Discurso no Senado Federal

RESPOSTA AO PRONUNCIAMENTO DO SR. ELCIO ALVARES, SOBRE POSIÇÃO DO GOVERNO EM RELAÇÃO AO PROJETO SIVAM.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).:
  • RESPOSTA AO PRONUNCIAMENTO DO SR. ELCIO ALVARES, SOBRE POSIÇÃO DO GOVERNO EM RELAÇÃO AO PROJETO SIVAM.
Publicação
Publicação no DSF de 17/01/1996 - Página 313
Assunto
Outros > SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
Indexação
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, ORADOR, DISCUSSÃO, PROJETO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
  • NECESSIDADE, SENADO, APURAÇÃO, ESCLARECIMENTOS, DENUNCIA, PROJETO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, temo por aquilo que está por ocorrer no Senado, e falo como amigo do Presidente Fernando Henrique Cardoso há muitos anos.

Não gostaria que o Projeto Sivam fosse a causa de eventual naufrágio de seu Governo, o que, entretanto, poderá vir a ocorrer dependendo daquilo que acontecer no Senado Federal.

Preocupam-me as declarações, por exemplo, do Senador Elcio Alvares, Líder do Governo, ao transmitir à imprensa que o Projeto Sivam agora tem uma decisão simples: que a única coisa que temos que ver é o afastamento da Esca, e poderemos aqui, simplesmente, analisar o projeto de resolução sem a participação da Esca, e tudo estará adequado.

Parece que nos esquecemos dos motivos que nos levaram a formar a Comissão para a análise do Projeto Sivam.

Lembremo-nos dos fatos: foram divulgadas pela imprensa as gravações de conversas entre o Embaixador Júlio César Gomes e o representante não da Esca, mas da Raytheon, no Brasil, o Presidente da Líder, Sr. José Afonso Assumpção. Tamanha foi a repercussão dos fatos que os Partidos de Oposição, o PT, o PC do B, o PDT e o PSB sugeriram a realização de CPI e começamos a coletar assinaturas na Câmara e no Senado. Foi então que o Líder do Governo, Senador Elcio Alvares, e diversos Senadores, inclusive o Presidente da Comissão de Defesa Nacional e Relações Exteriores, disseram-nos que poderíamos formar uma supercomissão, constituída pelas Comissões de Assuntos Econômicos, de Defesa Nacional e Relações Exteriores e, para o propósito de apurar e fiscalizar, também pela Comissão de Fiscalização e Controle.

A Comissão foi formada para apurar os fatos em profundidade, sem esconder este ou aquele outro. Pois bem, se a missão da Supercomissão não for cumprida, voltará a haver motivação para que recolhamos as assinaturas necessárias para a formação de comissão; e se, porventura, no Senado houver pressão para que os Senadores não assinem, o que vai acontecer é que o Senado estará abrindo mão da sua responsabilidade constitucional de fiscalizar e apurar, o que a Câmara fará, porque na Câmara já há número suficiente de assinaturas para a formação de comissão. Eu queria então dizer aos Srs. Senadores: não vamos abrir mão dessa nossa prerrogativa.

Os problemas do Projeto Sivam são graves sim. A relação da Esca com a Raytheon e a Líder data de junho de 1992, conforme documento que o Senador Antonio Carlos Magalhães obteve de patriota e do qual agora nós, membros da Comissão, estamos de posse. Trata-se de acordo entre as partes, no qual se propunham a fazer tudo para realizar este projeto, e, mais ainda, agir em outros países dos diversos continentes.

E havia naquele mesmo momento um outro acordo, realizado, assinado entre as três empresas, que, segundo o Vice-Presidente da Raytheon, James Carter, conforme declaração à Gazeta Mercantil, só foi desfeito em dezembro de 1994: o acordo de sigilo entre as três partes.

Não entendo como é que o Presidente Fernando Henrique Cardoso diz à Veja que esse acordo não tinha grande importância:

      "Para a Aeronáutica, os seis funcionários não eram da Esca, mas pessoas de sua confiança na Esca. Tanto que quando eu decidi que a Esca tinha de ser eliminada, tivemos de pegar o mesmo pessoal e levar para a Aeronáutica..."

Diz como se não fosse importante que a Aeronáutica tivesse seis de seus funcionários remunerados pela Esca na hora de escolher a Esca, e depois na hora também de recomendar a escolha da Raytheon, como se a escolha da Raytheon não estivesse contaminada por esse processo.

Ora, é preciso muita ingenuidade! Será que o Presidente Fernando Henrique Cardoso está tão pressionado pela Embaixada dos Estados Unidos, pelo Presidente Bill Clinton - que não falou com ele, diz ele aqui na entrevista à Veja -, pela carta do Presidente Bill Clinton ao Presidente Itamar Franco sobre isso?

São inúmeros e públicos os contatos das autoridades, as diversas vezes em que as autoridades, em que o Secretário Ron Brown e outros falaram; também falou o Presidente Mitterrand, também falaram os da França. Mas as autoridades dos Estados Unidos têm feito, sim, a maior pressão para que isso seja aprovado.

Ora, Sr. Presidente, a ESCA tinha então a responsabilidade, porque era da confiança do Ministério da Aeronáutica, de escolher a melhor empresa, dentre as brasileiras, para o trabalho de gerenciamento e integração.

Ontem conversei com o presidente de uma das empresas que estavam por ser eventualmente escolhidas e perguntei a ele, ao Sr. Henry Maksoud, Presidente da Hidroservice, se por acaso os funcionários da confiança do Ministro da Aeronáutica estiveram na sua empresa perguntando-lhe, em detalhe, em que medida tinha capacidade para integração e gerenciamento. E ele disse que não, que ninguém - da Aeronáutica ou da ESCA - havia estado lá, para perguntar isso, porque eles tinham, sim, capacidade para isso, se viessem a ser consultados. Esta teria sido a resposta.

Ora, não podemos agora querer passar sobre essas coisas como um rolo compressor. Precisamos, sim, ouvir os cientistas da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.

É por esta razão que estou encaminhando ao Presidente Antonio Carlos Magalhães um ofício - e é um requerimento -, primeiro, informando que o Sr. Aldo Vieira da Rosa, por estar em Stanford, não poderá vir, que o Sr. Saint Pierre poderá vir na semana próxima, no dia 25, ou desse dia em diante, porque esta semana estará viajando para o Peru e, também, diante da revelação, na revista IstoÉ desta semana, de que o projeto SIVAM poderá ser realizado por US$927 milhões, em vez de US$1,438 bilhão. Escutamos os cientistas da SBPC, que podem transmitir ao Senado a metodologia para a qual fizeram esses cálculos.

Ora, Sr. Presidente, eu gostaria que Sua Excelência o Presidente Fernando Henrique Cardoso dissesse ao Presidente Bill Clinton, ao Embaixador Melvyn Levitsky, dos Estados Unidos, e ao representante da Raytheon que nós, Senadores - Roberto Requião e Antonio Carlos Valadares -, ouvimos do Ministro Adib Jatene, ao explicar ao Embaixador de Cuba, Ramon Sanches Parodi, e ao Presidente representante do Centro de Engenharia Genética e Biotecnologia, que estava cancelando licitação inteiramente legal, internacional e pública para a compra de 21 milhões de vacinas, porque uma empresa disse que poderia fornecer o produto a um preço significativamente mais baixo.

Os representantes da empresa cubana teriam dito: "Olha, não acreditamos tanto que isso possa ocorrer, mas, em todo caso, também vamos participar da nova licitação. Não vamos protestar, vamos respeitar a decisão do Governo brasileiro". Eu gostaria de ouvir o Embaixador dos Estados Unidos e o representante da Raytheon dizerem: "Compreendo as decisões do Governo brasileiro e do Senado Federal". Que o Senador Ramez Tebet examine com clareza esse acordo.

Outro acordo que foi sigiloso e que só agora se tornou público: que sejam examinados com cuidado os preços oferecidos pela Raytheon, comparados àqueles que a comissão de cientistas da SBPC demonstram. Vamos esperar que o Governo americano transmita ao Governo brasileiro e ao Congresso a mensagem: "Sim, vocês têm a obrigação e o dever de defender o interesse público. Não vamos querer fornecer equipamentos ao Brasil superfaturados ou ainda a preços maiores do que os da indústria nacional".

Ouvidos os membros da SBPC e os empresários nacionais, espera-se que essas negociações não mais sejam feitas sigilosamente - porque o foram. A Esca e o Ministério da Aeronáutica - esse fato já está comprovado - agiram em desacordo com os princípios constitucionais do art. 37, que exigem da administração pública brasileira impessoalidade, moralidade e transparência de ações.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é preciso que tenhamos procedimentos transparentes e não tenhamos receio das palavras do Brigadeiro Ivan Frota. Permita-me, Senador Antonio Carlos Magalhães, havia sido uma decisão da Comissão ouvir o Brigadeiro Ivan Frota.

Também não gostei e discordo das observações lidas pelo Senador Jefferson Péres. Imaginem, ameaçar com golpe militar caso haja uma decisão contrária aos interesses públicos! A melhor defesa para as irregularidades são os processos democráticos. É a palavra a melhor defesa diante das denúncias generalizadas de que Senadores poderiam estar recebendo benesses para aprovar rapidamente o Projeto SIVAM. Dever-se-ia exigir um esclarecimento de pronto ali, na Comissão.

Sinto discordar e o faço com todo o respeito e amizade mesmo. Meus procedimentos têm sido no sentido de hora concordar, hora divergir, mas é importante expressarmos os pensamentos com franqueza.

Creio que o Senado teria avançado mais se tivesse ouvido o Brigadeiro Ivan Frota, as suas alegações. Jamais o golpe militar será a solução para os problemas brasileiros. É exatamente a democracia que nos permite uma análise profunda das matérias em debate.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/01/1996 - Página 313