Discurso no Senado Federal

RELATANDO ATIVIDADES DESEMPENHADAS DURANTE SEU COMPARECIMENTO A CONFERENCIA INTERNACIONAL SOBRE A POBREZA EM COPENHAGUE, DINAMARCA. DEFESA DE UM PAPEL MAIS DINAMICO A SER ADOTADO PELO SENADO FEDERAL PARA CONCRETIZAR SOLUÇÕES DE GRANDES PROBLEMAS SOCIAIS NO BRASIL.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • RELATANDO ATIVIDADES DESEMPENHADAS DURANTE SEU COMPARECIMENTO A CONFERENCIA INTERNACIONAL SOBRE A POBREZA EM COPENHAGUE, DINAMARCA. DEFESA DE UM PAPEL MAIS DINAMICO A SER ADOTADO PELO SENADO FEDERAL PARA CONCRETIZAR SOLUÇÕES DE GRANDES PROBLEMAS SOCIAIS NO BRASIL.
Aparteantes
Emília Fernandes, Marluce Pinto, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DCN2 de 18/03/1995 - Página 3269
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • RELATORIO, ATIVIDADE, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, CONFERENCIA INTERNACIONAL, PAIS ESTRANGEIRO, DINAMARCA, RELAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, MANIFESTAÇÃO, NECESSIDADE, ATENÇÃO, GOVERNO, POLITICO, DEFESA, SITUAÇÃO, CRIANÇA, ADOLESCENTE, MULHER, BRASIL.

A SRª BENEDITA DA SILVA (PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cumprindo a determinação positiva de que devemos trazer o relatório de nossas viagens, prestando contas de nossas atividades, em que pese eu não estar representando esta Casa no fórum oficial de Copenhague, fui convidada a participar do fórum paralelo, também realizado em Copenhague, oportunidade em que me manifestei a respeito da situação da criança e do adolescente em nosso País.

Sr. Presidente, o nosso País foi colocado na ordem do dia como um país que violenta crianças, um país que não tem justiça social, um país que, na verdade, tem exterminado crianças, um país em que há uma degradação social enorme. Por isso faz-se necessária uma atenção especial não só dos governantes, mas também dos representantes políticos, para esta questão.

É claro que sabemos das dificuldades e desigualdades sociais existentes em nosso País. Mas é preciso resgatar a nossa imagem no exterior. E a forma de fazê-lo seria aplicar políticas que dêem ao País condições de se desenvolver economicamente, para que não se veja mais aqui esse terrível quadro social que se apresenta em cada esquina de nossas cidades.

Foi importante estar nesse fórum paralelo, até porque, em Copenhague, tivemos também um fórum oficial, onde, coincidentemente, participamos das comemorações do Dia Internacional da Mulher, oportunidade em que o nosso Embaixador pôde se manifestar em nome do Governo, apresentando a proposta que temos em relação aos direitos da mulher.

Nesse momento, ouvimos atentos a sua proposta - inclusive contávamos com a presença do Senador Eduardo Suplicy - mas a consideramos tímida. Uma vez que somos a maioria da população deste País, precisamos também resgatar a nossa cidadania, porque não temos podido exercer, em toda a sua plenitude, nossas funções como cidadãs, seja em relação à nossa capacidade intelectual e profissional, seja na nossa participação política, seja na maternidade, que é uma questão natural para nós.

Precisamos, na verdade, fazer com que o Governo assuma compromissos maiores com as mulheres deste País. Isso é fundamental, já que em setembro haverá outro encontro, na cidade de Pequim. Esperamos que o Governo dele participe também, levando uma proposta mais amadurecida do ponto de vista das reivindicações das mulheres, inclusive daquelas que não têm a oportunidade de participar dos debates. Para isso é preciso que haja uma participação popular, porque são essas mulheres, na sua maioria, que estão na ordem do dia, para que haja o implemento de uma política imediata. É preciso ouvi-las aqui nesta Casa e na nossa representação, que certamente estará presente nesse encontro, colhendo informações que possam, de alguma maneira, contribuir com o Governo Federal na defesa desses interesses.

Em Copenhague, tive também a oportunidade de visitar o Parlamento, onde pude observar a atuação dos parlamentares e a participação do público. Não vou comparar uma Casa com a outra, porque ainda tenho a esperança de ver toda essa galeria lotada de brasileiros e de brasileiras assistindo ao debate político que esta Casa oferece. Acho que, no Senado, temos melhores oportunidades de fazer o debate nacional das políticas de interesse do nosso País e da política internacional. O povo precisa ter a oportunidade de participar desse debate, ainda que como ouvinte, evidentemente. Então, é preciso que este Parlamento seja dinâmico na presença dessa representação.

Sr. Presidente, ouvi atentamente o discurso feito pelo Senador Pedro Simon. Entendo que a sua iniciativa é perfeitamente ajustável ao exercício democrático de nosso mandato, independentemente das questões regimentais. Como políticos, temos o dever de prestar esclarecimentos ao povo e ao Governo no momento em que formos requisitados. O Parlamento estará cada vez mais enriquecido, na medida em que realmente puder estabelecer um diálogo entre as representações dos Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo. É importantíssima essa iniciativa, e também quero referendá-la.

O Sr. Pedro Simon - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Concedo um aparte ao nobre Senador.

O Sr. Pedro Simon - Em primeiro lugar, quero manifestar a V. Exª a alegria e a emoção com que a vejo na tribuna. Aprendi a admirá-la na tribuna da Câmara dos Deputados. É uma honra muito grande para nós, Senadores, tê-la aqui. Mulher, mulher de cor, mulher das favelas do Rio de Janeiro, V. Exª representa o povo nesta Casa. Para nós, querida Senadora Benedita da Silva, que geralmente debatemos aqui a vida inteira, nos oito anos de mandato, as questões, por exemplo, Brasil e Bélgica, os problemas da grande economia, os problemas da aplicação das taxas de juros, o problema dos resultados, o problema das exportações, o problema das importações, o problema daqueles que produzem e vendem seus produtos, etc. Nós, hoje, vemos V. Exª representando a gente simples, aqueles que passam fome, aquela gente das favelas do Rio de Janeiro, gente que parece ser a única responsável pelos crimes lá cometidos. V. Exª vem nos mostrar o outro Brasil, o Brasil que exige a nossa presença e o nosso trabalho, o Brasil que nos pergunta a cada dia, quando voltamos para casa - nós, que chegamos ao Senado às 7h ou às 8h da manhã, que trabalhamos, que debatemos, que discursamos, que fomos para as comissões - em que o nosso trabalho redundou de bom, de alívio para essa gente miserável, para essa realidade de 32 milhões de brasileiros que passam fome? Olhando para V. Exª, com a representatividade que tem, olhando para a espontaneidade do seu pronunciamento, em que aborda assuntos relativos à mulher, às minorias, à fome, à miséria, às discriminações internacionais, tenho a convicção de que V. Exª está aqui como que cobrando de nós. Quero dizer-lhe que para mim não é preciso nem que vá para a tribuna. Basta olhar para V. Exª para constatar o seu vigor, a sua seriedade, a sua representatividade. Gostaria de dizer-lhe que está aqui como uma espécie de consciência nossa, a nos cobrar o que estamos fazendo pelo Brasil. Que o Brasil vai mudar, vai mudar! Já cresceu 5%, 6%. Já tivemos a época do milagre brasileiro, na Revolução, na época do Sr. Delfim, quando crescia mais do que qualquer outro país do mundo. Já construímos riqueza. Mas, em termos sociais, considerando-se os que sofrem, os excluídos, este Brasil está caminhando cada vez pior. V. Exª está aqui para nos advertir e para nos alertar. Dizem que vale mais acender a vela do que amaldiçoar a escuridão. Como se diz que, na outra vida - se existir outra vida - será cobrado de cada um na mesma medida dos bens e da competência que Deus lhe deu; que será cobrado de cada um o que fez para minorar o sofrimento dos que passam fome e dos que morrem de fome; então, nós, Senadora, seremos os mais cobrados, porque somos os Senadores da República, somos os chamados pais da Pátria, os 81 privilegiados que devem estar preocupados em resolver os problemas da Nação. E o que estamos fazendo? Como estamos cumprindo o nosso mandato e o nosso compromisso de atender aos milhões que passam fome, que estão na miséria? Não importa se estão no Rio, no eleitorado de V. Exª, ou se estão no Rio Grande do Sul, no meu eleitorado. Eles estão no Brasil, e essa é a nossa primeira missão. V. Exª, para mim, é um símbolo, querida Senadora, do caminho que temos que percorrer. Meu abraço e minha solidariedade pela presença de V. Exª na tribuna.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Agradeço o aparte sensível de V. Exª.

Ir a Copenhague significava também levar a contribuição desses setores para o debate que se travava no fórum oficial de desenvolvimento social. Temos visto as discussões das grandes questões, e quando nos preocupamos com a questão social, ela não é assegurada nem nos nossos debates e muito menos nas nossas políticas.

Pude observar também que, naquele país, são cobradas taxas elevadíssimas, mas elas têm retorno social, principalmente na área da saúde, de forma que, nas ruas, não se distingue pobre de rico. Atentei também para a questão da educação, sem a qual é impossível o desenvolvimento.

Se o nosso Governo não for sensível à educação do povo brasileiro, teremos, daqui a pouco tempo, não apenas ignorantes, porque a cultura é tudo aquilo que o indivíduo consegue aprender por si mesmo, mas cidadãos sem a chamada educação formal, que dá a condição ao indivíduo, até mesmo ao que está na base da pirâmide social, de competir no âmbito do seu trabalho, já que ele precisa ter informações.

Nosso País, que é praticamente um país de analfabetos, não garante, na sua política social, a alfabetização, essa oportunidade aos lares pobres, mas apenas aos privilegiados. E porque assim somos, porque conseguimos deter essas informações, também somos devedores, co-responsáveis em fazer com que essa sensibilidade social, que economicamente não se ajusta, possa chegar ao nosso governo para o implemento dessa política.

A Srª Marluce Pinto - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Ouço o aparte de V. Exª.

A Srª Marluce Pinto - Nobre Senadora, realmente, no Senado, só temos satisfação em tê-la conosco, para dar continuidade ao grande trabalho que V. Exª fez no decorrer de oito anos como Deputada. Fico à vontade em dizer estas palavras, porque fui sua colega durante quatro anos na Câmara Federal e, na época dos trabalhos da Constituição, acompanhei passo a passo a sua disposição, a sua atuação, as suas indicações. Nessa época, éramos 26 mulheres na Câmara; hoje, no Senado da República, somos cinco, mas tenho certeza de que teremos a mesma cooperação dos nossos colegas Senadores, como tivemos na Câmara dos Deputados. A atuação de V. Exª será de grande valia, porque sabemos do seu desprendimento, até porque as dificuldades enfrentadas no passado serviram para fortalecê-la na defesa do povo. Todos nós aqui sabemos dos problemas sociais do nosso País. Através do nosso trabalho nos nossos Estados, procuramos minimizar a fome da população, procuramos dar melhores condições de vida às crianças e aos idosos, enfim, fazer um trabalho digno que possa ter alguma repercussão no contexto nacional. Mas, nessa revisão constitucional, saberemos também nos impor, mostrar o nosso trabalho. Tenho certeza, minha colega Benedita da Silva, que vamos conseguir, como já conseguimos. O Brasil e nós, Senadores, temos certeza absoluta de que a sua presença em Copenhague elevou a imagem do nosso País, porque V. Exª soube representá-lo muito bem. Tenho absoluta convicção de que, todas as vezes em que Benedita da Silva sair do nosso País para representá-lo, será para dignificar não só a mulher, não só a mulher de cor, não só a Senadora, mas todo o povo brasileiro. Quero parabenizá-la por seu belo discurso. Receba desta sua colega toda solidariedade e admiração pelo seu trabalho.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Agradeço o aparte.

A nossa presença aqui, ainda que minoritária, estará se somando à presença masculina, que é majoritária e que conhecemos muito bem. Mas representamos a maioria da população brasileira e, assim, desejamos nos somar aos colegas, para que a discussão política não seja discriminatória em relação à participação da mulher, que tem uma representação política legítima.

O SR. PRESIDENTE (Antônio Carlos Valadares) - V. Exª dispõe de dois minutos para terminar o seu discurso. Informo à Casa que, logo após a fala da nobre Senadora Benedita da Silva, entraremos na Ordem do Dia.

Lamentavelmente, os demais oradores não poderão falar antes da Ordem do Dia; mas, como esta está bastante resumida, posteriormente a ela, cada um terá direito a 50 minutos. O primeiro orador após a Ordem do Dia será o Senador Geraldo Melo.

Muito obrigado, Senadora Benedita da Silva.

A Srª Emília Fernandes - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senadora Benedita da Silva?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Lamento profundamente não lhe poder conceder o aparte, nobre Senadora Emília Fernandes. Ficará para a próxima vez.

O SR. PRESIDENTE (Antônio Carlos Valadares) - V. Exª ainda poderá conceder o aparte à Senadora Emília Fernandes.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Sendo assim, concedo o aparte à nobre Senadora Emília Fernandes.

A Srª Emília Fernandes - Solicitei o aparte, nobre Senadora Benedita da Silva, para manifestar a minha satisfação de saber que este Senado esteve tão bem representado no Encontro em Copenhague, onde foram discutidas questões importantes do ponto de vista social, no que diz respeito à igualdade, ao desenvolvimento e até mesmo à paz. Com a presença de V. Exª e do Senador Eduardo Suplicy, temos certeza de que esta Casa esteve muito bem representada. Recentemente, fui designada por este seleto Plenário e pela Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional para ir à última reunião preparatória da Conferência de Pequim, que já está acontecendo em Nova Iorque desde o dia 15 e se prolongará até o dia 4. Por decisão conjunta de uma bancada também de mulheres da Câmara Federal que estarão indo a essa reunião em Nova Iorque, sairemos do Brasil no dia 29 e participaremos da reunião até o dia 4, naquela cidade. Entendemos também a preocupação de V. Exª no que se refere a estratégias e ações concretas e objetivas, para que nós, em conjunto, homens e mulheres, com uma grande responsabilidade de autoridades maiores deste País, consigamos, a partir de Pequim, traçar linhas de ações efetivas. Para isso, contamos, inclusive, com o trabalho dos Parlamentares mas, acima de tudo, com os órgãos representativos do Governo, para que abram, de fato, espaços e caminhos para que as mulheres e os homens discriminados deste País, um número significativo, excluídos de uma condição de vida digna, tenham ações objetivas. Estamos indo para essa reunião preparatória com a análise de um documento que foi elaborado pelos órgãos governamentais, mas também estamos dando uma atenção especial ao plano de ação proposto por um grupo de ação paralela, que há meses vem estudando e apresentando propostas nesse sentido. Quero dizer da satisfação de ouvir V. Exª narrando alguma coisa que, tenho certeza, sai do fundo do coração e dos sentimentos, porque é a trajetória da sua própria vida. Somo-me a esse sentimento de ver urgentemente o País sair da imagem negativa que lhe é feita no exterior; temos, portanto, um compromisso muito importante. É com este pensamento e este desejo que estarei indo a Nova Iorque para levar a minha contribuição e, muito mais do que uma retórica, também a trajetória de uma mulher de vida simples, assalariada, que realmente conhece as dificuldades prementes da grande maioria do povo brasileiro. Coloco-me à disposição de V. Exª para que através da sua experiência nos passe às mãos, inclusive, sugestões que certamente enriqueceriam a nossa participação nesse momento em Nova Iorque. Muito obrigada.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Agradeço o seu aparte. Sei que a nobre Senadora, como educadora, sabe perfeitamente o quanto isso é importante. Este Senado estará muito bem representado na reunião em Nova Iorque.

Desejo concluir, dizendo que aprendi que a injustiça insulta os céus e que Deus não se deixa escarnecer diante dessa injustiça. Por isso, todos nós devemos estar imbuídos do desejo e da vontade de ver não só o nosso País crescer, mas também os seus habitantes. Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 18/03/1995 - Página 3269