Discurso no Senado Federal

CRITICAS A UTILIZAÇÃO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO, ATRAVES DA RADIOBRAS, PARA PROMOÇÃO DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, VISANDO A SUA REELEIÇÃO.

Autor
Lauro Campos (PT - Partido dos Trabalhadores/DF)
Nome completo: Lauro Álvares da Silva Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • CRITICAS A UTILIZAÇÃO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO, ATRAVES DA RADIOBRAS, PARA PROMOÇÃO DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, VISANDO A SUA REELEIÇÃO.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DSF de 10/02/1996 - Página 1642
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, EXECUTIVO, CONTRADIÇÃO, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MINISTRO DE ESTADO, ASSUNTO, PARTICIPAÇÃO, AUTORIDADE FEDERAL, CAMPANHA ELEITORAL.
  • INFORMAÇÃO, REPRESENTAÇÃO, ORADOR, TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (TST), DENUNCIA, ATUAÇÃO, MAURILIO FERREIRA LIMA, PRESIDENTE, EMPRESA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO S/A (RADIOBRAS), INCONSTITUCIONALIDADE, UTILIZAÇÃO, RADIO, TELEVISÃO, GOVERNO, BENEFICIO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), ELEIÇÕES, REELEIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

O SR. LAURO CAMPOS (PT-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o comportamento humano é situacional. De modo que, em um período de normalidade, é muito difícil encontrarmos as condições em que as virtudes humanas, as qualidades dos indivíduos, o seu poder de resistência, sua capacidade de discernimento claro, possam ser testadas.

Quando vem a crise - e esta é uma crise política, é uma crise partidária, é uma crise econômica, a mais importante deste século - de perda de legitimidade das instituições e do poder, quando vem a crise do Legislativo, a crise do Executivo, a crise do Judiciário, quando a sociedade se esgarça, da infância à terceira idade, tudo é abandonado. Então, aí podemos, realmente, conhecer os homens.

Tendo perdido a última eleição, Maurílio Ferreira Lima se encontra numa situação de perplexidade e de desespero. Se não fosse isso, como poderia ter ele abandonado as antigas posições democráticas e se perfilhado àquilo que há de mais estarrecedor diante da utilização da mídia, dos meios de comunicação de massa modernos?

Realmente, a proposta socialdemocrata de conduzir o capitalismo para a civilização, para a democracia verdadeira, entrou em crise quando o próprio capitalismo entrou no colapso do desemprego, do desmantelamento dos serviços sociais prestados pelo Estado, da dívida pública e da priorização da especulação bancária. O Estado capitalista ruiu em cima das propostas socialdemocratas assim como os escombros da União Soviética estão soterrando os setores bélicos, espaciais, de telecomunicações norte-americanos.

A economia de mercado nega a socialdemocracia. No momento em que a socialdemocracia européia entrava em colapso, intelectuais brasileiros desrealizados batizavam seu próprio partido com o nome da finada socialdemocracia. Isso foi comunicado a FHC em Portugal, por um mestre português que participava da cerimônia que concedia o honoris causa ao sorridente Presidente do Brasil. A partir daí, Sua Excelência declarou que era neo-socialista. Tudo resolvido, o neo-socialista vai em frente.

Tudo que FHC declara do "espaço etéreo onde subiu, se memória desta se consente" é imediatamente desdito por seu Sancho Pança terrestre, o Ministro Serjão, que parece ter nomeado FHC seu Ministro da Aeronáutica. FHC declarou que seus Ministros não usariam a máquina do Estado nas próximas eleições. Serjão deu-lhe uma bruta ..., confirmando a presença de todos nos palanques eleitorais. Se no jogo-do-bicho vale o escrito, no jogo político da finada socialdemocracia, parece que vale o Serjão.

Assim como a socialdemocracia transformou-se em socialfascismo na Alemanha e em outros países da Europa, de acordo com Nicos Poulantzas, Maurílio Ferreira Lima, sem trocar de tênis, tira a máscara democrática que usava nos anos da ditadura. Troca os jegues, os palanques nordestinos, as peixeiras e os jagunços eleitorais pela modernidade. A velha guerrilha do jaguncismo transforma-se na moderna e globalizante guerrilha rádio-televisiva, a serviço da vitória do "neo-coroner" FHC. "Minha missão na Radiobrás é essencialmente política. O projeto simbolizado pelo Presidente vai mudar o Brasil. Por isto, entrei na guerrilha da informação", brada o neo-socialdemocrata, de peixeira na mão. (Entrevista a IstoÉ, de 31 de janeiro de 1995, pp 5 e seguintes.) "Chamei alguns funcionários da empresa e disse que deveriam trabalhar abertamente o nome do Presidente nos programas. Quem está pensando em ser candidato a sucessor do Presidente será candidato contra ele", descobre o neo-socialdemocrata, confundindo disputa eleitoral com batalha campal cangaceira. E continua a filosofar, soprando a boca do bacamarte: "Quem está pensando em ser candidato a sucessor do Presidente Fernando Henrique Cardoso tem que topar esta parada; se não topar, que saia da raia, porque o candidato à Presidência da República, em 1998, é Fernando Henrique Cardoso". E apelando, talvez, para o sarcasmo: "Eu sei que ele é homem muito sério...", isto é, "não concorrerá em pé de igualdade com vagabundo nenhum"; faltou explicitar.

O que se deduz das declarações do ex-democrata nordestino é que a Radiobrás tem três tarefas fundamentais: reeleger FHC; eleger Ferreira Lima e salvar o PSDB. "Se porventura este projeto vier a fracassar, o PSDB nunca mais se aprumará. Havendo êxito, o PSDB terá que rebolar para tirar vantagens desse sucesso. O PSDB está umbilicalmente ligado ao projeto em curso, nacionalmente", conclui o novo Goebels da socialdemocracia brasileira. Assim, o futurólogo reconhece que mesmo que o real venha a dar certo, "havendo possibilidade de êxito, o PSDB terá que rebolar"...Rebola a Radiobrás, rebola o Serjão, rebola o Maurílio, rebolamos os brasileiros. Os brasileiros residentes aqui e mais de 1,5 milhão que residem no exterior. Para esses, Maurilião prometeu fazer um programa semelhante ao dos caminhoneiros - pg. 7: "Eles precisam estar vinculados ao País, pois pretendem voltar um dia. Todos têm direito à cidadania", principalmente os que escutarem a Radiobrás e votarem em FHC e no PSDB. Para esses, Maurilião pretende "oferecer uma aposentadoria", talvez como forma de estimular a emigração. O gênio da Radiobrás sugeriu ao Presidente um programa para os caminhoneiros, semelhante ao de Sula Miranda. "Por isto sugeri, e o Presidente recebeu no Palácio do Planalto a cantora Sula Miranda, a rainha dos caminhoneiros.(IstoÉ p.7.) "Democracia é isto", descobre o político neo-socialista. "Estamos ganhando corações e mentes". Ele que parecia ganhar eleições e dementes.

Pergunta o jornalista: "Mas adianta o rádio elogiar o Presidente se as estradas estão cheias de buracos?" Resposta do surrealista das comunicações eleitorais: "Só falta consertar os buracos das estradas e dar segurança em trechos nos quais os assaltos estão se generalizando. Os caminhoneiros são a categoria na qual nosso discurso entra no seu cotidiano" E arremata o erudito telecomunicador: "Quando a CIA quis criar condições psicossociais para derrubar Allende, mobilizou os caminhoneiros". Ao invés de aprender com Allende, o psicossocial democrata aprendeu com a CIA, com quem tem óbvias afinidades, como derrubar Allende ou como ganhar "ciamente" uma eleição no Brasil.

Em relação à reeleição de FHC, assim se expressa o vernacular Presidente da Radiobrás: "me sinto profundamente sacaneado". Peço desculpas ao Plenário, mas estou lendo as palavras, ipsis litteris, do ilustre Presidente da Radiobrás, Maurílio Ferreira Lima, que pretende divulgar a cultura brasileira. Continuando: "Eu e muitos outros fomos ... Os tucanos devem pegar esta bandeira" - da reeleição de FHC. (IstoÉ, p.7.) Resposta de Maurílio Ferreira Lima à revista IstoÉ: "É lógico que divulga a figura do Presidente. Este Governo funciona em torno da luz que emana de sua liderança", a mesma luz que iluminava Luís XIV, Meiji (o Iluminado) e outros déspotas narcisistas. "Montado num palanque eleitoral que se estende a 495 emissoras e que, por sua Agência Brasil, municia com materiais 69 jornais, o nosso parque radiofônico está classificado entre os cinco maiores do mundo."

Tudo isso colocado da forma mais despudorada e inconstitucional, a serviço da reeleição de FHC, no maior palanque eleitoral oficial montado neste País. Dispõe a Constituição Federal, em seu art. 37, § 1º:

      "A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos."

Por seu turno, o art. 237, caput, do Código Eleitoral, estatui:

      "A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade em desfavor da liberdade do voto serão coibidos e punidos."

O Ministro Sérgio Motta, a quem o Dr. Maurílio se refere como "um trator" (pág. 6), desmentiu o Presidente FHC, que ordenava o não-comparecimento de Ministros em palanques eleitorais. Na era da modernidade, da globalização e do encantamento tecnológico, o controle das ondas hertzianas da mídia eletrônica potencializa os palanques eleitorais e permite que a aliciação eleitoral se faça 24 horas por dia.

A Folha de S. Paulo de hoje, 9 de fevereiro, mostra o fôlego que tem o Presidente da Radiobrás em dar continuidade àquilo que chama de "guerrilha propagandística". Ele propõe "uma campanha popular a ser lançada na próxima semana com a sigla MPFHC." Diz o dirigente máximo das pulsões louvaminheiras e do servilismo palaciano: "Vão pensar que MP é Medida Provisória, mas é movimento popular. A idéia é colocar a reeleição nas ruas e na boca do povo."

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é, realmente, contristador para nós, que lutamos para criar um clima em que a inteligência humana pudesse circular, em que as idéias pudessem ser debatidas, em que o trabalho nacional pudesse ser respeitado, em que a dignidade humana pudesse andar nas ruas, em que as mentiras e as distorções deixassem de ser o resultado do linguajar oficial, verificarmos que isto ocorre no Brasil e que se entregam os meios de comunicação a uma pessoa que declaradamente assume, ofendendo as leis e a Constituição.

E é por isso, também, que a Voz do Brasil, que não tem os condicionamentos goebelianos do Sr. Maurílio Ferreira Lima, que não está 100% comprometida com aquilo que existe de principal, a eleição do iluminado Fernando Henrique Cardoso...

O Sr. Casildo Maldaner - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LAURO CAMPOS - Pois não.

O Sr. Casildo Maldaner - Farei um comentário ao seu discurso, sem adentrar talvez na forma como se tem colocado, que não condiz com este Plenário, com a ética brasileira, mas ficando mais no conteúdo daquilo que V. Exª tenta expor a nós todos, ou seja, a análise da questão envolvendo a presença ou não dos Ministros nos palanques. Na minha opinião pessoal, até diria que os Ministros podem ir ao palanque defender os candidatos de seu partido; não tenho nada contra isso. O que não poderia ir ao palanque seria a máquina administrativa, o Diário Oficial. E o Presidente da República teria que ficar como magistrado, fora disso. E diria mais, que não sei se este é o momento mais indicado para se discutir o tema reeleição, enquanto estamos aqui a comungar com as reformas de que o Brasil precisa e está a aguardar. Pensarmos em 1998 agora parece-me que não é o momento. No momento o País quer coisas mais práticas, o Brasil espera uma política de resultados, com o Governo dizendo para que veio e colocando em prática ações que tentem minimizar os problemas. Penso que isso é o fundamental. Não sou contra a tese da reeleição. Até o meu partido em Santa Catarina decidiu por reeleições já, para prefeitos, governadores e Presidente. Mas não só para 1998. O que está hoje colocado em primeira mão é a própria estabilização do Plano. Eu até diria, Senador Lauro Campos, que o que temos que cuidar hoje não é da reeleição ou de uma medida popular pregando a reeleição em 1998. Entendo que o assunto em pauta deve ser a estabilização, as garantias e uma política de resultados. Hoje o marketing do Plano Real é o frango, representando a comida popular; o frango virou um símbolo. Então temos que usar isso para que se mantenha o plano, porque, daqui a pouco, Senador Lauro Campos, se o frango começar a cacarejar, o Plano vai atucanar, ou melhor, poderá atucanar. Digo isso com muita sinceridade. Todos nós temos que cuidar para que haja essas garantias e essas reformas, isso é o mais essencial para o País hoje. Por isso, neste particular, gostaria de me congratular e avalizar o pronunciamento de V. Exª.

O SR. LAURO CAMPOS - Muito agradecido, Senador Casildo Maldaner, tenho certeza absoluta de que V. Exª concorda comigo e que esse assunto é importantíssimo em qualquer momento da vida nacional, estejam as eleições afastadas ou mais próximas.

A Voz do Brasil, que é a nossa modesta hora da verdade, está sendo ameaçada por essa mentalidade que pretende criar o monopólio da verdade, o monopólio das telecomunicações postas, como declarou reiteradas vezes o Sr. Maurílio Ferreira Lima, a serviço do candidato de um determinado partido já predeterminado.

Criam-se "verdades virtuais", que são as mentiras repetidas pela mídia. Goebels será confirmado se o processo espúrio de utilização dos meios de comunicação oficiais não for detido dentro dos limites legais. É preciso que a Justiça mostre ao Dr. Maurílio Ferreira Lima que democracia não é isso que mentes transtornadas pelo poder político pensam que seja.

Estou encaminhando, nesse sentido, uma representação ao Ministro Corregedor-Geral do Tribunal Superior Eleitoral, a fim de que sejam tomadas as medidas cabíveis, diante das manifestações descabidas do Presidente da Radiobrás, ex-deputado Maurílio Ferreira Lima.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/02/1996 - Página 1642