Discurso no Senado Federal

REGISTRANDO A VISITA AO SENADO DO PRESIDENTE DO VIETNÃ E DO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DA AFRICA DO SUL. A PROBLEMATICA DOS CONFLITOS DE TERRA E A NECESSIDADE DA REFORMA AGRARIA NO TERRITORIO NACIONAL.

Autor
Bernardo Cabral (PP - Partido Progressista/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. REFORMA AGRARIA.:
  • REGISTRANDO A VISITA AO SENADO DO PRESIDENTE DO VIETNÃ E DO MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DA AFRICA DO SUL. A PROBLEMATICA DOS CONFLITOS DE TERRA E A NECESSIDADE DA REFORMA AGRARIA NO TERRITORIO NACIONAL.
Aparteantes
Benedita da Silva, Epitácio Cafeteira, Josaphat Marinho, Nabor Júnior, Valmir Campelo.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/1995 - Página 772
Assunto
Outros > SENADO. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • REGISTRO, VISITA OFICIAL, SENADO, ALFRED NZO, MINISTRO, RELAÇÕES INTERNACIONAIS, PAIS ESTRANGEIRO, AFRICA DO SUL, DISCUSSÃO, PROBLEMA, APARTHEID, GUERRA.
  • REGISTRO, VISITA OFICIAL, SENADO, LE DUC ANH, PRESIDENTE, PAIS ESTRANGEIRO, VIETNÃ.
  • ANALISE, PROBLEMA, CONFLITO, TERRAS, BRASIL, DEFESA, NECESSIDADE, RESOLUÇÃO, REFORMA AGRARIA, INJUSTIÇA, SOCIEDADE.

O SR. BERNARDO CABRAL (PP-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje, pela manhã, por volta das 11h, esteve em visita ao Senado Federal o Ministro das Relações Exteriores da África do Sul, Alfred Nzo; depois, ao meio-dia, foi recepcionado pelo Presidente do Senado e do Congresso, Senador José Sarney, o Presidente do Vietnã, Sr. Le Duc Anh.

Ora, Sr. Presidente, por que essas visitas me trazem à tribuna? Apenas para registrá-las? O que desejo trazer à reflexão deste Senado?

Observem que a primeira autoridade vem de um país que, ao longo de tantos anos, sofreu com a chamada perseguição racial, em que a maioria negra ali era uma minoria, tendo o apartheid se transformado numa mancha para o mundo inteiro. Lá estive em outubro de l988, na companhia de dois velhos e sempre queridos amigos, o ex-Deputado Adolfo Oliveira e o ex-Deputado da Bahia, atual suplente do Senador Josaphat Marinho. Fizemos ver ao Ministro da Justiça daquele país que aquilo era terrível, sendo nós de um País que não cultivava a segregação racial - quando muito, o preconceito social, o que víamos a todo instante. Essa foi a primeira visita.

O Ministro das Relações Exteriores nos deu conta, hoje, pela manhã, do que existe em termos de desemprego, de que grande parte da população está partilhando a água com animais. Mas que a vida, a vida pela democracia ali estava transformando aquele espectro anterior em um caminho a ser indicado para o povo sul-africano. Depois, ao meio-dia, o Presidente do Vietnã, herói da guerra do Vietnã, do alto dos seus 75 anos, nos relatava o que foi o sofrimento daquele país na guerra.

Observe, portanto, V. Exª que, de um lado, se trata de um tipo de guerra - a África do Sul; de outro, no Vietnã. E quero chegar à guerra que se trava em nosso País. Até parece, Sr. Presidente, que as pessoas não se dão conta - quando digo as pessoas refiro-me àquelas responsáveis não para tratar de um assunto como esse apenas no tipo "deixa como está, para ver como fica" -, que as pessoas se esquecem desse problema dos sem-terra, que sabemos como começou e não temos idéia de como terminará.

Eu dizia, semana passada, em uma conversa com o jornalista Haroldo Hollanda, que o problema da terra não é um problema para ser tratado de forma policial. E lembrava que talvez a maior polícia e o maior exército do mundo estivessem concentrados no Irã e, no entanto, o Xainxá da Pérsia, do Irã, acabou sendo derrubado por um movimento religioso, cujo líder se encontrava em Paris, na França. Essas coisas começam como se fossem pequenos rios no princípio, que vão recebendo águas emprestadas durante o seu caminho até se transformarem em caudalosos. Há algumas semanas, dizia-se que ora se fazia a ocupação, que ora era a invasão.

Não quero, Sr. Presidente, deter-me no problema da qualificação literária. Quero chegar ao assunto que hoje li, de que o Poder Judiciário começa a ter medo. O Poder Judiciário está acuado frente a um problema que é da mais alta gravidade: de um lado, o respeito ao direito à propriedade; e de outro, dar terras a quem delas precisa. Ora, como é que se pode imaginar que esse é um problema que apenas será resolvido pelo Presidente do INCRA, ou com a boa vontade do Presidente da República, ou com o estímulo dos que invadem as terras, que, produtivas ou improdutivas, pouco ocupam? Como é que podemos imaginar se não houver a partilha da responsabilidade de que aquele grito lá fora vai ecoar aqui?

Temo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quando vejo o nome de um cidadão que até pouco tempo este País desconhecia aparecer no noticiário da imprensa, seja ela escrita ou ligada ao rádio ou televisão, que ou estão a fabricar um herói ou, quem sabe, criar um mártir. E daí, Sr. Presidente, não haverá ninguém neste País que consiga deter a marcha dos acontecimentos que virão.

Ora, o Senado é composto de homens da mais alta categoria. Não tomem a exceção de um nome que usarei como se fosse diminuição aos demais, até ao contrário, apenas para ilustrar o que quero dizer. O Líder do PTB, Senador Valmir Campelo, ao que sei, de uma liderança nessa área, até pelo passado, e o Partido Trabalhista Brasileiro, ainda não li, em nenhum instante, em jornal algum, que S. Exª tenha sido chamado para debater a questão da terra. Mas vejo lá em cima, na fronteira, um Senador altamente inquieto que chega a dar um depoimento de que a invasão no seu Estado começa a dar calafrios, também não vejo seu nome nos jornais convocado para discutir o assunto - e me refiro ao Senador Nabor Júnior. E, se começarmos a pegar exemplo por exemplo, chegaremos a um homem da categoria intelectual do Senador Josaphat Marinho, que poderia dar uma contribuição hoje, que é indispensável, no sentido de encontrarmos um caminho para uma legislação para a reforma agrária. E também S. Exª não é convocado.

Afinal, o que se passa neste País? O que pretendem os responsáveis - todos nós o somos - na condução de uma matéria de tão alta gravidade? Esperar apenas que aconteça, que se transforme em notícia de jornal, quando alguns corpos começarem a rolar, de um lado, pela falta de previdência daqueles que invadem ou que ocupam usando a violência; e, de outro, dos que começam a ter milícias particulares para fazerem a defesa de suas propriedades? O que está faltando para a convocação de homens que têm responsabilidade a dar, contribuição a oferecer e que são absolutamente marginalizados? Será que esse problema da reforma agrária é um problema para ser tratado no campo emotivo ou para empurrarmos com a barriga para sabermos aonde vamos chegar?

A Srª Benedita da Silva - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL  -Concedo o aparte a V. Exª.

A Srª Benedita da Silva - Senador Bernardo Cabral, estou acompanhando o pronunciamento de V. Exª e hoje também tive a satisfação de acompanhar essas duas grandes representações da Comissão de Relações Exteriores. Não vou falar sobre o assunto até porque V. Exª, em síntese, já descreveu a importância dessa visita. Mas, com relação à segunda parte de seu discurso, tenho que me manifestar, porque, quando V. Exª pergunta se estamos querendo criar um herói ou um mártir, temos que chamar para nós essa responsabilidade, para o Congresso Nacional, para esta Casa. V. Exª especialmente, como vice-Presidente da Comissão de Relações Exteriores, poderá promover um grande debate a respeito da reforma agrária. Há essa necessidade, porque, até hoje, esse assunto foi tratado ideologicamente e, por conta, não foi colocado como prioridade, mas é dos que tinham terra e os que não tinham estariam tomando essas terras. Hoje, se temos alguma radicalidade nessa situação é porque não soubemos tratar politicamente o momento dessas explosões. E esse momento, como V. Exª está colocando, também não só me impressiona, como me assusta. Porque se, por um lado, temos os sem-terra, que, politicamente, estão se organizando; temos, por um outro lado, outros que vão defender as suas terras armados - pois assisti pela televisão alguns dizerem que pegariam as suas armas e que tinham os seus grupos para defenderem as suas terras.

Tenho um conceito de terra mais do ponto de vista espiritual, da passagem do ser humano por essa vida e da sua necessidade, porque, conforme diz a Bíblia, "trabalharás com o suor do seu rosto", "trabalharás dia e noite para não ser pesado ao seu irmão" e "a terra lhe dará o fruto necessário para o seu sustento." É muito importante tratarmos essa questão sem esse viés ideológico e com a preocupação que V. Exª destaca. Se tivermos apenas a propaganda de que existe um grupo que quer tomar e um outro que quer impedir, estaremos simplesmente adiando uma convulsão social que vai acontecer em nosso País em razão desta questão. V. Exª aborda, na verdade, um assunto que é de nossa responsabilidade também. Agradeço a V. Exª.

O SR. BERNARDO CABRAL - Eminente Senadora Benedita da Silva, não digo impossível, mas dificilmente alguém me verá ocupar esta tribuna para discutir uma matéria qualquer sobre a qual eu não tenha feito a reflexão da seriedade - isto que V. Exª acabou de captar e definir. O que quero é trazer à nossa reflexão um problema que não pode ser tratado sob o viés ideológico.

Fui orador da minha turma na Faculdade de Direito e há 41 anos, nesse discurso, eu dizia que era um ensejo azado, um momento propício para se discutir a reforma agrária. E lembro-me que usei o termo "somiticaria do latifúndio". Quarenta e um anos decorridos e vejo que se trata dessa matéria sem a responsabilidade que deve existir naquilo que chamo compartilhar.

Quero agradecer a V. Exª a interferência, não só porque foi ao ponto com que me trouxe à tribuna, mas também porque presta a sua contribuição dentro daquilo que nós precisamos observar com responsabilidade.

O Sr. Epitacio Cafeteira - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Concedo o aparte a V. Exª, Líder Epitacio Cafeteira.

O Sr. Epitacio Cafeteira - Nobre Senador Bernardo Cabral, quando aqui chegou a corte de Portugal, quando o Rei tinha o direito de conceder benesses, sesmarias foram distribuídas. A terra, naquela época, era considerada um patrimônio, um bem patrimonial. De lá para cá, não mudou nada, Senador. E na hora em que o Governo fala em reforma e, na reforma administrativa, faz questão de acabar com o direito adquirido do funcionário - funcionário que, às vezes, deixou de ter um emprego melhor, porque preferiu ficar no Governo ganhando menos, mas com estabilidade -, nada isso importa. E o Governo diz que quer reformar. A expressão reforma agrária parece-me muito mais uma obra de ficção. Se não reformarmos a estrutura agrária, se não exigirmos do proprietário da terra que ele dê um uso social à terra, se deixarmos que ele continue a usar sua terra como uma caderneta de poupança, então, não existe reforma agrária. Existe a tentativa de mudança de proprietários da terra, pela desapropriação de uns, pela transferência a outros, mas, no fundo, a essência vai continuar, o grande problema vai continuar. E estamos vendo, nobre Senador Bernardo Cabral, desde a criação do Real, quando conseguimos estancar a inflação, mas sem conseguirmos fazer nada contra o desemprego, que o povo perdeu não só o seu emprego na cidade, mas até a esperança de morar numa cidade. No meio desses sem-terra, há muitos trabalhadores da cidade. Estão lá atrás de um lugar para se defenderem, porque, sem emprego na cidade, é preferível lutar por um pedaço de chão para plantar; pelo menos de fome eles não morreriam, como morrerão na cidade, à míngua de tudo. O Governo não só manteve toda a estrutura agrária no seu conceito jurídico - e V. Exª, que foi o Relator da Constituinte, sabe disso -, como também o Governo, a par disso, não busca quem realmente tem um desejo de mudar, um desejo de aproximar o homem daquele que é o seu meio de sustento. Assim, nobre Senador Bernardo Cabral, quero me congratular com V. Exª e dizer que tive oportunidade de conhecer de perto esses problemas. Tenho uma grande honra de dizer, em alto e bom som, que ninguém morreu na luta por terras no Maranhão enquanto eu era Governador. Não dei guarida a nenhuma reintegração de posse. Na ocasião em que a solução se apresentava nos termos de "ou a Justiça me manda entregar à polícia para expulsar ou, então, vou brigar com a Justiça", aí, o Estado entrava para desapropriar, mas nunca entrou com a polícia. Isso é o que estamos vendo: de um lado, há um grupo desesperado que o Governo não cadastrou. Se se perguntar: quem são os sem-terra, quantos são, onde estão? Ninguém saberá responder. E esse grupo cresce. Este País, que, com muita facilidade, demarca terras indígenas, a mãos cheias - para tribos pequenas muita terra -, nunca pensou no caboclo. E vemos o caboclo morrer como aconteceu na última chacina, lá no Norte, com a maior tranqüilidade. Isso precisa acabar. V. Exª está certo quando diz: Vão criar um líder? Vão! Vão criar um mártir? Vão! É preciso que alguém se antecipe a tudo isso que está acontecendo. Mas não pode ser uma pessoa que entenda que não é distribuindo terras que se faz reforma agrária. Não é com pessoas dessa natureza que vamos fazer uma reforma agrária neste País. Mas reafirmo, Senador Bernardo Cabral, o início tem que ser na Constituição. A reforma tem que passar por transformações no conceito de propriedade e do uso da terra, porque só assim nós poderemos pensar em justiça social no campo. Parabéns a V. Exª, Senador Bernardo Cabral.

O SR. BERNARDO CABRAL - Senador Epitacio Cafeteira, V. Exª fala em sesmarias, a Senadora Benedita da Silva retrocede um pouco mais no tempo e vai ao preceito bíblico, e observe como isso tem uma seqüência: das lições da Bíblia, passando pelas sesmarias, pela vinda de D. João VI e chegando ao momento atual, nós estamos tratando o problema da reforma agrária e acabamos desembocando, sem resolvê-lo, no problema da reforma urbana.

As periferias das grandes cidades estão todas elas, sem exceção, inchadas, porque se trata do problema do campo como se fosse um problema menor. E esse êxodo do interior para a capital começa a fazer com que proliferem essas crianças, meninas e meninos de rua, cujos pais, por não conseguirem emprego, já não podem educá-las; e se transformam, de um lado, os marginais e, de outro, as prostitutas infantis. Quando isso for num crescendo, não se deteve a primeira, que foi a invasão ou ocupação, depois, não se conseguirá pôr um freio na segunda. Observem que as pontes, os viadutos nas grandes capitais são hoje um problema social da maior seriedade. E não adianta se dizer que a violência vem em função da falta de habitação, de escola, de moradia, de alimentação, porque tudo isso tem as suas raízes encrostadas numa profunda injustiça social.

E quis trazer esse assunto à baila, a essa reflexão, a essa discussão, a essa conversa íntima com os companheiros Senadores, para que não se diga amanhã que, por não termos sido convocados, nos omitimos em tratar do assunto com a seriedade que ele reclama e com a probidade que ele merece.

O Sr. Nabor Júnior - Permite V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Nabor Júnior.

O Sr. Nabor Júnior - Senador Bernardo Cabral, o tema que V. Exª está abordando, na tarde de hoje, na tribuna do Senado Federal, é da maior oportunidade e gravidade. Tenho acompanhado, através de noticiário da imprensa, esse movimento dos chamados grupo dos sem-terra, e também que proprietários de terras estão constituindo as suas milícias particulares para defenderem o seu direito de propriedade. Então, estamos marchando para um confronto dos trabalhadores que estão desejosos de conseguir um lote de terra para serem assentados e, ali, produzir o sustento para si e para as suas famílias. No outro lado, os proprietários de terra também querem defender o seu patrimônio, que o adquiriram ou através de compra ao próprio Estado ou através de cessão de direito. Penso que o Governo não está levando na devida conta a gravidade desse problema, e que as medidas deveriam ser preventivas. Não podemos assistir de braços cruzados a repetição daquele episódio de Rondônia e outros havidos no sul do Pará. O Governo, inicialmente, precisa fazer o cadastramento de todos esses trabalhadores chamados sem-terra, para saber, como disse o o Senador Epitacio Cafeteira, quantos são, onde estão localizados, qual a necessidade de glebas para assentar todas essas famílias, e, ao mesmo tempo evitar esses confrontos que podem ocorrer, a qualquer momento, com graves conseqüências para a imagem do País, inclusive no exterior. Quero parabenizar V. Exª pela oportunidade do pronunciamento e me associar às suas preocupações para que as autoridades tomem medidas imediatas, a fim de evitar um conflito de maiores proporções. Muito obrigado.

O SR. BERNARDO CABRAL - Sr. Presidente, vou concluir. Peço permissão a V.Exª, ainda que esteja sendo cansativo aos meus companheiros Senadores, que me permita o privilégio de ter mais dois minutos para concluir.

O SR. PRESIDENTE (Mauro Miranda) - Concedo a V. Exª mais dois minutos.

O SR. BERNARDO CABRAL - Concedido o privilégio, agradeço a V. Exª.

Quero fazer justiça ao eminente Senador Nabor Júnior. Quem primeiro tratou dessa preocupação com os cadastrados dos sem-terra foi o Senador Nabor Júnior, na Comissão de Relações Exteriores, e com a preocupação de que na fronteira do seu Estado S. Exª já não sabia quais eram os brasileiros e quais eram os estrangeiros. E numa sessão secreta que fizemos - e essa não é uma revelação que possa comprometer o lado confidencial - S. Exª exigia isso. De modo que registro essa preocupação do Senador Nabor Júnior e confirmo a preocupação do Senador Epitacio Cafeteira na mesma reunião.

Quero dizer, Sr. Presidente, que hoje todos estamos conscientes de que esse é um problema da maior gravidade. Aqui não cabe aquela filosofia Khayámiana de que "a vida é um bem me deram sem me consultar e que eu restituirei com a mesma indiferença". Penso que tem que ser com muita observação, para que não se transforme - aquilo que eu dizia ao começo dessa despretensiosa fala - um cidadão num líder ou acabe por torná-lo num mártir.

O Sr. Valmir Campelo - Permite V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Tem o aparte V. Exª.

O Sr. Valmir Campelo - Nobre Senador Bernardo Cabral, estava aqui mais uma vez ouvindo o pronunciamento de V. Exª, de muita competência e muita transparência. Hoje, em uma reunião entre lideranças e o porta-voz do Governo, V. Exª manifestou essa preocupação ao porta-voz do Governo na presença dos líderes que dão sustentação política ao Governo nesta Casa, tanto no Senado como na Câmara dos Deputados. V. Exª, mais uma vez, foi brilhante. O Governo, realmente, precisa ouvir V. Exª, um homem experiente, um homem vivido, Presidente da OAB, Secretário de Justiça, Deputado Federal, Senador da República, Relator da Constituinte. V. Exª, hoje, expôs uma preocupação que foi aplaudida por todos nós, Líderes, na reunião de hoje, pela manhã, com o porta-voz do Governo. V. Exª está certo. Não se resolve o problema da reforma agrária não se ligando, por exemplo, órgãos ao próprio Presidente da República; não se resolve através da emoção; resolve-se através da discussão, principalmente com Líderes, com Senadores, com Deputados desta Casa, que conhecem os problemas e que têm condições, realmente, de dar sugestões e opiniões ao próprio Governo. Quero, mais uma vez, parabenizar V. Exª. Sou seu admirador, além de amigo, o que me faz sentir muito feliz. A cada dia que passo nesta Casa, tenho a oportunidade de aprender com V. Exª. Meus parabéns pelo brilhante discurso de V. Exª, mais uma vez, nesta Casa.

O SR. BERNARDO CABRAL - Senador Valmir Campelo, a admiração que V. Exª tem por mim, coloco em dobro aquilo que sinto por V. Exª; isto define tudo.

O Sr. Josaphat Marinho - Permite V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL - Ouço V. Exª.

O Sr. Josaphat Marinho - Eu queria, na linha de seu pronunciamento, ponderar que esse problema da Reforma Agrária ou, em termos mais amplos, da redistribuição da terra não reside essencialmente na mudança de chefes de serviço, nem no pedido de prisão dos chefes dos grupos que estão invadindo terras. A gravidade desse problema está a exigir do Governo, depois da discussão a que acaba de se referir o nobre Senador Valmir Campelo, em traçar um plano o mais amplo possível e realizável, anunciá-lo à Nação, particularmente aos interessados, com a discriminação das áreas, com a fixação dos recursos, enfim, com a enunciação de todos os elementos capazes de gerar confiança e tranqüilidade. As ameaças não resolverão. Precisamos estar muito atentos a uma lição de um grande escritor do nosso tempo, que eu costumo sempre refletir sobre ela e repeti-la: "as formas legais são respeitadas quando os homens sentem que têm em comum os grandes fins da vida. Enquanto não tiver essa sensação, os injustiçados lutarão, se possível, transformarão a luta na resistência, dentro da medida que lhes for possível." Nós outros que detemos uma parcela de poder é que precisamos ter a humildade suficiente para compreender este problema, e não pensar que o Poder, o Estado resolve tudo ditando ordens.

O SR. BERNARDO CABRAL - Sr. Presidente, eminentes Senadores, vou concluir. No campo da oratória, quando o orador começa seu discurso sempre se preocupa com o final; embora o exórdio seja a peça que vai ficar na mente daqueles que o ouvem, verifico que não preciso encerrá-lo: O Senador Josaphat Marinho acaba de completar meu discurso. Se tivesse eu alguma dificuldade em aqui plantar as palavras finais, estaria em terreno fértil. Por isso, Sr. Presidente, ao incorporá-lo ao meu discurso, quero agradecer a V. Exª pela concessão dos minutos a mais e dizer que este é um tema que deve voltar a ser debatido.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/1995 - Página 772