Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE INSTRUMENTOS QUE PERMITAM MAIOR EFICIENCIA DO EXECUTIVO, SEM COMPROMETER A COMPETENCIA DO CONGRESSO NACIONAL, COMO OCORRE ATUALMENTE COM A ADOÇÃO DE MEDIDAS PROVISORIAS.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MEDIDA PROVISORIA (MPV).:
  • NECESSIDADE DE INSTRUMENTOS QUE PERMITAM MAIOR EFICIENCIA DO EXECUTIVO, SEM COMPROMETER A COMPETENCIA DO CONGRESSO NACIONAL, COMO OCORRE ATUALMENTE COM A ADOÇÃO DE MEDIDAS PROVISORIAS.
Aparteantes
Epitácio Cafeteira, José Eduardo Dutra, Nabor Júnior, Ney Suassuna, Roberto Freire.
Publicação
Publicação no DSF de 21/06/1996 - Página 10465
Assunto
Outros > MEDIDA PROVISORIA (MPV).
Indexação
  • EXPECTATIVA, SOLUÇÃO, RELACIONAMENTO, LEGISLATIVO, EXECUTIVO, REFERENCIA, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ESPECIFICAÇÃO, ABRANGENCIA, REEDIÇÃO, ANALISE, CONGRESSO NACIONAL.
  • DESCRIÇÃO, TRATAMENTO, ASSUNTO, PAIS ESTRANGEIRO, BELGICA.
  • CRITICA, VOTAÇÃO, SESSÃO CONJUNTA, DEFESA, ORGANIZAÇÃO, LEGISLATIVO, FORMA, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, creio que os últimos fatos registrados aqui no Senado e a troca de impressões com o Poder Executivo, com o Presidente da República e com os seus ministros, nos animam a acreditar que, depois de um longo debate, que, praticamente se instalou quando teve início a atual Legislatura, poderemos chegar a alguma forma aceitável em relação à edição de medidas provisórias.

Nós, desejosos de encontrar uma solução justa, democrática, que preserve a competência dos Poderes e que, ao mesmo tempo, não prive o Poder Executivo de um instrumento eficiente para que possa o Estado moderno bem se desincumbir de suas atribuições, estamos convencidos de que é preciso encontrar uma solução que consulte não o interesse do Poder Legislativo ou do Poder Executivo isoladamente, mas o interesse do País, facilitando a administração desta Nação e a implementação de políticas públicas, que são do interesse geral.

É claro que a modernidade, a rapidez das comunicações, a globalização, a exigência, enfim, dos Estados modernos requer que os Executivos sejam dotados de instrumentos que permitam agir rapidamente e, com eficiência, em determinados momentos e circunstâncias. Não podemos aceitar o exagero, o excesso e o abuso na edição e na reedição dessas medidas, que atingem diretamente a competência do Poder Legislativo.

Penso que o bom senso que preside os trabalhos desta Casa e que inspira a atuação de cada Senador tem justamente nos norteado na direção de buscarmos uma solução justa, razoável.

Estou esperançoso de que esses últimos entendimentos, não só no âmbito do Senado, mas também do Poder Executivo, possam levar-nos a uma solução justa, razoável.

Recentemente, por exemplo, para mostrar a necessidade de que os Estados modernos precisam ter instrumentos que permitam celeridade, eficiência, rapidez na adoção de determinadas medidas, o Poder Executivo, da Bélgica, vem de obter do seu Legislativo - porque já foi aprovado na Câmara dos Deputados e o Senado vai apenas dar um parecer, devido a sua função muito limitada, restrita, na Bélgica, muito diferente da nossa - três instrumentos, chamados de Lei Esquadro, que permitem ao rei editar, baixar determinados decretos sobre três tipos de matérias, a que vou me referir, portanto, previamente autorizado pelo Poder Legislativo.

A primeira dessas matérias são leis que visem concretizar condições de participação da Bélgica na união econômica e monetária européia. Sabemos que a União Européia está em busca de ajustes econômicos entre os estados-membros - de política econômica e monetária - que permitam a adoção da moeda única num prazo relativamente curto.

Pois bem, a Câmara dos Deputados na Bélgica deu ao rei poderes para editar leis - sem enviá-las ao Congresso - que viabilizem a participação da Bélgica na união econômica e monetária da Europa. Autoriza também que o rei edite leis que tratem de modernização da seguridade social e garantia da viabilidade dos sistemas de pensões. Além disso, o rei está autorizado a legislar sobre promoção de emprego e salvaguarda preventiva da competitividade. Entretanto, essa autorização prévia pela Câmara dos Deputados, pelo Legislativo belga, deve vigorar até agosto de 1997.

Há, portanto, uma diferença muito grande entre nossa situação e a de outros países que têm instrumentos semelhantes às medidas provisórias. Explico-me, Sr. Presidente: Temos aqui o problema de abrangência, edita-se medida provisória sobre tudo; temos o problema da reedição das medidas provisórias; e temos um problema adicional criado pelo próprio Congresso, a Resolução nº 1, que estabeleceu uma situação inconstitucional, qual seja, exige que essas medidas sejam examinadas por comissões mistas. Se lermos nossa Constituição, vamos verificar que ali está prevista apenas uma comissão mista permanente, que é a Comissão de Orçamento. As outras comissões referidas são de inquérito etc.

A Resolução nº 1 extrapolou a Constituição ao exigir que essas medidas provisórias sejam examinadas por comissões mistas. Isso me leva a atentar para outro fato: Há certas iniciativas que tendem a institucionalizar, que tendem a dar força a uma terceira Casa Legislativa, que é o Congresso Nacional. Isso não existe. Se consultarmos a Constituição dos países bicamerais, que têm Câmara dos Deputados e Senado, vamos verificar que as matérias tramitam separadamente nas duas casas. A única ocasião em que as duas casas se reúnem é na instalação das Legislaturas; o resto tem tramitação separada.

Mesmo aqui, no Brasil, a tradição não é de deliberação em sessão conjunta, com exceção da Constituinte, que é unicameral por natureza. A própria apreciação do Orçamento em sessão conjunta da Câmara e do Senado é obra da Emenda Constitucional nº 1, de 1969, outorgada pelo Poder Executivo durante recesso do Congresso Nacional, com base no Ato Institucional nº 5, de 1968, que praticamente eliminou a participação ativa do Poder Legislativo na elaboração da Lei de Meios, que era, naquela época, tão-somente homologada por esse Poder.

Sabemos que naquele período o Congresso não tinha poder de iniciativa em matéria orçamentária. Então, a Emenda Constitucional de 1969, com o Congresso em recesso, introduziu a elaboração e apreciação do Orçamento pelo Congresso Nacional, ou seja, em sessão conjunta das duas Casas.

O jurista Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que é um nome insuspeito em relação ao governo militar, diz em seus Comentários à Constituição Brasileira, volume I, pág. 209:

      "A Emenda nº 1 inovou neste ponto em relação a todo Direito anterior. Prevê que o projeto de orçamento será apreciado pelo Congresso Nacional em sessão conjunta. Tal preceito visa simplificar o procedimento de aprovação do Orçamento; contudo, reduz a expressão mais simples o papel do Congresso na elaboração deste."

Todos os dias afirmamos aqui - e a Constituição assim o diz - que o Congresso é a Casa dos Estados e da Federação. Ora, a apreciação conjunta do Orçamento vai relatar os gastos federais e, portanto, interessa diretamente aos Estados e às regiões que possuem grandes desigualdades, conforme acabou de falar o nobre Senador Freitas Neto. Como podemos combatê-la senão por intermédio do Orçamento?

Numa reunião conjunta, nossa força estará diluída. Somos 81 Senadores numa reunião que tem 513 Deputados. Nossa própria representatividade federativa, em relação a Estados e regiões, está ameaçada no momento em que o Senado se reúne com a Câmara para deliberar sobre Orçamento.

O Sr. Nabor Júnior - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço o aparte do nobre Senador Nabor Júnior.

O Sr. Nabor Júnior - Nobre Senador Lúcio Alcântara, V. Exª, com a clarividência e o senso de oportunidade habituais, está analisando a questão da edição e das reedições de Medidas Provisórias -- um problema que o Senado Federal trata com a maior atenção, como se vê nas várias Propostas de Emenda à Constituição que visam, justamente, modificar as normas desse instituto jurídico, criado pela Constituição de 1988. V. Exª aborda um aspecto que considero muito importante, que vem ao encontro do nosso interesse e do nosso empenho em buscar uma solução negociável, capaz de atender não só aos interesses do Executivo, mas sobretudo à valorização do Poder Legislativo: as medidas provisórias poderiam tramitar separadamente em cada uma das Casas do Congresso Nacional. É notório o fato de que está havendo certa dificuldade para o Congresso Nacional se reunir; muitas vezes, o seu Presidente, que é o Presidente do Senado Federal, convoca sessão conjunta para apreciação de medidas provisórias, vetos etc., mas a Câmara dos Deputados, voltada para a apreciação das emendas que introduzem as reformas constitucionais, não cede seu plenário. Se as medidas provisórias tramitassem de forma isolada, primeiramente na Câmara e posteriormente no Senado, acredito que seriam votadas mais facilmente, evitando a situação constrangedora a que o Legislativo se vê hoje exposto. Há medidas provisórias que já foram reeditadas 30 vezes e que, assim tratadas, caem no descrédito! A essa altura, ninguém consegue tratar com seriedade o tema "Medidas Provisórias", por mais que elas, efetivamente, gerem efeitos, causem situações -- às vezes irreparáveis -- para a vida dos cidadãos. V. Exª apresentou algumas sugestões ao Relator da Comissão Especial, Senador Josaphat Marinho, das quais quero deixar esta, que é o aspecto que considero mais positivo: não só as medidas provisórias devem ser discutidas e votadas sucessivamente nas duas Casas do Congresso Nacional, mas também os vetos e, quem sabe, até mesmo o Orçamento da República. Assim, o Congresso Nacional se reuniria apenas para instalar os trabalhos legislativos anuais e para dar posse ao Presidente e ao Vice-Presidente da República.

Muito obrigado pela oportunidade que V. Exª me propiciou, de aportar a seu discurso este meu aparte.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Senador Nabor Júnior, o aparte de V. Exª foi oportuno porque, inclusive, antecipou parte do conteúdo do meu pronunciamento. Tenho aqui um levantamento que fiz junto à Secretaria da Mesa. Atualmente, já existe até Mesa do Congresso Nacional. Isso é um absurdo, isso não existe! Mas já há Mesa do Congresso Nacional. Esse é um caminho perigoso pelo qual estamos enveredando para dar força, para institucionalizar uma terceira Casa Legislativa, o que é um absurdo. As Casas são duas: a Câmara e o Senado.

Vamos estabelecer prazos de tramitação numa Casa e noutra, quando for o caso, para garantir celeridade, rapidez; estabeleçamos sustação de apreciação de matérias enquanto não forem deliberados determinados assuntos prioritários.

Mas alerto o Senado para que se insurja contra isso, para que reaja, para que rejeite todas as tentativas no sentido de dar força a essa terceira Casa Legislativa que seria chamada Congresso Nacional. Isso não é bom para a democracia e não é bom para as missões específicas de cada uma das duas Casas.

O levantamento a que procedi mostra o número de sessões do Congresso Nacional realizadas na primeira sessão legislativa ordinária da 50ª Legislatura: 43. Foi tudo o que se fez em 1995. E agora, de 15 de fevereiro a 18 de junho de 1996, foram realizadas 12 sessões, sendo que quase todas sem quorum. Não se delibera, não se vota, não se discute, o que mostra que algumas tentativas que há, de criar uma comissão mista permanente para apreciar medidas provisórias, não são interessantes. Acho que não devemos caminhar por aí. Essa comissão teria uma força absurda, e iríamos ter mais uma comissão mista que esvaziaria a ação isolada, separada, das duas Casas.

Eu queria alertar os Srs. Senadores, porque creio que esse não é um bom caminho para seguirmos quanto à tramitação e apreciação de medidas provisórias.

O Sr. Ney Suassuna - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço V. Exª, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna - Creio que o assunto que V. Exª está hoje abordando é de suma importância para o Congresso Nacional. Estou aqui com um documento, com um controle, que mostra que pela 37ª vez foi reeditada a medida provisória, que agora tem o nº 1.481, que legisla sobre privatização. Trinta e sete vezes! Uma outra medida, sobre o sistema de controle interno, foi reeditada 25 vezes. Uma outra, sobre a contribuição para a Previdência, 24 vezes; outra, sobre modificação de tabelas, 21 vezes. Há três anos, então, estão tramitando determinadas medidas provisórias sem que o Congresso tenha se manifestado. Isso é uma verdadeira aberração! Três anos uma medida provisória aguarda sem que se consiga incluí-la na pauta, ou sem que haja vontade política para se decidir sobre o assunto. A medida provisória é uma legislação temporária e perigosa. Fica-se três anos e um mês aguardando para deliberar sobre um assunto.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Imagine V. Exª se o Congresso tivesse um rompante e resolvesse rejeitar a medida provisória das privatizações, que é um tema polêmico, que suscita muito debate e muita discussão. O que aconteceria? Empresas já foram negociadas e vendidas; no entanto, há uma possibilidade real de o Congresso, amanhã, dizer que houve um escândalo, que estão vendendo a preço vil, que alguém está levando dinheiro nessas vendas, que é contra a privatização e rejeitar essa medida. Teríamos, então, que fazer uma lei para disciplinar relações anteriores já constituídas de compra e venda, transferência de controle, etc.

É uma situação com a qual realmente não podemos continuar convivendo. Não é uma situação séria. Não é simples o problema, reconheço, mas temos que enfrentá-lo dando um solução justa, que não negue ao Executivo instrumentos ágeis, eficazes, eficientes e modernos de gestão e que não retire, não confisque do Legislativo essa que é uma função básica sua, a de fazer leis.

O Sr. José Eduardo Dutra - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço V. Exª, com prazer.

O Sr. José Eduardo Dutra - Senador Lúcio Alcântara, não sou tão otimista quanto a chegarmos a uma solução para essa questão. Primeiro porque, a partir do momento em que se chegou a um certo consenso de que é necessária uma proposta de emenda constitucional para regulamentar a questão, nós nos defrontamos com o fato de que é praticamente impossível aprovarmos uma proposta de emenda constitucional sem o apoio do Executivo. Podemos chegar a consenso em praticamente tudo: temas sobre os quais as medidas provisórias podem legislar, resgate de prerrogativas que o Executivo tinha na Constituição de 1946 etc. Podemos chegar a acordo com relação a tudo isso. Mas, a meu ver, a questão principal é a possibilidade da reedição das medidas provisórias, ponto do qual, ao que parece, o Governo não abre mão. Dizem que o culpado é o Congresso, que não vota as medidas provisórias. Mas ele não vota porque as Lideranças do Governo no Congresso preferem não votar. É mais cômodo manter a medida provisória da desestatização por dois anos; a do salário mínimo por não sei quanto tempo; a do Proer por não sei quanto tempo. É mais cômodo manter as medidas provisórias, porque se pode reeditá-las. Se a possibilidade de legislar é dada ao Executivo excepcionalmente, no caso de medida provisória, o Executivo tem que arcar com a obrigação de utilizar a sua base parlamentar para transformá-la em lei no prazo de 30 dias, como está proposto. Se não resolvermos essa questão, que, a meu ver, é a principal, vamos continuar tendo reedições sucessivas, porque, para o Governo, é mais cômodo reeditar. Realmente, no caso da medida provisória das privatizações, que trata principalmente do setor elétrico, se fosse rejeitada agora, significaria anular a venda da Light, anular a venda da Escelsa? É até mais fácil para o Governo transformar a coisa em um fato consumado. Ao passo que se a medida fosse apreciada no prazo de 30 dias, não teríamos a argumentação de fato consumado.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Estou de acordo com V. Exª. É fundamental a questão da reedição.

O Sr. José Eduardo Dutra - Estou pessimista em relação à solução desse problema. Muito obrigado.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Acho que discutir o problema da reedição é fundamental, porque se continuar a haver a reedição e a convalidação - encontraram uma maneira de colocar isso nessa questão das medidas provisórias - não vamos chegar a lugar algum.

O Sr. Epitacio Cafeteira - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Quero ouvir o Senador Epitacio Cafeteira, mas pedir-lhe-ia que fosse breve em seu aparte, porque o Senador Roberto Freire também deseja falar e o tempo está-se esgotando.

Não sei se a Mesa vai permitir que V. Exªs se manifestem, mas esse é um tema oportuno. Prometo que encerrarei o meu pronunciamento rapidamente após o término dos apartes.

O Sr. Epitacio Cafeteira - Nobre Senador Lúcio Alcântara, eu estou freqüentando o Poder Legislativo desde 1963. São, portanto, 33 anos. Nesse período, só me lembro de um ano e de um mês durante os quais eu participei de um Legislativo que tinha condições de usar o nome: foram o ano de 1963 e o mês de março de 1964. A partir daí veio a Revolução. Com ela, acabou-se o Poder Legislativo, até porque o Governo fechava o Congresso quando queria, e o deixava funcionar quando queria ser condescendente. Mas só se aprovava o que o Governo queria. Os decretos-leis, depois de editados, se em 30 dias não fossem examinados, viravam lei. O Governo mandava para cá, por exemplo, um decreto-lei, mas retirava a sua Bancada do plenário. Todos os decretos viraram leis. Veio esse período chamado de redemocratização, da Constituição cidadã, e foi feito o dispositivo da medida provisória, prevendo-se o regime parlamentarista. O regime passou a ser presidencialista e a medida provisória ficou embutida na Constituição de tal ordem que o Poder Executivo tem mais poderes do que o próprio Legislativo, até porque edita uma medida provisória e, após 20, 25 dias, reedita-a. E vai, assim, levando o Congresso no empurrão. O meu primeiro discurso no Senado Federal tinha o título Reeditar Medida Provisória é Inconstitucional. Esse é o entendimento de qualquer pessoa que, de forma meridiana, veja o assunto. Participei, ontem, de uma reunião de Líderes com o Presidente da República e quero aqui dar meu depoimento. Sua Excelência diz que está disposto a abrir mão da reedição de medidas provisórias. Foi categórico e eu até me congratulei com ele. Ficou estabelecido que vamos fazer, Executivo e Legislativo, uma emenda através da qual se devolva ao Poder Executivo prerrogativas administrativas que foram tiradas dele pela atual Constituição. E, nessa ocasião, seria estabelecida uma forma de haver uma medida provisória, que pode ter outro nome - medida de emergência ou coisa que o valha -, com o prazo de 90 dias. Após o referido prazo, o assunto estaria encerrado sem direito a reedição. Portanto, no caput desse novo art. 62, deve haver a seguinte redação: "Em caso de emergência, poder-se-á emitir medida provisória sem possibilidade de reedição". Logo a seguir, viria o restante do dispositivo. Isso é importante - e torço para ver essa proposta realizada ainda neste meu mandato. Senti-me realmente no Legislativo, que tem o poder de dizer sim e não. Se essa proposta for viabilizada, serei a favor de uma comissão permanente de medidas provisórias, porque o que está acontecendo é uma pulverização de designação das comissões, que não se reúnem e, portanto, ninguém é responsável. Se houver uma comissão, alguém será responsável pelo seu não-funcionamento. Quero me congratular com V. Exª por abordar uma matéria que foi a minha preocupação primeira.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Agradeço o aparte de V. Exª porque a sua informação é importante, concernente à opinião do Presidente da República em uma reunião de Líderes. Mas divirjo sobre essa Comissão Mista Permanente do Congresso Nacional. Creio que não convém a criação de uma terceira Casa do Poder Legislativo.

O Sr. Epitacio Cafeteira - Um dos pontos que foram discutidos é que, com esse novo prazo de 90 dias, a matéria seria votada no Senado e na Câmara ou na Câmara e no Senado. Essa é a única maneira de se votar em separado nas duas Casas.

O Sr. Roberto Freire - Só para concluir - talvez até fosse desnecessário -, eu gostaria de enfatizar o que V. Exª disse, a respeito de não se criar uma terceira Casa Legislativa no Brasil, e o que disse o Senador Epitacio Cafeteira, no sentido de que talvez uma grande solução fosse a reformulação do Regimento do Congresso Nacional, que define - não é nada constitucional - que as medidas provisórias devem ser analisadas, discutidas e votadas pelo Congresso Nacional, em sessão conjunta. Talvez, se modificássemos o Regimento...

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Não se trata do Regimento, mas da Resolução nº 1, que é um absurdo, é inconstitucional!

O Sr. Roberto Freire - Sim, mas é uma resolução que faz parte hoje do Regimento. As medidas provisórias são analisadas por uma Comissão Mista, Senado e Câmara, e votadas em uma sessão conjunta do Congresso Nacional. Se modificássemos o Regimento Comum - e vou apresentar um projeto nesse sentido -, provavelmente essas medidas provisórias seriam votadas dentro de um tempo hábil, o suficiente para se evitar esse absurdo - que, talvez, seja um caso único no mundo - de termos uma legislação provisória e permanentemente emendada pelo Executivo, sem que ninguém possa dizer nada, porque, de 30 em 30 dias, é reeditado algo diferente do que já havia sido feito. Isso é um absurdo! E não temos que ficar perguntando o que o Presidente da República pensa sobre isso. Esse não é um problema do Senhor Fernando Henrique Cardoso, e sim da democracia, das instituições - Congresso e Executivo. Nós precisamos definir a questão, e não o Senhor Fernando Henrique Cardoso, que diz não querer reeditá-las. Ótimo! Mas, amanhã, pode haver um Presidente que queira reeditar infinitamente as medidas provisórias. Quero saber o que é melhor para a democracia e tenho a impressão de que é não termos nenhuma medida provisória sendo permanentemente reeditada, criando esse híbrido, que é a situação legislativa brasileira.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Muito obrigado aos Srs. Senadores que me apartearam.

Quero agradecer à Mesa a tolerância em ter permitido, além do prazo, que cada um pudesse se manifestar, porque o tema é importante, eu diria mesmo fundamental, para o aprimoramento dos trabalhos legislativos e das instituições políticas brasileiras.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/06/1996 - Página 10465