de 2.100 dólares por ano.

    O SR. RONAN TITO - Nos Estados Unidos, 2.560 dólares de subsídio por ano.

    O Sr. Jarbas Passarinho - Bem mais do que a média da renda per capita da maioria dos países subdesenvolvidos. Então, esse é um ponto que me parece importante, porque a justificativa que S. Exª disse que ouviu do seu colega, do seu correspondente na França, era precisamente essa: que a França preferia investir nesse subsídio para evitar um gasto muito maior, que seria o êxodo rural para as grandes cidades. E aí vinham problemas de todos os serviços públicos que deveriam ser fornecidos; a partir de casa, alimentação, que são os problemas que encontramos na favelização das cidades brasileiras. Então, é muito mais barato subsidiar. Esse era, realmente o ponto importante. Era esse tipo de contribuição, pálida para o discurso de V. Exª, mas completado por alguma coisa que me parece muito importante, sobretudo aos homens de Governo que aqui se encontram, os Partidos que apóiam o Governo: é que eu acabo de saber - e isso eu pediria a V. Exª, que conhece a matéria muito bem - que todo esse escândalo feito a respeito dos 97 bilhões de dólares não teria a menor razão de ser. Subitamente, é como se fosse um sortilégio. Como!? Então, um escândalo daquele não tem valor!? Não tem. Por quê? Ouvi dois parlamentares dizerem, ainda há pouco, que o que a Câmara fez foi sustar.

     O SR. RONAN TITO - Perfeito.

     O SR. Jarbas Passarinho - E, sustando, não provoca nenhum tipo de ressarcimento a posteriori. Nada. Tudo que estivesse para trás seria apenas esquecido. E, daqui para a frente, seria sustado. Eu não sei se isso modifica completamente aquilo que vamos discutir no Senado da República a partir da apreciação desse Projeto.

    O SR. RONAN TITO - Nobre Senador, hoje, com essa popularização da maquininha japonesa, fazer umas contas de multiplicar, dividir, somar, as operações todas, e depois raiz quadrada, ficou popularizado. Não é mais privilégio dos economistas. Agora inventaram esses microcomputadores, ficou muito fácil. Pelos números oficiais fornecidos, se verdadeiramente se perdoasse todas as diferenças dos Planos, na verdade a perda do Banco do Brasil aproximar-se-ia de 3 bilhões de dólares.

    Agora, aquilo é uma invenção danada; é uma invenção gloriosa. Aliás, isso acontece com relação a números no Brasil porque este é um País que não tem estatística. O Próprio IBGE não nos fornece as estatísticas desejadas.

    Mas, de repente, alguém inventa um número. Querem ver um número muito bem inventado: o Brasil tem 32 milhões de pessoas ao nível da miséria. Pelo amor de Deus! Não são 31 milhões e 500 mil, não? Não são 29 milhões e 800 mil? Não são 40 milhões? Mas, onde é que arranjaram esse número tão exato? Sei que são muitos. E se fossem 30 mil, já seria um escândalo. Não estou questionando a luta para acabar com a miséria e com a fome; não é isso; é a desenvoltura da invenção das estatísticas.

    V. Exª, uma vez, citou alguma coisa que eu também li, de Benjamim Disraeli, numa biografia extraordinária de André Malraux, em que ele diz que existem diversas maneiras de tapear o povo, de ilaquear a boa-fé pública: a primeira delas é mentindo descaradamente, como fez o PT, agora, numa flagrante inconstitucionalidade, quebrando o sigilo bancário, afrontando a Constituição, em seu art. 5°, e mentindo; porque alguns que eles disseram que estavam inadimplentes, não o estavam. Mas isso passa a ser verdade, e passa a ser um absurdo, tendo em vista as pessoas que foram caluniadas. Essas pessoas vão ser usadas, porque transitaram em julgado.

    O Sr. Darcy Ribeiro - Nobre Senador Ronan Tito, sinto-me em falta por pedir licença para dizer uma palavra. Gosto muito de ouvi-lo e gostei também de ouvir o nosso nobre Senador Jarbas Passarinho. Sinto que é uma pena fazer esta intervenção. Mas houve uma referência a uma filha e quando alguém se refere a uma filha nossa, há que se dizer alguma coisa. Efetivamente, uma vez eu disse esta frase de mau gosto: a Universidade de Brasília é minha filha que caiu na vida.

    O SR. RONAN TITO - Eu quis amenizar com prostíbulo, mas lembro-me bem da frase.

    O Sr. Darcy Ribeiro - O objetivo que eu tinha era o de que se a minha filha havia caído na vida, eu queria tirá-la da má vida. Não falei isso para jogar a filha no patíbulo; falei que era preciso fazer alguma coisa; que o Brasil não podia passar sem uma universidade da mais alta qualidade em Brasília. Falei no sentido de que “caiu na vida”; e, de fato, nos últimos anos, ocorreram coisas terríveis na Universidade, que estava num estado deplorável. Era preciso que ela saísse daquela situação, porque o Brasil precisa dela. E agora quero dar uma boa notícia ao Senado e ao País: minha filha está-se recuperando; está com um Reitor magnífico, quase esplêndido. Acabo de firmar com ele um convênio de irmandade com a nova universidade que estou criando no norte do Estado do Rio de Janeiro; para implantar, no Brasil, curso superior de educação à distância. Essa é a inovação mais importante que há no ensino superior no mundo; esse programa será feito em conjunto com a Universidade de Brasília e a Universidade Norte-Fluminen se. Portanto, a minha filha, que prevaricou uma vez, está sendo recuperada e vai muito bem. Muito obrigado, Senador.

    O SR. RONAN TITO - Eu que agradeço. Todos entendemos o desabafo de V. Exª O meu desabafo é também nesse sentido. Quero ter esperanças, mas não é a esperança do "Pedro-pedreiro", que espera sentado, ou espera ganhar na loteria; é a esperança cristã, é a esperança redentora, que faz alguma coisa para alcançar o que espera.

    Que o Banco do Brasil se recupere; que deixe de ser especulador, como ou mais do que os outros.

    Peço aos Srs. Parlamentares - não sei se aqui existe algum Senador que, às vezes, entra no vermelho do seu cheque-ouro. Parece que uma vez houve uma confissão pública de um senador, no sentido de que havia uma brigada vermelha aqui dentro, que é o pessoal que freqüenta sempre o saldo negativo na conta-ouro do Banco do Brasil.

    Verifiquem quanto o Banco do Brasil está cobrando, Está cobrando a módica taxa de 70% ao mês. Será que isso não traz uma certa desilusão? Quem, durante 15 anos, fez discursos, subiu à tribuna e defendeu o Banco do Brasil como o mais extraordinário e eficiente sistema de crédito às mãos do Governo, para levar o desenvolvimento, o fomento da agricultura, da indústria e do comércio pelo interior do País?

    Será que não causa uma certa irritação ver esse Banco - que já foi chamado de "Banco do Agricultor", o banco que mais financiava agricultura no mundo, ganhava até do Credit Lyonnais, da França executando agricultores de 90 hectares? Transformando aqueles agricultores em vilões da sociedade, e o agente financeiro em herói? Agricultores que não agüentaram a virada das URP, dos planos, dessa invenção diabólica dos economistas brasileiros; os únicos que estão sendo obrigados, pelo Banco do Brasil, a pagar.

    Mas eu descobri outro bandido: é o grande produtor. Então, vou dizer agora aos agricultores: se alguém ainda obstinar-se em produzir, plante menos de quatrocentos hectares, porque, senão, será execrado na Comissão de Assuntos Econômicos pelos Líderes do Governo, porque é grande agricultor. Quem planta 450 hectares aqui é considerado grande agricultor.

    Eu, que sou do ramo, gostaria de dizer-lhes uma coisa: 450 hectares é a medida exata para se ter uma colheitadeira, e soja só se colhe com colheitadeira. Então, uma propriedade de 450 hectares é um módulo agrícola. Gostaria de lembrar que 40% do PIB brasileiro é agrícola, e isso ocorre graças não somente aos pequenos agricultores, mas também aos grandes.

    Gostaria de dar um conselho aos Srs. Senadores e a todos aqueles que são contra os grandes agricultores: antes de comer o arroz, o feijão, verifiquem a sua origem, porque pode ser que esse arroz ou esse feijão tenha vindo de um criminoso, de um grande produtor.

    Agora estou entendendo Olacyr de Moraes, que saiu do Brasil e está plantando na Bolívia: como era o maior produtor de soja do mundo, deve ter sido olhado com desconfiança e até ter sido incriminado. Somos de um país grande, que requer grandes soluções para os seus grandes problemas; por isso, requer também uma elite dirigente com grandeza. Com pequenas soluções não resolveremos os problemas do Brasil.

    A propriedade do maior empresário brasileiro, cantado em prosa e em verso, é um décimo da do maior empresário da Coréia.

    Ficamos impressionados porque o Grupo Ermírio de Moraes fatura três bilhões de dólares. O maior grupo da Coréia fatura perto de 46 bilhões de dólares, e os coreanos têm orgulho dele. Aqui temos antipatia dos empresários. Queremos construir capitalismo criticando nossos empresários. Vai ser fácil, não é mesmo? Muito fácil!

    Ontem, na Comissão de Assuntos Econômicos, não se tratou de um assunto muito importante, muito interessante: quando nós agricultores ainda teimamos em plantar neste País, arriscamos tudo, pois temos de enfrentar não só essa economia louca, mas também as intempéries. Além disso, assinamos, obrigatoriamente, um seguro que se chama PROAGRO, que não é um seguro agrícola, que existe em todos os países civilizados; é seguro de banqueiro, porque só segura o financiamento que o banco fez.

    Quando vence o financiamento, o agricultor vende uma parte, paga o banco e depois vai receber o PROAGRO, porque teve uma frustração de safra constatada, mas este não paga. Há duzentos, trezentos, quinhentos ou mil processos contra o PROAGRO transitados em julgado. O juiz mandou pagar, mas o PROAGRO diz que não tem recursos. Recebeu o pagamento compulsório de 2% sobre o valor do custeio e depois não paga.

    Há esses parlamentares imbecis - que não são muitos -, que se metem a defender agricultores. Se vão ao Banco do Brasil, lá são informados: isso é com o Banco Central. No Banco Central, dizem já ter passado para o Banco do Brasil, que diz que isso é com o Tesouro. Já me perdi nesses caminhos.

    Uma coisa eu sei: sou Presidente da Comissão da Evasão Fiscal. Quem não paga impostos, quem foge do pagamento é sonegador, é criminoso e, segundo o Secretário da Receita, tem de ir para a cadeia. E o Estado inadimplente, que não cumpre os seus compromissos?

    O Presidente do Banco do Brasil disse para o Brasil inteiro ouvir: assinei um contrato com os agricultores, liberei as duas primeiras parcelas e a terceira não vou liberar. Ele rompe unilateralment e o contrato, e todos batem palmas para ele. Bem-feito! Quem mandou esses agricultores procurar o Banco do Brasil?! Ele não disse o que fez, verdadeiramente.

    Então, eu lhe disse: Presidente, não fica bem para nós ouvir isso de V. Sª. Por quê? Porque já pensou se nós, Parlamentares, dissermos que só votaremos o plano do Ministro Fernando Henrique Cardoso se V. Sª levantar esse bloqueio? haverá chantagem de um lado e de outro. Será que vamos governar este País com chantagens?

    Justiça seja feita: o Presidente Itamar, ontem à noite, antes da votação, mandou desbloquear, e os contratos foram levantados.

    A minha irritação contra o Banco do Brasil é grande por aquelas razões, que o nobre Senador Darcy Ribeiro, Senador pelo Rio de Janeiro e meu conterrâneo, para muita honra de todos os mineiros, conhece muito bem. Estou irritado com o Banco do Brasil, sim, principalmente pela influência extraordinária que esse banco teve no desenvolvimento da agricultura brasileira e na expansão das pequenas indústrias pelo interior, mas estou muito mais irritado com a imprensa brasileira, porque a mídia brasileira, toda ela, está a serviço de quem paga propaganda. É evidente! E agricultor não paga propaganda. Sabemos que, se abrirmos qualquer jornal, se ouvirmos qualquer canal de televisão, qualquer um, veremos as manchetes: os bandidos dos fazendeiros estão querendo tomar o dinheiro suado do Banco do Brasil.

    É de matar de pena! Coitado do Banco do Brasil, não é?! Há uma coisa que ninguém comenta: uma sentença dada num processo de funcionários do Banco do Brasil - justamente sobre a virada dos Planos - , que está engavetada no Supremo Tribunal Federal e que, se for executada, quebrará o Banco do Brasil, uma vez que o total de sua dívida é da ordem de 20 bilhões de dólares. Vinte bilhões de dólares! Quem me contou isso foi um Ministro do STF, que disse: "Como vou despachar essa sentença do jeito que foi colocado? O Estado não se defendeu. A coisa caminhou aqui dentro da maneira que quis a corporação. Se for executada a sentença, são 20 bilhões de dólares."

    Esses são patriotas, com representação de grandes bancadas aqui, enorme bancada no Senado e outra enorme bancada na Câmara dos Deputados.

    O corporativismo é a maneira mais antiga e mais retrógrada da manifestação política. No entanto, aqui é tido como progresso. Não conheço nenhuma manifestação mais retrógrada e mais antiga do que a manifestação política corporativista. Mas aqui, no Brasil, isso quer dizer progresso, idéia progressista. Muito bem!

    Sr. Presidente, estou recebendo telefonemas e telegramas dos agricultores do Brasil e gostaria de dizer que o Senado Federal, e muito menos este Parlamentar, não quer quebrar o Banco do Brasil. O que queremos? Queremos que a Diretoria do Banco do Brasil desça do seu pedestal de glória, converse e acerte com os agricultores.

    Há poucos dias, tive o privilégio de relatar uma resolução complicadíssima, pois trata da dívida dos Municípios e dos Estados com a União, da União com o exterior, etc. Havia interesses conflitantes de todos os lados: dos Municípios com os Estados, dos Estados com a Federação, da Federação com a banca internacional, do Banco Central. O que fiz? Fiquei 30, 40, 60, 90 dias conversando com as partes, como pode confirmar o Presidente da Comissão de Assuntos Econômicos, Senador João Rocha. No final, batemos o martelo, fizemos acordo. O que querem os agricultores? Querem fazer acordo, querem conversar, querem parlamentar. Com seu jeito muitas vezes não muito erudito, as unhas sem esmalte, pouco à vontade nos gabinetes com ar refrigerado, porque para eles a caneta é muito mais pesada do que a enxada, querem conversar, querem contar a sua história.

    Eu queria fazer um pedido aos representantes da imprensa aqui: ouçam também os agricultores, em homenagem àquele prato de arroz com feijão que você come todo dia na sua casa.

    Gostaria de fazer uma observação pequena: querem ver como tudo está montado contra a agricultura? Já viram como, por exemplo, a Rede Globo, ou a Manchete, ou o SBT, qualquer uma dessas cadeias de televisão, noticiam o tempo?

    Dizem: "Tempo bom". Bom para quem? Para uma praia. Tempo bom no Nordeste é quando chove, não é, Senador Mauro Benevides?

    O Sr. Mauro Benevides - Perfeitamente, nobre Senador.

    O SR. RONAN TITO - Mas o imaginário está voltado para o homem urbano, que recebe a comida quentinha no prato sem se preocupar com todo o processo que ela passou até chegar a sua mesa. Uma vez, da tribuna, eu falei para o General Figueiredo, quando ele estava no Poder e chamou os fazendeiros de gigolôs de vaca: olha o respeito, General. Estribo mais curto com quem manda o leite quentinho para a sua boca e a de seus filhos.

    O Sr. Iram Saraiva - Mas ele preferiu o cheiro de cavalo.

    O SR. RONAN TITO - Ele não gostava do cheiro de fazendeiro; gostava só do cheiro de cavalo.

    Sr. Presidente, eu gostaria que os agricultores falassem - eles sabem falar - mas que fossem ouvidos, e que contassem também a sua parte da história. Inadimplência, quando há, verdadeiramente, de um agricultor com um banco, noventa e nove por cento da culpa é do banco, não do agricultor. Criminoso não é o inadimplente, mas o banco, que não quis acertar com seu mutuário. Será que é possível invertermos essa historiazinha e brincar um pouquinho de falar a verdade neste País? Será que é possível brincar de falar a verdade, com tanto discurso mentiroso, com essa mídia que distorce tudo? O Brasil é um elefante amarrado num pé de cenoura.

    O Ministro Fernando Henrique Cardoso, quando esteve no Canadá, ficou assustado ao comparar os números daquele país com os do Brasil. Os números do Brasil são muitos melhores do que os do Canadá. O Primeiro-Ministro do Canadá disse: "Mas não é possível que os números dos senhores sejam esses!". São! Nós temos uma dívida interna dos "santos banqueiros" - ou do setor financeiro, porque não são só os bancos - de 36 bilhões de dólares, que, em relação ao nosso PIB, é uma dívida pequena que custa 25%. Nós temos uma reserva em dólares guardada no exterior. Nós recebemos 3% pelo valor do depósito e pagamos, para rolar a nossa dívida, 36 bilhões de dólares, uma dívida interna rastreada em moeda forte externa, se não tivéssemos uma economia pujante como a nossa. No entanto, pagamos 25%.

    Mas já sei: os criminosos, os bandidos, como na fábula de La Fontaine, são os agricultores; e os heróis, os agentes financeiros.

    Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 10/02/1994 - Página 634