Discurso no Senado Federal

DENUNCIAS, PELA IMPRENSA, DE LOTEAMENTO DE CARGOS PUBLICOS.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • DENUNCIAS, PELA IMPRENSA, DE LOTEAMENTO DE CARGOS PUBLICOS.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Esperidião Amin, Geraldo Melo, Osmar Dias, Pedro Simon, Vilson Kleinübing.
Publicação
Publicação no DCN2 de 05/08/1995 - Página 13083
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, DENUNCIA, IMPRENSA, OCORRENCIA, DISTRIBUIÇÃO, CARGO PUBLICO, PROPORCIONALIDADE, INTERESSE PARTICULAR, CONGRESSISTA, IDEOLOGIA, PARTIDO POLITICO, CRITERIOS, FAVORECIMENTO, EXECUÇÃO, NEPOTISMO.
  • CRITICA, GOVERNO, IRREGULARIDADE, PREENCHIMENTO, CARGO PUBLICO, ATENDIMENTO, INDICAÇÃO, POLITICO, PESSOAS, SUSPEIÇÃO, CORRUPÇÃO.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a imprensa, nos últimos dias, tem sido pródiga em denúncias de loteamento de cargos públicos federais. Ao que parece, essa praga, esse vício inerradicável da política brasileira, o fisiologismo, está de volta, envolvendo, principalmente, as "teles", as empresas estaduais de telecomunicações.

Diante dessas denúncias e de um pronunciamento feito em plenário pelo eminente Senador Esperidião Amin, ontem procurei entrar em contato com o Ministro Sérgio Motta, para obter esclarecimentos de S. Exª, que mandou dizer que estava em reunião e que em seguida retornaria a ligação. Não retornou até hoje.

Vou dizer, então, de público, o que diria, em particular, ao Ministro.

A revista Veja, desta semana, se refere ao assunto dizendo que "é um butim de quatro mil cargos. E o Governo, que prometera usar critérios técnicos racionais, está usando os velhos parâmetros do nepotismo, filhotismo e coronelismo. Nas teles, 26 empresas estaduais, foram nomeados quarenta apaniguados de políticos."

Há casos ridículos - vou omitir nomes e partidos, porque o meu pronunciamento é em termos impessoais e apartidários -, como o do Governador que indicou o papai para presidir uma "tele", e de outros políticos, como o de um que, criticando sem parar o Governo, colocou seus parentes, um irmão e um primo, na "tele" do seu Estado. Um outro colocou também o primo, e houve até quem colocasse o ex-marido da mulher.

Em um desses casos - segundo denúncia do Senador Esperidião Amin que foi objeto de um pedido de informações - foi alterado o estatuto da empresa, da TELESC, em Santa Catarina, a fim de possibilitar a nomeação do parente desse político.

A explicação para esse apetite, diz a revista, "se explica. No atacado permitem agradar a centenas de municípios, que têm o poder de distribuir telefones; no varejo, podem facilitar a liberação de uma linha que, pelos trâmites normais, demoraria meses."

A Folha de São Paulo de ontem repete a denúncia, dizendo que o Deputado de um certo partido teria declarado, explicitamente: "O Governo vai entrar no pau na reforma tributária, a dissidência vai ser grande". Isso porque o Deputado não teve o seu pedido atendido. Isto se chama simplesmente chantagem.

O Sr. Esperidião Amin - Nobre Senador Jefferson Péres, V. Exª me permite um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Com o maior prazer, Senador Esperidião Amin.

O Sr. Esperidião Amin -  Até por ter sido citado por V. Exª - o que muito me honra -, peço permissão para, neste aparte, antecipar o que pretendo, de público, daqui a pouco, fazer. Quero anunciar que vou apresentar, daqui a pouco, a minha solidariedade ao Ministro Sérgio Motta; solidariedade preocupada, penalizada até, principalmente diante de duas notícias das muitas que hoje a imprensa divulga. Há a citação de uma frase do Ministro Sérgio Motta que me deixou confrangido: "Com esta briga por cargos, o Congresso está cada vez mais distante da sociedade. As urnas mostrarão isso." Está no jornal Correio Braziliense, na coluna do inteligente jornalista Luiz Cláudio Cunha. E uma outra, no jornal O Globo, na página 3, do ex-Ministro Ciro Gomes, do PSDB: Ciro acusa Governo de clientelismo. E começa assim: "Embora tenha indicado o irmão Lúcio Gomes para a diretoria financeira da TELECEARÁ, o ex-Ministro da Fazenda Ciro Gomes acusou o Governo Fernando Henrique de cair na ´tradição lamentável do fisiologismo e do clientelismo político`". E menciona especificamente a questão das telecomunicações. De forma que quero, também, me solidarizar com o Ministro Ciro Gomes, que sempre foi um defensor tonitruante dessa questão moral, e aproveito este aparte para agradecer a citação feita por V. Exª, para dizer que aquele requerimento que apresentei está evoluindo para um voto de solidariedade. Até nem sei se devemos convocar o Ministro, é uma questão que deixo aqui no ar. Que pressões são essas que o Congresso faz? Vejam bem, é genérico, daqui não escapa ninguém, nem o Senador Lauro Campos, que está me espiando de lá. É o Congresso todo! A frase que está aqui é esta: "Com esta briga por cargos, o Congresso está cada vez mais distante da sociedade." Não escapa ninguém, Senador Lauro Campos, nem V. Exª. De forma que não sei se devemos convocar o Ministro, mas, certamente, movido pelo desejo de solidariedade, pelo impulso da solidariedade, precisamos saber quem é essa parte do Congresso que está levando o Ministro ao mau caminho, que está desencaminhando o Ministro. Peço desculpas por ter-me alongado, agradeço a citação e faço minhas as suas preocupações.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Citei V. Exª com o maior prazer, ilustre Senador Esperidião Amin.

Noticia a imprensa também que o Senador Antonio Carlos Magalhães, Sr. Presidente, foi ao Presidente da República levando uma lista de 12 pessoas indicadas para cargos no Governo que seriam suspeitas de corrupção. Para espanto meu, no dia seguinte, o porta-voz da Presidência da República declara que apenas dois nomes serão investigados, porque a denúncia contra os outros não tem fundamento. Espanta a rapidez com que isso foi apurado - em 24 horas.

O Sr. Pedro Simon - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ilustre Senador Pedro Simon, cedo-lhe o aparte.

O Sr. Pedro Simon - V. Exª aborda um assunto da maior importância. Penso, com toda sinceridade, que o Senador Antonio Carlos Magalhães fez o que era a sua obrigação. S. Exª, correto, de uma maneira elegante, esperou o Presidente da República chegar do exterior, pediu uma audiência e nesta apresentou 12 nomes a cujas indicações, segundo o Sr. Antonio Carlos Magalhães, Sua Excelência tinha graves restrições. Sua Excelência recebe as indicações. Sai na imprensa: dos 12 nomes, 10 o Presidente da República já conhecia e nada tinha contra; dois, mandou investigar. Vem o Senador Antonio Carlos Magalhães e diz o seguinte: não é verdade que o Presidente da República tenha dito que sabia sobre 10 dos nomes; não sabia. Fica, de um lado, a palavra do porta-voz da Presidência, dizendo que já sabia, e, de outro, a do Senador Antonio Carlos Magalhães, dizendo que não sabia. Pela manhã, telefona o porta-voz para o Senador Antonio Carlos pedindo desculpas e dizendo: fica o dito pelo não dito e o assunto está encerrado. O assunto não está encerrado! Quero dizer ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que eu, Pedro Simon, Senador da República, quero saber quais são os 12 nomes indicados pelo Sr. Antonio Carlos, quais são as acusações, o que foi apurado e o que não foi, se vai acontecer alguma coisa e, se não, por que não vai acontecer nada. Esse não é um assunto intramuros. O Senhor Fernando Henrique Cardoso está equivocado. O mesmo Antonio Carlos fez uma denúncia idêntica no Governo Itamar Franco, do qual o Presidente Fernando Henrique era Ministro, e o ex-Presidente Itamar Franco recebeu com as mesmas honrarias o Sr. Antonio Carlos, ouviu os nomes, deles tomou conhecimento, a imprensa ficou sabendo, e foi feito um levantamento em torno de todos os nomes. Não! Não é uma questão de sigilo. Se o Sr. Antonio Carlos Magalhães tivesse, numa questão pessoal, falado com o Presidente Fernando Henrique sobre o assunto, de correligionário para correligionário, e a imprensa tivesse extrapolado, tudo bem. Afinal, o Sr. Antonio Carlos teria tratado de uma questão sigilosa e, numa questão sigilosa do Sr. Antonio Carlos para o Presidente da República, a imprensa teria extrapolado. Mas não foi o caso. No caso, o Sr. Antonio Carlos disse, de público, que apresentou nomes, a sessão de apresentação dos nomes foi feita publicamente, foi filmada, apareceu uma fotografia do Sr. Antonio Carlos entregando a lista ao Presidente da República, e vem agora o ilustre porta-voz da Presidência dizer que o assunto está encerrado. Não está encerrado! Quero dizer, como Senador da República, que quero conhecer a lista do Sr. Antonio Carlos, quero saber o que está naquela lista, quero saber quais são as explicações do Senhor Presidente da República e o que aconteceu em torno disso. Isso é matéria que tem que ser feita assim. O Senhor Fernando Henrique deve ser fiel a sua tradição e fiel a sua história. Que história é essa agora de ficar no diz-que-não-diz, no cochicho, no é ou não é. Repito: se o Senador tivesse, numa questão pessoal, entregado a lista como correligionário, como amigo, tudo bem. Mas esta foi uma questão pública, foi uma questão aberta, da qual a Nação inteira tomou conhecimento. O Presidente Fernando Henrique Cardoso deve esclarecimentos à Nação, porque o Sr. Antonio Carlos cumpriu sua missão com o maior respeito ao entregar a lista ao Presidente. E quando, na saída, lhe perguntaram se não iria distribuir a lista para a imprensa, Antonio Carlos disse: "Não. Isso cabe ao Presidente". E está certo o Senador Antonio Carlos Magalhães. Entregou a lista ao Presidente da República. Quando saiu da entrevista e a imprensa lhe perguntou sobre a lista, S. Exª disse que caberia ao Presidente, já que havia entregado a lista ao Presidente. Então, o Senador agiu corretamente, fez o seu papel. O que não está correto é o procedimento do Palácio do Planalto. O Presidente da República tem a obrigação de dar o nome das 12 pessoas, esclarecer o que tem a respeito dessas pessoas, por que arquivou ou por que não vai arquivar. Meus cumprimentos ao pronunciamento de V. Exª.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Muito obrigado pelo seu aparte, ilustre Senador Pedro Simon. V. Exª tem toda razão. Eu não apenas incorporo o seu aparte ao meu discurso mas também me incorporo à sua disposição de não deixar que isso caia no esquecimento.

A sociedade tem o direito de saber, e o Presidente da República tem o dever de informar, de revelar esses nomes.

E faço isso com muita autoridade, com muita tranqüilidade, porque pertenço ao PSDB, Partido do Governo. E eu sou, por princípio, contrário ao fisiologismo. Sempre agi assim. Eu disse que seria um Senador de custo zero para o Governo, que jamais indicaria alguém para cargo público. Não indiquei e não vou indicar. Não faço isso por alguma razão circunstancial, mas por uma questão de princípio. Acho que os cargos públicos devem ser preenchidos pelos melhores. Se o Presidente da República me chamasse hoje para me oferecer todos os cargos federais no Amazonas, eu diria: "Não, Presidente. Mande verificar quem são os melhores, os mais competentes. Preencha esses cargos pelo sistema do mérito". A "meritocracia" precisa ser implantada no serviço público brasileiro.

O PSDB é um Partido que prima, ou pelo menos diz que prima, pela ética. Não podemos fazer no Governo aquilo que condenamos na Oposição. Loteamento de cargos públicos, privatização do setor público, não! Definitivamente, não! Qualquer que seja a interpretação que dêem às minhas palavras, como membro do PSDB, não posso concordar com isso; e não posso ficar aos cochichos pelos corredores. Tenho que dizer de público - que fique registrado nos Anais do Senado! -: não posso concordar com isso, não posso aceitar isso. Não importa qual seja a reação do Governo. Não farei chantagem com o Governo. Não! Vou continuar votando nas propostas do Governo sempre que eu concorde com elas. Mas não vou abdicar do direito de criticar o Governo quando estiver errado, porque está errado ao preencher o cargo público mediante indicações de políticos e, pior ainda, pessoas suspeitas de corrupção.

O Sr. Vilson Kleinübing - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Com prazer, nobre Senador.

O Sr. Vilson Kleinübing - Em primeiro lugar, gostaria de fazer uma observação sobre o aparte do Senador Pedro Simon. Está absolutamente correto o procedimento adotado pelo Senador Antonio Carlos Magalhães e pelo Presidente da República. Já ouvi aqui muita vezes Senadores e o próprio Senador Pedro Simon dizerem o seguinte: "foi citado no jornal, é ladrão; apareceu na imprensa já é bandido". Então, claramente, entregam-se os nomes; há dúvidas; o Presidente tem os seus instrumentos para verificar se são corretos ou não. Depois de verificado, informa ao Senado, ao Senador: esses aqui realmente não prestam; esses aqui realmente prestam.

O Sr. Pedro Simon - Isso me serve. V. Exª está corretíssimo. Não é o que diz o porta-voz. O porta-voz diz que o assunto está encerrado. V. Exª diz que virá uma resposta do Presidente. Concordo com o que diz o nobre Senador. É exatamente isso. S. Exª está correto: receber os nomes, ver, fazer o levantamento e noticiar. Mas o porta-voz diz: "O assunto está encerrado". V. Exª está correto.

O Sr. Vilson Kleinübing - A segunda parte do meu aparte ao Senador Jefferson Péres é a seguinte: indicação de cargo existe aqui, nos Estados Unidos, na Rússia, na China, em qualquer país do mundo. Temos o dever, como homens públicos, conhecedores que somos das pessoas do nosso Estado, de fazer as indicações para, num país tão grande como o nosso, com tanto cargo público - infelizmente -, fazer as indicações. Cabe ao Presidente ter um instrumento de avaliação dessas pessoas para ver se são honestas, corretas, aliás, se correspondem àquele velho pensamento do pensador político argentino que dizia o seguinte: "Não se deve nomear para cargo público pessoas cujas únicas qualidades são as de ser seu correligionário ou seu amigo". Elas devem ter, evidentemente, outras qualidades. E tem-se que nomear de uma vez por todas, porque o governo que ganhou é o governo que tem que governar, é o governo que tem que dar ordens. Loteamento partidário, concordo com V. Exª, não deve ser feito. Sugerir bons nomes de gente séria que o governo tenha a capacidade de avaliar quem são, para nomear, considero uma atitude correta.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ilustre Senador Vilson Kleinübing, tenho o maior respeito por V. Exª. Reconheço o direito que tem todo político de fazer indicações. Mas eu não faço. É uma questão minha, não faço. Entendo que os cargos políticos são os de primeiro escalão, Ministros e Secretários de Estado, em nível estadual. Esses sim são cargos políticos e devem ser preenchidos preferencialmente por critérios políticos, mas cargos burocráticos, de diretoria de estatais, na Caixa Econômica, na Receita Federal, não devem ser políticos. Para que um político quer colocar alguém na Receita Federal? Por que deseja colocar alguém na Caixa Econômica? A não ser que haja propósitos escusos - perdoem-me os que fizeram indicações com esse fim. Eu não faço.

O Sr. Pedro Simon - Chefia da Arrecadação da Receita, em São Paulo.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Vimos o que aconteceu no Aeroporto de Cumbica, em São Paulo.

Outro dia, estive com o Secretário da Receita Federal e disse a S. Exª o que nenhum político ousou dizer: "Dr. Everardo Maciel, no momento em que o senhor começar a preencher cargo de delegado da Receita Federal por indicação de políticos, a sua gestão estará altamente comprometida e o senhor começará a perder credibilidade, pelo menos para mim".

O Sr. Osmar Dias - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. Osmar Dias - Senador Jefferson Péres, serei rápido. Eu gostaria apenas de dizer que, quando ingressei no PSDB, fiz apenas uma exigência: que não conversassem comigo a respeito da indicação de cargos do Governo Federal, porque também não sou a favor dessas atitudes e, por isso, admiro a posição de V. Exª. Não indicarei, não vetarei, mas quero dizer ao Governo Federal que o verdadeiro responsável por essa situação, por esse fisiologismo - que é crescente, ao invés de diminuir - é o próprio Governo, porque oito meses para preencher os cargos do segundo escalão é tempo demais. Quando começará o Governo de verdade? Porque o segundo escalão também é Governo! Se existe apenas um programa, um plano em execução no País, que é o de cuidar do Plano Real, talvez seja porque, nas empresas estatais, no segundo escalão, o Governo não tenha se preocupado em fazer nomeações logo no início. Oito meses é muito tempo, e essa barganha que se estabelece entre o Congresso e o Governo é exatamente porque este se insinua para o Congresso, a fim de que ela ocorra.

O SR. JEFFERSON PÉRES  - Muito obrigado, Senador Osmar Dias, e parabéns pela sua posição.

O Sr. Bernardo Cabral - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Jefferson Péres?

O SR. JEFFERSON PÉRES  - Senador Bernardo Cabral, meu conterrâneo e amigo, com o maior prazer concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Bernardo Cabral - Meu caro Senador Jefferson Péres, até que eu não queria interromper o seu discurso, a fim de não lhe tomar o tempo, mas não posso fugir à denúncia do mal maior que existe; e ele existe exatamente porque o sistema de governo é presidencialista. Se tivéssemos o sistema parlamentarista, esse segundo escalão não seria modificado ao bel prazer desta ou daquela indicação. A raiz tem o seu mal incrustado exatamente nessa circunstância do sistema de governo. V. Exª diz bem quando sugere que a nomeação política deveria ser a do primeiro escalão, a dos Ministros de Estado, dos que formam a confiança do Governo. Veja V. Exª que, no sistema parlamentarista, quando é apeado do poder o 1º Ministro ou o chamado Chefe de Governo, através da moção de desconfiança, o sistema burocrático continua absolutamente estável, intacto, não é alterado em nenhum instante. De modo que, a par da minha solidariedade - que V. Exª sempre tem -, quero deixar registrado que esse é um dos males do sistema presidencialista de governo.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ilustre Senador Bernardo Cabral, V. Exª tem toda razão. Veja, por exemplo, o serviço público na França, cujos cargos de direção são todos preenchidos por quem cursou a École Nationale d` Administration.

De forma que a queda de gabinete não afeta em nada o andamento, a eficiência e a seriedade da administração pública.

O Sr. Geraldo Melo - V.Exª me concede um aparte, nobre Senador?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo um aparte ao ilustre companheiro de Partido, nobre Senador Geraldo Melo.

O Sr. Geraldo Melo - Nobre Senador, agradeço a V. Exª a oportunidade que me dá em participar de um pronunciamento de tamanha importância. Quero dizer a V. Exª que, no meu Estado, a Bancada Federal fez indicações e, entretanto, não assinei o referido documento. Até a título de brincadeira, costumo dizer aos meus companheiros que não sou muito "cargueiro"; não tenho muito entusiasmo pela tarefa de selecionar e de fazer indicações de pessoas. Já fui Governador de Estado e sei que essa atitude, muitas vezes, ao invés de ser uma colaboração, termina sendo uma perturbação à atividade de governar. Agora, concordando com a tese geral de V. Exª, eu gostaria de fazer uma ponderação. Somos políticos, e o fato de sermos políticos não nos inabilita como cidadãos comprometidos com a ética, com a moral, com a eficiência, com a competência. O fato de que alguém tem o apoio de um político para alguma posição não significa, necessariamente, que esse alguém seja incompetente ou desonesto. Não se pode dar valor ao que está sendo mostrado ao País, infelizmente, que, em se tratando de indicação de político, não se pode confiar. Não tenho indicação alguma; não tenho importância política para ser ouvido por ninguém na formação de quadro de escalão nenhum. Penso que não podemos "engrossar a onda" de que o simples fato de se fazer uma indicação política desmoralize o indicado ou o governo que aceita a indicação. Na realidade, temos dois colegas Senadores que estão no governo - a não ser que haja outros dos quais esteja me esquecendo: o Ministro da Agricultura e o Ministro do Planejamento. Vejamos o caso da área econômica. No início do Governo, quando estávamos chegando nesta Casa, na condição de Senadores, eu mesmo ouvi falar que a área econômica do Governo não ouviria nenhuma indicação de político. Pergunto: o Ministro José Serra, afinal, o que é? Ele é um político como eu, como V. Exª, como todos nós aqui. Por que será que alguém, uma vez com assento nesta Casa, está desautorizado, e se sai daqui, atravessa a rua e assume um ministério, as suas indicações, de repente, são idôneas? Então, compreendo, porque conheço de perto a seriedade desse meu companheiro de Partido, muito querido, que é o Senador Jefferson Péres. É um homem que chegou aqui com inteira noção de integridade, de moral, de ética e de compromisso com esse sonho de todos os brasileiros: o de construir um novo País, uma nova Pátria, um lugar limpo, onde se respire um ar puro, onde se possa viver melhor. Avalio, portanto, que o Senador Jefferson Péres é uma afirmação e demonstração do que estou tentando dizer; S. Exª é um exemplo de homem de bem. Não acredito que se alguém pedir a V. Exª um nome para alguma função, V. Exª vá indicar um bandido! Concordo que as pessoas com desvio de comportamento, com um padrão de conduta fora daquilo que a sociedade brasileira tem o dever de exigir não devem ser acolhidas. Porém, devemos ter cuidado para que não se distribua na Casa do povo brasileiro a noção de que o simples fato de alguém ter o aval de um político, de um de nós, Senador Jefferson Péres, signifique uma desmoralização. E digo isso com a tranqüilidade de alguém que não tem indicados e que não espera indicação de quem quer que seja.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Muito obrigado, ilustre Senador Geraldo Melo. Eu já conhecia a sua postura porque já estamos convivendo há 6 meses no seio da Bancada e sei perfeitamente que este é seu modo de pensar.

Prefiro, Senador Geraldo Melo, que o "QI" seja substituído neste País pelo "CC", critério de competência e probidade para o preenchimento de cargos públicos.

É muito difícil que em indicações de centenas de políticos não passe nomes de pessoas cuja probidade ou competência deixe a desejar. O critério político é, por si só, perverso, ilustre Senador Geraldo Melo.

O Sr. Geraldo Melo - Desculpe interrompê-lo Senador, mas não estou absolutamente defendendo que o critério de provimento deva ser o critério político; estou apenas dizendo que o simples fato de que alguém tenha aval ou indicação de um político não o desmoraliza e nem o inabilita necessariamente.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Certamente que não. Conheço políticos sérios que fazem indicações de pessoas sérias, mas questiono - permita-me - o critério político de preenchimento de cargos burocráticos na administração pública. Entendo que esse não é e definitivamente não será nunca o melhor critério.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 05/08/1995 - Página 13083