Discurso no Senado Federal

REGOZIJO COM A CIRCULAÇÃO, AS SEGUNDAS-FEIRAS, DO JORNAL O ESTADO DE MINAS. DEFESA DOS ATUAIS DIREITOS DA MULHER NA REVISÃO CONSTITUCIONAL.

Autor
Junia Marise (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MG)
Nome completo: Júnia Marise Azeredo Coutinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • REGOZIJO COM A CIRCULAÇÃO, AS SEGUNDAS-FEIRAS, DO JORNAL O ESTADO DE MINAS. DEFESA DOS ATUAIS DIREITOS DA MULHER NA REVISÃO CONSTITUCIONAL.
Publicação
Publicação no DCN2 de 10/03/1994 - Página 1150
Assunto
Outros > HOMENAGEM. REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • ELOGIO, INICIATIVA, JORNAL, ESTADO DE MINAS, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), ACRESCIMO, DIA, CIRCULAÇÃO, SEMANA.
  • COMENTARIO, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, MULHER, BRASIL, MUNDO.
  • DEFESA, PRESERVAÇÃO, APOSENTADORIA, MULHER, EXTENSÃO, ADOÇÃO, LICENÇA, MATERNIDADE, MÃE ADOTIVA, CUMPRIMENTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, INSTALAÇÃO, CURSO PRIMARIO, CRECHE, RESPONSABILIDADE, GOVERNO FEDERAL, GOVERNO ESTADUAL, GOVERNO MUNICIPAL.

    A SRA. JÚNIA MARISE (PDT - MG. Para uma breve comunicação. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores:

    Solicitei a palavra para fazer dois registros importantes. O primeiro deles, e eu não poderia deixar de fazê-lo, neste momento, trata exatamente da iniciativa do O Estado de Minas, um dos jornais de maior circulação no nosso Estado, que, a partir desta semana, começa a circular também às segundas-feiras. Este é um fato extremamente salutar, porque O Estado de Minas tem tradição na defesa dos interesses de Minas Gerais, propiciando sempre, através de suas páginas, a participação de todos aqueles que possam contribuir e defender os interesses de Minas Gerais.

    Como jornalista profissional e, sobretudo, pelo respeito e admiração que tenho pelo referido jornal, na figura de seus Diretores, Camilo Teixeira da Costa, de seus editores, Roberto Elíseo, João Bosco, de sua sucursal, em Brasília, dirigida pelo jornalista Paulo Cota, enfim, por todos aqueles que em O Estado de Minas estão hoje propugnando, de forma afirmativa e decidida, pelo desenvolvimento de Minas Gerais, e, sobretudo, pela preservação de um Estado que sempre se colocou como ímpar no cenário nacional.

    Minas Gerais tem hoje o segundo PIB nacional mas é, sobretudo, o Estado que já está garantindo a sua preferência na produção agrícola e pecuária em nosso País. Portanto, Sr. Presidente e Srs. Senadores, esse é um dos fatos relevantes que desejava registrar.

    O outro assunto, Sr. Presidente - serei breve - refere-se à comemoração, no Brasil e no mundo, do Dia Internacional da Mulher. Certamente essa data nos faz lembrar os avanços conquistados, ao longo de décadas, sobretudo pela mulher brasileira, que lutou e conseguiu o direito de votar e ser votada.

    A Constituição de 1988 revela algumas conquistas substanciais que permitiram que a mulher brasileira, com respeito e dignidade, pudesse integrar-se na nossa sociedade. Alguns pontos foram definidos claramente e resultaram do documento Carta das Mulheres aos Constituintes de 1988, que considerava fundamental que a Constituição brasileira consagrasse:

    1) Preceito que revogue automaticamente todas as disposições legais que impliquem classificações discriminatórias; 

    2) a determinação de que a afronta ao Princípio de Igualdade constituirá crime inafiançável;

    3) o acato, sem reservas, às convenções e tratados internacionais de que o País é signatário no que diz respeito à eliminação de todas as formas de discriminação;

    4) o reconhecimento da titularidade do direito de ação aos movimentos sociais organizados, sindicatos, associações e entidades da sociedade civil na defesa dos interesses coletivos.

    Por isso, Sr. Presidente, Srs. Senadores, a grande preocupação que move hoje todos os movimentos organizados de mulheres e todas as mulheres brasileiras, trabalhadoras, profissionais liberais, é a Revisão Constitucional.

    Antes do início da Revisão Constitucional, havia um pacto e um entendimento: não se tocaria no capítulo dos direitos e garantias sociais. Esse entendimento está hoje desmascarado no Congresso Nacional. Novecentos e cinqüenta e seis emendas foram apresentadas, muitas delas intimamente ligadas à questão das garantias e dos direitos conquistados pelas mulheres brasileiras em 1988. Querem reduzir a licença maternidade de cento e vinte dias para noventa, sessenta, quarenta e cinco dias. Existem sete emendas propondo a pura extinção da licença maternidade.

    Em relação à aposentadoria da mulher trabalhadora, hoje definida na Constituição como sendo trinta anos de serviço, existem emendas propondo a sua extinção pura e simples, colocando-a em igualdade, pelo limite de idade - querem extinguir o limite de 60 anos - de 65 anos.

    Falo também, Sr. Presidente, sobre a aposentadoria das professoras primárias, definida aos 25 anos de trabalho. Há propostas que pretendem extinguir esse benefício.

    Nesse quadro, afirmamos a nossa presença na sociedade brasileira, integrando-nos, ao lado dos homens, como força produtiva de trabalho, e propugnando uma sociedade mais justa, igualitária, em que não haja discriminação de sexo ou de raça, e sim um clima de verdadeira justiça social.

    A nossa posição se reafirma, neste instante, diante da possibilidade e da tentativa que configura afronta à Constituição de 1988, de extinguir direitos individuais como a licença maternidade de 120 dias.

    O Sr. Josaphat Marinho - Permite V. Exa um aparte?

    O Sr. Ney Maranhão - Permite V. Exa um aparte?

    O SR. PRESIDENTE (Chagas Rodrigues) - Peço permissão para interromper a nobre oradora e lembrar aos Srs. Senadores que S. Exa fala para uma breve comunicação, período em que o Regimento Interno não prevê apartes.

    A SRA. JÚNIA MARISE - Concluindo, Sr. Presidente, quero externar, neste momento, o sentimento de todas as mulheres brasileiras em relação à Revisão Constitucional - já nos colocamos contrários a ela - neste Congresso Nacional. Queremos reafirmar nossa posição pela preservação da aposentadoria das mulheres, pela extensão da adoção da licença maternidade à mãe adotiva, pela exigência, junto ao Governo Federal, junto aos Governos Estaduais e Municipais, de que cumpram a Constituição e promovam a instalação de creches e cursos pré-escolares por todo o Brasil para atender crianças de zero a seis anos.

    Tomamos ainda essa posição por entender que é preciso, neste momento, não apenas que mulheres brasileiras se organizem, mas sobretudo que haja bom-senso por parte dos Srs. Congressistas, Deputados Federais e Senadores.

    Confiamos. Confiamos em que não se cometerá nenhuma injustiça, nenhuma ilegalidade neste País. Conhecemos a história da luta da mulher brasileira, que procura avançar nas suas conquistas e sobretudo nos seus direitos, sem almejar privilégio, mas procurando oferecer à nossa sociedade, ao Brasil e à Nação a melhor participação que lhe cabe no desenvolvimento e na construção de uma Nação mais justa e igualitária.

    Sr. Presidente, a questão que estamos abordando hoje cala profundamente na alma e no coração de todo Senado da República. Por essa razão, se V. Exa permitir, gostaria de conceder aparte ao eminente Senador Ney Maranhão. Certamente as mulheres brasileiras, neste momento, prestariam a V. Exa, mais uma vez, a sua homenagem.

    O SR. PRESIDENTE (Chagas Rodrigues) - A questão é regimental, e há outros oradores inscritos. Mas nada impede que, em seguida, o nobre Senador também peça a palavra para congratular-se com V. Exa.

    A SRA. JÚNIA MARISE - Quero registrar, Sr. Presidente, que tenho certeza de que o Senador Ney Maranhão também se associa às palavras de apoio à manutenção das conquistas da mulher brasileira, hoje incluídas na Constituição de 1988. Tenho a certeza de que, em seu aparte, S. Exa iria confirmar, para registro nos Anais do Senado Federal, que também se enfileirará junto a todos os Parlamentares que se voltarem contra os que desejam retirar da Constituição as conquistas que alcançamos.

    Muito obrigada.

    DOCUMENTO A QUE REFERE A SRA JÚNIA MARISE EM SEU DISCURSO:

    A Constituição de 1988 foi um marco em matéria de conquista dos direitos da mulher no Brasil. Foi a primeira Carta Magna a consagrar os direitos femininos em nosso País. Para isso, foi necessária uma grande mobilização popular a fim de demonstrar aos constituintes de 1988 a necessidade de estabelecer no texto da Lei Maior preceitos que garantissem o exercício da cidadania em plenas condições de igualdade, suprimindo tudo aquilo que comprometia a participação da mulher nos processos social, político e econômico.

    Em nosso País, um dos primeiros e expressivos avanços na luta pela contemplação dos direitos feministas no texto legal foi a garantia do exercício do direito ao voto da mulher, em 1931. Posteriormente, tivemos a grande mobilização que se verificou na década de 70, através da denúncia da opressão, resultando na organização das mulheres em vários grupos, como os clubes de mães, grupos autônomos, comissões em sindicatos, núcleos em partidos políticos, de maneira a gerar o reconhecimento pelo Estado da discriminação intolerável que existia.

    Nesse estágio, Senhor Presidente, Senhores Senadores, importante passo foi dado com a criação dos Conselhos da Condição Feminina Municipal, Estadual e Federal. A oportunidade de consagrar os direitos da mulher, de forma definitiva, no texto da Lei Maior surgiu com a Constituição de 1988. Quando da instauração do processo constituinte, em 1986, as mulheres organizadas em todo o território nacional deflagraram a campanha da Constituinte, encabeçadas pelo Conselho Nacional dos Direitos da Mulher - CNDM.

    A Campanha, Constituinte prá valer tem que ter direitos da mulher, foi o corolário de um uma infinidade de movimentos regionais anteriores, que se verificaram por todo o Brasil, ordenando as reivindicações em propostas populares oriundas de encontros, seminários e discussões nos quais discutiu-se o papel da mulher em nossa sociedade, enfatizando a necessidade de assegurar os seus direitos no texto constitucional, a fim de garantir o direito à igualdade.

    A proposta era ousada em face da realidade da representação. Tínhamos 26 mulheres parlamentares ou 4,6% do total dos Constituintes, um retrato vivo do contraste existente entre o número de mulheres da população e a sua insuficiente representação política. Entretanto, o trabalho sistemático ao longo dos anos seguintes, o qual consistiu em campanhas, reuniões, mobilizações, debates amplos e abertos com a população de um modo geral, edição de cartilhas, panfletos, jornais e o encaminhamento de propostas e das emendas populares com muito mais do que o dobro das assinaturas necessárias à sua inclusão no debate, levou os constituintes a respeitar o movimento feminista e suas reivindicações.

    Marco inquestionável da luta pela conquista dos direitos da mulher no Brasil foi, sem dúvida, o documento "Carta das Mulheres aos Constituintes", o qual resultou de Encontro Nacional, realizado no dia 26 de agosto de 1986. Ali, ficou estabelecido que "para a efetivação do princípio de igualdade" seria fundamental que a Constituição brasileira consagrasse:

    1) preceito que revogue automaticamente todas as disposições legais que impliquem em classificações discriminatórias;

    2) a determinação de que a afronta ao princípio de igualdade constituirá crime inafiançável;

    3) o acato, sem reservas, às convenções e tratados internacionais de que o País é signatário, no que diz respeito à eliminação de todas as formas de discriminação;

    4) o reconhecimento da titularidade do direito de ação aos movimentos sociais organizados, sindicatos, associações e entidades da sociedade civil, na defesa dos interesses coletivos.

    Leis complementares e demais normas deverão garantir a aplicabilidade desse princípio.

    Senhor Presidente,

    Senhores Senadores,

    Já não há dúvida de que a Constituição de 1988 consagrou mudanças substanciais na ideologia do papel da mulher. Na verdade, a sociedade brasileira reconheceu a existência da discriminação contra a mulher e exigiu dos constituintes de 1988 os instrumentos necessários para efetivar a mudança qualitativa que começou a se operar. A ideologia que relegava a mulher à condição de cidadã de segunda classe, expressa em uma legislação ultrapassada, foi alijada da estrutura legal, sendo hoje indispensável reescrever as leis de forma a reservar à mulher o papel de relevo que lhe cabe na sociedade moderna.

    Hoje, é inquestionável que a maior parte dos pleitos apresentados ao Congresso Constituinte pelos movimentos feministas destinou-se a rever os conceitos da família em contraste com a realidade da mulher brasileira, então disposta a romper os limites do espaço doméstico em prol da realização profissional e pessoal. Vista pela ótica do legislador constituinte, a mulher está bem mais próxima da realidade cotidiana do que a que está descrita na legislação ordinária.

    As conquistas da mulher brasileira foram consagradas nas mudanças conceituais nas relações de família e na extensão de tal conceito às uniões estáveis, no reconhecimento da função social da maternidade, bem como o da dupla jornada de trabalho feminino, na garantia de acesso ao planejamento familiar, em suas várias formas, na redistribuição de tarefas no âmbito doméstico, no reconhecimento, enfim, de seu papel relevante na sociedade brasileira.

    Todos esses novos direitos, reclamam a devida regulamentação. As leis ordinárias, infelizmente, ainda não foram adaptadas à nova realidade constitucional, razão por que, muito mais importante do que revisar, neste momento, é preciso regulamentar.

    Dentre os princípios acatados pela Constituição Federal, alguns se destacam pela relevância na transformação e no avanço que proporcionaram, como o reconhecimento da união estável como entidade familiar. Tal reconhecimento poderá ajudar na solução dos problemas vividos por boa parte da população brasileira.

    Os filhos foram, também, igualados em direitos, exitingüindo-se a injusta discriminação que pesava sobre aqueles havidos fora dos laços do casamento. As conquistas serviram para mostrar o reconhecimento pelo legislador da justeza do elenco de reivindicações formuladas pelo movimento feminista, ao longo de décadas, em nosso País. O reconhecimento de uma nova família, na qual a responsabilidade, direitos e deveres do homem e da mulher são balizados pelos princípios da fraterna igualdade, foi consagrado na nossa Constituição.

    Outra questão de fundamental importância, foi o reconhecimento do direito de acesso dos cidadãos ao planejamento familiar, como livre decisão do casal, e da obrigação do Estado no que diz respeito à prestação das informações e meios para isso necessários. Não há como desconhecer a importância desse direito, agora consagrada no texto da nossa Lei Maior.

    Efetivamente, era indispensável garantir a atuação do Estado no que diz respeito ao planejamento familiar, de forma a ocupar um espaço que era invadido por organizações controlistas, que defendem o controle da natalidade, distribuição em massa de anticoncepcionais colocando em risco a saúde e a capacidade conceptiva da mulher, com seqüelas irreversíveis, e constituindo um atentado aos direitos de cidadania da mulher brasileira.

    O texto constitucional, não pode ser considerado ideal, mas certamente avançou quando reconheceu que os filhos são responsabilidade comum do casal, quer na educação, quer nos cuidados quotidianos e na partilha das tarefas internas do lar.

    Senhor Presidente,

    Senhores Senadores,

    Uma das questões que suscitou maior polêmica durante os trabalhos da Constituinte e que continua suscitando discussões refere-se à questão da licença - maternidade. Muitas ameaças foram feitas à época da Constituinte, inclusive a de não mais se contratar mulheres para o trabalho regular. Refiridas ameaças acabaram se concretizando, uma vez que não havia possibilidade de total dispensa da mão-de-obra feminina, até por que os salários médios pagos às mulheres trabalhadoras são, ainda, inferiores aos percebidos pelos homens para o mesmo trabalho.

    Senhor Presidente,

    Senhores Senadores,

    É fora de dúvida que as licenças - maternidade e paternidade asseguram a plena igualdade de homens e mulheres nos afazeres dentro e fora do lar, atribuindo-lhes as mesmas responsabilidades. A manutenção desses direitos representa o reconhecimento da função social da maternidade.

    Nos últimos tempos, alguns setores importantes da sociedade vêm defendendo a transferência dos direitos da trabalhadora e do trabalhador (licenças-maternidade e paternidade) para a assistência social, invocando-se como pretexto uma melhor e mais racional organização da Previdência Social, assim como o barateamento dos seus custos. Entendemos que a lei não pode retroceder, sob nenhum pretexto. O legislador constitucional reconheceu a função eminentemente social da maternidade, assim como o direito da criança de ter, nos primeiros meses de vida, o acalento do pai e da mãe, garantindo-se aos trabalhadores o direito à prole, que deve ser mantido.

    Um outro tema que provoca grande polêmica, agora que se inicia a revisão constitucional, é o prazo justo para que se conceda o direito à aposentadoria. Forças conservadoras estão notoriamente engajadas em movimento para estabelecer a mesma idade na aposentadoira de homens e mulheres. Ainda hoje, muitas mulheres sofrem acentuado desgaste físico quando exercem dupla jornada de trabalho, trabalhando fora de casa e exercendo a responsabilidade pelas tarefas domésticas.

    Os mais apressados perguntariam: Se os direitos são iguais, por que seriam diferentes no que se refere à aposentadoria?

    Enquanto o serviço doméstico continuar como responsabilidade da mulher, não há como ignorar a dupla jornada de trabalho e, por via de conseqüência, a diferença de idade do direito à percepção da aposentadoria por tempo de serviço.

    Um dos maiores avanços da Constituição de 1988 foi o reconhecimento da existência de violência específica contra a mulher. É notório que a estrutura social incentivou, ao longo dos tempos, o poder do homem sobre a mulher e suas vontades, gerando a violência que se expressa dentro e fora do lar. O reconhecimento de tal direito na esfera constitucional foi uma conseqüência natural da luta empreendida pelos vários grupos feministas que por muitos anos denunciaram a violência contra a mulher, de que resultou a criação, em âmbito estadual, das Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher.

    Dessa forma, o dispositivo constitucional que assegurou a criação de mecanismos para coibir a violência no âmbito familiar (parágrafo 8º do artigo 223 da Constituição Federal), refletiu, com realismo, essa questão que hoje já é tratada como infringência aos Direitos Humanos, como o reconheceu a Carta de Viena.

    A revisão constitucional, como não poderia deixar de ser, tem provocado grande receio entre os movimentos organizados da sociedade, de modo especial às mulheres, que temem perder as conquistas garantidas no texto da nossa Lei Maior. Quando se sabe que a maioria das conquistas asseguradas no texto constitucional está pendente de regulamentação, esses receios são plenamente justificados.

    É preciso redobrar as atenções para evitar que direitos consagrados no texto da Constituição venham a ser revogados de maneira injusta. O texto constitucional não é e nem poderia ser imutável. Independentemente do poder revisional, autorizado pelo constituinte de 1988, existe o poder de reformar, previsto no artigo 60 da Carta Magna. O poder reformador de qualquer constituição baseia-se na evolução da sociedade e nas mudanças do momento histórico, eterno gerador de novos direitos.

    Hoje em dia, novas questões foram postas e novos direitos reclamados. Parece não haver dúvida quanto à necessidade de incluir no texto constitucional os seguintes direitos:

    1) garantir a todos os trabalhadores os mesmos direitos previdenciários, de modo especial no que se refere à licença-maternidade. Todas as mulheres contribuintes da Previdência Social devem ter direito aos benefícios gerados pelo sistema;

    2) estender à categoria das trabalhadoras domésticas todos os direitos trabalhistas e previdenciários garantidos às demais trabalhadoras;

    3) proibir a educação diferenciada, dando ênfase à igualdade dos sexos, descartando os métodos educacionais discriminatórios que colocam a mulher e outros grupos tidos como minoritários em posição inferior, garantindo perante a sociedade a imagem social da mulher em igualdade de condições com o homem, independente da origem étnico-racial.

    4) garantir a assistência integral à saúde da população, mas reconhecer, no âmbito governamental, o atendimento à saúde da mulher, independente de sua função procriadora;

    5) garantir à mulher a livre opção pela maternidade. É indispensável o reconhecimento expresso de que o corpo da mulher a ela pertence, e somente a ela cabe optar pela maternidade.

    Finalmente Senhor Presidente, Senhores Senadores, quando se comemora o Dia Internacional da Mulher, é oportuno lembrar as responsabilidades dos nossos congressistas com a manutenção dos direitos da mulher, sobretudo porque se está a começar um polêmico processo revisor do texto constitucional. As mulheres estarão mobilizadas para garantir a permanência de direitos consagrados no nosso texto constitucional, dispostas a lutar contra mudanças que representem um lastimável retrocesso. Não nos esqueçamos de que as mulheres representam 51% da massa eleitoral e 52% da população brasileira.

    A Constituição de 1988 reconheceu o direito da mulher à sua dignidade. A supressão de qualquer dos direitos estabelecidos na nossa Carta Magna seria um esbulho condenável. Preferimos acreditar que o bom-senso impedirá qualquer mudança injusta no Capítulo dos Direitos da Mulher.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 10/03/1994 - Página 1150