Discurso no Senado Federal

REGOZIJO DE S.EXA. COM O RECEBIMENTO DE COMUNICAÇÃO OFICIAL DO MINISTERIO DA AERONAUTICA E SECRETARIA DE ASSUNTOS ESTRATEGICOS, DANDO CONTAS DE MEDIDAS IMPLEMENTADAS PELO EXECUTIVO, RELATIVAS AO SIPAM/SIVAM. ATOS ILICITOS, MALEFICIOS AMBIENTAIS E INTROMISSÕES DE ORGANIZAÇÕES ESTRANGEIRAS NA AMAZONIA. URGENCIA DO FORTALECIMENTO DA PRESENÇA DO ESTADO NO ESTABELECIMENTO DE CONDIÇÕES DIGNAS DE VIDA PARA A POPULAÇÃO QUE OCUPA OS ESPAÇOS AMAZONICOS. IMPORTANCIA DO PROGRAMA PRO-AMAZONIA.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM). SOBERANIA NACIONAL.:
  • REGOZIJO DE S.EXA. COM O RECEBIMENTO DE COMUNICAÇÃO OFICIAL DO MINISTERIO DA AERONAUTICA E SECRETARIA DE ASSUNTOS ESTRATEGICOS, DANDO CONTAS DE MEDIDAS IMPLEMENTADAS PELO EXECUTIVO, RELATIVAS AO SIPAM/SIVAM. ATOS ILICITOS, MALEFICIOS AMBIENTAIS E INTROMISSÕES DE ORGANIZAÇÕES ESTRANGEIRAS NA AMAZONIA. URGENCIA DO FORTALECIMENTO DA PRESENÇA DO ESTADO NO ESTABELECIMENTO DE CONDIÇÕES DIGNAS DE VIDA PARA A POPULAÇÃO QUE OCUPA OS ESPAÇOS AMAZONICOS. IMPORTANCIA DO PROGRAMA PRO-AMAZONIA.
Publicação
Publicação no DSF de 30/11/1996 - Página 19402
Assunto
Outros > SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM). SOBERANIA NACIONAL.
Indexação
  • REGISTRO, INICIO, ATIVIDADE, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM), ATENDIMENTO, RECOMENDAÇÃO, RELATORIO, ORADOR, COMISSÃO, SENADO, COOPERAÇÃO, EXECUTIVO, LEGISLATIVO.
  • ANALISE, LOBBY, PRIMEIRO MUNDO, REDUÇÃO, SOBERANIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA.
  • NECESSIDADE, URGENCIA, PROVIDENCIA, FISCALIZAÇÃO, CONTROLE, REGIÃO AMAZONICA, APOIO, POPULAÇÃO, FRONTEIRA.
  • REGISTRO, ATUAÇÃO, POLICIA FEDERAL, MINISTERIO DA AERONAUTICA (MAER), PROJETO, AMBITO, SEGURANÇA, APOIO, OBJETIVO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM).

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em suas costumeiras e profundas reflexões, Immanuel Kant usava dizer que "há apenas duas coisas belas no universo: o céu estrelado sobre nossas cabeças e o sentimento do dever cumprido que vive em nossos corações".

Eis a sensação que me toma o espírito neste momento, ao receber uma comunicação oficial encaminhada pelo Ministro da Aeronáutica e pelo Secretário de Assuntos Estratégicos, dando-me conta de medidas implementadas pelo Executivo, no espírito das recomendações expressas em parecer de minha autoria, que fundamentou os termos da Resolução nº 37, do Senado Federal, aprovada neste plenário, tratando dos sistemas de proteção e de vigilância da Amazônia - Sipam/Sivam.

Certamente, todos ainda temos bem vivos, na memória, os intensos debates que ocorreram, por ocasião dos exames levados a efeito sobre o Projeto Sipam/Sivam, no curso das atividades desenvolvidas pela Supercomissão que foi instalada, nesta Casa, para analisar a matéria, da qual tive o privilégio de ser designado Relator, sob a Presidência do eminente Senador Antonio Carlos Magalhães.

Ali, ao longo dos depoimentos de autoridades convocadas, das discussões que se seguiam, dos questionamentos apresentados pelos ilustres Parlamentares, dos estudos a cargo das assessorias, enfim, do sincero envolvimento de todos quanto se aprofundaram no tema relacionado à proteção da Amazônia, foi possível, literalmente, dissecar os meandros dos sistemas de proteção e de vigilância propostos pelo Governo federal, com vistas a fortalecer a atuação do Estado e a dar suporte à política de desenvolvimento sustentável para a Região Amazônica.

Sr. Presidente, ao deitarmos nossos olhos sobre a história da nossa terra, vamos constatar que a Amazônia tem sido motivo de atenção desde os mais remotos tempos, começando pelas primeiras ordens, emanadas da Coroa Portuguesa, para que homens destemidos explorassem as inóspitas paragens amazônicas, a exemplo do Jesuíta Christóval Acuña e de Pedro Teixeira, que, em 1639, receberam a incumbência de vir de Quito a Belém do Pará, percorrendo insondáveis caminhos espraiados na misteriosa imensidão do rio-mar.

Desde então, e até os dias atuais, essa região tem sido lenitivo para os que dela procuram simplesmente extrair o alimento de sustento, que depende do suor derramado nos seringais, do trabalho sofrido nos garimpos ou da habilidade inata no manejo das embarcações que singram suas águas.

Por outro lado, tem servido, também, de fonte de inspiração para a cobiça de numerosos aventureiros que se embrenharam em suas entranhas, buscando desvendar riquezas e potenciais para atender a interesses inconfessáveis. Os exemplos dessas ações de pilhagem podem ser contados às dezenas, bastando citar as inúmeras expedições que renderam grossos compêndios e belíssimas gravuras, todos assinados por profissionais das armas, pesquisadores ou artistas, cujos nomes reúnem tal mistura de consoantes que se tornam impronunciáveis para nós, brasileiros, simples descendentes da colonização ibérica, amantes que somos da sonoridade do nosso idioma, perpetuado nos versos de Bilac como a "última flor do Lácio, inculta e bela".

A esse contexto, ao longo dos anos, juntem-se mais os ingredientes do descuido e do descaso com o meio ambiente: poluindo-se cursos d'água, queimando-se e derribando-se substanciais porções da floresta sem manejo e gerando-se prejuízos importantes a ecossistemas sensíveis.

Nesse cenário, fixando-me no momento presente, tenho notícia de uma interessante exposição feita pela especialista em História do Direito, da Universidade do Texas, a brasileira de nascimento Lydia Garner, traduzindo uma análise acurada sobre a evolução da jurisprudência da soberania nacional, relativa à Amazônia, desde os meados do século XIX. Este tema foi abordado no 3º Encontro de Estudos Estratégicos, organizado pela Escola Superior de Guerra e Secretaria de Assuntos Estratégicos, no Rio de Janeiro, durante o mês de outubro do corrente ano, recebendo largo espaço na mídia nacional.

Naquele evento, a ilustre professora, que vive há vinte anos nos Estados Unidos, não teve pejo de mostrar, com todas as letras, "as várias formas de intromissão de organizações estrangeiras na Região Amazônica, que, de um modo ou de outro, estão escudadas em interpretações que diminuem a validade da Lei das Nações, interpretações que atribuem aos países mais desenvolvidos a liderança nos assuntos mundiais, determinam agendas e, imperceptivelmente, se apoderam da agenda nacional."

Nesse quadro, coaduna-se, à perfeição, a tese do "direito de ingerência", defendido publicamente pelo falecido ex-Presidente da França, François Mitterrand, cuja essência deriva da justificativa de que seria lícito às nações do primeiro mundo interferirem em países subdesenvolvidos que demonstrassem incapacidade para preservar o meio ambiente em seu território.

Certamente, não terá sido mero deslize diplomático a posição defendida por representantes de países europeus, na Conferência de Haia, em 1989, os quais sugeriam veementemente que o Brasil e outros países amazônicos abrissem mão de "parcelas de soberania" sobre a região para proporcionar a "proteção" da floresta equatorial, porquanto este passara a ser um assunto de preocupação mundial.

É por essas e outras que este Senado Federal jamais se eximirá de participar, intensa e ativamente, das decisões que, hoje, se fazem imperativas no tocante a programas genuinamente nacionais que busquem a proteção e o desenvolvimento da Amazônia brasileira, a exemplo da iniciativa do Executivo representada pelo Sipam/Sivam, que, ao ser encaminhada para apreciação do Congresso, e após profunda análise, recebeu o apoio e a solidariedade desta Casa Parlamentar.

Entendo, Sr. Presidente, que o valor geopolítico e estratégico representado pela Amazônia Legal brasileira, nos contextos nacional e internacional, determina ações urgentes para coibir atos ilícitos ali praticados, como o contrabando de riquezas, o narcotráfico, o uso inadequado de recursos naturais ou mesmo o desrespeito aos limites das nossas fronteiras e dos nossos espaços, cujo controle, atualmente, em vista dos parcos meios disponíveis, é feito com enormes dificuldades e, certamente, com algumas deficiências.

O espírito patriótico que habita os corações e as mentes de um sem-número de brasileiros, que, apesar das condições precárias, mas preservando a nacionalidade, insistem em viver nas mais remotas áreas do nosso território, merece a atenção de todos nós, porquanto é através do desprendimento e da abnegação de suas ações que se torna possível manter incólume a integridade da nossa terra. Integridade esta conquistada com o sangue, o suor e, sobretudo, a inteligência dos nossos antepassados, entre os quais não se pode deixar de distinguir figuras como Plácido de Castro e a epopéia do Acre, Barão do Rio Branco, cuja atuação foi decisiva para o delineamento de nossas fronteiras, e Marechal Rondon, com o sobre-humano trabalho de implantação dos meios de comunicação e de integração dos índios em terras longínquas.

É sempre bom notar, Sr. Presidente, que estamos tratando de uma região privilegiada pelos desígnios de Deus, porque ali se encontram, entre outros potenciais: a maior reserva mundial de água doce, recurso inestimável e fundamental para a sobrevivência da humanidade; mais de 1/3 das florestas tropicais do planeta e, por conseqüência, um formidável acervo de biodiversidade; e, a isso tudo, agrega-se uma espetacular reserva de recursos minerais, com valores estimados em R$1,6 trilhão, que, decerto, é razão de preocupantes disputas por grupos de interesses econômicos e políticos os mais diversos.

Ademais, existe, também, a vertente dos seriíssimos desafios relativos aos aspectos sociais da região, em vista dos padrões heterogêneos de qualidade de vida que são desfrutados pelo contingente populacional que ocupa os espaços amazônicos. Essa realidade mostra-nos 17 milhões de pessoas vivendo situações de contrastes profundos, desde o convívio com as modernas fábricas e montadoras da Zona Franca de Manaus, passando pelo intenso comércio de materiais de última geração nas zonas de livre comércio, em Macapá e Guajará-Mirim, até o encontro com a miséria subumana espelhada nas águas fétidas que correm embaixo de palafitas, construídas sobre os leitos dos rios e igarapés.

Em vista de tal realidade, impõe-se o urgente fortalecimento da presença do Estado, por intermédio de suas instituições, notadamente aquelas responsáveis pelos encargos da educação e da segurança. Do primeiro, deve-se esperar o estabelecimento de condições dignas para a formação e consolidação dos valores éticos e morais no seio da comunidade; o segundo precisa dispor dos meios adequados à proteção dos direitos individuais e coletivos, coibindo-se atividades que possam interferir no bem-estar da sociedade ou conflitar com os interesses soberanos da Nação.

Com efeito, no tocante à segurança, equipes de profissionais do Departamento de Polícia Federal e do Ministério da Aeronáutica já estão trabalhando em conjunto com vistas a desenvolver a elaboração dos requisitos técnicos de um projeto conhecido como Projeto Pró-Amazônia, cuja meta é aprimorar a capacidade do aparelho policial na região.

Aliás, é importante esclarecer que o Sipam/Sivam e o Pró-Amazônia, longe de serem projetos paralelos, redundantes ou mesmo conflitantes, são, isto sim, iniciativas do Executivo que convergem nos seus princípios e objetivos, complementam-se em suas ações, buscando atingir os melhores resultados para a ação governamental no campo da segurança.

É sobre esse quadro de desafios amazônicos que técnicos do Governo, dos institutos de pesquisas, dos centros acadêmicos e de entidades representativas da sociedade se debruçam, diariamente, analisando nuanças, pesquisando particularidades, formulando planejamentos e sugerindo soluções para questões que vão desde o ato de ensinar simples noções de higiene até a implementação de mecanismos complexos de socioeconomia que permitam o encaminhamento de consistentes políticas de desenvolvimento a longo prazo.

Assim é que, no mês de maio deste ano, em relatório submetido à apreciação dos ilustres Senadores, tive a oportunidade de enfatizar "o nosso genuíno interesse em garantir o respeito aos direitos humanos e assegurar melhores condições de vida a todos os brasileiros que vivem na Amazônia, seja pela necessidade de preservar e explorar, de forma equilibrada, suas riquezas, seja ainda pela necessidade de afastar qualquer ameaça à nossa soberania". Nesse contexto, reforçava ainda mais esse meu raciocínio, afirmando que "o Brasil precisa construir rapidamente um projeto nacional para o desenvolvimento auto-sustentado da Amazônia."

Pois bem, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sinto-me, hoje, rejubilado, porque venho a esta tribuna para dar o meu testemunho de que o Executivo, no que respeita à busca de soluções para a Amazônia, está agindo em consonância com o pensamento defendido por todos nós, encaminhando ao Congresso Nacional proposta de inclusão de recursos no Orçamento da União de 1996, para o fortalecimento do Sipam/Sivam, pleito este já analisado e aprovado pela Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização. Estou convicto de que, mais uma vez, o Legislativo, ao apoiar iniciativas dessa natureza, com vistas a instituir verdadeiros programas de desenvolvimento, estará emprestando imprescindível contribuição para a proteção e a definitiva integração social da Região Amazônica.

É importante destacar que o Projeto Sistema de Proteção da Amazônia tem medidas que estão sendo implementadas desde 1992, procurando fortalecer o desenvolvimento regional, maximizar a utilização da infra-estrutura disponível e criar um ambiente facilitador à atuação integrada dos órgãos governamentais, nas quais já foram aplicados, nos últimos 4 anos, recursos da ordem de R$25 milhões.

Dessa forma, foi possível viabilizar estudos para a construção de uma pequena central hidrelétrica em São Gabriel da Cachoeira, no extremo-oeste do Estado do Amazonas, cujo projeto aguardava recursos e decisão política há mais de dez anos. Assim, quando esse empreendimento entrar em operação, em março de 1999, tornará disponíveis 2,6 megawatts de energia para uma comunidade de 10 mil habitantes, resolvendo o crônico problema de deficiência de energia elétrica naquela cidade, que terá suas necessidades atendidas até o ano 2.008, em vista do ritmo de crescimento estimado.

Eis, portanto, Sr. Presidente, exemplos de iniciativas importantes, postas em prática graças ao Sipam, atendendo a áreas cujos habitantes carecem do mínimo de recursos para atingir padrões aceitáveis de dignidade e bem-estar social. Nessas localidades, os órgãos públicos deparam-se com conflitos de toda ordem - desde os originados pelas questões demarcatórias das áreas indígenas, passando pela realidade dos grupos de garimpeiros que, de uma forma ou de outra, por meio desse tipo de trabalho, buscam sua sobrevivência. Agrava-se ainda mais esse quadro devido à preocupante invasão dos "exércitos mercenários", que trabalham a soldo dos comerciantes de drogas e não reconhecem fronteiras soberanas ou leis, mas apenas disputam o lucro fácil, empregando a mais variada gama de ardis para incrementar o butim.

Nesta última constatação, vale registrar a imensa ousadia dos traficantes, que, hoje em dia, não se importam em aliciar jovens de todas as idades, pais de família e mesmo índios para servirem de mão-de-obra - no plantio das culturas de insumo, na colheita e na indústria de transformação e, finalmente, como agentes do comércio ilegal das drogas, deformando valores e comportamentos e difundindo rapidamente o mais penoso mal que atinge a todas as nações, indiscriminadamente, neste final de século.

Sr. Presidente, para finalizar esse quadro de reflexões, mais uma vez rejubilo-me por constatar importantes medidas do Executivo que, muito embora não tenham ainda toda a abrangência que a envergadura do desafio amazônico exige, certamente haverão de atender a sérios e prementes apelos emanados daquela região.

Os importantes mecanismos de coordenação e vigilância que o Sipam/Sivam pretende adotar na Amazônia resultarão, a curto e médios prazos, em racionalização no emprego de recursos e economia de meios, traduzindo-se em consideráveis benefícios para as áreas de saúde, planejamento de uso dos solos, proteção do meio ambiente e segurança territorial.

Eis a cruzada que só depende da vontade da sociedade, atuando por meio de suas instituições representativas, em especial desta Casa, que luta pela redução dos desequilíbrios regionais. De modo particular, quando se trata do desenvolvimento e da ocupação racional da Amazônia brasileira, que, a nosso ver, implica empregar, de maneira inteligente, seus potenciais em proveito das necessidades do presente, mas sem descurar das ações que possibilitem a conservação dos recursos para uso das futuras gerações, as quais serão as responsáveis pela continuidade da História deste imenso Brasil.

Muito obrigado, Sr. Presidente


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/11/1996 - Página 19402