Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE AS MEDIDAS PROVISORIAS 433 E 434, DE 1994, QUE TRATAM DO ABONO AO FUNCIONALISMO PUBLICO E DA CRIAÇÃO DA URV.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE AS MEDIDAS PROVISORIAS 433 E 434, DE 1994, QUE TRATAM DO ABONO AO FUNCIONALISMO PUBLICO E DA CRIAÇÃO DA URV.
Aparteantes
Amir Lando, Eduardo Suplicy, Esperidião Amin, Gerson Camata, Mauro Benevides.
Publicação
Publicação no DCN2 de 01/03/1994 - Página 908
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ANALISE, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), IMPLANTAÇÃO, UNIDADE REAL DE VALOR (URV), CRIAÇÃO, ABONO, DESTINAÇÃO, FUNCIONARIO PUBLICO, POSSIBILIDADE, FIXAÇÃO, SALARIO MINIMO, TRABALHADOR.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB-RS. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores:

    Tenho em mãos as Medidas Provisórias n°s 433 e 434, publicadas no Diário Oficial de hoje, segunda-feira, 28 de fevereiro, e percebo claramente que o Governo obedeceu a uma estratégia na publicação dessas duas medidas provisórias.

    A primeira delas, a de n° 433, concede abono especial aos servidores públicos civis e militares da União, da Administração Federal Direta, Autárquica e Fundacional. Esses 5%, depois são também referidos na Medida Provisória n° 434, que substancialmente, trata da criação da Unidade Real de Valor - URV.

    Tive o cuidado, Sr. Presidente, Srs. Senadores, de fazer uma leitura acurada e detalhada da Medida 434. E, já no art. 1° , percebe-se claramente que a URV não é apenas um índice, é mais do que isso: é uma unidade de conta que integra o sistema monetário, ou seja, a partir do momento que esta Medida Provisória for publicada os salários, por exemplo, só podem ser contabilizados em URV. Mas, como se sabe, moeda tem três funções: é unidade de conta, é meio de pagamento e reserva de valor. Então, pode-se dizer que a URV é uma espécie de meia moeda porque serve de unidade de conta, mas não é meio de pagamento com poder liberatório, ou seja, nenhum empregador e nem mesmo o Estado podem fazer pagamentos expressos em URV. Os pagamentos dos salários serão feitos pela moeda com poder liberatório que é o cruzeiro real, correspondendo a tantas URVs quantas sejam aquelas creditadas ao trabalhador na forma de salário. Se um trabalhador recebe 500 URVs, ele receberá 500 URVs ao final do mês de março, 500 URVs ao final do mês de abril e assim subseqüentemente até que se crie a moeda denominada de real. 0 Governo dá a si próprio poder e prazo, pois criará essa moeda, o real, no prazo de 360 dias.

    É interessante verificar que o Governo transfere essa possibilidade - se não conseguir cumpri-la - para o próximo Governo, porque em 1° de janeiro de 1995 estará tomando posse um novo Presidente da República.

    Note-se, a URV é unidade de conta, mas não é meio de pagamento e só vale como unidade de conta, ou seja, ela só é "meia moeda" para os salários, pois não é obrigatoriamente aplicável aos preços. Qualquer comerciante, qualquer ente que lide com preços comerciais ou industriais poderá continuar expressando seus preços em cruzeiros reais, tendo a possibilidade de expressa-los em URV. No entanto, é claro que o preço expresso em URV será, na verdade, um preço fixo, de caráter mais permanente.

    Todavia, Sr. Presidente, Srs. Senadores, nem mesmo assim há congelamento de preços, e também não há congelamento de salários; em outras palavras, estamos vivendo no Brasil um estado de choque, que é tanto quanto descabido, eu diria até desproporcional à realidade dos fatos. Há grande mudança de regras operacionais na economia e no sistema monetário, isso é verdade, mas não há uma mudança de fundo, uma mudança real na vida dos cidadãos.

    O que quero dizer é que este não é um plano que contenha congelamento de preços e salários; os preços poderão ser mudados agora à tarde, hoje à noite, amanhã pela manhã, daqui a dez ou vinte dias. Não há controle de preços, absolutamente, não há congelamento de preços. É preciso que se tenha isso bem claro, para entender o processo que estamos vivendo. Ao mesmo tempo não há também congelamento de salários, porque, pela instrução que se segue à medida provisória, ao anexo, e a seguir ao decreto do Presidente da República, percebe-se que Sua Excelência determina que "diariamente o Banco Central irá fixar, com base em índices da Fundação Getúlio Vargas, da FIPE de São Paulo e do IBGE, quais são os índices, correspondentes em cruzeiros reais, da URV do dia seguinte".

    Portanto, na véspera, o Banco Central sempre fixará a URV do dia seguinte, que terá continuidade e se repetirá nos dias que são considerados não úteis da semana.

    Então, o que é importante reparar em primeiro lugar? Que não podemos reproduzir, Sr. Presidente, Srs. Senadores, o mesmo clima emocional e, enganoso do choque econômico do Plano Cruzado ou do Plano Bresser ou do chamado Plano Verão, que continham congelamento.

    De fato, naquela perspectiva, era demasiadamente importante fixas as regras e os valores de entrada no sistema, porque, uma vez entrando no sistema, estava tudo amarrado, engessado, enrijecido, congelado. Mas é muito importante que se saiba que isso agora não acontece. Repito: não há congelamento nem de preços, nem de salários.

    O art. 25 da Medida Provisória diz, de modo muito claro, eloqüente e indiscutível que, após a conversão dos salários para URV, de conformidade com os arts. 18 e 26, que dão a mecânica operacional dessa conversão, continua assegurada a livre negociação e a negociação coletiva dos salários.

    Portanto, dependerá de acordo entre as partes - empregadores e empregados - reverem, tão sistematicamente quanto quiserem, os valores salariais pagos e recebidos.

    Por outro lado, como os preços não estão obrigatoriamente convertidos em unidade real de valor, qualquer comerciante, qualquer industrial, qualquer detentor de preço, pode mudar os preços à hora que quiser em cruzeiros reais porque não há controle do sistema de preços no Brasil, salvo aqueles preços submetidos ao controle público pela via legal. São as chamadas tarifas públicas, os

    preços públicos e os preços oligopolizados que dependem de monitoramento. Fora isso, em qualquer lugar, a variação de preços vai obedecer rigorosamente às leis de mercado, porque os preços são expressos obrigatoriamente em cruzeiros reais ou, facultativamente, expressos em URV.

    A medida provisória estabelece apenas e tão-somente que uma vez divulgado o preço em URV, ou seja, o preço comercial, industrial, sendo divulgado em URV por tabelas comerciais ou industriais, concomitantemente deverá ser apresentado também o equivalente em cruzeiros reais. De modo que a URV é facultativa, mas não é suficiente. A empresa que adotar a URV nos seus preços poderá fazê-lo, mas isso não será suficiente. Obrigatoriamente, ela terá de usar a moeda que é para ela unidade de conta e meio de pagamento com poder liberatório, que é o cruzeiro real.

    Portanto, esse estado de ânimo, que é a síndrome do choque, digamos, que é o comportamento paranóico que cerca os períodos anteriores aos choques econômicos, não pode reproduzir-se nesta situação, neste caso, neste episódio, porque os trabalhadores, por exemplo, que entenderem que houve perdas setoriais pelas conversões estabelecidas segundo a medida provisória, que se baseia na média dos últimos quatro meses, estão, absolutamente, liberados para, juntamente com os seus empregadores, produzirem acordos em livre negociação que restabeleçam os níveis de ganho que entenderem justos e apropriados.

    Não há congelamento, nem de preços e nem de salários. O que há, é, isso sim, a criação de um índice que passa a ser uma unidade de conta, uma unidade de referência, um elemento de referência para o acompanhamento do processo inflacionário que se dá no cruzeiro real dia a dia.

     Toda pessoa que trabalhava com dólar, toda pessoa que pensava em dólar, está acostumada com esse processo. As pessoas que diziam que um automóvel valia 15 mil dólares, hoje dirão que um automóvel vale 15 mil URVs. Como isso vai-se expressar em cruzeiros dependerá do valor da URV no dia, porque a URV vai bater, quase que necessariamente, com o valor do dólar na mesa de câmbio do Banco Central. Não haverá uma diferença, uma defasagem muito grande entre uma e outra.

    O Sr. Mauro Benevides - Permite-me V.Exª um aparte, nobre Senador José Fogaça?

    O SR JOSÉ FOGAÇA - É evidente que eu apenas faço esta observação, Senador Mauro Benevides, para que, ao abrirmos qualquer discussão, qualquer debate, que não o façamos sob o clima de quem está vivendo um plano que contém choque econômico. Nós estamos debatendo um plano que, por certo, tem muitos erros e introduzirá uma série de problemas novos, até de situações críticas setorialmente consideradas. Mas isto advém da natural execução e administração do plano. Os desajustes, os desalinhamentos que ocorrerão poderão ser resolvidos. Nós não estamos entrando num processo de camisa-de-força. É a isso que quero, substancialmente, me referir. Portanto, não é um plano que é despejado sobre nós, nós o aprovamos, ou não, e vamos para casa. Ele exige acompanhamento diário, global, ou seja, sobre o aspecto macroeconômico do plano, e acompanhamento setorial, o quanto ele pode implicar perdas nas variações setoriais que venha a ter nesta ou naquela categoria. Nada que não possa ser remediado, nada que não possa ser recuperado, nada que não possa ser revisto dentro do tempo e das perspectivas que a situação oferece.

    De modo, Senador Mauro Benevides, que não estou fazendo um julgamento definitivo, mas estou apenas, como introdutório, dizendo que estamos diante de um outro quadro. Se nos vestirmos com o sentimento de que estamos sendo submetidos a um choque econômico, a um congelamento, isso nos tira a capacidade de dialogar, de discutir, de negociar, de buscar soluções, porque ficamos amarrados pela sensação. Aliás, o Ministro do Trabalho e Administração acabou passando um pouco para a sociedade a sensação de que este é um plano de congelamento e que, uma vez que entramos nele, não há mais como mudar, não há mais como sair, não há mais como rever, não há mais como recuperar perdas. Não é este o caso; este não é um plano de congelamento; este é um plano que contém uma indexação e uma unidade de conta nova que é a URV.

    Dentro disso, todos os setores, tanto preços quanto salários, poderão fazer o alinhamento que o mercado, que as condições políticas, econômicas lhe propiciarem.

    Existe apenas um problema que é sempre extremamente difícil de enfrentar, uma vez que se trata de forças que estão acima do mercado e que se impõem a ele, quais sejam, os preços oligopolizados. Todavia, os preços oligopolizados têm poder em cruzeiros reais, têm poder em URV, têm poder em real; não adianta mudar moeda, porque não é mudança da moeda nem do sistema monetário que irá conter os preços oligopolizados; é um outro tipo de política que o Governo tem que adotar, qual seja, a utilização das reservas monetárias - hoje da ordem de 35 bilhões de dólares. Esse é um instrumento, hoje, altamente favorável ao Governo, a par de poder utilizar a legislação antioligopólios que existe aí. Há sobretudo instrumentos legais severos nas mãos do Governo. Porém, imaginar que agora os oligopólios vão se "lavar" ou que a situação, que era injustamente favorável a esses setores mudou, não. Nem a URV controla os oligopólios nem os favorece. Oligopólio tem poder econômico em qualquer moeda, Sr. Presidente, Srs. Senadores.

    O Sr. Mauro Benevides - Permite-me V. Exª um aparte, Senador José Fogaça?

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Com prazer, Senador Mauro Benevides.

    O Sr. Marro Benevides - Nobre Senador José Fogaça, V. Exª realmente inicia, na tarde de hoje, uma avaliação preliminar sobre a medida provisória editada ontem, publicada hoje pelo Governo Federal. Naturalmente, têm chegado a V. Exª, a mim e aos demais Senadores uma série de indagações originárias, a maioria delas dos nossos respectivos Estados, a fim de que se esclareçam aquelas dúvidas que, porventura, estejam remanescendo no espírito do povo brasileiro. Sabe V. Exª que, até este momento, não se definiu ainda, em função da URV, já quantificada em 647,50 cruzeiros reais para amanhã, o valor do salário mínimo. Não sei se V. Exª seria capaz de identificar, hoje, o salário mínimo. Ontem, o Ministro Fernando Henrique Cardoso anunciava que o salário mínimo ficaria em derredor de 65 dólares. V. Exª se recorda disso?

    O SR JOSÉ FOGAÇA - O cálculo que a medida provisória permite é este: multiplique 64,7 vezes 647,50 cruzeiros reais, e V. Exª terá o valor do salário mínimo amanhã, que não será o mesmo da Quarta-feira, porque o Banco Central irá fixar um outro valor gradativamente maior em cruzeiros reais.

    O Sr. Mauro Benevides - V. Exª se recorda, nobre Senador José Fogaça, de que, quando se saudou a presença do Ministro Walter Barelli na equipe do Presidente Itamar Franco, exatamente pelo seu aprofundamento em matéria de política salarial, chegávamos a ouvir de S. Exª aquela informação - auspiciosa sob todos os aspectos - de que, como Ministro do Presidente Itamar Franco, haveria de conduzir a política salarial para que o salário mínimo ficasse em derredor de 100 dólares? Não sei se V. Exª se recorda desse prognóstico com que o Ministro Walter Barelli acenou para a grande expectativa das classes trabalhadoras brasileiras. Todavia, neste plano sentimos que aquilo realmente foi apenas um sonho, um vaticínio que, lamentavelmente, não se concretiza, apesar do alarde que fez em torno dela o Ministro Walter Barelli. Então, fica a dúvida: vamos permanecer em torno de 65 dólares ou haverá ainda, mesmo longinquamente, a possibilidade de se chegar àquele patamar que possibilitaria aos trabalhadores brasileiros condições de sobrevivência ideais - senão ideais, pelo menos possíveis - diante da conjuntura social-econômica do País? No caso, fica a nossa dúvida. Esperamos que, gradualmente, as autoridades do Governo busquem dissipar, acenando com algo que possa trazer mais tranqüilidade à classe trabalhadora do País.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - V. Exª tem toda razão quanto a essa observação. Na verdade, o salário mínimo proposto na medida provisória é sacrificial ao trabalhador brasileiro e está abaixo dos mais baixos padrões salariais do Terceiro Mundo. Mas é preciso, antes de mais nada, fazer justiça quanto à medida provisória e à atitude do Ministro da Fazenda. S. Exª não aumentou mas também não diminuiu.

    Hoje pela manhã, Senador Mauro Benevides, tive o cuidado de telefonar a um amigo meu que tem uma empresa no Rio Grande do Sul, que lida com funcionários de serviços gerais. Perguntei-lhe se na sua empresa havia funcionários que recebessem salário mínimo, e ele me disse que todos ali recebem mais de dois. Então, pedi-lhe a média, em dólares, de um trabalhador com dois salários mínimos, em 93, que foi a seguinte: em setembro, outubro, novembro, esses trabalhadores recebiam 130, 135, 140 dólares. A média para trabalhadores de dois salários mínimos, ao longo do ano de 1994, era em torno de 65 dólares, mesmo com aquela política salarial que foi aqui ostensivamente votada no Congresso, com o argumento de que se estava criando um salário mínimo de 100 dólares.

    Em primeiro lugar, não vamos aceitar hipocrisia política. É hipócrita quem diz que já deu ao trabalhador 100 dólares. Nós, brasileiros, não tivemos ainda suficiente vergonha para dar 100 dólares de fato aos trabalhadores brasileiros. Somos muito sutis, enganosos e desonestos neste País, quando dizemos que o valor do salário é 100 dólares no dia I° de fevereiro. Mas quando é feito o pagamento no dia 28, o trabalhador recebe 65 dólares.  

    Ora, não podemos ser cúmplices dessa hipocrisia. Se o Ministro do Trabalho, como V. Exª e como eu, queremos que o salário mínimo seja aumentado para 100 dólares, porque 100 dólares já é muito pouco, essa é uma atitude decente, honesta, esta é a atitude decente, honesta, esta é a atitude de V. Exª. Podemos até reivindicar, demandar; podemos até brigar com o Governo para que este aumente o salário mínimo para 100 dólares; agora, dizer que o salário mínimo já era de 100 dólares é uma grossa e vergonhosa mentira, Senador Mauro Benevides.

    Concordo com o teor da intervenção do Senador Mauro Benevides. De fato, 65 dólares é uma coisa dolorosa, profundamente injusta para um País que tem 450 bilhões de dólares de Produto Interno Bruto.

    O Sr. Gerson Camata - Permite-me V. Exª um aparte?

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Ouço V. Exª, com prazer.

    O Sr. Gerson Camata - Senador José Fogaça, venho acompanhando a sua exposição e vejo que a leitura detalhada que fez do Plano surpreende a todos, porque, na verdade, o essencial do Plano é a sua simplicidade.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - De extrema simplicidade; não há qualquer complexidade.

    O Sr. Gerson Camata - Nenhuma complexidade. Ouvi dizer que inúmeras pessoas foram ao banco, na sexta-feira, retiraram o seu dinheiro e o levaram para debaixo do colchão; hoje, acordaram só com as perdas que tiveram nas aplicações no fim de semana.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Mas esse tipo de atitude é explicável pelo nosso passado recente.

    O Sr. Gerson Camata - Exato.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Podemos explicar e entender que os brasileiros ajam dessa maneira. O que já foi feito com o dinheiro do povo brasileiro é uma coisa extremamente abusiva, desrespeitosa. Quando as pessoas vão aos bancos, tiram o dinheiro e o colocam debaixo do colchão, essa é uma atitude instintiva de defesa.

    O Sr. Gerson Camata - Um amigo do Espírito Santo telefonou-me para perguntar o que eu achava que iria acontecer. Disse-lhe que não iam desaparecer todos os indexadores e viria apenas um, com a diferença de que os indexadores de ontem indexavam tudo, menos os salários, e agora os salários também ficarão indexados diariamente. A diferença fundamental é esta.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Estamos vivendo uma situação socialmente invertida. Veja para o quê V. Exª chama atenção! Eu havia anotado aqui para fazer uma referência a respeito disso. Temos, hoje, apenas um fator da economia que está obrigatoriamente indexado ao dólar ou à URV, que é o salário; nem o Imposto de Renda está indexado, pois está vinculado à UFIR, que ainda subsiste.

    O Sr. Gerson Camata - Até ontem, os preços estavam indexados na cabeça dos comerciantes ou dos industriais, bem como as tarifas públicas na cabeça do Governo, mas os salários não estavam indexados. A única diferença é que o novo indexador atinge somente os salários. A partir de hoje, um trabalhador que ganha um salário mínimo de 65 dólares receberá, efetivamente, ao final do mês, 65 dólares. No primeiro dia do mês, ele poderia estar ganhando 80 dólares, mas no final receberia 55 dólares, porque a inflação corroía o salário dele. Agora, o trabalhador vai receber efetivamente, no final do mês, a quantidade de dólares prefixados em URVs, estipulado como salário mínimo. É um avanço, porque poupa uma perda de 40% no salário de todo mundo no final de cada mês. Até temo que haverá um aumento na massa salarial de 40% todo o mês, que poderá causar uma inflação de demanda e que o Governo tenha de gastar as divisas que tem para quebrar os oligopólios a que V. Exª se referiu, com uma importação maciça de bens de consumo popular, para que esses oligopólios sejam pisados na cabeça e obrigados a concorrer com o preço do mercado internacional. Alguns setores desses oligopólios, como V. Exª sabe, geraram inflação de 101 % em dólar no ano passado.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Acima da inflação.

    O Sr. Gerson Camata - Eles desmoralizaram até a moeda americana, desmoralizam tudo. A partir deste momento, considero que o Governo deva começar a usar essas reservas que pertencem ao povo brasileiro; e penso que esse novo indexador deverá se transformar em moeda dentro de trinta dias, rapidamente, para que as pessoas comecem a fixar não só quanto elas ganham em URV ou em dólar, mas também quanto custa o bem de consumo que elas compram na nova moeda, que deverá ser indexada ao dólar. O Governo vai ter que usar muito dessas reservas cambiais para que se quebre a resistência desses oligopólios, e, por meio da inserção deles, concorrendo no mercado internacional. Mas no início do seu pronunciamento, V. Exª falou claramente que a complexidade do Plano é que ele é simples demais. No entanto, na entrevista dada pelo Ministro Fernando Henrique Cardoso, hoje de manhã, notei que os jornalistas se confundiam.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Os jornalistas e os repórteres também estão vestidos com a idéia de que há um choque econômico e de que há congelamento; todos esperavam que hoje a camisa-de-força fosse amarrada e entrássemos num processo de congelamento de preços e de salários, sem saber que a liberdade de opção que viria daqui para diante, principalmente no nível dos preços, iria permitir que os reajustes fossem feitos de acordo com os insumos, com o processo inflacionário, sem perdas, desde que - é claro - o Governo pudesse, como disse V. Exª, enfrentar os oligopólios.

    Mas o enfrentamento dos oligopólios deveria ter sido feito no período anterior à URV, de modo que se tratasse de um problema permanente, e não da nova moeda, do novo índice, da nova unidade de conta. Não, o oligopólio é um problema permanente. O ano inteiro do Governo Itamar foi de enfrentamento de oligopólios, que são os setores de remédio, cimento e automóveis. Quer dizer, esses setores têm de ser enfrentados mediante a abertura da economia.

    Primeiro, basta reduzir tarifas, ampliar quotas de importação; em seguida, esses setores se acomodam. Quando se iniciou o Plano Cruzado, as nossas reservas monetárias eram pouco superiores a oito bilhões de dólares; quando chegamos a outubro de 1986, mês anterior às eleições, as reservas monetárias já tinham chegado a 2,5 bilhões de dólares.

    Em um país como o Brasil, que tinha um PIB de quase 400 bilhões de dólares e reservas de 2,5, V. Exª percebe claramente que, do ponto de vista estratégico e até de segurança nacional, a situação estava próxima da bancarrota, da crise absoluta do ponto de vista institucional, político e econômico. Aquela situação não poderia persistir; era preciso quebrar a camisa-de-força do cruzado, o que foi feito com o chamado realinhamento de preço, que veio depois, em novembro.

    De modo que essa situação que se produziu em 1986 não poderá e não deverá se reproduzir, porque as nossas reservas monetárias hoje são superiores a 30, chegando quase a US$35 bilhões. Portanto, a folga, a margem de negociação que o Governo tem é muito mais ampla.

    Há uma clareza maior de atuação, por parte do Governo, neste campo, e me parece que este é o intento claro e inequívoco do Ministro da Fazenda: enfrentar os oligopólios, com a abertura da economia e através do art. 34, Senador Gerson Camata, introduzido na medida provisória, que dá um poder que eu diria ser mais um poder político, um instrumento político. Às vezes, um instrumento político é também poderoso. Diz o art. 34:

   "O Poder Executivo, por intermédio do Ministério da Fazenda, poderá exigir que, em um prazo de cinco dias úteis, sejam justificadas as distorções apuradas quanto a aumentos abusivos de preços em setores de alta concentração econômica - ou seja, oligopolizados -, de preços públicos e de tarifas de serviços públicos.

    Portanto, o Governo está fazendo valer essa regra também para si, ou seja, para suas empresas estatais.

       "§ 1° Até a primeira emissão do Real, será considerado como abusivo, para os fins previstos no caput deste artigo, o aumento injustificado que resultar em preço equivalente em URV superior à média dos meses de setembro, outubro, novembro e dezembro de 1993."

    Por outro lado, Senador Gerson Camata, fazendo uma observação quanto ao aparte de V. Exª, a criação da URV não suprime dois outros índices que continuam a vigorar na economia - a UFIR e a TR.

    A UFIR continua valendo para efeito de pagamento dos impostos. O Imposto de Renda será pago calculado o valor de um salário em URV e transferidos os valores de URV para UFIR; portanto, o pagamento é em UFIR. Quaisquer valores sobre tributos, se os valores forem em URV, serão transferidos em UFIR. Se os valores tributados forem em cruzeiros reais, serão transferidos de cruzeiros reais para a URV e de URV para UFIR. Portanto, a UFIR continua sendo a moeda, a unidade de conta tributária do País.

    O Sr. Gerson Camata - Permite-me V. Exª uma intervenção final?

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Pois não.

    O Sr. Gerson Camata - Essa indexação, na verdade, já estava sendo feita nas ruas e em todos os negócios. Nos classificados dos jornais, víamos que o preço dos imóveis estava ancorado no dólar. De um mês para cá, os classificados de jornais já anunciavam os automóveis nacionais em dólar; quer dizer, em URV, na cotação que está estabelecida para amanhã. No interior do Espírito Santo, há poucos dias, numa loja de antiguidades, o vendedor me deu o preço de um relógio antigo em dólar. Eu perguntei a ele: "Você já viu uma nota de dólar?" Ele disse: "Eu nunca vi não, doutor, mas eu tenho a cotação que sai no jornal, porque eu tenho que corrigir o preço todo dia". Então, até mesmo quem nunca viu uma nota de dólar já estava indexando. Essa indexação foi oficialmente passada, agora, para os salários, e as pessoas continuam fazendo a indexação de preços em outro setor. Foi tão simples! Consagrou-se em lei aquilo que já se fazia e se obrigou a fazer para os salários aquilo que não se fazia.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Nobre Senador, é importante relembrar aqui uma observação feita pelo Ministro da Fazenda: não adianta os preços dispararem, porque o mercado vai pegá-los; se os preços dispararem, não venderão, ou, simplesmente, vão se expressar no valor reajustado diariamente da URV, que vale para os salários. 

    De modo que os ganhos que alguém supõe que vá ter num desalinhamento tresloucado de preços, esses ganhos vão ser derrotados pelo mercado ou vão ser repostos pela URV. Daí porque é extremamente importante que os preços realmente não estejam sob controle, porque, com isso, nesse período de 30, 60 ou 90 dias que o Governo vai usar para a introdução da moeda Real, vai haver um alinhamento ajustado e, é evidente, através de uma política de controle e monitoramento do Governo, principalmente diante dos oligopólios.

    De modo, Senador Gerson Camata, que houve uma inversão social de valores políticos. O que se tinha sempre no Brasil era tudo indexado, todos os valores do capital estavam indexados, e o salário, não. Isto foi invertido agora: o capital não está indexado, o salário está obrigatoriamente indexado, e esta me parece uma inversão social de valores políticos altamente importante.

    Há quem diga também, o que é correto - porque estamos numa economia de liberdade de iniciativa assegurada pela Constituição, uma economia livre -, que essa liberdade de mercado permite, por exemplo, que o empregador, ao ver que a transferência para a URV lhe é desvantajosa na garantia das suas margens de lucro, demita e contrate novos funcionários em patamares mais baixos de URV.

    Isso até é possível e talvez por isso tenha sido introduzida uma cláusula na medida provisória, uma cláusula preventiva contra esse processo de demissões que sempre acompanha esses momentos de reorganização simbólica da moeda.

    No art. 29, está assegurada uma indenização em 50% do salário recebido no último mês, em acréscimo a todas as vantagens a que legalmente o trabalhador tem direito. Diz o art. 29:

    "Na hipótese de ocorrência de demissões sem justa causa, durante a vigência da URV prevista nesta Medida Provisória, as verbas rescisórias serão acrescidas de uma indenização adicional equivalente a 50% do último salário recebido."

    Portanto, além do aviso prévio, além das férias, além de um salário, além de todas as vantagens e valores que o trabalhador recebe como verba rescisória, serão acrescidos 50% do último salário, para evitar, ao aumentar o custo da demissão, que estas se dêem em massa.

    O Congresso terá até liberdade para emendar a medida provisória no projeto de conversão, aumentando esta indenização de 50% para o equivalente a um salário inteiro, para exatamente evitar que alguns empresários mal-intencionados se valham deste processo de mudança simbólica da moeda para produzir demissão em massa e baixar o patamar em URV dos salários que paga.

    Dito isso, Sr. Presidente, quero crer que pude fazer uma pequena introdução de análise. Há muita coisa a dizer, há muita coisa a observar diante desta medida provisória, mas nós vemos que ela cuida de vários elementos, de vários fatores da economia.

    A medida provisória, inicialmente, trata do salário mínimo; depois, dos salários em geral; depois, dos benefícios da Previdência; a seguir, dos proventos dos aposentados, do sistema de Seguridade Social, ou seja, do INSS; depois, do salário dos funcionários públicos; e, depois, dos proventos dos aposentados no setor público, estabelecendo, sempre, que a média, em URV, será estabelecida pelos últimos quatro meses.

    Para que os trabalhadores do setor público venham a receber o valor médio, em URV ou em dólares, que deveriam receber pelo reajuste a ser dado na lei salarial do funcionalismo para março, na Medida Provisória anterior, a de n° 433, foi acrescido um abono de 5%, que deverá ser aplicado para corrigir essa defasagem.

    O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Pois não, nobre Senador.

    O Sr. Eduardo Suplicy - Seria importante que, no Congresso Nacional, nós tivéssemos a precaução de não identificar a URV com o dólar. O Ministro Fernando Henrique Cardoso procurou ontem, de alguma forma, distinguir que, inicialmente, a URV equivalerá a 1 dólar, mas não necessariamente essa paridade continuará, visto não ser interessante. Os próprios economistas que formularam esse Plano, ao longo dos últimos dois meses, tiveram o cuidado de ressaltar que as medidas de contenção da inflação não significariam a dolarização da economia brasileira. Devemos ter em mente que não seria adequado termos uma moeda nacional que não fosse nacional, porque se passarmos a ter o dólar como moeda nacional, teremos como base daquilo que estiver ocorrendo na economia brasileira o que for de maior interesse da economia que tem o dólar como moeda. Faço aqui uma observação de precaução, pois certamente teremos oportunidade de analisar em maior profundidade as razões deste cuidado. Em segundo lugar, V. Exª salientou o aspecto do controle dos preços ou o não-abuso dos preços por parte dos oligopólios - conforme consta do art. 34. Ali está estabelecido que as câmaras setoriais, sobretudo, poderão examinar se houve abuso na marcação dos preços, em especial tendo como parâmetro a média dos preços praticados nos últimos quatro meses de 1993. Mas aqui - e esse é um aspecto que pode ser melhorado pelo Congresso Nacional - falta definir qual a sanção que será imposta para a empresa que tenha abusado na marcação dos seus preços. Contudo, poderemos ainda, no Congresso Nacional, debater o aprimoramento deste tema. Há algo importante no que diz respeito ao que as autoridades vinham afirmando, até há semana passada, e ao que foi publicado hoje. O Ministro Fernando Henrique Cardoso salientou, durante os últimos dois meses, que poderia a sociedade, os agentes econômicos e, inclusive, os trabalhadores abraçarem ou não a idéia da URV, pois ela seria introduzida voluntariamente. Observamos que, para os trabalhadores, trata-se de um abraço compulsório. Ainda que possam depois negociar, do ponto de vista dos que recebem salário mínimo, os salários do setor privado, os salários do setor público, as regras mínimas são compulsórias. Sobre essas regras, eu também certamente terei a oportunidade de, como V. Exª, estar discutindo melhor. Todavia, gostaria de salientar que considero importante o objetivo da estabilização dos preços. O Governo tinha que adotar medidas nessa direção, qual seja, a da consolidação da moeda. Faltam, entretanto, ingredientes, dentro do que se espera do Governo Itamar Franco, com respeita à melhoria da distribuição da renda e à erradicação da miséria.

    O Sr. JOSÉ FOGAÇA - Muito obrigado, Senador Eduardo Suplicy. De fato, seria até despiciendo fazer essa observação não fosse ela tão importante.

    É evidente que URV não é dólar. Às vezes, entretanto, cometemos o deslize, o engano, muito mais um erro político, de usar a expressão dólar em lugar de URV. Se o Governo estivesse fazendo uma conversibilidade de dólar em cruzeiro, aí, sim, todo o meu pronunciamento seria uma monumental besteira, porque iniciei afirmando que esse não é um Plano camisa-de-força; se o Governo estivesse dolarizando a economia, ou seja, vinculando, com paridade absoluta, o dólar e o cruzeiro, ou o dólar e a URV, então seria camisa-de-força, engessamento da economia, submissão dos setores produtivos a tendências vindas das forças econômicas externas ao País.

    Portanto, até por óbvia demais, a observação de V. Exª passa a ser importante porque é preciso ter bem claro que URV e dólar são coisas completamente distintas. Haverá uma taxa fixada para o dólar pelo Banco Central e uma taxa fixada para a URV. Coincidindo ou não, este instrumento de política monetária, para assegurar competitividade às mercadorias exportadas pelo País, não pode ser jogado por terra, não pode ser abandonado. A taxa de câmbio do dólar é um importante instrumento e um importante fator competitivo para o comércio exterior brasileiro e para a competitividade dos nossos produtos. Se o Governo amarrasse nessa camisa-de-força o cruzeiro e o dólar, a URV e o dólar, ele estaria destruindo esse instrumento para assegurar a nossa soberania, a nossa independência, a nossa agilidade de política de comércio exterior.   

    De modo que, quanto a essa observação, só tenho a dizer que ela é extremamente óbvia, mas não desnecessária.

    No que diz respeito à segunda referência feita por V. Exª, parece-me importante analisá-la. V. Exª não entrou muito no mérito de cada questão, apenas levantou pontos que poderiam ser vistos e analisados, com o que não só concordo quanto desejo ver realizado, pois, com certeza, há aspectos a melhorar.

    O art. 34, que trata do mecanismo antioligopólio, é mero jogo político de palavras. Chamar empresários para dizer que o Governo está descontente com o que aconteceu, parece-me uma atitude demasiada ou excessivamente branda para o poder de fogo que têm essas empresas de grande concentração.

    Por outro lado, restou a nós, Congressistas, uma boa margem de trabalho nesse campo. Já temos uma lei antitruste no Brasil; todavia, podemos introduzir aqui instrumentos eventuais, circunstanciais para o caso dos mecanismos novos de moeda. Nesse ponto concordamos também plenamente.

    Quanto à questão do controle de salários, ou seja, quanto à compulsoriedade da transformação dos salários, só concordo com V. Exª no que diz respeito aos salários do setor público. De fato, nós, trabalhadores do setor público, não temos outra escolha; estamos presos à URV até I° de janeiro de 1995, quando, espero, já seja o Real e não mais a URV.

    Pergunto a V. Exª: Em um ano de eleição como este, num ano de Revisão Constitucional como este, num ano de dificuldades políticas como este, haveria outra política salarial que não aquela que estava em vigor para o funcionalismo e que nos dava, a cada dois meses, apenas 50% da inflação, quando os demais trabalhadores tinham 60%?

    Para os funcionários públicos há uma entrada compulsória na URV, mas, reconheçamos, com ganhos, porque não tem mais aqueles meses de pico e de vale, ou seja, cume da montanha e profundezas do mar. Esta era a realidade dos nossos salários, dos salários do setor público: havia meses, como o de janeiro, com grande pico em valores reais e meses subseqüentes de uma perda consistente do poder aquisitivo, de um empobrecimento real dos trabalhadores.

    A manutenção das médias, pelo menos, está assegurada, sem perda de poder aquisitivo. Só o fato de ser possível planejar e saber que seu salário não perde 40% do valor ao longo de 20 ou 30 dias, já é uma conquista notável e importante. Mas não significa que tenha havido melhora, que venhamos aqui dizer que entramos no melhor dos mundos. Diria que, no máximo, ficamos mais ou menos onde estávamos em termos de padrão salarial do funcionalismo público. E concordo com V. Exª que não podemos mudar.

    Esta é, digamos assim, a área submetida ao gesso, à camisa-de-força: a área relativa aos salários do setor público. Primeiramente, porque a regra é compulsória; em segundo lugar, porque somente o Governo mandando outra lei é que poderá haver modificação; e, em terceiro lugar, porque não podemos mudar a medida provisória nessa parte, pois seria inconstitucional. Se produzirmos um projeto de conversão alterando as regras do funcionalismo público, determinando aumento de despesa, estaríamos eivando de inconstitucionalidade o projeto de conversão.

    O Sr. Eduardo Suplicy - Permite V. Exª um aparte?

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Aí concordo com V. Exª: no campo do funcionalismo, realmente estamos amarrados. Concedo o aparte a V. Exª.

    O Sr. Eduardo Suplicy - Acredito que, no diálogo com o Governo, poderíamos imaginar, como exemplo: para o funcionalismo público, o Governo considerou a média dos últimos quatro meses - tinha considerado a média dos últimos oito, a média dos últimos doze meses. Para os trabalhadores do setor privado, foi permitido uma certa flexibilidade de negociação na data - base para recompor, de acordo com a média dos últimos doze meses, se esta for a melhor.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Bem, isto vale também para o funcionalismo - V. Exª leu -, só que em primeiro de janeiro, que é a data - base dos funcionários federais.

    O Sr. Eduardo Suplicy - Pois bem, no meu entender, o Congresso poderia propor esta mudança: que se dê a liberdade de considerar os últimos quatro, os últimos oito ou os últimos doze meses - na verdade, já se sabe que são os últimos doze meses o período que daria a melhor média para um setor ou outro, em especial para o funcionalismo. Por que não dar essa margem de liberdade ao servidor público, ao trabalhador do setor privado, já no primeiro mês de entrada? Creio que podemos apresentar, aqui no Congresso Nacional, esta sugestão.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Avalio que, se essa modificação representar aumento das despesas, estaríamos vedados a fazê-la. Agora, a sugestão de V. Exª é criativa e viável.

    No bojo das negociações da aprovação da medida provisória - o diálogo entre o Congresso e o Governo terá de ser intenso nesses trinta dias -, pode-se introduzir, como um dos elementos de negociação, a melhora dessa média para a obtenção da URV, porque, de fato, os últimos quatro meses são de aceleração da inflação e de baixos níveis salariais do setor público, principalmente novembro e dezembro.

    Agora, não esqueçamos que a URV de I° de março não será a mesma no dia 25, quando os trabalhadores do setor público receberem os seus salários, e, portanto, terá um reajuste de 40% posto em cima do valor de hoje e mais os 5%, já assegurados pela Medida Provisória n° 433.

    De modo que me parece, por obra e ação do Ministro Walter Barelli, que já houve obtenção de valores muito próximos dos doze meses, Senador Eduardo Suplicy. Não tenho esses cálculos e não poderia dizer com a tranqüilidade e a certeza que uma observação como esta exige, mas me parece que a idéia já é, ao criar a Medida Provisória n° 433, introduzindo um abono de 5% ao funcionalismo, de aproximar-se do índice que seria produzido pela média dos doze meses.

    O Sr. Amir Lando - Permite V. Exª um aparte?

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Concedo o aparte a V. Exª.

    O Sr. Amir Lando - Nobre Senador José Fogaça, V. Exª aborda em primeira mão um tema estrepitoso que constitui a preocupação da Nação inteira. Parabenizo-o por abordar essa questão e parabenizo também - pois avalio que merece ser saudada - a iniciativa do Governo de tentar nesta hora alguma providência para debelar a crise econômica que assola o País. Todavia, entendo que, em termos abstratos e em termos acadêmicos, o Plano até pode ser analisado de um ponto de vista do êxito plausível, possível. Mas o Plano não é bom porque foi bem escrito; o Plano será bom se executado corretamente.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Exatamente. Quanto a isso V.Exª fez uma observação extremamente aguda. Esse Plano não é daqueles que dependem do dia de começar - como os anteriores: dado o choque, o resto ia atrás. Agora, não; agora, temos um Plano que dá patamares, premissas e pressupostos e que, depois, a execução, competente ou não, vai torná-los bons ou maus.

    O Sr. Amir Lando - Exatamente, V. Exª antecipa algumas observações que eu faria, mas, de qualquer maneira, facilita e abrevia o meu aparte. O resultado é que realmente dará os critérios para a avaliação definitiva. Nós temos de saber dos ganhos sociais desse Plano e isso, parece-me, dependerá da sua correta execução - como V. Exª dizia -, da competência na sua execução e sobremodo da capacidade de corrigir as distorções que advirão. Porque há, por trás de tudo isso, uma elite que não quer plano, mas vantagens, se possível lícitas; se não for possível, também as ilícitas. Há uma elite que não está interessada na felicidade geral da Nação, mas que quer ganhos e mais ganhos, dando continuidade a um processo de enriquecimento sem parâmetros na História deste País e, talvez, na História Universal. Esse me parece o ponto e a determinação do Governo que vai decretar o êxito ou não desse Plano. V. Exª já apontou - quando eu imaginava fazer o aparte, essa questão ainda não havia sido tratada em profundidade - sobre o artigo relativo aos monopólios e os oligopólios. Esse combate não pode ser, como bem disse V. Exª, um amontoado de palavras. Deve, sim, ser um programa claro, definido, determinado e rígido, porque aí está exatamente o terreno da liberdade, necessária nas relações econômicas, mas, sobretudo, da liberdade abusiva. É neste local que está a sede e a competência para o Governo realmente afirmar o êxito desse plano. Por isso, neste particular entendo que devamos meditar e dar uma contribuição.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - E nós temos condições para isso. Nada nos impede de introduzir elementos.

    O Sr. Amir Lando - Perfeitamente. Não se trata daquelas matérias de iniciativa exclusiva do Poder Executiva, mas, ao contrário, de matérias que reclamam a parceria do Congresso. Por outro lado, para concluir, devo dizer a V. Exª que também sou daqueles que têm algum entendimento de que há perdas salariais, ao menos neste momento de partida do plano. Não há dúvidas de que há um expurgo de parte da inflação e de que já se começa com algum prejuízo. É claro que conheço o discurso de que se a inflação for debelada, etc, os ganhos virão depois. Só que nós saímos da certeza da perda para a incerteza do ganho. E é isso que constitui a pedra angular, o lugar-comum de todos os planos: a primeira conta sempre é do trabalhador. Esta primeira conta quem paga é o trabalhador. O resto é dúvida. E eu não quero ser contra o plano. Desejo a melhoria das condições de vida do povo brasileiro. Creio que o Brasil tem condições de acertar, porque se não começarmos realmente com a resolução dos problemas e das dificuldades desta Nação, vamos nos encaminhar para a desagregação social, territorial e da própria Nação como um todo. Fico naquela expectativa, como Thomas More na Utopia: Eu desejo mais do que espero. Obrigado.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Obrigado, Senador Amir Lando. De tudo o que V. Exª falou, eu apenas iria reforçar ou enfatizar um aspecto que me pareceu o que mais se destaca daquilo que foi observado e mencionado por V. Exª, a questão dos ganhos sociais.

    Senador Amir Lando, V. Exª pode até dizer que é discurso, que é falatório, que é falação vazia...

    O Sr. Amir Lando - Não chego a tanto.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Não chega a tanto, mas poderá quem quer que seja fazê-lo.

    O Sr. Amir Lando - Apenas disse que é um discurso racional, mas que me deixa na dúvida.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Não há duvida que sabemos que os elementos de força, a correlação de forças no sistema em que vivemos é extremamente desvantajosa para os trabalhadores, mas isso não é produto da URV, é produto do sistema capitalista.

    Agora, o que eu gostaria de observar é o quanto é importante concentrarmos esforços no combate à inflação, porque V. Exª pode dizer até que isto é um pouco de discurso, é um pouco de tese, é um pouco de teoria, mas não há exemplo, na história econômica mundial, em que salários tenham derrotado os preços em períodos inflacionários; ou seja, o salário só ganha, só cresce proporcionalmente nos períodos de estabilização. Em qualquer modelo de desenvolvimento, seja o europeu do pós-Guerra, pós 45, seja o desenvolvimentista dos países asiáticos nos anos 80, seja o de retomada da América Latina com o México, o Chile e a Argentina...

    O Sr. Amir Lando - E também é preciso desmistificar - permita V. Exª que o interrompa - uma premissa usada constantemente, a de que o salário é causa da inflação. Isto também não é verdadeiro.

    O SR JOSÉ FOGAÇA - Vamos ver agora como não é.

    Então, veja V. Exª o quanto é importante concentrarmos, intensificarmos a nossa atuação no campo do combate à inflação, porque combater a inflação não é melhorar salários. Combater a inflação é assegurar os meios pelos quais os trabalhadores podem conquistar um patamar melhor.

    Eu tinha em mãos até ontem uma revista, produzida pelas indústrias rio-grandenses, que mostrava que o número de greves no Brasil decresceu radicalmente, na mesma proporção em que se deu o aumento da inflação. Então, vamos verificar que nos períodos de estabilidade aumenta o número de greves nas fábricas; nos períodos de grande processo inflacionário cai o número de greves. O que isso significa? Significa claramente que a inflação retira do trabalhador um instrumento de barganha poderoso, que é o direito de greve, na prática. Só com estabilidade é que o trabalhador pode fazer greve sem quebrar a empresa, sem perder o emprego, para conquistar melhor salário.

    Portanto, a inflação é o pressuposto do caos. Inflação quer dizer salários permanentemente derrotados pelos preços. E estabilização quer dizer possibilidade de os salários se recuperarem consistentemente diante dos preços.

    Portanto, se eu tivesse que fazer uma passeata de trabalhadores, eu não viria ao Congresso pedir reajuste de salários; eu iria ao Banco Central pedir estabilização da moeda, porque, depois, os trabalhadores fariam o resto, por sua própria conta, autonomamente, nas fabricas. Dêem aos trabalhadores uma moeda estável e eles conquistam salários melhores, através da sua organização sindical. Agora, com uma inflação de 40% não há sindicato poderoso, não há organização social de trabalhadores consistente. Com uma inflação de 40%, o sindicato é meramente um poder político, de expressão política, sem ganhos econômicos reais e consistentes. É um poder vazio.

    A organização dos trabalhadores, pela qual lutamos tantos anos de nossa vida, Senador Amir Lando, se torna ineficaz nos períodos inflacionários. Só existe organização eficaz em períodos de estabilização.

     

    O Sr. Amir Lando - Permita, Exª, voltar a citar Thomas More: Quando o jugo é demasiadamente pesado, ninguém tem força para sacudi-lo.

    O SR JOSÉ FOGAÇA - Vejo que V. Exª faz sempre observações inteligentes, criativas, e creio que contribui enormemente para as observações precárias que aqui estou fazendo. V. Exª, Senador Amir Lando, deu-nos uma importante contribuição.

    O Sr. Josaphat Marinho - Concede-me V. Exª um aparte, Senador José Fogaça?

    O Sr. Esperidião Amin - Senador José Fogaça, V. Exª me concede um aparte quando julgar oportuno?

    O SR. JOSE FOGAÇA - Senador Esperidião Amin, V. Exª terá a palavra após eu ter a honra de concedê-la ao Senador Josaphat Marinho, que já a havia solicitado.

    O Sr. Josaphat Marinho - Eu desejaria apenas obter um esclarecimento. Sou pouco entendido nesta matéria de natureza econômica. Ontem à noite, ouvia e via o Sr. Ministro da Fazenda, em resposta a indagação que lhe foi feita, dizer que não é a URV que seguirá o dólar, mas o dólar que seguirá a URV. E se o dólar se elevar além da URV? É a indagação que faço, já que V. Exª está expondo o assunto. 

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Senador Josaphat Marinho, V. Exª realmente faz uma pergunta para a qual eu não teria uma resposta oficial. Mas é perfeitamente possível respondê-la da seguinte forma: a URV será calculada pelo Decreto n° 1.066. Este Decreto dispõe que a URV será calculada diariamente pelo Banco Central com base nos seguintes índices:

    "1. Índice de Preço ao Consumidor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas - FIPE - da Universidade de São Paulo, apurado para a terceira quadrissemana.

    2. Índice Nacional de Preço ao Consumidor Amplo - IPCA - da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

    3. Índice Geral de Preços do Mercado da Fundação Getúlio Vargas."

    Portanto, o Banco Central fixa esses valores com base em uma matemática monetária que a nós, meros rábulas e advogados, é algo impenetrável, como V. Exª sabe, mas fixa-os com base nesses valores, independentemente do que possa acontecer com o dólar, que é um outro mecanismo, um outro mercado.

    Agora, é evidente que haverá coincidência e haverá incoincidência, mas isso dependerá de política monetária que está sob controle do Governo. Este, detendo reservas monetárias, tem controle sobre o dólar. Quando houver grande demanda dessa moeda, haverá reservas suficientes para despejar, no mercado irregular, o dólar. Se houver, evidentemente, uma superação da URV em relação ao dólar que vier a tornar os nossos produtos extremamente caros para a venda no exterior, o Governo poderá produzir uma escassez de dólar no mercado e uma conseqüente elevação, porque o Banco Central, com as reservas monetárias que tem, estará dotado desses mecanismos.

    Por isso, entendo que o Governo poderá exercer uma política monetária, uma política cambial que será adequada ou não, conforme a competência, a sabedoria do Governo, porque isso não está dado, é algo a ser implantado no dia-a-dia da política cambial. De modo que a lei diz isto: URV é FIPE, CGV e IBGE; dólar é outra coisa. Ambos poderão e deverão até coincidir por um longo período, mas não sempre necessariamente.

    Quando a nossa balança comercial, nas exportações, começar a cair muito, como está acontecendo na Argentina, necessariamente terá que haver uma defasagem para a recuperação de vendas no mercado externo.

    Senador Esperidião Amin, concedo-lhe o aparte, para encerrar. Já estou encerrando o meu pronunciamento e não gostaria de me furtar à sua intervenção.

    O Sr. Esperidião Amin - Senador José Fogaça, V. Exª. presta um grande serviço ao Senado Federal e ao País por propiciar, ainda que sem uma palavra oficial do Governo, que seria obtida, caso fosse mantido o debate programado para a Comissão de Assuntos Econômicos desta Casa, por iniciativa do Senador Eduardo Suplicy. E, mesmo sem a palavra oficial do Governo, sem a presença dos Assessores do Ministro da Fazenda, estamos, de alguma forma, prestando um serviço à nossa curiosidade, à nossa responsabilidade e também, de certa forma, ao País, na medida em que a Imprensa acompanha o excelente pronunciamento de V. Exª. Não quero alongar-me, até porque o meu partido não se reuniu ainda para apreciar a matéria que é objeto de seu pronunciamento, mas não posso furtar-me a estabelecer aqui algumas cautelas. A primeira decorre da circunstância de hoje ser o dia do nascimento de um outro plano: há oito anos, nascia o Plano Cruzado. Boa parte da paternidade é a mesma. Comentam alguns que algumas barbas encaneceram, outros fios azularam - disso entendo muito. E, de uma forma ou de outra, os pais, oito anos depois da última paternidade, devem ser mais responsáveis. Mas ensina a vida familiar e doméstica que os filhos nascidos depois de um intervalo de oito anos são mais travessos. Essa é a primeira cautela. Independente da maior responsabilidade dos pais, os filhos tendem a ser, ou seja, o produto tende a ser mais manhoso. Essa é a primeira cautela. A segunda se divide em três partes. O Brasil, nobre Senador José Fogaça, tem a sua economia assentada, genericamente, sobre um tripé: preço, salário e juros. Não acredito que o Governo, que lutou bravamente para impedir o reajuste mensal dos salários, deseje dar, sete meses depois, um tratamento vip aos salários. Não é o mesmo Governo. Ou é efeito do carnaval, ou é uma quaresma muito estranha. Mas foi este Governo que lutou à exaustão para impedir o reajuste mensal, porque provocaria inflação. Não posso acreditar que tenha descoberto que o reajuste diário não será inflacionário. Portanto, há uma semelhança inequívoca entre esta Medida Provisória, o conceito, portanto, do plano, e o Plano Cruzado, em relação ao salário. Cinto de castidade, camisa de força nele! Em 1986 foi o abono de 8% do salário mínimo e hoje é 5% para o servidor público. Segundo ponto: preço. É evidente que, não existindo mais a SUNAB, não sendo o GATT um órgão descentralizado, não havendo nem reputação, nem experiência na arte de punir o abuso econômico, o que este Governo pode cometer é vigilância, não se sabendo quem vai exercê-la. Não haverá fiscais do Plano Cruzado, não estão disponíveis para recrutamento, ainda estão na nossa memória as cenas do Plano Cruzado e é difícil reeditá-las. Por isso, apenas quero manifestar minha grande preocupação com essa história da vigilância sem meios. Vigilância sem meio. Quem é que vai vigiar? Quem é o sentinela? Ninguém sabe.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Pela medida provisória, não...

    O Sr. Esperidião Amin - Pelo anúncio do Governo, ninguém sabe. Estou referindo-me à escalada de comunicação. A medida provisória é um pedaço. Está aí a cartilha; estão aí hoje mesmo as falas do Ministro. Não se sabe quem vai fiscalizar os preços dos oligopólios. Mas ouso deixar aqui registrada uma preocupação.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - O art. 34 diz que o Ministro da Fazenda vai mandar chamar, vai passar um pito.

     O Sr. Esperidião Amin - Mas isso já devia ter sido feito antes, quantas vezes pedi aqui. O Senador Rollemberg quantas vezes discursou aqui, pedindo que pelo menos os oligopólios da indústria farmacêutica fossem punidos. Portanto, isso soa como um blefe de um blefador. Não estou referindo-me ao Ministro, mas ao Governo, que já blefou várias vezes e está blefando de novo, não puniu ninguém, não há notícia. Devo chamar o Senador Ney Maranhão, que já fez discurso contra oligopólio, pois não sou mais credenciado a fazê-lo, mas o Governo, até hoje, não levou isso a capricho. Será que vai levar doravante? Mas o salário agora vai estar com cinto de castidade. E os juros, nobre Senador José Fogaça? Em 86, quando o salário e o preço foram congelados - e ambos foram congelados mesmo - participei do anúncio e o então Governador Gérson Camata também assistiu ao que foi dito pelo então Ministro Dílson Funaro, numa reunião com os governadores: "Não, com os juros, temos um acordo de cavalheiros". E este acordo de cavalheiros resultou em que, com inflação zero...

          O SR. JOSÉ, FOGAÇA - Não existe acordo de cavalheiros.

                      `

    O Sr. Esperidião Amin - Ainda mais com juros. E disso resultou, Senador José Fogaça, que, antes do Plano Cruzado II, os juros chegaram a 250% ao ano, com o Brasil da inflação da Suíça e desenvolvimento do Japão. Então, o vilão da história é o salário? E, agora, o que está sendo dito dos juros? Está sendo dito, e às vezes o Governo diz pela metade - hoje, por exemplo, nosso admirável Ministro Fernando Henrique Cardoso disse pela metade - que mais tarde vão cair. Mas o que foi anunciado na semana passada e neste fim de semana é que eles vão subir. Então, cinto de castidade para quem tem apanhado, quem não tem prejudicado ninguém, quem não se tem excedido. E para os juros o leão ou a ave de rapina da economia brasileira, na época do Plano Cruzado houve um acordo de cavalheiros, hoje, "mais tarde vão cair". Não estou condenando óplano nem 'à intenção do Ministro Fernando Henrique Cardoso, cujo espírito público, cuja brasilidade defenderei sempre, mas tenho o direito de, como cidadão, desconfiar. Estou aqui aplaudindo V. Exª para trazer a *minha desconfiança, não a minha condenação. Vou levar ao meu Partida, vou ouvir quem entende dessa matéria mais do que eu, mas estou preocupado, porque o enredo eu conheço, e os personagens são os mesmos, e um dos personagens tem sido vitima: o salário. E o vilão, nobre Senador José Fogaça, o vilão continua solto e pára este não há cinto de castidade. A Constituição até tentou, de maneira bizarra e bisonha, dizer que tabelaria os juros. Não adiantou nada. Todos nós sabemos quem é o vilão, com URV ou com qualquer outra forma de contingenciamento parcial - não vou dizer que étabelamento - ele continua solto, é feroz, tem apetite e é muito esperto. Muito obrigado.

    O SR JOSÉ FOGAÇA - Obrigado, Senador Esperidião Amin. Antes de encerrar, gostaria de fazer uma observação. Não ouvi do Ministro Fernando Henrique Cardoso a declaração de que os juros vão continuar altos, V. Exª ouviu, e ele deve ter dito. Quero dizer a V. Exª que se ele anunciou que os juros vão continuar altos, penso que essa pode ser uma boa noticia para os salários.

    Isso significa que a massa salarial vai ganhar uma proporção muito maior de poder aquisitivo, porque o juro vai ser usado como instrumento para contenção do consumo, ou seja, a capacidade de consumir do povo brasileiro vai aumentar, e vai ser preciso aumentar os juros.

    Na época do Plano Cruzado tivemos aumento de juros. V. Exª há de reconhecer que houve um aumento da massa salarial, da capacidade aquisitiva da população, que era enorme e - reconheço - até irreal, fantasiosa. Reconheço isso. Mas o instrumento de controle eram os juros.

    Quem conhece os mecanismos desse sistema sabe que só haverá juro alto, se houver demanda. Demanda baixa significa juro baixo. São duas coisas que não podem casar: diz-se que o Governo está arrochando os salários e aumentando os juros. Não, se está aumentando os juros éporque não há arrocho salarial, há um aumento da massa salarial.

    Agora, se os juros baixarem, pode-se ter certeza de que houve um arrocho de salários, uma contenção da demanda, uma redução do consumo, e o juro alto não é mais necessário. Basta ver a experiência dos Estados Unidos: juros de 4% ao ano, porque o país não cresce há três ou quatro anos.

    Esta, parece-me, tem sido uma questão bastante contraditória. Mas, como diz V. Exª, vamos consultar, vamos estudar, vamos ouvir os experts nessa matéria, para que ela possa ser mais clara, mais inteligível por todos nós.

    De minha parte, encerro esta comunicação agradecendo a tolerância de V. Exª.

    Era o que eu tinha a dizer.

    Sr. Presidente


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 01/03/1994 - Página 908