Discurso no Senado Federal

ANIVERSARIO DE BRASILIA. PROBLEMAS FINANCEIROS E TRIBUTARIOS COMO FATORES COMPROMETEDORES DA AUTONOMIA POLITICA DA CAPITAL BRASILEIRA.

Autor
Maurício Corrêa (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/DF)
Nome completo: Maurício José Corrêa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • ANIVERSARIO DE BRASILIA. PROBLEMAS FINANCEIROS E TRIBUTARIOS COMO FATORES COMPROMETEDORES DA AUTONOMIA POLITICA DA CAPITAL BRASILEIRA.
Publicação
Publicação no DCN2 de 21/04/1994 - Página 1967
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF).
  • ANALISE, HISTORIA, PROCESSO, EMANCIPAÇÃO POLITICA, DISTRITO FEDERAL (DF), PERIODO, PROMULGAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, EQUIPARAÇÃO, COMPETENCIA TRIBUTARIA, ESTADOS, RESULTADO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, FORMA, ARRECADAÇÃO, TRIBUTOS, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE).
  • ANALISE, DEFASAGEM, PROGRAMAÇÃO ECONOMICA, ORÇAMENTO, UNIÃO FEDERAL, RELAÇÃO, DEMANDA, BENS, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, MERCADO DE TRABALHO, DISTRITO FEDERAL (DF), PERIFERIA URBANA, RESULTADO, PREJUIZO, QUALIDADE DE VIDA, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, SETOR, EDUCAÇÃO, SAUDE PUBLICA.
  • APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, CRIAÇÃO, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE), OBJETIVO, EXCLUSIVIDADE, AUTONOMIA FINANCEIRA, DISTRITO FEDERAL (DF), MOTIVO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, FORMA, ARRECADAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO, TRIBUTOS, UNIÃO FEDERAL.

     O SR. MAURÍCIO CORRÊA (PSDB - DF. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, "Brasília foi o resultado de um amadurecimento, o anúncio de uma reforma; é um decisivo impacto de progresso, um detonador de novos empreendimentos que vão surgindo".

     Essas palavras, proferidas pelo fundador de Brasília, na ocasião de sua inauguração, há 34 anos, permanecem impregnadas de intensa atualidade, seja para aquilatarmos a decisiva importância da transferência da Capital para o interior do País, seja para avaliarmos a contra-argumentação daqueles que, no dizer do Presidente Juscelino Kubitschek "não compreenderam e não amaram esta obra".

     Esta minha fala destina-se, obviamente, a manifestar a profunda emoção que esta data provoca em todos os que, de uma forma ou de outra, participamos de sua construção, de seu vacilante crescimento, de sua consolidação, de sua independência política.

     Aqui chegado em 1961, coube-me o privilégio de não só acompanhar, mas também participar dos momentos e movimentos mais decisivos da vida desta querida Cidade. Sofremos juntos os longos anos em que apenas éramos seus habitantes. Árdua foi a batalha para sua autonomia política, quando nos tornamos cidadãos. A luta, no presente, centra-se na conquista de sua autonomia política plena que passa, necessariamente, pela autonomia tributária e financeira.

     Sirvo-me desta oportunidade, Sr. Presidente e Srs. Senadores, para, ao homenagear Brasília e todos os que aqui vivem e trabalham, refletir acerca de alguns aspectos hoje cruciais para a Cidade, no contexto do que ela representa para o País. Muitas das idéias e opiniões apresentadas constituir-se-ão, à primeira vista, em obviedades. Por considerá-las básicas e pertinentes, assumo o risco da aparente tautologia.

     A transferência da Capital para o interior do País representou uma reivindicação alimentada por várias gerações de brasileiros - a começar pelo sonho dos Inconfidentes - que a encaravam como solução para a melhoria do nível da administração federal, para a segurança nacional e, notadamente, como fonte promotora do desenvolvimento do interior central do País.

     Nestes 34 anos de existência, Brasília tem dado provas insofismáveis de ser uma cidade própria ao trabalho ordenado, eficiente, além de construir pólo irradiador do progresso para uma imensa região - cerca de dois terços do território nacional -, que tem sido conquistada a partir de Brasília, por intermédio das estradas que, daqui fluindo, levam a vida e o progresso a regiões antes praticamente desertas.

     Assim é que, na atualidade, à criação de Brasília é creditado o sucesso na ocupação dos cerrados do Centro-Oeste. Somente no setor de grãos, a região é responsável por 30 por cento do mercado nacional. Apontados como a última fronteira agrícola do mundo, com clima privilegiado, com abundância de água, os cerrados vêm atraindo e despertando o acesso a novas tecnologias. O eixo de comercialização dos produtos do Centro-Oeste tem Brasília como centro de referência: quase quarenta por cento da população da região concentra-se no trecho fixado entre Brasília e Goiânia. Brasília é de fato uma referência estratégica do Centro-Oeste.

     Além disso, constata-se em Brasília a formação de uma nova geração de valores humanos, que caminha para a integração nacional, com etnia e sotaque próprios, englobando e assimilando a miscigenação de brasileiros vindos de todos os quadrantes do País. Nenhuma outra cidade possui, juntos, tantos sentimentos e estilos de brasilidade - a similitude na diversidade -, o que a consolida como a Capital da República, proporcionando a integração da pluralidade cultural e étnica brasileira.

     Para os que não conhecem bem a Cidade, seus famosos espaços vazios representam, simplesmente, distâncias a percorrer. Na verdade, estatísticas da Organização das Nações Unidas -ONU - atestam sua importância para que se situe Brasília entre as primeiras na lista de área verde por habitante.

     Esse é tão-somente um dos indicativos do nível da qualidade de vida que aqui é desfrutado, fruto de um moderno conceito de morar e de viver, com suas revolucionárias e arrojadas linhas arquitetônicas que a tornaram, em 1987, patrimônio cultural da humanidade pela Unesco. No centro de todas as coisas, o homem, como sua mais profunda razão de ser.

     Sim, porque aqui vivem, trabalham, lutam um milhão e setecentas mil pessoas, quase quatro vezes mais do que o previsto - 500 mil habitantes no ano dois mil -, uma prova de que o povo não ficou para trás. A própria História da Capital comprova a enorme força de todos os movimentos de denúncia e de protesto aqui deflagrados - antigas uns, mais recentes outras -, de profunda repercussão em todo o País. Aqui o exercício da cidadania faz-se muito presente, impulsionado, certamente, pela proximidade do poder. Aqui, principalmente para os que trabalham no setor público, muitas vezes os fatos políticos são vivenciados no exercício de suas funções e não simplesmente veiculados pelos meios de comunicação. Daí a participação e a conscientização políticas mais se acentuarem.

     Por tudo isso, sim, Brasília, é privilegiada. Seu orgulho maior, no entanto, situa-se em sua função administrativa: sede do País, abrigo dos Três Poderes da República, anfitriã das representações diplomáticas. Se grande, entretanto, é a honra, infinitamente maior é a sua responsabilidade de prover os meios necessários à manutenção dos serviços daí decorrentes - saúde, educação, segurança e transporte.

     Vejamos por quê. Em termos geopolíticos e funcionais, o Distrito Federal constitui um centro de convergência das correntes migratórias em permanente atividade. O empobrecimento crescente de regiões carentes do País, sobretudo em razão das pressões inflacionárias e da recessão econômica, faz movimentar para as fronteiras da Capital considerável fluxo humano: pessoas que deixam seu lugar de origem em busca de melhores oportunidades de vida, no exercício do impostergável direito de ir e vir e cujas conseqüências os poderes públicos devem assumir e sua integridade - não apenas acolhê-las condignamente, como também evitar prejuízo às populações aqui radicadas, no que concerne à qualidade de vida. As pressões daí decorrentes, sobre bens, serviços, mercado de trabalho e equipamentos urbanos exigem crescente esforço para manter os padrões qualitativos de atendimento.

     Assim, em três décadas, Brasília transcendeu sua concepção original: recebeu quase dois milhões de pessoas, além de cumprir sua função de Capital do País. O preço dessa sua função já ultrapassa, e muito, sua disponibilidade financeira e tributária.

     Sustentar Brasília como Capital significa assumir a segurança de toda uma máquina que move os Três Poderes da República, além das 83 representações diplomáticas e outros organismos internacionais, que não pagam imposto pelos 2.048.500 metros quadrados que ocupam. O Governo local é responsável, ainda, por toda a infra-estrutura - iluminação, limpeza e manutenção das áreas externas das Embaixadas.

     Pelo menos 1.500 homens da Policia Militar do Distrito Federal são permanentemente mobilizados para guarda dos equipamentos públicos, corpo diplomático e autoridades dos Três Poderes da União. Um efetivo de 400 policiais designado para a segurança exclusiva do Congresso Nacional, residências oficiais dos presidentes das duas Casas congressuais e das quadras funcionais dos parlamentares. Outros 500 homens estão de prontidão entre o Palácio da Alvorada e a Rodoviária do Plano Piloto. O Setor Bancário Sul e Norte - e o de Autarquias do Governo Federal absorvem pelo menos 150 homens responsáveis pela segurança externa e pelos equipamentos. Todos os edifícios tombados pela Unesco têm guarda ininterrupta. Além disso, cerca de 250 homens estão à disposição para segurança pessoal de autoridades. Além de tudo isso, naturalmente, existe a função inerente de manutenção da ordem e de garantia de segurança da população do Plano Piloto e das CidadesSatélites.

     O setor da Educação representa uma das maiores vitórias do planejamento da construção de Brasília, colocando-a numa posição de destaque em área tão vital ao desenvolvimento do País. Ao contemplar cada grupo de quadras com sua Escola Classe, garantiu ao aluno percorrer a trajetória do Jardim de Infância até o Segundo Grau. A partir das exigências de sua expansão, esse modelo foi sendo adotado nas Cidades-Satélites, atingindo-se o número expressivo de 500 escolas públicas no ano de 1993. A manutenção desse nível educacional vem sendo permanentemente ameaçado pelas dificuldades orçamentárias, que obstaculizam, também, expansão e a melhoria do ensino público.

 

     

     Idealizado por ser o melhor do País, o Sistema de Saúde do Distrito Federal conta com 12 hospitais, 48 centros de saúde e 32 postos de atendimento emergencial, suficientes para atender à demanda do Distrito Federal, desde que se assegure o repasse em dia dos recursos do Sistema único de Saúde - SUS. No entanto, sofre esse setor a pressão de demanda de outras regiões do País - a começar pelos municípios do assim denominado Entorno. Acorrem a Brasília pacientes dos mais longínqüos Estados, notadamente das regiões mais carentes, sobretudo quando se sabe que o atendimento de aidéticos e de pacientes renais, por exemplo, é totalmente gratuito, inclusive os transplantes. Desse modo, a crescente queda na qualidade do atendimento médico e hospitalar, em Brasília, deve-se ao descompasso orçamentário, pois o Ministério da Saúde leva em conta, nos cálculos, apenas o contingente populacional do Distrito Federal.

     A Constituição de 1988 representou, inegavelmente, o decisivo passo para a emancipação política do Distrito Federal, nos três níveis do poder - Executivo, Legislativo e Judiciário.

     1 - Determinou que a eleição do Governador e do Vice-Govemador "coincidirá com a dos Governadores e Deputados Estaduais, para mandato de igual duração", conforme estabelece o artigo 32, parágrafo segundo. O artigo 16 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias estabeleceu que, até que se efetivasse tal eleição, caberia ao Presidente da República indicá-los, com a aprovação do Senado Federal. Em 3 de outubro de 1990, mediante sufrágio universal e direto, foi escolhido o primeiro Governador eleito do Distrito Federal.

     2 - Estabeleceu que a eleição dos Deputados Distritais do Distrito Federal coincidiria com a dos Deputados Estaduais, para mandato de igual duração, de acordo com o mesmo parágrafo segundo do artigo 32, ficando estabelecido, no artigo 16 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que a competência da Câmara Legislativa do Distrito Federal, até sua instalação, seria exercida pelo Senado. Assim, a Resolução do Senado Federal número 157, de 1º de novembro de 1988, estabeleceu normas para que o Senado exercesse a competência da Câmara Legislativa do Distrito Federal aumentando o número de membros da Comissão do Distrito Federal para 21 senadores. Essa Comissão Permanente, que funcionou por 28 anos consecutivos, teve suas atividades encerradas na 24ª Reunião Especial, realizada em 12 de dezembro de 1990, sob a presidência do Senador Mauro Benevides. A primeira eleição para a Câmara Legislativa ocorreu em 3 de outubro de 1990, tomando posse os Deputados Distritais em 1º de janeiro de 1991, marco da autonomia legislativa do Distrito Federal. Trabalhando ininterruptamente durante um ano, dez meses e seis dias, os Deputados Distritais elaboraram a Lei Orgânica do Distrito Federal - nossa Carta Magna -, em moldes tão democráticos quão modernos - auscultando a sociedade, refletindo-se os anseios, traduzindo-se as necessidades. Ao todo, são oito capítulos, 365 artigos nas Disposições Permanentes, 55 nas Disposições Gerais e Transitórias. Em seu conteúdo, repousa a maioridade deste singular quadrilátero, unidade política diferenciada, única, atípica, decorrente do papel institucional que lhe cumpre no conjunto da Federação como sede dos Poderes da República.

     3 - Dispôs que compete à União "organizar e manter o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública do Distrito Federal", conforme o preconizado no artigo 21, XIII: que compete privativamente à União legislar sobre "organização judiciária, do Ministério Público e da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios, bem como organização administrativa destes", como estatui o artigo 22, XVII; que cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, dispor sobre a "organização judiciária, do Ministério Público e da Defensoria Pública do Distrito Federal", de acordo com o artigo 48, IX. Se na Constituição de 1967 o Ministério Público era classificado como organismo situado na esfera do Poder Executivo, na de 1988, vem inserindo um novo capítuo - "Das Funções Essenciais da Justiça" -, no qual se inclui, também, a Defensoria Pública. Assim sendo, os Ministérios Públicos e as Defensorias Públicas passam a situar-se no âmbito do Poder Judiciário sem, no entanto, serem órgãos desse poder. Ao Congresso Nacional cabe dispor sobre a organização judiciária, Ministério Público e Defensoria Pública do Distrito Federal, o que não ocorre com os Estados - a elaboração de leis sobre tais matérias é de competência das Assembléias Legislativas.

     Por oportuno, cumpre relembrar a Emenda nº 200.046.6, por mim apresentada à Comissão da Organização do Estado na Assembléia Nacional Constituinte, discordando do disposto no artigo 21, XIII, com a seguinte justificativa: "estamos pedindo o reconhecimento da autonomia plena para o Distrito Federal, acrescentando na redação do anteprojeto a autonomia judiciária". A emenda foi rejeitada.

     De acordo com o Professor Gilberto Tristão, "houve avanços e retrocessos na prerrogativa dos habitantes do Distrito Federal elegerem seus representantes políticos junto ao Congresso Nacional. As Constituições de 1981 e de 1934 incluíam o Distrito Federal entre as unidades da Federação que elegiam Deputados Federais e Senadores. A Carta de 1937 cassou o direito de voto dos eleitores do Distrito Federal, uma vez que não podiam eleger representantes para a Câmara, nem para o Senado. A Emenda Constitucional nº 25, de 15 de maio de 1985, mudou na Constituição de 1967 os artigos 39 e 41, determinando que a primeira representação do Distrito Federal seria composta de oito Deputados e três Senadores eleitos em 15 de novembro de 1986. A Constituição de 1988 assegurou-a definitivamente com os artigos 45 e 46, garantindo ao Distrito Federal tratamento equivalente ao de Estado".

     A atual Constituição, ao permitir ao Distrito Federal eleger o Governador e os Deputados Distritais, bem como ao conceder-Ihe competência para criar sua Norma Básica, também equipara o Distrito Federal a Estado. O mesmo sucede no que se refere à existência do Tribunal de Contas do Distrito Federal, criado pela Lei nº 3.751, de 13 de abril de 1960. Recorde-se que a Constituição de 1988 estabeleceu restrições à criação de Tribunais de Contas municipais, sendo de praxe sua existência em nível estadual.

     Tais são entre outras as ambigüidades, constantes no texto constitucional, referentes ao Distrito Federal, opinião reforçada pelo mesmo Professor Gilberto Tristão: "Ao analista menos avisado pode parecer apenas um problema de semântica o questionamento sobre se essa unidade da Federação equivale a um Estado ou a um Município. Não resta a menor dúvida que deve haver uma coerência terminológica em assunto de tal magnitude. Se o Distrito Federal tem equivalência com Estado, é um erro denominar-se seu Poder Legislativo de Câmara e sua Norma Básica de Lei Orgânica. Em sendo equiparado ao Município, não há respaldo jurídico para que o seu principal executivo seja intitulado Governador".

     Detém a União a competência para "organizar e manter a polícia civil, a policia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal", enquanto que, relativamente aos Estados, a competência da União limita-se a normas gerais.

     No aspecto tributário, o texto constitucional - artigo 155 - atribui ao Distrito Federal a competência tributária igual à dos Estados e dos Municípios, uma vez que absorveu as competências legislativas destes, participantes com elas da repartição da receita. Centra-se nesse setor a maior parte das celeumas em torno do Distrito Federal, alardeando-se a idéia da "dependência" de Brasília dos cofres da União.

     A esse propósito, cito palavras do economista Paulo Timm, em artigo publicado no jornal Gazeta Mercantil: "A dependência

de Brasília dos cofres da União, além de não ser fato exclusivo no País, é de natureza institucional e não econômica. Economia, a propósito, é renda e não produto físico decorrente de estrutura produtiva; nesse caso, o Distrito Federal não só dispõe e um nível invejável de renda - PIB -, da ordem de seis bilhões de dólares, como apresenta uma das mais altas rendas per capita do Continente, em torno de 4 mil dólares".

     As causas das dificuldades financeiras de Brasília situam-se, assim, em três níveis. Primeiro, como capital da República, Brasília cumpre um conjunto de funções e serviços, não remunerados. É preceito constitucional não haver cobrança de tributos entre os Poderes e suas várias instâncias. Os serviços de segurança às autoridades nacionais e internacionais, sediadas na capital, não podem ser cobrados, apesar de exercidos pelo governo local. As exigências de saúde e educação básicas, para o funcionamento dos poderes da República, também são desempenhadas pelo Governo do Distrito Federal, que para financiá-los não irá duplicar o valor dos impostos cobrados sobre a comunidade.

     A insuficiência de recursos do setor público na gestão de tão vastas e complexas funções da cidade, é também conseqüência da rigidez do sistema tributário vigente, que não distingue a vocação natural dos espaços urbanos.

     Vejamos o caso de Brasília. Sua função como sede do Governo, em meio a uma economia secularmente estável ao nível da susbistência, determinou sua vocação eminentemente terciária, em que sua principal matéria-prima é o número de passageiros que transitam pelo aeroporto local, na ordem de 3,5 milhões ao ano, terceiro em importância no País.

     Paradoxalmente, Brasília chega ao século XXI antes do tempo. Como tal, gera recursos fiscais, vez que aqui concentra importante processo gerador de renda. No ano de 1990, foram arrecadados, no Distrito Federal, 4 bilhões de dólares, ou o equivalente ao PIB da Bolívia. Mas apenas 20 por cento deste total se constitui em receita própria do Governo do Distrito Federal. O resto "pertence" à União, como produto de arrecadação dos Impostos sobre Patrimônio e IPI. O Distrito Federal, aliás, é a terceira arrecadação nacional do Imposto de Renda e um dos mais altos do IPI.

     Finalmente, o Distrito Federal é dos menos aquinhoados na distribuição aos Estados do produto da arrecadação federal realizada através do Fundo de Participação dos Estados - FPE, porque a participação de cada Estado neste fundo é resultado, principalmente, de sua população e da superfície. Sendo uma pequena unidade, o Distrito Federal é prejudicado e acaba gerando recursos fiscais para este fundo que, ao final, vazam para o "exterior".

     A discriminação que vitima o Distrito Federal na participação das rendas pública reclama urgente correção, sob pena de um comprometimento irreversível da autonomia política tão duramente conquistada.

     O primeiro nível de solução aponta para a Revisão do Texto Constitucional mesmo que sob forma de emendas, em que seja concedida ao Distrito Federal tratamento condizente com o rol de suas intransferíveis atribuições.

     Nesse sentido, constitui consenso entre todos os níveis de representatividade de Brasília, assim como nos setores organizados de sua sociedade, a criação do Fundo de Participação do Distrito Federal, autônomo em relação ao Fundo de Participação dos Estados e Municípios, com vistas a assegurar a fonte dos recursos, que seriam obtidos por intermédio dos mecanismos compensação pela perda das receitas decorrente das imunidades constitucionais que, com tanta intensidade, afetam a arrecadação do Distrito Federal.

     O segundo caminho indica o incremento da industrialização do Distrito Federal, como o meio de aumentar o recolhimento de tributos, levando-se em conta, evidentemente, a salvaguarda da arquitetura, do urbanismo e, sobretudo, do meio ambiente, priorizando, desse modo, a indústria de tecnologia limpa, não poluente, assim como a agroindústria, entre outras.

     A luta em prol da superação dos problemas financeiros e tributários que afetam a estabilidade administrativa do Distrito Federal não se restringe aos seus limites, não pertence somente ao cidadão brasiliense. Ao contrário, constitui uma questão afeta a toda a Nação brasileira. Brasília é a Capital do País. Como tal, é a Capital de todos os brasileiros e por todos - na pessoa dos que os representam - deve ser defendida, preservada, transmitindo sua verdadeira imagem para o País e para o Exterior: meta-síntese do Governo do Presidente Juscelino Kubitscheck, símbolo do rompimento das amarras que atavam o País a um passado de anacronismos, de lançamento do Brasil no rumo do desenvolvimento, da prosperidade e da modernização. Que não tenha sido vão o esforço.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 21/04/1994 - Página 1967