Discurso no Senado Federal

CRITICAS A TRIBUTAÇÃO FEITA AO SETOR AGROPECUARIO BRASILEIRO.

Autor
Nelson Wedekin (PDT - Partido Democrático Trabalhista/SC)
Nome completo: Nelson Wedekin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • CRITICAS A TRIBUTAÇÃO FEITA AO SETOR AGROPECUARIO BRASILEIRO.
Publicação
Publicação no DCN2 de 20/04/1994 - Página 1922
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, INCOERENCIA, POLITICA AGRICOLA, FALTA, ATENÇÃO, PRODUTOR RURAL, EXCEÇÃO, TRIBUTAÇÃO, SETOR, AGROPECUARIA, PREJUIZO, DESENVOLVIMENTO, PRODUÇÃO, AGRICULTURA, PAIS.

    O SR. NELSON WEDEKIN (PDT - SC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a agricultura brasileira tem sofrido muito nas mãos de inexperientes administradores do poder público, que desenham castelos nas nuvens e pretendem alcançá-los às custas dos sacrifícios dos cidadãos deste País. Não é difícil relacionar diversos casos de incúria administrativa, de desleixo e de falta de atenção com o produtor rural e com a política agrícola. O Brasil, país de imensas dimensões, com enorme potencial ainda a ser desenvolvido, possui massas famélicas e, vez por outra, se vê obrigado a realizar importações de alimentos.

    Poderia dar vários exemplos, mas vou referir-me a apenas um, ocorrido há alguns anos. O que se chamou de Plano Collor, comandado pela ex-Ministra Zélia Cardoso de Mello, praticamente extinguiu, no ano de 1991, qualquer perspectiva para o homem do campo. Para que V. Exªs tenham uma idéia do tamanho do desastre, vale relembrar a seguinte informação: em 1981, as empresas brasileiras produziram 51.900 máquinas agrícolas; em 1991, esse número caiu para 21.400, sendo repetido no exercício seguinte.

    É saudável, embora doloroso, lembrar a tragédia que significou para a agricultura brasileira a passagem pelos órgãos decisórios da economia de pessoas tão inexperientes. O Brasil vai recuperar-se desse e de outros prejuízos ocasionados por aquela equipe administrativa. Mas, por causa do mau exemplo, comandado a poucos metros do prédio do Congresso Nacional, creio ser importante para todos nós, parlamentares, rediscutir o modelo agrícola brasileiro com o objetivo de alcançarmos pontos em comum e prosseguirmos na busca das políticas aqui definidas. O governo Itamar Franco não procurou dizimar a produção agrícola, nem extinguir a figura do agricultor. Apenas nomeia Ministros da Agricultura, um depois de outro, sem a preocupação de seguir um modelo ou acertar uma linha definida de atuação neste setor.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, o setor agropecuário brasileiro é tributado de forma direta e indireta através de um sistema constituído por três agentes arrecadadores: União, Estados e Municípios. Os principais impostos são os seguintes: Imposto sobre a Renda Rural (IRR), Imposto Territorial Rural (ITR), Fundo de Investimento Social (FINSOCIAL), Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (FUNRURAL) e Imposto sobre Herança (IH), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), Imposto sobre Serviços (ISS), Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre a Venda a Varejo de Combustíveis, que não se aplica ao óleo diesel e Imposto sobre Veículos Automotores (IPVA). Além daqueles impostos, as atividades agropecuárias são afetadas, também, pelas tarifas sobre as importações de fertilizantes, defensivos, máquinas e implementos e pelos recolhimentos compulsórios. Entre os últimos, figuram as contribuições previdenciárias (INSS) e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

    Uma avaliação global sobre a incidência de impostos revela que os insumos são taxados em 17,5%; máquinas, em 32,5%; embalagens, em 25,5%; eletricidade, em 27%; e comercialização, em 16,5%. Os recolhimentos compulsórios sobre a mão-de-obra chegam a 16%. Café moído, açúcar, óleo e macarrão são taxados em 29,3%; carnes, arroz e feijão, em 22,1%; pão e sal, em 21,1%, enquanto leite, frutas e hortaliças, em 8,8 por cento.

    Aspecto importante da política tributária são os inúmeros programas de incentivos fiscais que beneficiam os diferentes setores da economia e regiões do país. Em 1989, esses programas somavam 109, na maioria relacionados a incentivos por intermédio do Imposto de Renda. Em certos casos, agricultores individuais podem deduzir até 80 por cento das receitas no momento de calcular o valor do imposto devido. Projetos aprovados pela Sudam e Sudene são elegíveis para créditos de investimento com taxas de juros subsidiadas. Os projetos, nestas duas áreas, iniciados antes de 31 de dezembro de 1988 estão isentos de Imposto de Renda por dez anos.

    Como resultado das pressões originárias da sociedade, o Governo Federal começou a baixar as alíquotas dos impostos. A safra 91/92 foi isenta de IPI sobre máquinas e equipamentos agrícolas. Não há dúvida, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que o principal problema relacionado à política agrícola é a excessiva tributação via impostos indiretos, dos quais o ICMS é o mais importante. O sistema tributário penaliza a produção e poupa a posse improdutiva da terra. O Estado taxa em função do faturamento e não, do lucro. Não há distinção entre produtores profissionalizados e proprietários improdutivos e posseiros.

    O ICMS, originalmente um imposto sobre o valor agregado, tornou-se, na prática, um encargo adicional sobre o setor agrícola, em função das características especiais do setor. Quando aplicado aos produtos exportados, o ICMS torna-se um imposto sobre a agricultura uma vez que, sendo tomador de preços no mercado internacional de praticamente todos os produtos agrícolas, o setor não tem como repassar o imposto aos preços. Com base nesse panorama, os técnicos são unânimes em sugerir o seguinte:

    1) redução da tributação indireta sobre cada setor, especialmente aquela aplicada a produtos da cesta básica, de exportação e bens de capital;

    2) avaliação das possibilidades de diminuir o número de impostos indiretos incidentes sobre o setor e revisão da sistemática de aplicação do ICMS, com vistas a facilitar a recuperação dos créditos;

    3) transformação do Imposto Territorial Rural num instrumento capaz de viabilizar a utilização mais eficiente da terra.

    O resultado mais perverso das políticas equivocadas para o setor agrícola tem sido a concentração, cada vez mais evidente, de mais terra nas mãos de um menor número de pessoas. As políticas tarifárias conduzem à concentração e a falta de recursos impede a realização de uma efetiva e profunda reforma agrária. Essa reforma deveria ser baseada na desapropriação e no sistema de arrendamento através de bolsas de terra, na linha que já vem sendo implantada em projetos-piloto do Banco do Brasil. Os proprietários rurais menos eficientes ou aqueles que utilizam a terra como reserva de valor devem ser estimulados, através daquele programa, a vender ou inscrever suas áreas nos programas de arrendamento.

    Tudo isso é necessário em função de nossa própria história. A agricultura brasileira, quando devidamente tratada pelo Governo Federal, respondeu de maneira efetiva e aumentou sua produção. Invadiu mercados no exterior e conquistou novas áreas dentro do País. Durante o período 1986/90, a maioria das atividades agropecuárias exibiram uma trajetória ascendente, passando por produções máximas no triênio 87/89 e registrando quedas acentuadas em 1990. A evolução da produção agrícola no período 1986/91 foi relativamente satisfatória. As culturas de café e de laranja apresentaram as maiores taxas anuais de crescimento, de aproximadamente 6%, sendo seguidas pelo feijão e pelo milho, com expansões de 4,3% e 2,4%, respectivamente. Algumas culturas experimentaram taxas negativas de crescimento como o algodão arbóreo (-10,1%) e herbáceo (-2,8%), trigo (-8,1%) e arroz (-1,5%). O fraco desempenho dessas culturas foi o resultado da política econômica altamente restritiva em termos de crédito e da redução dos subsídios agrícolas, particularmente na safra 90/91.

    As fontes de crescimento da produção agrícola no período 1986/91 dividiram-se entre a expansão da área cultivada e o aumento da produtividade. O crescimento da área foi estimulado por diversos fatores, entre eles a política de preços mínimos compensadores para regiões afastadas, incentivos fiscais, crédito agrícola subsidiado, desenvolvimento pela EMBRAPA de sementes melhoradas e adaptadas às diversas regiões ecológicas do país.

    O aumento de produtividade agrícola resultou principalmente do incremento do uso de sementes melhoradas, fertilizantes e máquinas agrícolas. Na década de oitenta, a produção de sementes melhoradas de trigo cresceu 100%, com um índice de utilização pelos agricultores da ordem de 90-100%; a produção de sementes melhoradas de arroz cresceu mais de 30%, atingindo um índice de utilização de mais de 50% na Região Sudeste e de 70% no Rio Grande do Sul. No caso do milho, o crescimento foi de 13%, com um índice de utilização entre 70 e 80% nas Regiões Sul e Sudeste. A produtividade da mão-de-obra também foi incrementada pela forte mecanização concentrada nas Regiões Centro-Oeste e Sul. Em 1991, o Brasil produziu 51.900 máquinas agrícolas. Em 1986, a produção chegou a 67.800 unidades. Em 1991, a produção caiu para 21.400 unidades, número que se repetiu em 1992.

    Em termos regionais, o aumento da produção agrícola obedeceu a processos diferenciados. Nas Regiões Norte e Centro-Oeste, a área cultivada expandiu-se em 7,3% e 10,3%, respectivamente. No Norte, a principal expansão se deu no café, cacau e milho. No Centro-Oeste, na produção de soja, através da incorporação de terras virgens e áreas de pasto. Na Região Sudeste acentuou-se a especialização, sendo que 50% da produção concentraram-se nas culturas da cana-de-açúcar e do café. Na Região Sul, ocorreu maior diversificação, com aumentos significativos na produção de arroz, trigo, cana-de-açúcar e decréscimo na produção de milho e soja. No Nordeste, ocorreu uma diminuição significativa da participação do algodão arbóreo e da mandioca, substituídos por produtos de maior valor como milho, a soja e o algodão herbáceo.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, os resultados dessa falta de atenção ao homem do campo e da inexistência de uma política coerente para a agricultura foram desastrosos para a sociedade brasileira. O êxodo rural aumentou, a produção oscilou entre períodos de euforia e depressão. A tributação excessiva e o regime de juros estratosféricos inibiram qualquer ação consistente de caráter individual.

    Tivemos o desastre Collor em toda sua extensão refletido no setor agrícola. Em 1991, a agricultura brasileira teve um de seus piores desempenhos das últimas décadas, baixando a produção de grãos em 15 milhões de toneladas em comparação com o ano anterior. O Governo que sucedeu o desastre, do Presidente Itamar Franco, não agride a agricultura, mas muda ministros da área com enorme facilidade, sem demonstrar preocupação com a criação de uma política definida para o setor. Vejam, Srs. Senadores, Sr. Presidente! É fundamental que os parlamentares entrem na discussão sobre a política agrícola para que o País alcance, afinal, o desenvolvimento auto-sustentado nesse setor. E, também, para que se tenha a oportunidade de traçar um plano de longo prazo para a agricultura, de maneira a elevar a produção, aumentar a produtividade, dar garantias ao produtor e proteger o Brasil de administradores tão audaciosos quanto inexperientes, que enorme dano causaram à economia nacional.

    Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 20/04/1994 - Página 1922