Discurso durante a 21ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

ABORDAGEM SOBRE O SALARIO-EDUCAÇÃO.

Autor
Bernardo Cabral (S/PARTIDO - Sem Partido/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • ABORDAGEM SOBRE O SALARIO-EDUCAÇÃO.
Aparteantes
Esperidião Amin, Hugo Napoleão, Joel de Hollanda, Romeu Tuma, Waldeck Ornelas.
Publicação
Publicação no DSF de 06/02/1996 - Página 1338
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, DIVERSIDADE, PROPOSIÇÃO, TRAMITAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, UTILIZAÇÃO, SALARIO EDUCAÇÃO, ORIENTAÇÃO, DESCENTRALIZAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO, AUMENTO, PARCELA, DESTINAÇÃO, MUNICIPIOS.
  • INTERESSE, EMENDA CONSTITUCIONAL, CRIAÇÃO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, ENSINO FUNDAMENTAL, VALORIZAÇÃO, MAGISTERIO, POSSIBILIDADE, UTILIZAÇÃO, PARCELA, SALARIO EDUCAÇÃO, UNIÃO FEDERAL.

O SR. BERNARDO CABRAL ( AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na sexta-feira passada, pedi à Presidência que me garantisse a inscrição no dia de hoje, como primeiro orador após a Ordem do Dia, pois gostaria de fazer uma abordagem profunda sobre o tema salário-educação. Na sessão de sexta-feira, já nos últimos minutos, não era possível fazê-lo, apesar de ter trazido notícia à Casa de que o Ministério da Educação, à vista da balburdia, da desonestidade, até mesmo do crime de apropriação indébita que se estava a fazer no Rio de Janeiro, teria determinado o fechamento de várias escolas naquela cidade.

Entendi assim, Sr. Presidente, porque está na hora de o Parlamento brasileiro levar a sério uma instituição que foi criada em 1964 e que desconta 2,5% da folha de empregados. Ora, desse levantamento que realizei, acabei notando que, no ano de 1994, houve uma soma de R$1,2 bilhão, arrecadados exatamente da folha de pagamento de funcionários das empresas. Lembro-me que a atual Constituição, no seu art. 212, § 5º dá como fonte adicional de ensino esse salário-educação porque entende que é preciso financiar o ensino fundamental.

O que se nota, a grande luta que tem havido por parte de Deputados e Senadores é que há uma idéia no sentido da descentralização da distribuição de recursos do salário-educação. O Decreto-lei nº 1.422, de 23.10.75, destina dois terços dos recursos do salário-educação aos Estados, Territórios e Distrito Federal, enquanto um terço é administrado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão ligado ao Ministério da Educação e do Desporto. Conforme o Decreto nº 88.347/83, 25% da cota federal devem ser destinados ao apoio a programas municipais de ensino fundamental.

E aqui, Sr. Presidente, volto ao problema da reivindicação. As reivindicações a respeito da descentralização da distribuição dos recursos do salário-educação são antigas. E cresceram após 1988, com a argumentação de que cabe aos municípios receber uma parcela mais significativa dessa contribuição social, uma vez que a Constituição Federal estabeleceu, em seu art. 211, § 2º, a atuação prioritária desses entes federados no ensino fundamental.

Embora a legislação básica sobre a matéria tenha se mantido inalterada nos últimos anos, o Poder Executivo Federal vem ampliando o número de municípios atendidos pelo FNDE. O problema é que os critérios de transferências continuam a ser consideravelmente aleatórios, o que beneficia o clientelismo político e o desperdício. A pouca agilidade das transferências intergovernamentais também continua sendo um problema, ainda que seus danos tenham sido atenuados pela estabilização monetária.

O princípio da descentralização na aplicação dos recursos do salário-educação merece ser defendido, porém sua implementação precisa ser muito bem dosada. Não se pode menosprezar o fato de que mais da metade dos alunos do ensino fundamental do País encontra-se matriculada nas redes estaduais. Em alguns Estados, essa proporção é ainda maior, como em São Paulo, onde o poder público estadual mantém 80% das matrículas.

Em Santa Catarina, a rede estadual é responsável por quase 70% dos alunos matriculados no ensino fundamental. Essa situação indica que, sem negociação entre os governos estaduais e seus respectivos municípios, dificilmente uma política descentralizadora poderá ser bem sucedida.

Diversos projetos de lei sobre o salário-educação foram apresentados nos últimos anos no Congresso Nacional. A tônica geral é a da descentralização mediante a criação de uma quota municipal mais representativa. Parte dessas proposições preocupa-se com o estabelecimento de critérios mais objetivos nas transferências. Contudo, algumas delas ainda primam pela desinformação sobre as condições da oferta do ensino fundamental pelos entes federados.

Um dos projetos de lei, de autoria do ex-Senador Jorge Bornhausen, foi aprovado no Senado em 1990 e tramita desde então na Câmara dos Deputados. A esse Projeto de Lei, de nº 4.400-A/90, foram apensadas oito proposições sobre a matéria de iniciativa de Deputados.

A Comissão de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados, a CECD, aprovou, em setembro de 1993, substitutivo da Deputada Ângela Amin ao Projeto de Lei nº 4.400-A/90. Esse substitutivo contempla os municípios com 20% do total dos recursos arrecadados do salário-educação, além de outros 20% a ele distribuídos pelos Estados. A matéria encontra-se na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara desde 1993 e aguarda atualmente a votação do parecer (favorável, com subemendas) do Relator, Deputado Francisco Dornelles.

Apesar dessa situação, foram apresentados no Senado Federal, na atual legislatura, dois outros projetos de lei sobre a matéria. Ambos também procuram promover uma descentralização na distribuição dos recursos do salário-educação de forma a beneficiar os municípios.

O Sr. Hugo Napoleão - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Bernardo Cabral?

O Sr. Esperidião Amin - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Bernardo Cabral?

O Sr. Romeu Tuma - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Pois não, nobre Senador Hugo Napoleão. Voltarei a abordar esses dois projetos tão logo tenha a honra de ouvir o eminente Senador Hugo Napoleão, que foi Ministro da Educação e hoje exercita o múnus de Líder do PFL neste Senado.

O Sr. Hugo Napoleão - Nobre Senador Bernardo Cabral, V. Exª acaba de fazer referência ao ex-Senador Jorge Bornhausen, que é Presidente do meu Partido, o PFL. Por uma dessas coincidências, eu o sucedi no Ministério da Educação e ele, por sua vez, sucedeu ao hoje vice-Presidente Marco Maciel. Aliás, por uma outra curiosa coincidência, o primeiro presidente do PFL foi justamente o Senador Jorge Bornhausen, e o segundo, o atual vice-Presidente da República, Marco Maciel, tendo eu sido o terceiro e novamente agora, como disse o Senador Jorge Bornhausen, que é um homem dedicado, extremamente dedicado à educação. V. Exª fez referência a um projeto dele. Gostaria de dizer que o salário-educação constituiu sempre, pelo menos no meu período no Ministério da Educação, uma das mais importantes molas mestras de todo o sistema, porque, arrecadado como é, à razão de 2,5% sobre a folha de pagamento das empresas, destina-se ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, que efetivamente, desde o ensino básico até o 3º grau, inclusive na área de esportes, financia construções, reformas, ampliações, enfim, presta um grande serviço à rede educacional do nosso País. De modo que quero congratular-me com V. Exª em nome da Liderança do PFL. Continuarei atentamente a ouvir a aula que V. Exª está hoje a proferir da tribuna do Senado Federal.

O SR. BERNARDO CABRAL - Quero agradecer a V. Exª, eminente Senador Hugo Napoleão, e dizer-lhe que, muito embora seja desnecessário falar sobre os méritos de V. Exª no Ministério da Educação, espero que essa coincidência de presidências de partido possam ser renovadas para vê-lo novamente, muito breve, à frente dos destinos do PFL. Acolho e incorporo o aparte de V. Exª.

Depois de fazer duas breves considerações que talvez mereçam a análise dos eminentes pares, concederei o aparte ao eminente Senador Esperidião Amin e ao Senador Romeu Tuma.

O Projeto de Lei nº 79/95, de autoria do Senador Waldeck Ornelas, estabelece que o gestor do salário-educação deverá destinar 90% da sua arrecadação aos municípios. Os restantes 10% ficarão com a União, para o desenvolvimento de programas relacionados ao ensino fundamental. Da primeira parcela, 70% serão automaticamente enviados na proporção da população entre 7 e 14 anos de cada município. O valor restante será aplicado segundo critérios de esforço e eficiência estabelecidos periodicamente.

Chamo a atenção do Senado para o Projeto do Senador Joel de Hollanda, sob o nº 80/95, que divide o montante dos recursos do salário-educação em partes iguais entre os municípios e os Estados. A atribuição das quotas obedece aos critérios de rateio fixados para o Fundo de Participação dos Estados (FPE) e o Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

Com essa idéia do eminente Senador Joel de Hollanda, o Senador Iris Rezende, que é o Relator da matéria na Comissão de Educação, apresentou um substitutivo que procura estabelecer o equilíbrio entre as duas proposições. Essa iniciativa assegura que pelo menos 70% dos recursos líquidos do salário-educação serão destinados aos municípios, sendo 40% distribuídos pela União e o mínimo de 30% repassados pelos Estados. A quota estadual é fixada em 60% dos recursos líquidos enquanto a exigência de transferência do mínimo de metade deste valor aos municípios possibilita uma descentralização negociada entre os governos estaduais e municipais. Já a União poderá deduzir até 4% dos recursos do salário-educação para a iniciativa nas áreas de pesquisa de avaliação do ensino fundamental.

Observem V. Exªs que, ainda de acordo com esse substitutivo, todas as transferências intergovernamentais obedecerão à forma de conhecimento público, que incluirá critérios técnicos, de natureza quantitativa e qualitativa relacionados às necessidades e ao empenho dos governos subnacionais na oferta do ensino fundamental. Embora a quota da União seja reduzida, seu papel na definição dos critérios de transferência de recursos para os entes federados é de grande importância.

Por isso mesmo ouço o eminente Senador Esperidião Amin.

O Sr. Esperidião Amin - Nobre Senador Bernardo Cabral, por duas circunstâncias não poderia deixar de interromper o seu pronunciamento sobre tema tão importante.

O SR. BERNARDO CABRAL - V. Exª não interrompe; V. Exª completa o meu pronunciamento.

O Sr. Esperidião Amin - V. Exª aborda com profundidade um dos instrumentos mais eficientes e eficazes de que o País tem disposto ao longo dos últimos quase trinta anos. Primeiro, a referência de V. Exª ao substitutivo de autoria da minha esposa, então Deputada Federal Ângela Amin, e que foi presidente da Comissão de Educação, dedicando ao assunto a sua inteligência, o seu esforço, a sua dedicação, a compreensão da importância do instrumento. O segundo, é porque V. Exª está enaltecendo exatamente o aspecto mais importante, na minha opinião, de todo esse conjunto de projetos. É o esforço que o Congresso, por meio de seus representantes, seus integrantes, têm feito para tornar a descentralização desses recursos, ou seja, a distribuição desses recursos ao aplicador final, que é o Estado e o Município, crescentemente, uma distribuição dentro de critérios racionais que contribuam para melhorar a qualidade do esforço em prol da educação e, particularmente, do Ensino Fundamental em todo o Brasil. Nobre Senador Bernardo Cabral, sem dúvida alguma, o salário-educação é um dos emblemas que desmentem aqueles que são contrários aos recursos vinculados. V. Exª sabe que, hoje, há uma linguagem quase uniforme no Brasil contra a vinculação de recursos. Quando observamos as dificuldades por que o Brasil ainda passa no campo da educação, e quando se faz a avaliação de onde estaríamos se não houvesse o salário-educação, o recurso vinculado, destinado precipuamente a essa finalidade, esse cotejo faz com que o salário-educação seja objeto do reconhecimento ao mérito da sua existência e à busca, da forma mais eficaz possível, de sua aplicação pelos entes federados. Pela importância do tema, do tributo e da sua destinação, desejo associar-me as suas palavras, enaltecendo a finalidade do seu pronunciamento, pedindo-lhe que considere a minha palavra como um aplauso a sua iniciativa de focalizar, com tanta profundidade, um assunto de tanta relevância para o Brasil e, por conseqüência, para o Senado Federal.

O SR. BERNARDO CABRAL - Senador Esperidião Amin, quero agradecer a V. Exª por dois motivos. Primeiro, V. Exª fala com a experiência de quem acompanhou de perto essa matéria, até pela ligação com a eminente Deputada Angela Amin, sua esposa. Segundo, porque, tendo sido Governador de Estado, teve oportunidade de verificar que essa vinculação estava correta.

De modo que aceite os meus agradecimentos. Tomo o aparte de V. Exª como um incentivo para futuros pronunciamentos.

O Sr. Romeu Tuma - V. Exª concede-me um aparte, nobre Senador?

O SR. BERNARDO CABRAL - Com muito prazer, Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma - Obrigado, Senador Bernardo Cabral, por essa oportunidade. V. Exª sempre traz a este Plenário assuntos atuais e de vital importância para o futuro do País. Ouvindo os apartes dos Senadores Hugo Napoleão e Esperidião Amin, muito pouco poderei acrescentar à bela peça oratória que V. Exª traz a esta Casa, com dados técnicos para que realmente o Senado possa ajudá-lo nessa empreitada. Não só aqui no Senado, onde o tema educação é quase que objeto da conversa diária de muitos Senadores, mas em casa, em conversa com minha esposa, Zilda, que sempre trabalhou na área da educação e que se angustiava com a formação do ensino municipal em São Paulo, pude ter um contato direto com os problemas relacionadas a essa área. Agora V. Exª nos mostra a possibilidade de uma dotação maior para o município. Não se pode fugir à realidade, e V. Exª, Senador Bernardo Cabral, com conhecimento de causa, afirma que a municipalização do ensino básico é a coisa mais importante a ser realizada hoje. O Ministro da Educação propõe algumas reformas sadias, e o próprio Presidente da República, dentre uma das cinco prioridades na busca de um ensino básico melhor, aponta o pagamento de um salário básico para professores do ensino fundamental, leigos ou não. Em determinadas regiões do País não há professor formado e, por isso, leigos se ocupam em fazer as crianças aprenderem, no mínimo, as primeiras letras, recebendo em troca salários que são praticamente a metade do que seria o mínimo desejável. De modo que desejo cumprimentar V. Exª e agradecê-lo até pelo tema do discurso que traz à apreciação de seus Pares na tarde de hoje.

O SR. BERNARDO CABRAL - Veja V. Exª, eminente Senador Romeu Tuma, que toda família que cuida do assunto educação sempre está às voltas com um problema preocupante.

Agora mesmo V. Exª traz à colação o depoimento de Dona Zilda, que, além de ser sua esposa, trabalha em uma área altamente desconfortável, que é a do professor mal pago, mas que nem por isso deixa de observar as dificuldades pelas quais atravessa o País. E essa dificuldade é tanto maior que, quando dizia dos projetos dos eminentes Senadores Waldeck Ornelas e Joel de Hollanda, com a preocupação de que se possa ter um roteiro, eu me referia ao substitutivo do Senador Iris Rezende. O mais grave é que, como não pôde ser ele votado na Comissão de Educação, o que acontece? Esgotou-se o prazo regimental e, com isso, a matéria não obteve pronunciamento e foi remetida para o plenário desta Casa, onde está aguardando - e espero que isso ocorra em breve - a sua inclusão na Ordem do Dia.

Quero declarar que apesar de suas qualidades, o substitutivo do Senador Iris Rezende, uma vez aprovado no Senado, tem poucas condições de sobrevivência na Câmara, uma vez que, ou a iniciativa acabará chegando tarde demais, ou será apensada ao Projeto de Lei nº 4.900-A/90, com pouca probabilidade de ser preferido em meio a tantas iniciativas de parlamentares daquela Casa, incluindo o substitutivo da CECD.

Essa profusão de proposições já seria suficiente para recomendar cautela no propósito de se apresentar nova iniciativa sobre o assunto. O mais adequado é, sem dúvida, emprestar apoio ao princípio descentralizador contido nas iniciativas já existentes dos eminentes Senadores.

O Sr. Joel de Hollanda - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Joel de Hollanda - Nobre Senador Bernardo Cabral, inicialmente gostaria de cumprimentá-lo pelo tema que V. Exª em boa hora trouxe à discussão nesta Casa e pela forma competente e profunda com que V. Exª o aborda nesta tarde.

O SR. BERNARDO CABRAL - Obrigado a V. Exª.

O Sr. Joel de Hollanda - O financiamento da educação é, sem dúvida alguma, um dos capítulos mais importantes dos grandes problemas que envolvem este valioso setor, assim como identificar formas eficientes de financiar os salários dos professores e o funcionamento das unidades escolares, o que sempre preocupou os educadores. E o salário-educação, como bem disse o meu Líder Hugo Napoleão, é, na verdade, um instrumento eficiente que conseguiu estabelecer um fluxo permanente de recursos para a educação e tem contribuído para que possamos avançar bastante nessa área, sobretudo em termos da universalização da matrícula e da melhoria da qualidade do ensino. É um instrumento que pode e deve ser aperfeiçoado, porque a sociedade muda, os cenários mudam, e precisamos estar atentos a essas mudanças para cada vez mais aperfeiçoá-las. V. Exª chama atenção para as várias propostas em exame nesta Casa e na Câmara dos Deputados. É preciso que meditemos sobre essas propostas para obtermos avanços e não retrocessos nesse essencial capítulo, que é o de financiar a educação. Quero parabenizar V. Exª pela contribuição que traz, e a minha modesta proposta nesse campo procura preservar o sentido da descentralização, mas que seja compatível com a responsabilidade dos municípios e também a dos estados. Não se trata simplesmente de mudar uma legislação, mas de tentar aperfeiçoá-la, dando não somente aos municípios encargos que eles devem ter em termos de novas funções de governo, mas, sobretudo, o arcabouço de recursos financeiros para bem desempenhar essa função. Essa é uma preocupação que se deve ter. Acolho com muita alegria esse pronunciamento de V. Exª, porque ele chama a nossa responsabilidade as propostas em exame. O que aqui decidirmos trará uma repercussão muito grande à escola, as nossas regiões, ao importante estado que V. Exª representa e ao meu Estado de Pernambuco. Por isso, temos de meditar muito e analisar bem as propostas que foram feitas para termos um avanço, não só na descentralização, mas também na adequação das receitas às funções nos municípios e nos estados nessa importante área da Educação. Parabéns, Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Waldeck Ornelas - Permite V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Ouço o Senador Waldeck Ornelas, porque assim responderei a ambos, já que foram autores de medidas tão oportunas.

O Sr. Waldeck Ornelas - Efetivamente, é muito oportuna a questão que V. Exª coloca. Coincidentemente, eu e o Senador Joel de Hollanda tomamos iniciativas idênticas, até numa mesma data, sem nenhuma articulação entre nós. Mas essa multiplicidade de projetos que V. Exª registra é um indicador de que o tema está realmente carente de atenção do Legislativo. Por outro lado, é estranho e, ao mesmo tempo, significativo que o Legislativo, embora tendo vários projetos tramitando, não consiga concluí-los. Eu próprio tenho me dedicado a esse tema desde a minha primeira legislatura como Deputado, na época da Constituinte. A minha preocupação básica está voltada para o critério de distribuição. Atualmente, o estado que gera a receita do salário-educação fica com 2/3 do volume arrecadado. Como se trata de incidência sobre a folha de salários, quem gera mais são, justamente, as áreas mais desenvolvidas, as que têm as mais elevadas taxas de alfabetização, por conseguinte, necessitam menos desses recursos. É evidente que o Estado de São Paulo é o grande arrecadador, com algo da ordem de 40% do volume global gerado, embora - veja-se do lado da despesa - que esses recursos no Estado de São Paulo representem apenas 3% dos gastos da Secretaria de Educação na área de Educação. Isso gerou lá uma coisa interessante: o estado é quem faz ensino fundamental em São Paulo, e os municípios têm, muitas vezes, ficado fora do ensino fundamental. Registra-se, inclusive, o Ministro da Educação tem chamado a atenção para esse fato, o caso de Paulínia, que mantém um transporte coletivo gratuito para toda população e não tem um único aluno matriculado na rede fundamental, porque naquela localidade não há rede fundamental. A minha preocupação tem sido a municipalização, a criação de uma quota municipal, tendo em vista a descentralização da responsabilidade. Ora, encontra-se, atualmente, em tramitação na Câmara dos Deputados e no Congresso Nacional, mas começando pela Câmara dos Deputados, uma emenda constitucional que institui o Fundo de Valorização do Ensino Fundamental.

O SR. BERNARDO CABRAL - É ao que vou chegar agora.

O Sr. Waldeck Ornelas - Com isso, praticamente torna-se indiferente a vinculação administrativa das escolas - se estadual ou municipal - porque os recursos da ordem de 25%, os quais a Constituição vinculou à Educação, passarão a ser distribuídos com base no alunado, na matrícula vigente, na matrícula efetiva. É conveniente observar-se que a União não aplica recursos fiscais - e isso precisava ocorrer - no ensino fundamental. Os 18% da União vão praticamente, na sua quase totalidade, para o ensino de III grau e para a pós-graduação. Essa é uma distorção que precisa ser corrigida, mas o modelo proposto pelo Ministro Paulo Renato, pelo Presidente da República, mantém em aberto a conta da União. Então, haverá necessidade de recursos fiscais, até porque é preciso universalizar o ensino fundamental. Essa é a outra vertente das minhas preocupações. De outro lado, temos visto ser levantada a hipótese de extinção do salário-educação dentro de uma política de redução do custo dos encargos sociais, já que incide sobre a folha salarial. De todo modo, é conveniente que o projeto seja votado, porque os recursos do salário-educação estão entrando na composição do Fundo de Valorização do Ensino Fundamental, independente do critério de distribuição. O projeto que apresentei - há também um substitutivo do Senador Iris Rezende - contempla outras medidas e providências necessárias ao aperfeiçoamento do salário-educação, tais como a que diz respeito ao período de sua arrecadação, à imposição de multas àqueles que não arrecadarem, e assim por diante, de modo a assegurar uma elevação desse bolo, porque há muita evasão. Ainda recentemente foram detectados no Rio de Janeiro desvios na aplicação desses recursos. A educação sempre foi muito importante e fundamental para o desenvolvimento da sociedade. Agora que ingressamos nessa era do conhecimento, a educação se torna, cada vez mais, um elemento estratégico. E é preciso que o Brasil venha a apagar essa chaga do analfabetismo, tão marcante em nossas regiões. Defendo a votação do substitutivo do Senador Iris Rezende. Se esse projeto for para a Câmara dos Deputados, ele certamente será juntado aos outros e todos deverão ser juntados, posteriormente, à lei regulamentadora desse Fundo de Valorização do Ensino Fundamental, que vamos ter a oportunidade de examinar proximamente aqui no Senado.

O SR. BERNARDO CABRAL - Eminente Senador Waldeck Ornelas, V. Exª não se encontrava presente quando fiz menção de que a idéia do seu projeto é estabelecer que o gestor do salário-educação deverá destinar 90% da sua arrecadação aos municípios e os 10% restantes à União.

Por que V. Exª pensa assim? Porque V. Exª entende que esse é o caminho para o desenvolvimento dos programas relacionados ao ensino fundamental. Fiz questão de destacar que, dessa primeira parcela, dos 70%, os recursos seriam automaticamente enviados, na proporção da população entre 7 e 14 anos, para cada município. Essa é a nossa grande luta. E o valor restante, esse, sim, seria aplicado segundo critérios de eficiência estabelecidos periodicamente.

Ao mesmo tempo, fiz uma observação quanto ao projeto de lei do Senador Joel de Hollanda, pelo qual S. Exª divide o montante dos recursos do salário-educação em partes iguais entre os municípios e os estados. E fiz questão de dizer que o Senador Iris Rezende havia apresentado um substitutivo no sentido de estabelecer um equilíbrio entre as duas proposições. Fiz esse raciocínio e procurei desencadeá-lo, evidentemente sem o brilho, que me falta, mas com a persistência que vejo em meus nobres pares, a qual devo imitar, para mostrar que há um novo fator que precisa ser considerado na análise de qualquer proposta de mudança do salário-educação: o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério. Esse é o termo. Onde isso está contido? Na Proposta de Emenda à Constituição que tomou o número 233/95, de iniciativa do Senhor Presidente da República, e que se encontra em apreciação na Câmara dos Deputados, como V. Exª, en passant, fez questão de registrar. Qual a sua finalidade? Criar um fundo de apoio ao ensino fundamental no âmbito de cada estado, com recursos estaduais e municipais. Caso o fundo de algum estado não consiga atingir um valor mínimo por aluno, a União se compromete a completá-lo.

Vejam, eminentes Senadores Joel de Hollanda e Waldeck Ornelas, que para isso a União poderá utilizar o recurso salário-educação, além de dotações orçamentárias. Por isso mesmo, acho que essa iniciativa pretende ser a principal ação do atual Governo na área educacional. Não cabe aqui analisar sua adequação e viabilidade, o importante é ressaltar dois aspectos: primeiro, um dos méritos da proposta é estimular a negociação entre os Estados e seus respectivos municípios acerca da divisão de responsabilidade na oferta do ensino fundamental. De outro lado, o Ministério da Educação e do Desporto resistirá mais do que o habitual a qualquer proposta que possa reduzir a cota federal do salário-educação, como reivindicam alguns projetos de lei.

Em verdade, os que estamos interessados em encontrar uma solução para essa questão precisamos trazê-la para a discussão e, ao mesmo tempo, partir para um caminho de melhor ajuste da sua distribuição. Entendo que a contribuição de cada Senador, de cada Parlamentar, a par desse Fundo que se cria, significa dar passos para que talvez - eu uso talvez - seja possível retirar essa forma desonesta que se abate sobre o salário-educação em tantas escolas, o que acaba desvirtuando o fim para o qual foi criado.

Eu sei, Sr. Presidente, que está terminado o meu tempo. Por isso, vou concluir, dizendo que a atenção dos eminentes Senadores que me deram a honra dos apartes contribui cada vez mais para o incentivo e a certeza de que unidos nós podemos chegar a alguma coisa no terreno da educação.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/02/1996 - Página 1338