Discurso no Senado Federal

CRITICAS A IMPORTAÇÃO SUBSIDIADA DE ALGODÃO DOS ESTADOS UNIDOS. EMENDA DE S.EXA AO PROJETO SIVAM.

Autor
Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).:
  • CRITICAS A IMPORTAÇÃO SUBSIDIADA DE ALGODÃO DOS ESTADOS UNIDOS. EMENDA DE S.EXA AO PROJETO SIVAM.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Casildo Maldaner, Eduardo Suplicy, Jefferson Peres, Josaphat Marinho, Mauro Miranda, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 31/01/1996 - Página 1062
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).
Indexação
  • CRITICA, SUBSIDIOS, IMPORTAÇÃO, ALGODÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), LOBBY, INDUSTRIA TEXTIL, OMISSÃO, GOVERNO, REDUÇÃO, AREA, CULTIVO, EVASÃO DE DIVISAS, DESEMPREGO, PREVISÃO, CURTO PRAZO, PROBLEMA, MERCADO INTERNACIONAL.
  • CRITICA, POLITICA AGRICOLA, GOVERNO, INCENTIVO, IMPORTAÇÃO.
  • SOLICITAÇÃO, SENADO, DEFESA, CULTIVO, ALGODÃO, ATENÇÃO, CRIAÇÃO, EMPREGO, EMPRESA DE FIAÇÃO.
  • JUSTIFICAÇÃO, APRESENTAÇÃO, EMENDA, OBRIGATORIEDADE, LICITAÇÃO, PROJETO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM), ESCLARECIMENTOS, DENUNCIA, SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIENCIA (SBPC), EXCESSO, FATURAMENTO, POSSIBILIDADE, PARTICIPAÇÃO, EMPRESA NACIONAL, DUVIDA, PRESERVAÇÃO, SOBERANIA NACIONAL.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, quero aproveitar a tarde de hoje para falar sobre um assunto de extrema gravidade, a exemplo de outros sobre os quais esta Casa tem discutido com bastante intensidade.

Participei, hoje, com a Ministra Dorothéa Werneck, no Ministério da Indústria e Comércio, de uma audiência a respeito da importação subsidiada de algodão, em especial dos Estados Unidos, que, a partir de 1992, principalmente, derrubou os preços do algodão e, em conseqüência, a área plantada, a renda do produtor e o emprego no meio rural e nos centros urbanos.

Os dados são alarmantes. O Brasil, que, na safra de 1991/92, plantou e colheu mais de 900 mil toneladas de algodão em fibra para um consumo de oitocentas mil toneladas, colheu em 1992/1993 a colher a metade disso, em função da importação, no início de 1992, quando se comercializava a safra de 1991/1992, da metade do consumo interno. Grande parte desse total foi importado por apenas uma empresa, uma grande empresa nacional do setor têxtil.

Há, por parte das indústrias têxteis do País, um imediatismo criminoso contra elas próprias. Essas indústrias, que estão ganhando agora com o crédito privilegiado da importação, com o prazo de seis meses e com a alíquota de 2% que o Governo teimosamente mantém baixa para que o algodão importado entre e acabe com a lavoura nacional, encontrarão, em prazo muito curto, o mesmo problema dos moinhos de trigo, que neste ano pagaram US$300,00 a tonelada de trigo, sendo que se haviam negado a pagar US$150,00 para os produtores nacionais.

A prova de que as importações foram a causa principal da queda diária de produção e, portanto, de emprego e de renda para o setor é que, no ano de 1992/1993, tivemos queda de 50% da área a ser plantada. Essa queda continuou, e hoje o Brasil vai destinar ao plantio área menor do que a destinada pela Argentina, que tradicionalmente não é produtora de algodão.

Os Estados Unidos, maior produtor mundial, está feliz com a atitude do nosso Governo, que tem em mãos, desde 1993, pedido de investigação de subsídio na origem, e não o faz. Não o faz porque não interessa às indústrias, que pressionam o Governo nesse sentido. Alertamos a Ministra Dorothéa Werneck e aproveitamos a oportunidade para alertar os Senadores para o fato de que devem defender essa cultura, maior empregadora de mão-de-obra nos nossos campos.

Perde-se uma oportunidade no instante em que o Brasil apresenta as maiores vantagens comparativas no setor primário - maiores ainda do que aquelas dos tempos de inflação devastadora. Essas vantagens estão sendo eliminadas pela abertura inconseqüente, pois, enquanto a indústria tem taxação de 70% para os produtos industrializados, tem o privilégio de importar algodão a 2%.

Esse absurdo vai matar o cotonicultor, a cultura de algodão, e vai impedir 260 mil trabalhadores de trabalharem nas regiões produtoras. Muito mais! Porque, se o Governo fala em assentar 200 mil famílias, está desassentando 260 mil trabalhadores apenas com a cultura do algodão. Os apelos dos produtores e das entidades que os representam são dramáticos.

Renovo o apelo aos Senadores que em seus Estados têm na cultura do algodão uma atividade econômica importante, como, por exemplo, o Estado de Goiás, do Senador Mauro Miranda; renovo o apelo ao Governo para que não vá na conversa mole dos técnicos que fizeram um estudo - não o querem mostrar ao setor produtivo, porque não têm o que mostrar - segundo o qual as importações não foram a causa da redução da área. O Governo deve ouvir as pessoas que entendem do assunto. Esse tema já me valeu problemas pessoais: quando fui Secretário da Agricultura do Paraná, já lutava para que colocassem salvaguardas na importação de algodão. À época era Ministro da Indústria e Comércio o atual Ministro da Agricultura, que me processou, levando-me à Polícia Federal. O processo foi arquivado somente porque ganhei o mandato de Senador e com ele a imunidade parlamentar. Caso contrário, seria necessário - compareci dois anos seguidos à Polícia Federal - que eu me defendesse de um apelo que fazia em nome de mais de 400 mil plantadores de algodão do País. É um absurdo: enquanto se defende, Senador Mauro Miranda, os produtores de algodão, o Ministro, que tinha obrigação de taxar o algodão e impedir a entrada do produto subsidiado, leva à Polícia Federal quem defende o setor como se fosse um criminoso.

Agora é diferente. Quem deve pedir a investigação é a Ministra Dorothéa Werneck, que prometeu mais uma vez estudar o assunto, o que vem sendo feito desde 1992. Queremos é que o Governo diga sim ou não; que pare de empurrar com a barriga. Porque, enquanto empurra com a barriga, o setor está sendo desestruturado, as indústrias de fiação estão sendo fechadas.

Para que vejam a gravidade da situação, o algodão nacional, que caiu pela metade, está estocado. As indústrias não querem o algodão, mas querem o crédito subsidiado, privilegiado, dos organismos internacionais, que, acertados com os seus respectivos governos, financiam a exportação do algodão para o nosso País. Somente nos Estados Unidos, o subsídio é de cinco bilhões e meio ao ano para a cultura do algodão. Por essa razão, preferem o algodão nacional, que fica estocado, sem mercado, e os produtores têm que pedir pelo amor de Deus que as indústrias comprem o seu produto.

O Sr. Mauro Miranda - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Concedo, com satisfação, o aparte ao Senador Mauro Miranda.

O Sr. Mauro Miranda - Senador Osmar Dias, fico muito feliz com a sua defesa de tese à agricultura. Sempre se pode ouvir sua palavra em prol desse setor, sobretudo no que se refere ao algodão. V. Exª está falando pelo meu Estado também, e com mais propriedade. Não sou propriamente da área rural, mas vejo o sofrimento dos produtoras de algodão, especialmente os do Sudoeste do nosso Estado, onde é grande a produção do produto. Vejo a luta de V. Exª e digo que pode contar comigo e com todos os Senadores do Centro-Oeste. Falo em nome de Iris Rezende e de Onofre Quinan. Trata-se de uma luta que interessa a todos nós. Existe um conflito muito grande: de um lado, o Governo está querendo fazer reforma agrária, querendo estimular as repartições de terra; do outro, desestimula a permanência do cidadão na área produtiva de algodão. Associo-me a V. Exª, quando combate as invasões de terra e defende os produtores, especialmente os de algodão. Trata-se da cultura que mais absorve mão-de-obra, pelo menos no meu Estado. V. Exª tem meu apoio e de todo o Estado de Goiás na sua defesa por essa política do algodão nacional.

O SR. OSMAR DIAS - Muito obrigado, Senador Mauro Miranda. O algodão emprega no seu ciclo produtivo cerca de 40 homens por hectare. É a cultura que mais emprego gera no campo. Quando se reduz a área plantada pela metade, praticamente uma indústria de médio porte se fecha em cada cidade do interior. O Governo luta e precisa lutar mais, porque a política de geração de empregos não tem dado os resultados que todos esperamos. O Governo precisa olhar para a cultura de algodão como uma indústria de empregos que está morrendo em todas as cidades que a têm como uma atividade econômica fundamental.

Para que V. Exªs tenham uma idéia, jogamos para fora do País, com a importação de algodão, R$863 milhões. Esse foi o valor jogado fora pela importação, valor que poderia ter dinamizado a economia interna, gerado empregos. São impostos da ordem de R$135 milhões que os Estados plantadores deixaram de arrecadar. São valores incontestáveis que, somados ao trigo que foi importado, somados ao arroz, que foi importado, somados àquilo que vamos ter que importar este ano pelos equívocos da política de 1995, em especial, somados à omissão do Governo em relação a algumas culturas, vão nos fazer chegar a 11 milhões de toneladas de importação, a um custo de quase R$3 bilhões para os cofres do País, que vão fazer muita falta ao Governo, à balança comercial e também à dinâmica da economia interna.

Não entendo essa política.

Tenho insistido junto aos representantes do Governo e, hoje, recebi apenas a promessa de voltar a estudar o assunto, que já vem sendo estudado de forma cansativa por todos nós desde 1992. Trocam-se os técnicos, que fazem viagem aos Estados Unidos, passeiam, buscam dados, voltam e dizem que não há subsídios. E os próprios representantes americanos colocam na sua prestação de contas U$$5.5 bilhões de subsídio só para a cultura do algodão. É preciso deixar a ingenuidade ou o interesse obscuro de lado e lutar pelos interesses nacionais, tanto na questão do algodão como em outras questões.

Para finalizar, não poderia deixar de colocar aqui assunto que me tem preocupado e até me incomodado nos últimos dias. Fiz, sim, uma emenda ao Projeto Sivam, obrigando o Governo brasileiro a licitar novamente o Projeto - licitar novamente não seria nem o termo, porque ele não foi licitado. Recebi um apelo para que não apresentasse a emenda; recebi pressões. Hoje a protocolei junto à Comissão de Relações Exteriores e junto à Supercomissão do Senado para que o Relator, Senador Ramez Tebet, aprecie a minha emenda e, se julgá-la oportuna, possa inclui-la como redação de Relator; caso contrário, eu a reapresentarei aqui no plenário do Senado para que o conjunto dos Senadores possa julgar essa emenda que esclarece os três principais pontos de dúvidas - dúvidas minhas e também de outros Senadores com quem tenho conversado.

Primeiro, o Relatório da SBPC traz números que também são incontestáveis. Tenho em mãos estudo da SBPC que conclui que o Projeto, que custa R$1,435 bilhão ao Brasil, poderia ser realizado com R$934 milhões - portanto, R$501 milhões de economia -, caso fosse feita nova licitação. Só esse dado já justificaria a emenda que apresentei. Não fosse esse dado, temos outro: dos R$ 934 milhões, a parte nacional - ou seja, aquela que as empresas nacionais estão capacitadas a realizar - chega a R$507 milhões; portanto, mais de 50% poderia ser executado por empresas nacionais e apenas R$427 milhões por empresas estrangeiras. Poderia ser até a Raytheon, mas não a Raytheon em exclusividade, porque esses dados da SBPC não podem ser contestados já que ela é uma entidade respeitada.

Também o valor, a participação nacional e a soberania nacional estariam explicados e as dúvidas que hoje cercam os Senadores poderiam ser também dissipadas para que pudéssemos votar esse projeto com a consciência tranqüila de que estaremos votando algo bom para a Amazônia, bom para o Brasil e bom para a sociedade brasileira também, porque seu custo seria pagável por essa sociedade.

O Sr. Jefferson Péres - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Concedo, com satisfação, um aparte ao nobre Senador Jefferson Péres.

O Sr. Jefferson Péres - Senador Osmar Dias, subscrevi, com muita satisfação, a emenda de V. Exª, oportuna e necessária. Somos ambos Senadores do PSDB. Entendo que estamos servindo muito mais ao Governo do que aos que por acaso se oponham à sua emenda. A essa altura, Senador Osmar Dias, por tudo o que já estudei a respeito do Sivam, estou convencido de que há necessidade de uma revisão desse projeto. A opinião pública, por outro lado, não aceitaria, de maneira alguma - ou aceitaria, mas fundamente indignada - a manutenção do contrato com a Raytheon. Portanto, creio que a licitação, a esta altura, é indispensável simplesmente. Se o Senado não fizer isso, o prestígio desta Instituição junto ao povo brasileiro sofrerá um grave abalo. Meus parabéns pela sua emenda, Senador Osmar Dias!

O SR. OSMAR DIAS - Agradeço a V. Exª, Senador Jefferson Péres, não apenas pelo aparte, mas por ter sido V. Exª um dos primeiros a subscrever minha emenda, a exemplo do Senador Bernardo Cabral, o que me dá segurança, porque um dos argumentos é que um processo de licitação retardaria demais o Projeto Sivam. Ora, a Amazônia tem bem mais idade do que o próprio Brasil. O País tem quase 500 anos e conseguiu sobreviver sem o Projeto Sivam durante todos esses anos, e não seriam seis ou doze meses de atraso que levariam o País a sofrer qualquer prejuízo em função da exigência de um processo de licitação. Pelo contrário, o Brasil ganharia cerca de R$500 milhões.

Li uma entrevista do Presidente da República, Senador Jefferson Péres - se não me engano na revista Veja -, onde Sua Excelência dizia ser um Presidente que administra um Orçamento de R$400 milhões para fazer todas as obras do Governo, nas áreas de saúde, educação, agricultura. Ora, se o Presidente reclama que administra um orçamento de apenas R$400 milhões, por que haveria, este mesmo Presidente, de concordar em jogar fora - porque aí seria jogar fora - R$500 milhões num projeto que, ao invés de ser construído por R$1,435 bilhão poderia ser construído por R$934 milhões, segundo um organismo respeitado como a SBPC?.

Não entendo os argumentos daqueles que também dizem que estou provocando um problema de Estado. Estou provocando a solução para um problema de Estado que vai ocorrer caso o Senado aprove o Sivam como ele está, sem licitação! E há outros que dizem que a minha emenda é inócua, que ela não terá valor algum, porque o Legislativo não pode exigir ou não pode colocar regras para o Executivo, já que existe uma lei de licitação que fiscaliza e orienta os atos do Executivo. Mas, basta ler o art. 49 da Constituição, do nosso Relator Senador Bernardo Cabral, que vamos entender que é nossa obrigação, sim, fiscalizar os atos do Executivo. E não apenas fiscalizá-los, mas, se entendemos que esses atos estão incorretos, corrigi-los mediante emendas, projetos de resolução, enfim, de algum dispositivo legal que esteja ao nosso alcance para que possamos regularizar a situação.

O que estou procurando é cumprir com as minhas obrigações tendo em vista o mandato que me delegaram. Não vou trair a minha consciência nem aqueles que em mim confiaram. Vou apenas submeter a minha emenda à apreciação dos Srs. Senadores para que as consciências de S. Exªs possam recomendar seu voto numa emenda que restabelece a regularidade do processo, permitindo inclusive que se prove se é possível fazer o Projeto Sivam mais barato ou não. Esse é o comentário presente em todas as situações. Por exemplo, quando tomamos um táxi, quando conversamos nas ruas, as pessoas falam que não é possível que um projeto de R$1,4 bilhão possa ser construído sem licitação! Ora, qualquer cidadão brasileiro gostaria de ver esse projeto sendo licitado. Não entendo por que tanta pressa, tanta precipitação. Aliás, já foi problema para este Senado apreciar essa matéria às vésperas do Natal de 1994. Não estava aqui, mas sei que foi por volta do dia 22 de dezembro, e sei que essa precipitação é que ocasionou todo esse alvoroço em relação a esse projeto. Por que que eu não teria o direito, mesmo sendo do PSDB, de apresentar uma emenda para pôr fim às dúvidas que existem nos debates referentes a esse assunto no Senado Federal?

O Sr. Bernardo Cabral - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Com muita satisfação, Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador Osmar Dias, V. Exª não só tem o direito como o dever de fazê-lo. São nos arraiais da própria família que ficam melhores as críticas construtivas. V. Exª, eu diria, honra qualquer partido. Já fomos do mesmo partido - hoje estou sem partido, independente. V. Exª, por um problema regional, foi para o PSDB, Partido do Presidente da República. Mais uma razão para que seja dado a V. Exª o apoio. Observe que, no dia 7 de março de 1995, há quase um ano, o Diário do Congresso Nacional registrava o seguinte:

      "Concedo a palavra ao nobre Senador Bernardo Cabral que, na forma regimental, dispõe de 20 minutos."

E eu começava o meu discurso dizendo:

      "Sr. Presidente e Srs. Senadores, na qualidade de homem da Região Amazônica, quero abordar um assunto que tomou foros internacionais, e que diz respeito ao Sistema de Vigilância da Amazônia, o chamado Sivam.

      Há alguns dias, tomamos conhecimento de uma publicação do New York Times, feita por inconfidências de um agente da CIA, Central Intelligence Agency, na qual declarava que a vitória provável nessa concorrência em favor da firma norte-americana Raytheon se devera ao fato de aquele agente ter denunciado tentativa de suborno de empresas brasileiras, promovida pela concorrente francesa, a Empresa Thomson".

E, no final do discurso, em que pela primeira vez esse assunto foi abordado no Senado, eu pedia que fosse convocado para prestarem esclarecimentos, através de depoimento à Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, o Ministro da Aeronáutica e outro Brigadeiro encarregado. Daí por diante se desencadeou toda essa história, que sabemos como começou mas não temos idéia de como será o seu fim. Interrompi V. Exª não só como signatário da sua emenda - que me parece corretíssima dentro das minhas apoucadas luzes - como para dizer que ela é necessária, porque demonstra a independência e a inteireza de caráter de um parlamentar. Quero associar-me a V. Exª, eminente Senador Osmar Dias.

O SR. OSMAR DIAS - Senador Bernardo Cabral, além de enriquecer o meu pronunciamento, o aparte de V. Exª me conforta pelo respeito e, não apenas pelo respeito, mas pelo carinho que devoto a V. Exª, que tem sido um orientador, pelo menos para mim, nesta Casa, e me orgulho em dizer isso.

Agora, eu teria outras razões fortes para justificar a minha emenda. Mas essas três que citei dispensam todas as outras. Quinhentos milhões pode ser economia. Pode até não ser. Pode ser até que, ao se licitar, chegue-se à conclusão de que o projeto está no custo real. Mas quero ver se isso é verdadeiro, porque há muita gente e muitos organismos afirmando, como a SBPC, que esse projeto pode custar R$500 milhões a menos.

Quanto à questão da soberania, mesmo não podendo concordar, como o fiz na oportunidade em que esteve aqui o Brigadeiro Ivan Frota, com a sua acusação leviana e irresponsável em relação ao Senado, temos que concordar que há uma ameaça, sim, na medida em que estamos colocando nas mãos de uma empresa estrangeira os segredos de um processo, de tecnologia de ponta, sobretudo de uma região que hoje está no foco de todo o mundo: a Região Amazônica, que é o nosso maior patrimônio, sem nenhuma dúvida. Podemos somar todo o patrimônio nacional que temos, o maior - tanto é que todos os países estão de olho nela - é a Região Amazônica. Não podemos agir assim precipitadamente em relação a um assunto tão grave.

O outro ponto que reafirmo é o desejo de que fique claro se há um organismo dizendo e citando quais as empresas e, inclusive, em quais componentes do projeto podem participar empresas nacionais. Será que isso ficará na dúvida de todos nós? Porque, pelo menos na minha cabeça, passa essa dúvida de que essas empresas poderiam estar executando esse projeto, gerando empregos, gerando divisas, gerando renda e desenvolvimento, promovendo o crescimento científico em nosso País. No entanto, vamos dispensar esses três argumentos simplesmente porque veio um pedido para votar favoravelmente.

Eu não faço isso. Sou do PSDB e acho que estou defendendo - como disse o Senador Jefferson Péres - com muito cuidado, com muito rigor, o nome do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que é um Presidente honrado, competente, inteligente, para saber que a minha atitude não é contra o Governo mas muito mais a favor do Governo.

O Sr. Casildo Maldaner - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Casildo Maldaner - Nobre Senador Osmar Dias, até para preservar o Governo e o Presidente é que V. Exª está agindo dessa forma; não é para ser contra, em absoluto. É para que amanhã ou depois possa sair pelas ruas do País, conversar com a sociedade, estar de bem com a sociedade, estar com a consciência tranqüila. É nesse sentido que V. Exª apresentou essa emenda, a qual também tive a honra de subscrever. Parece-me, Senador Osmar Dias, que a preocupação de V. Exª sintetiza uma preocupação de grande parte dos Srs. Senadores. Acima de tudo, sintetiza uma preocupação do País, da Nação, pois a Nação está preocupada com o assunto. Não é só retirar a Esca do problema, como alguns querem afirmar: "retira a Esca e está tudo resolvido". Não, não pára só nisso. A amplitude é maior. É que isso já extravasou a região da Amazônia. Está no País inteiro e nós todos estamos inseridos nesse processo. Sou do Sul do Brasil, o Sul que não está aliado ao rastreamento da Amazônia, e até os céus de lá não estão assim como os céus de brigadeiro. Dizem lá no sul, inclusive, que não se sabe se é possível esse sistema detectar, já que os ares andam poluídos até no Sul. Não há como detectar com esses reatores, com esse sistema da Raytheon, ou coisa que o valha. Na rua, as pessoas - como V. Exª diz -, o taxista, qualquer um comenta: "Maldaner, o que está acontecendo? O que está havendo? Aqui estamos detectando também". Então, parece-me que essa coisa anda obscura. Se aprovarmos aqui, de um certo modo teremos que sempre dar uma explicação à Nação, e isso não fica bem. Quer dizer, queremos dar uma explicação, sim, mas transparente, conversando, dialogando, porque o homem público é uma vitrina permanente e o Senado e o Governo também devem ser isso. Não queria, neste momento, estar no lugar do grande Senador Ramez Tebet, que é o Relator desse processo todo e vai representar o pensamento do Governo, do País e desta Casa, acima de tudo. Sei que isso não é fácil e que S. Exª deve, em conseqüência, estar passando noites sem dormir. Precisamos comungar com o pensamento de V. Exª, para que possamos sair tranqüilamente pelo País e dizer: "Votamos aquilo que entendemos seja o melhor para o País, para a segurança, para a comunidade, enfim, para o conjunto de todos". Em função disso, quero trazer minha solidariedade à preocupação que manifesta na tarde de hoje, no Senado, Senador Osmar Dias.

O SR. OSMAR DIAS - Muito obrigado ao Senador Casildo Maldaner, que foi, realmente, um dos primeiros a subscrever a minha emenda, dando apoio para que possa apresentá-la. Agradeço, também, os vinte e quatro Senadores que a subscreveram e àqueles que gostariam de tê-lo feito mas não o fizeram por não terem sido encontrados, já que, hoje, protocolei a emenda, pois não há exigência regimental do número de assinaturas.

Quero, Senador Casildo Maldaner, dizer que depois que apresentei a emenda eu dormi melhor e entendo que o Senador Ramez Tebet não deve estar dormindo tranqüilamente, porque tem uma responsabilidade enorme nas mãos. Seu julgamento será muito importante para abalizar a decisão e o voto da Comissão e do Plenário.

Quero fazer um apelo ao Senador Ramez Tebet: esta minha emenda pode ser considerada pelo Sr. Relator ou poderá ser por mim apresentada aqui, em plenário, quando S. Exª encaminhar o projeto de resolução para ser votado. Mas não deixarei de fazê-lo, apesar de haver recebido, até de uma forma pouco elegante e educada, a observação de um Senador, que me disse: "Com essa emenda, você vai-se transformar num Senador ridículo, porque ela é inócua".

Ridículo é aquele que troca o voto por favores; esse é ridículo. Talvez esse Senador, que me fez essa ofensa, seja um dos ridículos que costumam trocar voto. Não troco o meu voto, não o vendo, e só voto de acordo com a minha consciência.

O Sr Ramez Tebet - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Com satisfação, Senador.

O Sr. Ramez Tebet - Senador Osmar Dias, V. Exª tem o direito e o dever, como cada um dos demais Senadores e cada homem público deste País, de apresentar suas sugestões, de transformá-las em emendas. Quero, em favor de V. Exª, neste aparte, dizer que ninguém pode considerar ridículo aquele que apresenta uma emenda. Acredito que essa expressão tenha sido forçada. Mas quero aproveitar a oportunidade da afirmativa de V. Exª e do Senador Casildo Maldaner para dizer que, em verdade, às vezes vale a pena passar insone algumas noites, porque temos a grande responsabilidade de ajudar na condução das coisas deste País. Por isso, tenho procedido - e penso que a Casa seja testemunha disso - com uma humildade muito grande. Tenho procurado ser discreto, tenho procurado ouvir todas as partes, tenho lido todos os documentos que me chegam às mãos e tenho meditado sobre eles. Vou analisar tudo que disser respeito a esse projeto, pensando, unicamente, naquilo que tenho afirmado. Estarei tranqüilo na hora em que puder afirmar que dei a minha opinião e apresentei o meu relatório de acordo com aquilo que a minha consciência determinou como sendo o melhor para o País. V. Exª falou em pressão. Eu nunca falei isso. Aproveito para dizer que penso que política é isso aí: quem quer obter as coisas, que peça! V. Exª pede o apoio para a sua emenda; quem acredita no projeto, pede para aprovar o projeto; quem não acredita no projeto, que desenvolva esforços para dizer que o projeto não consulta os interesses do País. Isso é absolutamente normal, não me atemoriza nem me preocupa. Se ontem tomei a cautela de comunicar à Casa - não por meio do microfone - que não entregarei o meu relatório amanhã é justamente porque desejo ser prudente, pois quero estudar o assunto o mais que puder. E não vou mentir a V. Exª, mas não foi uma razão essencial que me fez adiar a sua emenda. Porém, com toda certeza, ela está no rol daqueles documentos que, como Relator, tenho que analisar. Sei que o relatório não impõe nada à Casa, mas é como V. Exª afirmou: a Casa espera a palavra do Relator, porque é aquele que se debruça mais sobre o assunto, que o estuda mais, e que emite o seu parecer, que vai ser aceito ou não pelo Plenário da Casa. Sem entrar no mérito da sua emenda, digo a V. Exª que deve ficar absolutamente tranqüilo, porque apresentou uma sugestão, uma emenda que traduz aquilo que V. Exª pensa ser melhor para o projeto. Portanto, o meu aparte tem a finalidade de dizer que me solidarizo com V. Exª contra aqueles que tentaram ridicularizá-lo, se isso ocorreu - e V. Exª está afirmando que sim. Agradeço a V. Exª.

O SR. OSMAR DIAS - Senador Ramez Tebet, também não me importo com as pressões, mesmo porque elas me divertem e me estimulam. As pressões até fazem parte, efetivamente, do jogo democrático. Apenas não posso aceitar a ofensa. Não me sinto ridículo por ter apresentado a emenda; sinto-me com a consciência tranqüila e com o apoio de muitos Senadores, que, evidentemente, tendo assinado a emenda, poderão votar a favor ou contra a mesma. Mas, pelo menos, cumpri o meu dever e o dever com a minha consciência. Aqueles que dizem que a emenda é inócua poderiam ficar tranqüilos. E para que tanto alvoroço, se a emenda não tem valor, se é ridícula? Não há necessidade de alvoroço, fiquem tranqüilos. O Relator é o Senador Ramez Tebet, que saberá, com a sua inteligência, julgar a emenda que apresentei. E fiz isso em nome de muitos Senadores com quem conversei antes de apresentá-la.

Até aproveito a oportunidade para agradecer ao Senador Eduardo Suplicy, que me ajudou a elaborar a emenda, inclusive com o apoio da sua assessoria. Portanto, gostaria de agradecer a S. Exª, pois estamos cumprindo com o nosso dever.

O Sr. Josaphat Marinho - Permite-me V. Exª um aparte?

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PRESIDENTE (Teotonio Vilela Filho) - Senador Osmar Dias, V. Exª já ultrapassou em 10 minutos o tempo, e peço que conclua o seu pronunciamento.

O SR. OSMAR DIAS - Sr. Presidente, pela primeira vez, cometi essa indisciplina. Se V. Exª me permite, vou concluir com os apartes, primeiro, do Senador Josaphat Marinho e, em seguida, do Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Josaphat Marinho - Nobre Senador Osmar Dias, não tive oportunidade de assinar sua emenda, nem vou entrar no mérito dela, neste instante. Quero apenas louvar sua posição defendendo-a no plenário. Todas as vezes em que um Senador apresenta uma sugestão séria ela merece respeito, ainda que provoque divergências. O lamentável é que o Congresso não o faça sempre; e, porque não defende sempre suas prerrogativas, está numa situação muito baixa na opinião, segundo as pesquisas. É preciso que o Congresso se defenda mais e melhor, para que seja mais respeitada a sua posição.

O SR. OSMAR DIAS - Obrigado, Senador Josaphat Marinho. Com certeza, é um importante depoimento. E sinto alegria em ter ouvido que V. Exª também assinaria a minha emenda.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS - Concedo o aparte ao Senador Eduardo Suplicy, para depois encerrar, Sr. Presidente.

O Sr. Eduardo Suplicy - Senador Osmar Dias, primeiro, gostaria de reiterar a importância da iniciativa de V. Exª, que acredito esteja apontando um caminho, que é o de bom-senso para o Governo, que está alcançando tamanho respaldo entre os Senadores. Gostaria de transmitir que diversos Senadores do PT que ainda não haviam assinado a emenda manifestaram-se favoráveis a fazê-lo, inclusive o Senador José Eduardo Dutra, que hoje se encontra acamado, em virtude de uma gripe. S. Exª fez questão de solicitar que a proposição seja levada até a sua casa, porque também quer apor a sua assinatura. Considero o assunto da maior relevância. Está-se pedindo ao Presidente Fernando Henrique Cardoso para que exponha, publicamente, o seu ponto de vista. O Presidente Fernando Henrique Cardoso deve levar em conta que não será fácil explicar por que a Raytheon não precisa, necessariamente, passar por um novo processo de licitação pública. No último domingo, no jornal O Estado de S. Paulo, o Sr. Guido Rezende de Sousa expressou que considerava perfeitamente normal que pudesse a Esca estar remunerando as pessoas de confiança do Ministério da Aeronáutica que fizeram a escolha, primeiro, da Esca e, depois, da Raytheon. Ora, isso é o mesmo que estar dizendo que é perfeitamente normal não se cumprir a lei, não se cumprir aquilo que o Tribunal de Contas da União apontou como uma afronta aos princípios de transparência, de isonomia e de igualdade de direitos perante todas as empresas. Seria como se as pessoas estivessem dizendo, no Banco Central, que é normal o fato de o Banco Econômico ter emprestado recursos às próprias empresas associadas. Embora estivesse afrontando a lei, alguns acham normal isso.

O Sr. Ângelo Calmon de Sá pode achar normal. Não se pode achar normal o procedimento de escolha da Esca e da Raytheon. Normal será, sim, a licitação pública e sem nenhum tipo de discriminação. Aí, sim, a Raytheon e todas as demais empresas poderão competir. Gostaria de ressaltar que, diante do estudo da SBPC que recomenda que haja licitação pública, a iniciativa de V. Exª conta com o respaldo crescente, tanto no Senado Federal quanto na opinião pública brasileira.

O SR. OSMAR DIAS - Obrigado, Senador Eduardo Suplicy.

Vou encerrar, Sr. Presidente, apenas agradecendo a tolerância do tempo e dizendo que tenho quinhentos milhões de razões reais para apresentar essa emenda. Ela não é ridícula. Ridículo é pagar mais quando se pode pagar menos. Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/01/1996 - Página 1062