Discurso no Senado Federal

CONTINGENCIAMENTOS SOFRIDOS PELA ZONA FRANCA DE MANAUS.

Autor
Bernardo Cabral (PP - Partido Progressista/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • CONTINGENCIAMENTOS SOFRIDOS PELA ZONA FRANCA DE MANAUS.
Aparteantes
Jefferson Peres, Nabor Júnior.
Publicação
Publicação no DCN2 de 20/09/1995 - Página 16131
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • CRITICA, INCONSTITUCIONALIDADE, DECRETO FEDERAL, LIMITAÇÃO, COTA, IMPORTAÇÃO, ZONA FRANCA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), OMISSÃO, RECEITA FEDERAL, IMPEDIMENTO, CONTRABANDO, PAIS ESTRANGEIRO, PARAGUAI, DESTINO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF).
  • COMENTARIO, TRABALHO, AUTORIA, RONALDO BONFIM, ECONOMISTA, ANALISE, COMPARAÇÃO, SUPERIORIDADE, VENDA, COMERCIO, FEIRA DO PARAGUAI, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), VALOR, COTA, IMPORTAÇÃO, ZONA FRANCA, MUNICIPIO, MANAUS (AM), ESTADO DO AMAZONAS (AM).

O SR. BERNARDO CABRAL (PP-AM. Como Líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto à tribuna, ainda esta vez, para tratar do assunto Zona Franca de Manaus. Quando se trata dessa matéria, temos que nos referir ao contingenciamento que ela sofreu, de forma absolutamente inconstitucional, através da imposição, por decreto datado de 27 de abril de 1995.

Apesar de sabê-lo inconstitucional e contrário aos interesses do Estado, o Governador do Amazonas, o Advogado Amazonino Mendes, defendeu o contingenciamento como medida de interesse nacional e transitório. Assumiu, pois, de forma patriótica, o desgaste político; e, com ele, alguns companheiros representantes da Bancada Federal, dentre os quais me incluo. É que, naquela altura, os Ministros da área econômica assumiram três compromissos verbais com o Governador do Estado; presentes ao ato estávamos o Senador Jefferson Péres, eu e, se não me falha a memória, o Senador Gilberto Miranda. Até agora, de forma deplorável, nenhum dos Ministros cumpriram com aqueles três compromissos.

Vou alinhá-los, Sr. Presidente, consoante expediente que me fez chegar às mãos o Governador Amazonino Mendes.

Primeiro compromisso:

      "(a) - descontingenciar, tão logo a balança comercial sinalizar equilíbrio. Há dois meses apresenta superávit (insignificante, mas é um superávit) e o contingenciamento continua;"

Segundo compromisso:

      "(b) - aumentar a cota do comércio da Zona Franca de Manaus, se e quando aumentassem as cotas de importações das Áreas de Livre Comércio da Amazônia Ocidental (Amapá, Rondônia e Acre).

      - Há mais de 30 dias aumentaram em mais de 50% as cotas das Áreas de Livre Comércio acima e nada fizeram para o Comércio da Zona Franca de Manaus.

      - O que é mais grave e discriminatório contra o Estado do Amazonas: o Governo do Estado do Amazonas, há mais de 20 dias, pleiteou formalmente, por ofício ao Comitê de Ministros (presidido pela Ministra Dorothéa), o aumento da cota de comércio de US$60 milhões (menos de 30%) e não obteve sequer resposta (deferimento ou indeferimento)."

Terceiro compromisso não assumido:

      "(c) - O Governo Federal baixaria atos formais impondo restrições às importações ilegais oriundas do Paraguai (Fronteira Brasil-Paraguai).

      - Decorridos quatro meses e meio, nenhum ato foi baixado; o que se sabe é que o contrabando continua crescente, e hoje o que entrou pela fronteira em poucos dias é o equivalente à cota do comércio da Zona Franca de Manaus de 12 meses (US$230 milhões/ano)."

Faço aqui um parêntese, Sr. Presidente, para dar conhecimento à Casa sobre esse problema do contrabando da Ciudad del Este - que redundou na chamada Feira do Paraguai, aqui em Brasília -, através de um denso trabalho feito pelo Economista Ronaldo Bonfim, que é, sem dúvida nenhuma, um dos maiores experts na matéria.

Diz ele, a respeito dessa feira:

      "São 1.250 pequenas barracas, instaladas de forma ordenada em ampla área pavimentada, com estacionamento para veículos e local para venda de alimentos e refrigerantes, em terreno situado ao lado do estádio de futebol, no perímetro urbano da cidade. Constituem verdadeira zona franca comercial, onde são cobrados preços acessíveis, sem grandes variações entre os diversos pontos de venda, com atendimento de excelente qualidade e a garantia aos clientes de rápida substituição dos produtos que eventualmente apresentarem defeitos após a venda. Para exemplificar a competitividade de seus preços, lá, uma bateria tarja verde para telefone celular Motorola é vendida por R$60,00, enquanto em Manaus varia entre R$90,00 e R$120,00. É claro que o comércio regular da ZFM paga impostos e tem maiores custos operacionais, mas em compensação compra diretamente de fornecedores atacadistas no exterior, em melhores condições. Diante desses fatos, fica evidente que um morador de Brasília não mais necessita vir a Manaus para adquirir produtos importados."

Sr. Presidente, Srs. Senadores, imaginem, por esse destaque - que, aparentemente, pode ser levado por uns na conta de um simples registro -, a sangria que sofrem os cofres da Nação:

      "Admitindo que cada barraca venda, em média, US$1.000,00 diários, de 8 da manhã às 6 da tarde, de segunda a sábado, durante 26 dias por mês, teremos, mensalmente, um total de US$32,5 milhões (1.000 x 26 x 1250). Anualmente, o seu faturamento deverá estar atingindo cerca de US$400 milhões, cifra bem maior que o valor das importações comerciais da Zona Franca de Manaus (ZFM): em 1994, as lojas da ZFM importaram US$167 milhões, menos da metade do provável movimento financeiro das barracas brasilienses; no corrente ano, o total das importações do setor comercial de Manaus foi limitado pelo governo federal em US$210 milhões."

Veja, portanto, Sr. Presidente - esta é uma análise que faço -, como as autoridades do chamado setor fazendário se descuidam, se omitem, não tomam a providência devida para que uma sangria dessa natureza, que atinge uma cifra espantosa, causando prejuízo aos cofres da Nação, seja estancada.

O Economista Ronaldo Bonfim, na sua análise, estima que umas dez mil pessoas dependam do comércio informal da Feira do Paraguai. Com isso, ele não deixa de considerar que existe um importante aspecto social nessa espécie de contrabando institucionalizado, que se tolera em plena Capital Federal.

Destaca ainda Ronaldo Bonfim:

      "Tendo este cenário presente, não se pode entender a decisão do governo de contingenciar as importações da Zona Franca de Manaus, compostas basicamente de matérias-primas, máquinas e equipamentos (bens de produção), indispensáveis ao processo de desenvolvimento econômico regional. Especialmente agora, quando a balança comercial volta a ser favorável e o saldo de divisas supera a casa dos US$40 bilhões."

Eis aí, Sr. Presidente, um retrato de corpo inteiro de como o Governo Federal trata ou, para dizer melhor, maltrata a Zona Franca de Manaus.

O Sr. Jefferson Péres - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Concedo o aparte a V. Exª, eminente Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres - Ilustre Senador Bernardo Cabral, V. Exª mostra, com a lucidez de sempre, o tratamento discriminatório e preconceituoso de certas áreas do Governo em relação às regiões mais pobres do País - no caso específico, a Zona Franca de Manaus. V. Exª disse muito bem: o contingenciamento, essa camisa-de-força, nos foi imposta no começo do ano a pretexto das dificuldades cambiais do País e com a promessa de que seria removido tão logo a situação se normalizasse. Está normalizada a situação; o fantasma do efeito tequila está exorcizado. Ninguém, em sã consciência, espera que haja qualquer problema cambial mais grave no País até o final do ano. Além de a balança comercial estar equilibrada, o afluxo de capitais externos é muito grande a ponto de obrigar o Governo até a tomar medidas na área monetária, para evitar o excesso de liquidez. Por outro lado, o Governo faz vista grossa a este escândalo - e eu já abordei este assunto em dois pronunciamentos, bem como V. Exª -, que é o contrabando da Ciudad del Este, portas arrombadas, e a Feira do Paraguai, a dois ou três quilômetros do Congresso Nacional e do Palácio do Planalto. Essa feira vende, talvez, o dobro do que o comércio de Manaus importa. Entretanto, o Governo se recusa sequer a aumentar as quotas de importação do comércio de Manaus, o que permitiria reativar o turismo de compras daquela Zona Franca, que morreu. O que agora existe é esse fluxo em direção ao contrabando, que a Receita Federal não reprime. É realmente muito difícil para nós, Senador Bernardo Cabral, aceitarmos esse tratamento: a leniência com a ilegalidade de um crime, que é o contrabando, e uma medida dura, um tratamento duro com a Zona Franca de Manaus. Muito obrigado, Senador.

O SR. BERNARDO CABRAL - Agradeço a V. Exª, Senador Jefferson Péres, e incorporo o seu aparte a este pronunciamento. Todos nós da Bancada do Norte, sem exceção - aí entendida também a Amazônia Legal -, estamos presentes na luta contra o tratamento dispensado à Zona Franca de Manaus.

O que é mais grave nisso tudo é que esse contingenciamento foi imposto por um decreto. No entanto, o art. 40 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - uma luta do então Relator - demonstra que essa prática é absolutamente inconstitucional, porque só poderia ser estabelecido por lei o que tem sido feito por decreto.

O Sr. Nabor Júnior - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Ouço V. Exª, com prazer.

O Sr. Nabor Júnior - Senador Bernardo Cabral, solidarizo-me com as palavras de V. Exª em defesa da Zona Franca de Manaus. Represento, nesta Casa, um Estado que é beneficiado também pelos incentivos fiscais daquela Instituição, e sou um defensor intransigente da sua continuidade, do seu fortalecimento. Permita-me V. Exª , todavia fazer um pequeno reparo quanto à referência sobre as zonas de livre comércio do Estado do Acre, que, segundo V. Exª, teriam as suas cotas de importação aumentadas, quando, na realidade, nem sequer foram implantadas, apesar de a lei que as criou já ter sido sancionada, há mais de um ano, pelo Presidente da República, e devidamente regulamentada pela SUFRAMA. Apesar das reiteradas afirmações do Superintendente da Zona Franca de Manaus, Dr. Manoel Rodrigues, e das autoridades do Ministério da Fazenda e do Ministério do Planejamento, essas duas áreas de livre comércio não foram ainda implantadas nos Municípios de Brasiléia e Cruzeiro do Sul não foram ainda efetivamente contemplados com a operação dessas áreas mercantis voltadas para o exterior. Faço este reparo em respito ao permanente propósito de V. Exª de se ater à veracidade de todos os fatos, que, por sua importância, levam-no à tribuna desta Casa.

O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Senador Bernardo Cabral, perdoe-me interrompê-lo, mas vou prorrogar a hora do expediente por seis minutos, para que V. Exª possa concluir o seu discurso.

O SR. BERNARDO CABRAl - Agradeço a V. Exª, Presidente Sarney, pela gentileza da prorrogação e concluirei nesses seis minutos.

Quero agradecer também ao Senador Nabor Júnior o aparte e dizer que o expediente que tenho do Governo do Estado do Amazonas me dá conta de que as quotas das importações das áreas de livre comércio da Amazônia Ocidental - aí incluído o Acre - há mais de 30 dias teriam sido aumentadas em mais de 50%. V. Exª fez o reparo e ele fica registrado.

Quero concluir, Sr. Presidente, dizendo que, lamentavelmente, o Governo - e se trata de uma crítica frontal e formal ao Governo - fez o contingenciamento com base na crise cambial, que ele dizia iminente, através de um decreto. Acontece que esse ato discriminatório contra a Zona Franca de Manaus reside, sobretudo, no seguinte fato: enquanto as importações ali estão isentas do Imposto de Importação e do Imposto de Produtos Industrializados, os ingressados nos demais pontos do País pagam os tributos devidos - os dois a que me referi. O que evidencia - e aqui chamo a atenção da Casa - a preocupação do Governo com a arrecadação tributária e não com a crise cambial.

Mas, Sr. Presidente, está tramitando no Judiciário uma ação genérica interposta pelas entidades de classes que visa a suspender o contingenciamento. Quando for julgada - e tenho certeza de que será reconhecida a inconstitucionalidade do decreto -, ficará muito difícil para o Presidente da República, que se comprometeu com aquela área, ter ido - para não dizer uma palavra mais dura - na conversa de assessores que não estão à altura de desempenhar o cargo.

Sr. Presidente, quero registrar o final do expediente do Governo do Estado.

      "Enfim, acreditamos que, em face de a balança comercial não ser mais deficitária; de o contingenciamento não ter sido imposto por lei, mas sim por decreto; de o contingenciamento ter sido estabelecido de forma discriminatória somente para a Zona Franca de Manaus; de o Governo Federal já ter perdido mais de 50 mandados de segurança; de a indústria e o comércio de Manaus estarem na iminência de paralisação por falta de quotas; e de também ser iminente o descontingenciamento pelo Judiciário, o Governo Federal deveria se antecipar e revogar o contingenciamento e evitar, assim, o desgaste político do Governo."

Sr. Presidente, chamo a atenção do Líder do Governo ao afirmar que, em uma circunstância como essa, em que se prejudica uma região que tudo faz para sobreviver, tudo faz para continuar na filiação da Federação - porque a tratam como enteada -, é lamentável que a Liderança do Governo não chame a atenção da área fazendária, e não o faça de forma áspera. Daqui a alguns dias, vai acabar perdendo o apoio daqueles Parlamentares que compõem aquela área e que não estão aqui para deixar de defender os interesses do Amazonas.

Era o que tinha a dizer. (Muito bem!)


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 20/09/1995 - Página 16131