Discurso no Senado Federal

PRIORIDADE PARA OS DESAFIOS NACIONAIS COMO O DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, A PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE E A EQUIDADE SOCIAL.

Autor
Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.:
  • PRIORIDADE PARA OS DESAFIOS NACIONAIS COMO O DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, A PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE E A EQUIDADE SOCIAL.
Aparteantes
Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DCN2 de 19/08/1995 - Página 14123
Assunto
Outros > POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.
Indexação
  • COMENTARIO, INEXISTENCIA, PROJETO, PROGRAMA, GOVERNO FEDERAL, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, SIMULTANEIDADE, POLITICA, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, OBJETIVO, GARANTIA, EQUIDADE, NATUREZA SOCIAL, PAIS.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, só lamento que o Governo não tenha dedicado tanto tempo, como está fazendo em relação ao Banco Econômico, para resolver quatro desafios que são bem maiores do que a solução do problema de um banco quebrado. Sobre esse assunto, já manifestei minha opinião. No entanto, quando o então candidato a Governador do Paraná, Roberto Requião, convidou-me para coordenar a elaboração de seu plano de governo, numa conversa antes até da sua campanha, disse a S. Exª que tínhamos quatro desafios. Primeiro, desenvolver o Estado, mas promover um desenvolvimento sustentável. Junto com esse desafio, estabelecer a eqüidade social. O terceiro, cuidar do meio ambiente. E promover a integração competitiva do nosso Estado, o quarto. Parece-me que não mudou nada de lá para cá. São esses os quatro desafios que o Brasil deve enfrentar. No entanto, Srs. Senadores Jefferson Péres, Geraldo Melo e Lúcio Alcântara, eu, como V. Exªs, pertenço ao Partido do Presidente da República e não consigo enxergar nenhum programa elaborado pelo Governo, ou em ação, ou na gaveta, que possa enfrentar esses quatro desafios, com competência para vencê-los. É claro que existe um plano de estabilização econômica em vigor e que tem promovido alguns avanços no que se refere ao campo social. Li num Boletim do Banco Central que R$14 bilhões foram transferidos do setor produtivo para o trabalho, ou seja, os trabalhadores tiveram um ganho de R$14 bilhões nesse período do primeiro ano do real. No entanto, essa transferência que de certa forma estabelece uma certa eqüidade social, ou pelo menos leva a pensar que estamos neste caminho, transfere para o setor produtivo uma profunda injustiça, porque, se estivéssemos tirando o dinheiro do setor especulativo para o trabalho, estaríamos sendo mais justos, mas estamos tirando dinheiro do setor produtivo para o setor do trabalho.

Em relação ao meio ambiente, não conheço o programa do Governo em execução, para que possamos nos integrar com o mundo nessa questão.

Com relação à eqüidade social, temos um programa, que é o Comunidade Solidária, muito tímido no que diz respeito aos graves problemas sociais que o País enfrenta. Não há nenhum mecanismo mais duradouro sendo colocado em prática visando o estabelecimento da eqüidade social. Há mecanismos provisórios que não resolvem, apenas maquiam os problemas. Acredito que não há nenhum procedimento mais duradouro para estabelecer a eqüidade social do que efetivamente a geração de empregos, e, ao contrário, estamos vendo a economia brasileira desempregando mão-de-obra.

Estou com uma matéria da Folha de S. Paulo que diz: "A crise agrícola atola mercado de tratores."

Só no mercado de tratores, 9.850 pessoas foram demitidas desde abril, portanto, em quatro meses, quase 10 mil demissões.

Ontem, no Estado do Senador José Fogaça, a empresa de tratores Agrale demitiu 390 funcionários. No nosso Estado, Senador Roberto Requião, a Ford New Holland demitiu quase 500 empregados e deu férias coletivas. Ainda no Rio Grande do Sul, a empresa Valmet de tratores demitiu 600 empregados e deu férias coletivas para os demais. A máquina agrícola que não é vendida está no pátio dos fabricantes. Todas as empresas fabricantes estão com tratores no pátio, máquinas paradas, desempregando mão-de-obra e dando férias coletivas; a primeira vez na história do País.

Isso me parece ir contra qualquer política de estabelecimento de eqüidade social, porque o mecanismo mais duradouro do estabelecimento da eqüidade social, que é o emprego, está exatamente na contramão desse plano do Governo.

Portanto, nesta primeira parte do meu pronunciamento, quero afirmar que, em relação ao meio ambiente, não conheço nenhum plano do Governo para que o País se integre com o mundo. Em relação à eqüidade social, vejo que o Comunidade Solidária é impotente diante das conseqüências da política econômica que está gerando desemprego em todos os centros urbanos e também no campo.

E vou falar a respeito da integração competitiva e a oportunidade, mais uma vez, que estamos perdendo de nos integrarmos competitivamente com o mundo.

O Sr. Roberto Requião - Permite-me V. Exª um aparte, Senador?

O SR. OSMAR DIAS - Concedo o aparte ao Senador Roberto Requião.

O Sr. Roberto Requião - Senador Osmar Dias, isso tudo se dá com um Banco Central como está. Imagine como seria com um Banco Central independente. Durante a sessão de hoje, vários Senadores levantaram a proposta de se criar, num momento de pânico, uma legislação que desse independência ao Banco Central. Banco Central independente é realidade virtual. Quem seria esse Presidente do Banco Central mais puro, mais correto do que o Presidente da República, nomeado por Zeus? Que espécie de organismo transgênico iria cuidar da estabilidade de nossa moeda? Esta independência do Banco Central viabilizou a crise na agricultura e o absoluto desgoverno que o País vive hoje: a falta rigorosa de planejamento nas áreas essenciais, porque a estabilidade da moeda, a obsessão pelo real absorveu a conduta política do Governo Federal. Mas, mais do que isto e aproveitando este espaço que V. Exª tão generosamente me concede, quero defender a figura do Presidente da República, pois discurso feito, neste momento, acerca do Banco Central independente nos faz presumir um Presidente da República irresponsável e um grupo de técnicos acima do bem e do mal conduzindo a estabilidade da moeda e os rumos do País. Isto é rigorosamente inaceitável.

O SR. OSMAR DIAS - Quero incorporar o aparte de V. Exª a meu pronunciamento e dizer que o Governo brasileiro está perdendo uma oportunidade, mais uma vez, de promover a integração competitiva do Brasil no mercado internacional.

Sabemos que 81% de todo o mercado de commodities mundial estão nas mãos dos sete países mais desenvolvidos do mundo.

O nosso setor agropecuário é o que apresenta as maiores vantagens comparativas, no entanto os mecanismos que poderiam viabilizar a nossa integração competitiva não estão sendo colocados em prática de forma adequada, eficiente e competente.

Primeiramente, o mecanismo de crédito rural dispensa discussão porque está demasiadamente discutido e sabemos que não serve a nosso modelo de desenvolvimento; serve ao modelo de desenvolvimento do sistema financeiro para engordar cada vez mais os lucros dos bancos e saciar o apetite cada vez mais ganancioso dos banqueiros. Serve para isso, mas não serve para promover o desenvolvimento.

Em relação aos preços mínimos que foram divulgados na semana passada, não entendo qual é a aritmética do Governo, porque todos os produtos e insumos utilizados para a produção agrícola tiveram no mínimo 30%; e a inflação no período foi de 28%. Nenhum insumo teve aumento de preço inferior a 30%, todos de 30 a 60%. Se o custo de produção aumenta nesse nível de 30 a 60%, como se explicam os preços mínimos anunciados para a atual safra serem menores em valor nominal do que os preços de um ano atrás anunciados em julho de 1994?

É impossível entender como, depois de todo o alerta de que teríamos uma redução de safra, o Governo anuncia este mecanismo de política agrícola, que é o preço de garantia inferior àqueles que geraram uma boa safra de 81 milhões de toneladas. Agora, quando precisávamos aumentar ou pelo menos manter essa safra, ao invés de colocar em prática um preço mínimo suficiente para que isso acontecesse, o Governo reduz em valores reais o preço mínimo.

Mas, pior que isso - aproveito a presença do Presidente José Sarney -: estamos diante de um dilema muito grande. O Presidente Fernando Henrique Cardoso, à parte deste episódio do Banco Econômico, que não quero nem me pronunciar a respeito, porque também sobre ele já falamos demais, é sem dúvida alguma um homem respeitado na comunidade internacional. E o Presidente José Sarney é um dos homens mais respeitados no mundo também na comunidade internacional. Talvez faltem as informações necessárias para mostrarmos que o Brasil não tem na política interna para a agricultura apenas o seu problema; mas o maior problema do desenvolvimento sustentado e da busca dessa integração competitiva do nosso País no mercado internacional está exatamente em não estarmos disputando convenientemente o nosso espaço político nas negociações na Rodada do Uruguai, no GATT e, principalmente, com os blocos econômicos fortes já formados e que subsidiam fortemente sua agricultura.

Fiz um estudo detalhado a respeito disso e concluí que, nos últimos 30 anos, com os subsídios, a tecnologia aplicada na agricultura dessas regiões do mundo foi suficiente para promover o aumento da produtividade. Esse aumento da produtividade promoveu uma derrubada de preço para cada produto de meio por cento, na média, ao ano. Se em 30 anos, tivemos isso acumulado, hoje, nós temos uma redução próxima a 20%. Ou seja, as commodities agrícolas valem hoje 20% a menos do que valiam há 30 anos. Motivo principal: US$350 milhões de subsídios que os Estados Unidos, a União Européia e a Comunidade Asiática concedem para seus agricultores.

Pois bem. É possível negociar a redução desse subsídio se ele é o nosso problema? O subsídio chega a tanto, Senador Geraldo Melo, que uma de suas vacas, lá na Suíça, receberia US$2 mil por ano. Se elas estivessem nos Estados Unidos, receberiam US$1.400; na França, US$2.500. Isso significa que, para cada dólar produzido na Suíça, na França, no Japão, o subsídio do Governo varia de 50 a 80%, anulando as vantagens comparativas que o setor agropecuário brasileiro tem, teoricamente, diante de todos os outros competidores.

Para que possamos manter essas vantagens comparativas - e aí já que parece que ignoram a nossa vocação e não adianta ficarmos tentando ser bons em outras coisas, porque somos bons mesmo na produção agrícola e na industrialização dessa produção agrícola -, aproveitando essa vocação, poderíamos, negociando uma redução gradativa dos subsídios nos blocos econômicos fortes, ganhar a vantagem comparativa que oferece o setor produtivo nacional e, daí sim, promovermos o desenvolvimento.

Fiz um outro estudo: vamos supor que, de repente, os subsídios deixassem de existir no mundo. Os países em desenvolvimento, entre os quais o Brasil se inclui, ganharia um mercado, desde que o mercado fosse livre mesmo. Porque aqui se defende o mercado livre e nós nos esquecemos que os Estados Unidos, por exemplo, taxam o suco de laranja em US$500 a tonelada para impedir a competição com os produtores da Flórida, especialmente. Os Estados Unidos, país onde o discurso do capitalismo é forte, libera-se naquilo que interessa, mas se cerca e se protege o mercado interno naquilo que interessa também aos produtores nacionais.

Nós poderíamos adquirir 40 bilhões a mais, todos os anos, para os países em desenvolvimento, só de commodities agrícolas. Esse valor seria um acréscimo nas exportações que já fazemos e que poderiam significar ao Brasil o ingresso, só de commodities, de US$ 14 bilhões todos os anos; o que, sem dúvida alguma, seria um incremento, um fortalecimento da nossa balança comercial. E, assim, poderemos, com certeza, pensar em vencer o segundo desafio: o da eqüidade social.

Não há como discutirmos uma política de integração competitiva, pensando apenas nos mecanismos de políticas internas. Isso é mediocridade demais. Não vejo o Governo brasileiro sequer arranhar esse assunto de discutir o problema da participação competitiva do mercado internacional. Temos um mercado consumidor grande? Potencialmente sim, mas ele não é efetivo, porque o problema social não permite que milhares de pessoas se integrem a esse mercado competitivo. Podemos produzir para o mercado interno e sobrar mais para o mercado externo? É lógico que sim, desde que o Governo brasileiro, as autoridades nacionais empenhem-se na negociação de uma redução gradativa, mas acelerada, dos subsídios que tomam conta do mundo.

Volto a dizer: não é porque os 5% de agricultores que moram na zona rural do Japão, ou os 5% que moram na zona rural da França têm força demais que eles conseguem esses subsídios, é porque a agricultura nesses países é tratada como um segmento estratégico da economia, porque é a base da economia. Ainda mais aqui no nosso País, onde nossa vocação é esta.

Estrategicamente, deveríamos eleger a agricultura como uma prioridade absoluta, porque passa a ser mais prioritário discutir o problema de um banco quebrado do que discutir programas de ação que possam promover o crescimento nacional. E este crescimento nacional está, sim, estagnado, embora os economistas afirmem que, tecnicamente, não estejamos em recessão. Mas o que é a demissão de 9.850 empregados, em quatro meses, de uma indústria que jamais demitiu, que só cresceu, que só empregou, que é a indústria de máquinas agrícolas? Na história de seus 35 anos, jamais demitiu, jamais deu férias coletivas nesse período que separa a comercialização da safra de verão e o plantio da outra safra, quando os agricultores vão comprar seus equipamentos.

Para que V. Exªs tomem conhecimento: no mês de julho, duas colheitadeiras foram vendidas no Brasil e 1.182 tratores. Num programa que nós colocamos em prática no governo do Senador Roberto Requião, no Paraná, a equivalência-produto, chamado "panela cheia", em um mês, o Paraná vendeu, sozinho, 1.200 tratores. Agora, o Brasil inteiro vendeu 1.182 tratores num mês de alta comercialização. Portanto, estamos em uma situação de estagnação geral e perdendo uma grande oportunidade. E se continuarmos na mediocridade de ficar discutindo dívida passada, dívida passada de uma meia dúzia, 1.213 - agora dizem que é 5.000 -, mas, de qualquer modo, é muito menos do que 5 milhões de agricultores que poderiam, hoje, estar sendo apoiados por uma política que visasse não apenas o crédito rural, preço mínimo, política de armazenagem, mas, sobretudo, a integração desse setor produtivo, fundamental para o País, no mercado internacional.

E aí eu sei que o Presidente José Sarney tem prestígio suficiente para contribuir com o País, para que isso ocorra. Sei que o Presidente Fernando Henrique tem prestígio suficiente na comunidade internacional.

Agora, quero fazer aqui um apelo. Fiz contato com uma fundação internacional - não vou nem citar o nome, para não causar polêmica -, que me autorizou a estabelecer um convênio do Governo brasileiro com a FAO para que, através desse convênio, pudéssemos elaborar um planejamento, mas nos moldes que estou dizendo, de vencer os desafios do desenvolvimento sustentado, da integração competitiva, da questão do meio ambiente, da questão da eqüidade social, com base num desenvolvimento rural moderno. Um planejamento para os próximos cinqüenta anos! Já me chamaram de maluco: se o Brasil não planeja a próxima safra, vai planejar para cinqüenta anos? Mas foi assim que procederam os Estados Unidos, foi assim que procederam os países da União Européia, e nós podemos proceder assim também, com o auxílio de um organismo internacional da qualidade técnica da FAO, que nos ajudou a desenvolver o plano para a agricultura do Estado do Paraná, que é sucesso e é considerado modelo. Podemos desenvolver um plano para a agricultura do nosso País que a torne não apenas competitiva no mercado, porque aumentando a produtividade ela vai se tornar competitiva, mas, sobretudo, que leve à redução dos subsídios, que nos tiram, anualmente, Presidente Sarney, US$40 bilhões de oportunidades de crescimento. Nós estamos há décadas estagnados, sem a reação da sociedade política e civil em nosso País. Estou pregando essa reação.

O Sr. Roberto Requião - Senador, permite-me V. Exª mais um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - É permitido, Sr. Presidente?

O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Sim. V. Exª pode conceder o aparte, pois ainda dispõe de tempo para isso.

O SR. OSMAR DIAS - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Roberto Requião - Senador, eu acho que a sua exposição é extremamente clara. Nós temos a experiência do nosso governo no Paraná e temos conhecimento de outras experiências na história do mundo. Por exemplo, o New Deal, do Franklin Delano Roosevelt, que se suportava em algumas frases lapidares: Se as cidades queimarem, os campos se levantarão e reconstruirão as cidades; se os campos queimarem, as cidades morrerão de fome. Por outro lado, o que nós vemos na política externa brasileira é a subordinação a uma idéia estéril, inócua, que acredita que a cada concessão da soberania se sucede um investimento. Tentam empurrar garganta abaixo do Senado Federal uma Lei de Patentes pactuada secretamente pelo Ministério das Relações Exteriores com o Governo dos Estados Unidos, mas não negociam o fim dos incentivos, das concessões e dos subsídios aos produtos agrícolas dos países mais desenvolvidos. Nós não temos política agrícola, nós não temos política industrial, nós não temos política de educação, nós não temos um projeto de desenvolvimento. Tudo se subordina à idéia central do Consenso de Washington: abertura de mercados. A cada concessão de soberania, pensam os ingênuos, se sucede um investimento internacional. O Brasil está fazendo mudanças profundas na sua legislação constitucional, com medo de ser brasileiro, sem que essas mudanças - algumas necessárias - sejam feitas sob a perspectiva dos brasileiros, dos projetos nacionais permanentes, da crença de que nós, brasileiros, somos capazes de construir definitivamente um grande País.

O SR. OSMAR DIAS - Senador Roberto Requião, a França, em 1950, tinha, vivendo no campo, 8 milhões de franceses. Hoje, vivem no campo da França 800 mil franceses. Portanto, 1% de 45 anos atrás.

Esse processo de transferência da população rural para os centros urbanos ocorreu de forma praticamente igual em todos os países europeus e nos Estados Unidos, onde 3% da população rural se transferiu, ao ano, para as cidades. No Brasil, esse processo bateu todos os recordes. Nos últimos trinta anos, tivemos uma inversão. Setenta e cinco da população vivia no campo há 30 anos; hoje, 75% da população vive nas cidades. Isso significa que precisamos criar mecanismos de geração de empregos para essas pessoas que se transferem do campo, que está sendo mecanizado, que está se modernizando, para as cidades.

Muitas vezes ouvimos também críticas que dizem que os governos são incompetentes, porque o êxodo rural está ocorrendo. Se é assim, os governos do mundo inteiro foram incompetentes. A modernização da economia leva ao êxodo, leva à procura de outras oportunidades nos centros urbanos. E nós, aqui em nosso País, estamos deixando de fazer as duas coisas: de criar os mecanismos para receber as pessoas que deixam o campo, e de criar mecanismos para manter as pessoas no campo, trabalhando de forma competitiva.

Se perdemos essa grande oportunidade, em que a economia do mundo se globaliza, ou seja, em que há uma economia e um mercado somente, em que temos esse setor de amplas vantagens comparativas, que é o setor de fibras, grãos e carnes, perderemos a oportunidade de darmos um salto de desenvolvimento e de promovermos a eqüidade social que este País está desejando.

Agora, com essa política medíocre, em que uma bancada ruralista se reúne com o Ministro da Fazenda ou com o Ministro da Agricultura para discutir quem vai pagar a dívida dos agricultores que estão devendo, em que o Banco do Brasil se defende, mas não denuncia à Nação os verdadeiros devedores do dinheiro do povo - porque aqueles que tomaram dinheiro emprestado e não o aplicaram na agricultura deveriam ser denunciados publicamente e não o são, e não sei por que - enquanto ficarmos vivendo a mediocridade da discussão da dívida e do crédito, como se política agrícola fosse dívida e crédito, como se não tivéssemos que ter preocupação com a segurança alimentar, que é o foco principal das atenções de todos os países do mundo - e segurança alimentar não significa produzir o suficiente para comer, mas produzir e distribuir essa comida para toda a população -, não alcançaremos nenhum dos quatro desafios que listei aqui e que devem fazer parte de todo plano de desenvolvimento do País.

Conheço o Plano Real, porque está em execução, e conheço as suas conseqüências, mas não conheço, do Governo do Partido ao qual pertenço agora, nenhum plano para promover e vencer os quatro desafios que tracei aqui.

Quem sabe o problema das dívidas dos agricultores possa ser negociado pelo Senador Antonio Carlos Magalhães, que, sem dúvida alguma, proporia a sua estatização - porque ganhamos agora um novo adepto da estatização em nosso País. Poderia S. Exª propor ao Governo a estatização da dívida dos agricultores.

Quem sabe poderíamos estabelecer um novo diálogo com o Governo?! Estou levando ao Governo a proposta da FAO e de outros organismos internacionais, de planejarem, junto com os técnicos do Brasil, um desenvolvimento rural para os próximos 50 anos.

Falei com o Presidente da República. Sua Excelência me encaminhou ao Ministério da Agricultura, que não demonstrou nenhum interesse que esse convênio seja estabelecido. Não demonstrou, porque está bom assim. Os juros estão altos e, para o Ministério da Agricultura, o que importa é se os juros estão altos.

Portanto, estou aqui fazendo um alerta: o Brasil está perdendo uma grande oportunidade de se inserir no mercado internacional de forma competitiva. Está perdendo essa oportunidade por falta de propostas, e quero ajudar a fazê-las.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 19/08/1995 - Página 14123