Discurso no Senado Federal

JUSTIFICANDO A IMPORTANCIA DO PROJETO SIVAM PARA A AMAZONIA, NA OBTENÇÃO DE UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTADO NA REGIÃO.

Autor
Flaviano Melo (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Flaviano Flávio Baptista de Melo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).:
  • JUSTIFICANDO A IMPORTANCIA DO PROJETO SIVAM PARA A AMAZONIA, NA OBTENÇÃO DE UM DESENVOLVIMENTO SUSTENTADO NA REGIÃO.
Aparteantes
Ademir Andrade, Eduardo Suplicy, Geraldo Melo, Iris Rezende, Nabor Júnior.
Publicação
Publicação no DCN2 de 10/05/1995 - Página 7978
Assunto
Outros > SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
Indexação
  • DEFESA, IMPLANTAÇÃO, PROJETO, SISTEMA, VIGILANCIA, Amazônia Legal, MELHORIA, CONTROLE, TRAFEGO AEREO, RECURSOS HIDRICOS, FACILITAÇÃO, MAPEAMENTO, PRODUÇÃO, MAPA GEOGRAFICO, ACOMPANHAMENTO, EVOLUÇÃO, CLIMA, COMUNICAÇÃO DE DADOS, COMUNICAÇÃO DE MENSAGENS, DESTINAÇÃO, DEPARTAMENTO DE AGUAS E ENERGIA, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), POLICIA FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), OBJETIVO, EFICIENCIA, REALIZAÇÃO, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO, REGIÃO AMAZONICA.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, APURAÇÃO, DENUNCIA, IRREGULARIDADE, FRAUDE, CONTRATAÇÃO, EMPRESA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, EXECUÇÃO, PROJETO, SISTEMA, VIGILANCIA, Amazônia Legal.

O SR. FLAVIANO MELO (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, só quem vive na Amazônia sabe o quanto é difícil nela sobreviver. E é como amazônida que retomo, hoje, o debate a respeito do sistema de vigilância da região, o projeto SIVAM, tão combatido nas suas particularidades e esquecido quanto à essência e que, até agora, não conseguiu ser colocado em prática.

É preciso ter-se em mente, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a situação da Amazônia. É uma região sofrida, incompreendida, explorada e mal assistida, representando quase dois terços do território nacional, com sua reserva biológica e mineral para o futuro e que, no entanto, ao longo dos anos, tem sido depredada de modo sistemático.

Os exemplos são abundantes, vindos desde o Ciclo da Borracha, que tantas divisas representou para o Brasil, mas tão pouco ou quase nada trouxe de benefícios para a região, hoje na humilhante situação de indigência, conforme testemunham as atuais condições de vida dos seringueiros e demais habitantes locais.

Os desmatamentos avançam, especialmente com a pecuária extensiva e a exploração madeireira irracional.

A política de uso dos seus recursos minerais é feita sem sustentação na realidade.

O garimpo descontrolado, a omissão ou má ação governamental, nessa área, dão margem à exploração do homem pelo homem, à poluição e depredação do meio ambiente, à evasão de riquezas não retornáveis, à miséria, à pobreza e ao aviltamento do seu povo.

Os índios da região, vítimas naturais do processo de depredação, continuam a ter suas áreas invadidas e, como a maioria dos habitantes locais, estão na miséria, com fome, vítimas das mais diferentes doenças.

Há ainda denúncias de que a Amazônia está em vias de transformar-se em pólo abastecedor a serviço do narcotráfico. O seu isolamento, dificuldades de acesso, pobreza, vizinhança com países que cronicamente padecem dos males da droga levam a região a essa ameaça.

Atualmente, por exemplo, no sul da Amazônia, em sua fronteira com o Peru e a Bolívia, e na região do alto Rio Negro, na divisa com a Colômbia, a presença do narcotráfico é extremamente forte.

Paralelo a tudo isso estão as mais diversas ações governamentais ou da iniciativa privada, realizadas de forma inadequada à realidade local e que, assim, redundaram em sucessivos fracassos ou não tiveram resultados compensadores. Cito como exemplos a Transamazônica, a Perimetral Norte, o Projeto Jari, além de hidrelétricas, projetos de colonização, entre muitos outros.

Uma simples análise do quadro, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, leva à conclusão de que a Amazônia, definitivamente, não aceita ações isoladas ou políticas individualizadas. A região precisa, sim, de políticas adequadas e globais baseadas em informações concretas e corretas sobre a sua realidade.

Esse trabalho, pelo que entendo, é o que preconiza o projeto SIVAM que, porém, vem sendo severamente bombardeado. Seja por seu custo, seja por seu caráter estratégico, seja por questões relacionadas à lisura dos atos de escolha da empresa fornecedora de bens e serviços (a Raytheom), seja pela possível fraude ao INSS da empresa selecionada como integradora brasileira neste processo (a ESCA).

Não quero, aqui, tecer críticas a tais procedimentos. Ao contrário. Reconheço em muitos destes ataques a preocupação justa e fundada na preservação da lei e no respeito aos procedimentos que a ética e a lisura determinam no trato com a coisa pública.

Alerto, porém, para o fato de que não podemos deixar que o particular enfraqueça o essencial junto à opinião pública, que é a importância de um projeto da natureza do SIVAM para a Amazônia, uma vez que se constitui num extraordinário sistema de conhecimento regional e de repasse de informações que garantam o planejamento adequado e o sucesso das ações a serem executadas na região.

Segundo o projeto apresentado nesta Casa, o SIVAM, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, não é um projeto simplesmente destinado a fazer o controle do tráfego aéreo da Amazônia. É um pouco disso e muito mais.

Vai permitir, por exemplo, o monitoramento diário dos seus recursos hídricos por mais de 300 plataformas de coleta de dados espalhadas nos rios da região.

O mapeamento com relevo será procedido através de sensores específicos, permitindo produzir cartas atualizadas e em escala adequada.

Os radares e sensores meteorológicos permitirão um levantamento e acompanhamento da evolução climática regional.

As estações/rádio a serem implantadas darão margem à veiculação imediata das mensagens.

Todas as informações serão tratadas, processadas de modo global pelos Centros Regionais de Vigilância e pelo Centro de Controle Geral - que difundirão estes dados a seus usuários e provedores de informações a quem estarão interligados como o Departamento de Águas, a FUNAI, o IBAMA, a Polícia Federal, o IBGE, entre outros, para que possam executar e controlar suas tarefas de maneira eficaz.

A informação, ferramenta essencial, dirá no momento exato quando o desmatamento ocorrer, quando o rio se poluir, quando a movimentação irregular se processar e fará mais: proverá dados básicos sobre geologia, relevo e clima para a ação de planejamento político do Governo.

O Governo Federal disporá, portanto, dos instrumentos que precisa para traçar, implementar, executar e controlar as políticas regionais de modo integrado e coerente.

Assim, a Polícia Federal, por exemplo, poderá desenvolver ação mais eficaz contra o narcotráfico; a FUNAI, melhor controlar e agir nos casos de invasões de terras indígenas; o IBAMA, conduzir, de forma correta, suas medidas na preservação do meio ambiente, etc.

No campo social o zoneamento agro-ecológico e urbano e o direcionamento adequado de investimentos governamentais serão a conseqüência natural.

A iniciativa privada também será beneficiada, pois terá informações para a implantação de novos empreendimentos. Conforme já disse outras vezes: se dermos aos empresários opções de investimentos rentáveis que não agridam a natureza, eles acolherão as sugestões oferecidas. Isto, repito, somente é possível com maior conhecimento sobre a região.

Sei que um projeto grandioso como esse, envolvendo recursos da ordem de 1 bilhão e 400 milhões de dólares, certamente desperta a cobiça de muitos, dando ensejo a que ilegalidades possam ser tentadas.

Para a ilegalidade, o caminho correto é a aplicação da lei. Havendo ilícito, ele deverá ser investigado e punido. Se a ESCA, por exemplo, é culpada, que seja punida. E que o Governo indique outra empresa para desempenhar a sua função.

Segundo a imprensa, o Presidente Fernando Henrique Cardoso já cogita esta medida. Cabe, então, tomar a decisão com a maior rapidez. O que não pode ocorrer é a paralisação do projeto ou mesmo a demora na sua execução, como vem acontecendo.

A Amazônia tem urgência desse trabalho. E há um outro fator que também precisa ser levado em conta: se até o próximo dia 15 de junho o Brasil não assinar o contrato comercial que permite o início do projeto, junto ao EXIMBANK (banco norte-americano que financia a maior parte do projeto SIVAM), começa a pagar a chamada "taxa de compromisso" (COMMITMENT FEE).

Essa taxa é retroativa a 1º de dezembro de 94 e, até 15 de junho de 95, soma por volta de 3 milhões de dólares, ou seja, é um dinheiro que vai se pagar por um financiamento que sequer se usou.

É certo que não será por causa disso que vamos deixar de questionar quaisquer ilegalidades que tenham ocorrido ou que possam acontecer no processo. Mas é preciso uma imediata solução para a questão. Afinal, estamos há quase meio ano discutindo o assunto, sem que praticamente nada tenha sido resolvido. Enquanto isso, a Amazônia continua sendo depredada.

Por todos estes fatos, levanto aqui um questionamento destinado à meditação de todos: a quem interessa a extinção do SIVAM?

O Sr. Ademir Andrade - V. Exª me concede um aparte?

O SR. FLAVIANO MELO - Concedo o aparte ao Senador Ademir Andrade.

O Sr. Ademir Andrade - Senador Flaviano Melo, concordo plenamente com V. Exª. V. Exa. faz uma análise da nossa situação, das nossas dificuldades e da necessidade da implantação do Projeto SIVAM.

O que estranho é que diante de tantas coisas de que precisamos, a implantação desse projeto seja colocada como prioridade e executada, em toda a sua totalidade, praticamente, com financiamento externo. Fico muito preocupado em não definirmos as nossas prioridades. São um bilhão e quatrocentos milhões de dólares investidos nesse projeto. Também estou convencido de que ele é necessário, mas será que, antes de se conseguir o financiamento para a realização de despesa de tamanho vulto, não seria mais importante asfaltar, por exemplo, toda a rodovia Transamazônica? A construção de mais de dois mil quilômetros dessa rodovia não chegaria a custar quatrocentos milhões de dólares. Não seria mais prioritário asfaltar os mil quilômetros da rodovia Santarém-Cuiabá, a qual se tornaria um grande corredor de exportação da produção agrícola da área que V. Exª representa nesta Casa? Para isso, seriam gastos apenas cerca de cento e vinte milhões de dólares. Não seria mais importante levar a energia da Hidrelétrica de Tucuruí a todo o oeste da Amazônia, a Manaus, a Macapá, à margem direita do Rio Amazonas, a Itaituba, a Santarém? Quanto desenvolvimento não haveria na nossa região! Para tudo isso, seriam necessários apenas quinhentos milhões de dólares. Senador Flaviano Melo, o que me preocupa é que obras muito mais prioritárias do que o Projeto SIVAM, as quais trariam uma melhoria de vida incomparavelmente maior para o nosso povo, não são sequer consideradas. Essa é a minha dúvida, o meu questionamento. Considero que todas essas coisas são necessárias, inclusive o Projeto SIVAM. Entretanto, eu, no exercício do Governo, jamais faria um empréstimo desse para implantar o SIVAM, antes de haver colocado energia em toda a Amazônia, asfaltado suas rodovias e aplicado recursos na reforma agrária, para dar melhores condições de vida ao povo.

Essa prioridade tem que ser cautelosamente analisadas por nós, até em nível de desconfiança: por que o Governo, vendo coisas tão necessárias, preocupa-se com esta questão da segurança e não se preocupa com o essencial? Enquanto não se fizer uma obra prioritária, não se pode fazer outra. Essa era a opinião que gostaria de manifestar em relação ao pronunciamento de V. Exª.

O SR. FLAVIANO MELO - Obrigado pelo aparte, Senador Ademir Andrade, mas permita-me discordar.

O SIVAM dará condições de se encontrar uma forma definitiva de exploração da Amazônia, pois vamos ter um zoneamento agroecológico total da região, e informações que vão subsidiar o Governo para trazer de fato o desenvolvimento sustentado para a nossa região.

Entendo a sua preocupação. No meu estado mesmo, as rodovias federais, a BR-317 e a BR-364, estão praticamente intransitáveis. Oitenta por cento dos nossos municípios não podem ser alcançados durante o inverno e muitos deles nem mesmo durante o verão.

Mas o Governo já decidiu, e esse projeto vai ser de fundamental importância para o desenvolvimento da nossa região. A informação é fundamental para que possamos encontrar, definitivamente, uma forma de exploração da nossa riqueza, que está morrendo, acabando-se.

Não adianta querermos importar modelos, derrubar floresta para plantar feijão ou soja, temos lá uma riqueza que deve ser explorada, e para isso precisamos ter a informação concreta, precisa e definitiva da nossa região.

O Sr. Eduardo Suplicy - V. Exª me permite um aparte?

O SR. FLAVIANO MELO - Ouço V. Exª, Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Como o Senador Ademir Andrade, também pergunto se não haveria gastos de maior prioridade, inclusive na Região Amazônica, do que o Projeto SIVAM. Gostaria que o Executivo, que aqui propôs que se gastasse um bilhão e quatrocentos milhões de dólares - na verdade, será o dobro disso ao longo do período em que se pagará o projeto, dados os seus custos financeiros -, apresentasse projetos alternativos e a respectiva relação de benefício e custo social. Para a realização de gasto tão extraordinário, avalio que deveríamos ter examinado melhor a matéria. Deveríamos ter tido o cuidado que eu havia recomendado no dia 21 de dezembro, pois soou estranha a maneira acelerada como o Senado votou o projeto. Utilizou-se um requerimento de urgência baseado em perigo para a segurança nacional que não havia.

Seria perfeitamente viável este projeto tramitar com maior prudência, para que depois não tivéssemos os problemas que estamos observando.

Ainda hoje, na Folha de S. Paulo, o Professor de Física da UNICAMP, Rogério Cerqueira César, chama a atenção para alguns aspectos importantes. Afirma ele que é relevante, caso se aprove o Projeto SIVAM, que ele seja executado com o desenvolvimento de tecnologia nacional, criando-se oportunidades adicionais e não confiando-se simplesmente em tecnologia de empresas estrangeiras. A parte principal deste projeto poderia basear-se naquilo que o corpo tecnológico das universidades brasileiras e das empresas brasileiras estariam em condição de realizar, conforme o editorial sobre o assunto SIVAM divulgado à página 3 do jornal Folha de S. Paulo.

O SR. FLAVIANO MELO - Li o artigo desse físico da UNICAMP. Não discordo que o projeto seja realizado com tecnologia nacional, com mão-de-obra nacional.

Não é isso, entretanto, que está em discussão. Chamo a atenção para o fato de que, sempre que aparece algo que venha a beneficiar a Amazônia, percebe-se um "torpedeamento" vindo de todos os lados.

Sobre esse Projeto SIVAM, cujo empréstimo foi aprovado pelo Senado, assisti a duas explanações da equipe responsável, na Comissão de Relações Exteriores. Depois que houve esse problema com a ESCA, o torpedeamento foi geral. Infelizmente, hoje vemos que ele está morrendo e corre o risco de não ser executado. Essa a minha grande preocupação.

O Sr. Nabor Junior - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. FLAVIANO MELO - Concedo o aparte ao Senador Nabor Junior.

O Sr. Nabor Junior - Considero o pronunciamento de V. Exª da maior relevância e de grande oportunidade. V. Exª está trazendo ao debate desta Casa um problema que tem suscitado, realmente, manifestações em vários segmentos da sociedade brasileira, que é o Projeto SIVAM. É evidente que existem pessoas que defendem a implantação desse projeto, como nós da Amazônia, por exemplo, que entendemos que ele vai contribuir para um melhor conhecimento das nossas potencialidades. A Amazônia ainda é uma área praticamente desconhecida. Não temos um projeto de desenvolvimento integrado para essa região. Temos acompanhado vários depoimentos de pessoas, como Samuel Benchimol, que é um dos amazônidas mais ilustres deste País, que em seu livro "Amazônia" afirma não existir ainda um projeto de desenvolvimento da Região. O SIVAM viria contribuir para se conhecer a Amazônia, para saber qual é a sua verdadeira vocação, quais são as áreas apropriadas para agricultura, onde estão as jazidas de minério que podem ser exploradas etc. Então, considero da maior valia o pronunciamento de V. Exª, porque está trazendo à colação dos companheiros do Senado um problema da maior relevância para o nosso País. Contudo, é preciso que se entenda que todos os grandes investimentos neste País, em todos os tempos, foram feitos na Região Centro-Sul, na Região Sul, e pouca coisa existe de concreto na Região Norte, na Região Amazônica. A própria Transamazônia, a que se reportou há pouco o Senador Ademir Andrade, ficou pela metade: o Governo iniciou, mas não concluiu. É uma estrada que está totalmente abandonada. A BR-364, que tinha a finalidade de oferecer uma saída do Brasil para o Pacífico, passando pela nossa Região, também não tem definido um prazo de conclusão. O mesmo ocorre com a Cuiabá-Santarém. Quer dizer, todos os investimentos que o Governo pretende fazer na Região Norte não têm conseqüência, não têm conclusão, porque os recursos são escassos, e o Governo nem sempre lhes dá continuidade. Por isso, toda essa celeuma, essa verdadeira batalha que se faz a respeito do Projeto SIVAM existe porque ele vai ser implantado na Região Amazônica. Se fosse em outra Região do País, tenho quase absoluta convicção de que não haveria essas manifestações contra a sua implantação. De qualquer sorte, V. Exª está tendo a oportunidade de trazer um assunto dessa relevância para discussão no Plenário do Senado Federal e por isso parabenizo V. Exª.

O SR. FLAVIANO MELO - Muito obrigado, Senador Nabor Junior, pelo seu aparte. V. Exª tem toda razão. Realmente, o que afirmei aqui, V. Exª comprovou. Tudo o que acontece para benefício da Amazônia é boicotado, sofremos uma pressão imensa dos órgãos, das entidades envolvidas para que não aconteça.

Concordo com V. Exª que, se isso fosse no Sudeste ou no Sul do País, não haveria nenhum problema e estaria sendo aplaudido por todos daquela Região.

O Sr. Geraldo Mello - V. Exª me permite um aparte, Senador Flaviano Melo?

O SR. FLAVIANO MELO - Concedo o aparte ao Senador Geraldo Mello.

O Sr. Geraldo Mello - Agradeço a oportunidade e confesso a V. Exª que o seu discurso fez-me romper uma certa timidez com a qual venho encarando a discussão desse Projeto SIVAM. Tenho um gosto especial pelo assunto, já que envolve questões relacionadas à segurança do vôo e à maior disponibilidade de informações que permitam seja feita a aviação no País no nível da maioria das nações mais maduras do mundo. Esse gosto decorre do fato de que privadamente sou aviador. Embora esta seja uma Casa madura, que contribua com a experiência e o equilíbrio dos homens e mulheres que a integram para tirar, muitas vezes, o componente apaixonado que possa haver num momento de decisões graves do País, resisti a participar das discussões até agora porque sempre senti, em torno da discussão do Projeto SIVAM, que há muito mais frases de efeito, muito mais a suspeita, fundada ou não, instantânea em cada aspecto que envolve as decisões mais graves que se relacionam com o projeto de maior vulto no País. Não vi, por exemplo, nessa discussão toda, o esclarecimento de uma questão elementar: dois consórcios disputaram uma licitação, e, se fosse divulgada a informação de quanto esses consórcios cobraram, quais foram as vantagens oferecidas por eles, muito provavelmente descobrir-se-ia que quem ganhou deveria realmente ter ganho. Por isso, não haveria motivo para se envolver essa decisão em tanta suspeita. Com relação à questão levantada por dois eminentes Senadores, Ademir Andrade e Eduardo Suplicy, referente à aplicação de uma quantia tão elevada de US$1,4 bilhão nesse projeto, quando há outras alternativas - há e sempre haverá - creio que os investimentos em infra-estrutura sempre serão questionados. A construção do aterro do Rio de Janeiro, na Praia do Flamengo, não deveria ter sido feita, pois, naquela hora, havia outras necessidades no País - e houve quem acreditasse que não deveria ter sido feita. Quando se foi construir a Avenida Brasil, também no Rio de Janeiro, houve quem entendesse que não era o momento de fazê-la. Quando se foi fazer a CHESF no Nordeste para gerar energia elétrica, uma das teses mais discutidas para justificar a sua não construção foi a de que não havia mercado de energia elétrica na Região. Calculava-se o mercado pelo consumo de energia elétrica do Nordeste naquela região, que tinha que ser baixo por trezentos motivos, um dos quais era o de que não existia energia elétrica para ser consumida. Atualmente, por exemplo, US$1,400 bilhão constitui uma quantia astronômica, se fosse constar da conta pessoal de qualquer dos Senadores ou de todos juntos. Seria interessante que se comparasse o orçamento desse projeto com o custo do metrô do Rio de Janeiro, ou o da cidade de São Paulo, ou o quanto poderá custar o metrô de Brasília. Francamente, não sei se essas mesmas restrições foram feitas na época. Se formos verificar o portfólio financeiro dessas obras que acabo de citar, não devemos esquecer de acrescentar, por exemplo, a Ponte Rio-Niterói. Se formos verificar, talvez descobriremos que muito dessa dívida externa do Brasil está associada a empreendimentos contra os quais muitos aqui, hoje, posicionar-se-iam contra.

Provavelmente seria contra. Mas o metrô está construído e funcionando, a ponte está lá servindo. O fato de se dizer, hoje, que é contra não vai paralisar o metrô, nem bloquear a ponte. O Rio de Janeiro e São Paulo vão se beneficiar. E é justo que se beneficiem. As suas populações merecem esse benefício. Diante do desenvolvimento que esses investimentos propiciaram, graças a Deus, ao Rio de Janeiro e a São Paulo, espero que tenhamos a perspectiva necessária para, verificando o orçamento desse Projeto SIVAM e comparando com os investimentos que o País já fez em outras atividades de relevância discutível, definir se ele é tão caro quanto se diz, sem me referir aos benefícios diretos que, seguramente, a Nação e esta Casa conhecem. Mas V. Exª está trazendo informações sobre esse assunto que dispensam a minha palavra. Quis apenas acrescentar ao seu raciocínio uma visão crítica em torno da discussão, um tanto quanto apaixonada, que se passou a fazer. Penso que está na hora de se discutir e de se debater realmente esse assunto, mas sem paixão. Devemos colocar o Brasil acima das nossas emoções.

O Sr. Ademir Andrade - Senador Flaviano Melo, V. Exª me permite um aparte?

O SR. FLAVIANO MELO - Ouço V. Exª com muito prazer, Senador Ademir Andrade.

O Sr. Ademir Andrade - Nobre Senador Geraldo Melo, neste País costumamos decidir de cima para baixo. Quando colocaram a questão do Projeto SIVAM, ninguém tomou conhecimento e nem jamais foi consultado, nem os Governadores de Estado, nem os Senadores da República, nem os Deputados Federais, nem os Prefeitos, ninguém. O Brasil precisa mudar, Senador Geraldo Melo. O Brasil precisa passar por discussões, onde sua população tenha oportunidade...

O SR. PRESIDENTE (Júlio Campos. Fazendo soar a campainha.) - A Mesa adverte o nobre Senador Ademir Andrade de que o aparte só pode ser dirigido ao orador e não ao aparteante.

O Sr. Ademir Andrade - Sr. Presidente, peço desculpas. Como dizia, o Brasil precisa mudar, precisamos decidir através da discussão e devemos ter o direito de participar da mesma. Se o Governo Federal fosse a cada região discutir conosco sobre o que deve ser feito, tenho certeza de que tudo estaria melhor.

O SR. FLAVIANO MELO - Senador Geraldo Melo, agradeço o aparte de V.Exª, que ilustrou meu pronunciamento com muita propriedade.

Como engenheiro, trabalhei na ponte Rio-Niterói e no metrô do Rio de Janeiro. Tenho noção do custo dessas duas obras, mas não discuto sua importância para aquela cidade, como também a do metrô de São Paulo. Discuto um pouco o metrô de Brasília, que está paralisado; gastou-se muito dinheiro, não está funcionando e é necessário.

Mas, gostaria de ser consultado no momento de se conceber o SIVAM. Isso me interessaria. Opinaria favoravelmente, porque vejo, pela primeira vez, que algo de concreto, algo com profundidade está para acontecer na Amazônia: um plano de desenvolvimento para a Região, um plano global, envolvendo todos os Estados, a área como um todo. Neste caso, poderemos aproveitar nossa riqueza, que é muito grande.

O Sr. Geraldo Melo - Permite-me V. Exª um outro aparte?

O SR. FLAVIANO MELO - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Geraldo Melo - Senador Flaviano Melo, gostaria apenas de complementar o meu pensamento, em face da observação muito procedente do Senador Ademir Andrade. Não divirjo em nada da idéia de que o País precisa discutir os seus problemas e discutir as soluções. Entretanto, essas discussões precisam ser conseqüentes e não apenas o exercício de uma tertúlia, ou seja, chamarmos a população e pedirmos que todos parem as suas atividades a fim de discutirem questões que, muitas vezes, não têm a mínima noção do que se trata. Há o momento de se discutir. Por exemplo, o que estamos fazendo aqui, no dia de hoje, é discutir. Esta Casa, o Congresso Nacional está discutindo o SIVAM. Mas o SIVAM ainda não foi realizado. Portanto, se surgirem, amanhã, razões e convicções da sociedade brasileira e do seu Congresso de que esta é uma obra que não deve ser realizada, ela não será. O respeito e a confiança que tenho no critério de patriotismo do Presidente da República autorizam-me a dizer que, caso a obra seja considerada impatriótica, Sua Excelência não hesitará em interrompê-la. No entanto, o que considero sem sentido é dizer que se vai discutir com a população, antes de se ter o desenho de um determinado projeto, se deve-se ou não colocar radares, sensores e equipamentos sensíveis de alta precisão e de alta tecnologia, que não foram sequer vistos por ninguém no País. Penso que o momento de discutir chegará, como parece ter chegado. Agora estamos discutindo se deve-se ou não continuar. Eu, pessoalmente, entendo que deve sim, à luz de tudo que ouvi até agora. Não exitaria em modificar minha opinião se surgissem razões relevantes para fazer, mas até agora não aconteceu. Pedindo desculpas por mais esta interrupção, concordo que teria sido muito interessante consultar a população de Brasília sobre a construção do metrô. A população estaria pronta a opinar. Mas, perguntar à população do Pará, do Amazonas, ou do Rio Grande do Sul, enfim, do Brasil inteiro, se devem ser instalados radares com essa ou aquela capacidade, nesse ou naquele lugar, sem ao menos a existência do projeto, sem decisão governamental, sem grandes esclarecimentos à população, não seria conveniente agora.

O SR. FLAVIANO MELO - Muito obrigado, Senador Geraldo Melo.

O Sr. Iris Rezende - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Flaviano Melo?

O SR. FLAVIANO MELO - Pois não, nobre Senador Iris Rezende.

O Sr. Iris Rezende - Senador Flaviano Melo, louvo o gesto de V. Exª trazendo à discussão um assunto que se tornou um tanto polêmico. É esta a função do representante do povo. E V. Exª vem defender um projeto que se destina à Amazônia. Ouvi com muita atenção toda a sua exposição e endosso inteiramente a queixa que faz em relação ao tratamento que se dispensa ao interior deste País. Nós todos do interior temos sido vítimas desse tratamento. Foi um dos itens do meu primeiro pronunciamento nesta Casa: o de conclamar o País a se voltar inteiramente para o interior brasileiro, porque, aqui, encontraremos a solução para os grandes problemas enfrentados por este País. Lembro-me bem quando se deu início à construção da Ferrovia Norte-Sul, da Ferrovia Leste-Oeste, parecia que o mundo ia acabar. São projetos realmente de muito interesse para o interior brasileiro. Estarei assinando em branco todo projeto que V. Exª e nossos Colegas desta Casa venham a desenvolver em benefício da Amazônia, em benefício do oeste brasileiro. Mas devo ressaltar uma certa apreensão pessoal quanto a essa questão. Confesso não estar ainda em condições de discuti-la aqui com inteiro conhecimento de causa, mas sempre coloco minhas dúvidas em projetos que surgem em final de Governo. O atual Governo não tem responsabilidade direta sobre esse projeto. Quando o Presidente Fernando Henrique Cardoso assumiu a Presidência, já era quase um fato consumado. Assim, concordo com o nobre Senador Ademir Andrade quando salienta essa questão. Tenho certeza absoluta de que, se o Governo convocasse V. Exª, convocasse o Senador Nabor Junior, os Senadores do Estado do Amazonas, do Pará e de todos os Estados que integram o norte do País, com US$1,4 bilhão de dólares à disposição de V. Exªs para investimento naquela região, tenho certeza de que V. Exª jamais pensaria em investir todo esse dinheiro no SIVAM, porque, na verdade, é um montante de recursos que daria para, por exemplo, asfaltar 6 mil quilômetros de estradas da melhor qualidade - V. Exª é engenheiro, sabe disso -; daria para construir uma, duas, três ou quatro usinas hidrelétricas no montante de 800 megawatts, que seria suficiente para atender, durante anos, as exigências de energia da Amazônia. Quer dizer, é um dinheiro que daria para emendar o Brasil ao Pacífico sem dificuldades. Então, vêm as apreensões. Não me coloco contra o projeto, porque estou estudando, estou procurando conhecê-lo com mais profundidade. Aí, sim, assumirei uma posição. Mas solidarizo-me com V. Exª quando se queixa quanto à atenção do Governo, da sociedade, da elite deste País em relação ao interior brasileiro. Nesse aspecto, V. Exª tem a minha solidariedade, assim como, volto a repetir, nessa luta para que nos voltemos para essa região que está aberta, está à espera da ação do homem. Agora, oportunamente, vou confessar-me se era esse projeto o mais importante para a Amazônia, porque o temos observado neste País - isso acontece em relação aos Governos Federal, Estaduais e Municipais -, é que os governantes não entenderam ainda que o primeiro item para um bom governo é estabelecer prioridades. Não sei se o SIVAM é a prioridade número um da nossa Amazônia, do nosso Centro-Oeste. Agradeço a V. Exª pelo aparte.

O SR. FLAVIANO MELO - Muito obrigado, Senador Iris Rezende. Quero-lhe contar um fato, para ilustrar um pouco a questão do SIVAM.

Quando assumi o Governo do meu Estado, em 1987, criei uma fundação de tecnologia e fui muito criticado por criar mais um órgão. Mas entendia que o Estado do Acre precisava daquela fundação para que fossem realizadas pesquisas de efeito prático e mais imediato. No meu modo de entender, as pesquisas científicas de longo prazo deveriam ser realizadas pelos institutos nacionais.

Obtive grandes resultados com essa fundação. Um deles foi exatamente o de se começar o zoneamento agroecológico do meu Estado com fotos de satélites. Fui buscar recursos no Japão e consegui prosseguir com esse trabalho. Hoje, essa fundação é reconhecida internacionalmente. Uma grande parte das entidades não governamentais do exterior conhece essa fundação.

Digo isso para explicar essa questão do SIVAM. Não se pode comparar esse projeto com a construção de uma estrada ou de uma hidrelétrica, que são necessárias, mas ele representa um instrumento que nos ajudará a encontrar a forma de desenvolvimento da nossa região.

A quem interessa a extinção do SIVAM?

Sem grandes vôos de imaginação ou exercícios intelectuais aprofundados, dou alguns exemplos. Serão beneficiários com a extinção do SIVAM:

- Os maus empresários da exploração madeireira;

- Os exploradores dos garimpos ilegais e predatórios do meio ambiente;

- os invasores e exploradores de terras indígenas;

- os contrabandistas que evadem as riquezas regionais, lesando o País e enriquecendo ladrões;

- os narcotraficantes que mercadejam na Amazônia, infestando as cidades com drogas;

- enfim, todos aqueles que não têm qualquer compromisso com a Amazônia e o seu povo e que se utilizam da região com interesses escusos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muito tenho ouvido falar a respeito da necessidade de se defender a Região Amazônica, inclusive de interesses internacionais. No meu entender, a defesa da Amazônia está no conhecimento real da região.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 10/05/1995 - Página 7978