Discurso no Senado Federal

MENSAGEM DE NATAL. ANALOGIA ENTRE O NATAL E OS DESAFIOS SOCIAIS A SEREM SUPERADOS NO BRASIL.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. POLITICA SOCIAL.:
  • MENSAGEM DE NATAL. ANALOGIA ENTRE O NATAL E OS DESAFIOS SOCIAIS A SEREM SUPERADOS NO BRASIL.
Aparteantes
Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 17/12/1996 - Página 20703
Assunto
Outros > SENADO. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • AGRADECIMENTO, PESSOAL, SENADO, ATUAÇÃO, ORADOR, QUALIDADE, SENADOR.
  • ANALISE, NECESSIDADE, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, IMPLANTAÇÃO, POLITICA SOCIAL, EPOCA, COMEMORAÇÃO, FERIADO RELIGIOSO.

A SRª BENEDITA DA SILVA (PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje, dia 16 de dezembro de 1996, assomo a tribuna agradecendo, em primeiro lugar, pela gentileza da permuta, ao Senador Romero Jucá. Em segundo lugar, durante estes anos nesta Casa, pude contar com valorosos servidores, desde os do meu gabinete até aqueles dos departamentos deste Senado Federal, servidores que nunca deixaram de atender a uma solicitação, ainda que atarefados, que nunca deixaram de informar, de dar condição para que este mandato exercido neste ano possa ter êxito. Apesar das limitações que me são peculiares, tenho obtido êxito neste mandato.

Quero agradecer também àqueles que cooperaram conosco nas Comissões, onde tivermos oportunidade de trabalhar.

Quero agradecer aos meus pares, que durante esta sessão legislativa me apartearam em temas significativos, demonstrando sua preocupação. E não faltou também gentileza dos colegas em muitos momentos em que chegava a este plenário, não estando inscrita, e S. Exªs me cediam seu tempo para usar da palavra.

Sou grata também à Assessoria da Mesa Diretora da Casa, que sempre procurou ajudar-me para que aqui pudesse fazer minhas interrogações, meus questionamentos.

As iniciativas da imprensa, igualmente, foram importantes, pois sem elas jamais o nosso trabalho teria repercussão, ainda que, no meu caso, tenha passado por alguns momentos difíceis, lamentando profundamente as ocasiões em que a notícia não me era favorável e não obtinha espaço suficiente para fazer ressoar minha defesa ou minha crítica. No entanto, sendo uma cidadã, entendo que a democracia está exatamente colocada para que tenhamos espaço, seja de críticas construtivas ou não; mas que elas possam ser feitas, porque sem a liberdade de imprensa não há democracia. E eu tive a oportunidade, por esta mesma imprensa, de ter momentos registrados, fatos e feitos, que para mim foram de uma importância muito grande, pois não se tratavam de iniciativas apenas de mandato, mas certamente de reivindicações de segmentos expressivos da sociedade brasileira, às quais, sem a imprensa, jamais teriam eco.

Quero, muito particularmente, falar sobre a imprensa do Senado Federal, que, com isenção total, tem-nos colocado ao alcance de uma parte maior da população, para que conheça aquilo que temos feito. Esta semana, quando viajava para o Rio de Janeiro, ao ser distribuído o Jornal do Senado no avião, dizia: "Pois é, agora, ainda que atingindo um público menor que os 165 milhões de brasileiros, temos a voz do Senado, a nossa voz, escrita, falada, televisionada, projetando aquilo que entendemos ser nossa verdade, aquilo que entendemos ser importante ser debatido aqui."

Apresentei 34 projetos em dois anos. Não foi fácil elaborá-los, porque foram projetos trabalhados, que requereram um esforço muito grande para chegar a esta Casa. Quatro deles foram sancionados, são leis hoje. Mas falta muita coisa.

O Congresso Nacional poderia ter produzido muito mais, o Senado em particular. Abrimos mão de, em determinados momentos, fazer aqui grandes debates, porque, muitas vezes, o que parece ser moroso nada mais é do que um processo necessário para articular as forças, para democraticamente garantir o espaço das minorias e não deixar qualquer resquício que pudesse indicar que nesta Casa existe um rolo compressor. Não! Esta é uma Casa de debates, onde todos chegamos com valores diferentes. Recebemos do povo a incumbência de aqui chegar e defender nossos Estados; por conseguinte, temos peso igual, independentemente do número de votos que obtivemos na eleição ou do número dos integrantes de nossas bancadas.

Seria importante que determinados temas, como a privatização da Companhia Vale do Rio Doce, a Lei de Patentes, a reforma agrária - que ainda está em processo de discussão -, a quebra do monopólio de petróleo, a questão da Light e tantos outros aqui enfocados, não fossem tão difíceis de serem discutidos. Não é difícil ser oposição; difícil é ser minoria, porque nem sempre podemos fazer prevalecer a idéia em que acreditamos.

Portanto, para que não fique a impressão de que houve um rolo compressor, é preciso que haja o espaço para o debate e que ele seja garantido sempre.

Aqui pude fazer pronunciamentos muito importantes, ora acatados ora criticados. Quando falei sobre desenvolvimento econômico desta tribuna, eu o fiz com a convicção de que esse desenvolvimento era e é importante para este País, mas salientei que há uma injustiça social que os nossos discursos e pronunciamentos não têm conseguido eliminar, apesar do empenho de cada um de nós quando aqui abordamos esses temas enfaticamente. É preciso que haja vontade política, que não passa só por este Senado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desta tribuna pude, ainda, tratar dos problemas da pequena e média empresas; expressei minhas preocupações com os movimentos sociais de mulheres, com a problemática das crianças, dos negros, pobres trabalhadores, dos sem-terra, dos sem-teto; falamos, também, das culturas, da necessidade de o Congresso dar passos e mais passos no sentido de tornar este País cada vez melhor.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta Casa tenho trabalhado com alguns gabinetes e tenho tido acesso a qualquer um dos meus pares, nunca encontrei dificuldades para tratar de qualquer assunto. Não quero aqui citar nomes porque, se esquecer algum, poderei cometer uma injustiça.

Sempre abraço meus colegas quando eles dão pareceres contrários aos meus projetos. Eles chegam com tal postura que não consigo criticá-los, a não ser tentar convencê-los de seu engano. Só posso dizer: "Foi um equívoco de V. Exª. Trata-se de um grande projeto, um projeto importante e tenho certeza de que se ele viesse como medida provisória, V.Exª o apoiaria por julgá-lo importante e, também, para apoiar o Governo Federal".

Como somos oposição, sabemos das dificuldades que pesam sobre nossas proposições. Mesmo assim, desejo que meus colegas Senadores dêem pareceres favoráveis aos meus projetos. Faço até um apelo como presente de Natal: que possamos, como representação minoritária nesta Casa, receber projetos para relatar, nas comissões que tenham repercussão e que garantam debates nacionais e políticos, com críticas.

Não é fácil ser minoria, mas vale a pena exercer com dignidade e transparência nossos mandatos.

Quero desejar um Feliz Natal para todos e um ano de 1997 com muita força, muita garra. Talvez muitas pessoas não saibam, independentemente de serem ou não cristãs, do valor do nascimento de Jesus Cristo. Ele veio com uma proposta política avassaladora, revolucionária, que poucos de nós entendemos. Quando estamos defendendo a reforma agrária, quando não queremos crianças abandonadas nas ruas é porque sabemos - e da minha parte sei perfeitamente - que um Menino nasceu em uma manjedoura, entre os animais, teve como colchão o feno. Ele não veio dos castelos e dos palácios, mas foi um Rei.

Às vezes, não entendemos o que significa ser rei, talvez porque no nosso juízo ser rei é possuir muito gado, casas, mansões, palácios, carros, dinheiro em banco, mas para nós que temos fé em Jesus Cristo entender o Natal é um compromisso da riqueza de se despojar daquilo que tem e dar de graça o que de graça recebeu.

Jesus nasceu com um compromisso. O Menino não teve medo e pôde, desde a sua meninice, dizer aos grandes e poderosos da época que não era possível, de forma alguma, aceitar a injustiça. Ele veio para propiciar a mudança. Natal é mudança! Em todo Natal, não podemos apenas colocar um grande peru assado em nossas mesas, cozinhar as castanhas ou fazer as rabanadas. Sobretudo, devemos lembrar que estamos comemorando um nascimento e que há uma esperança, uma vontade, um desejo de que este País seja diferente e de que as nossas criancinhas não nasçam mais nas nossas calçadas frias.

Evidentemente, não é mais preciso que as nossas crianças sejam visitadas pelos animais, mas sim por pessoas que possam sorrir, estender-lhes as mãos e olhar para seus olhos sem medo de serem roubadas ou sem se envergonharem pelo fato de essas crianças não estarem bem vestidas.

Uma criança nasceu e, até hoje, faz com que nós adultos nos lembremos do compromisso de fazer mudanças e transformar a manjedoura numa cama decente. Devemos levar descanso aos pés descalços e inchados de tanto percorrer a terra e procurar o pão; algumas pessoas não tem onde reclinar suas cabeças. É preciso transformar isso. Isso é Natal!

Precisamos dar às nossas crianças o tratamento que muitas vezes damos aos animais. Quem cria em casa um cachorro ou um gato tem para com esses animais todos os cuidados. Desta tribuna, eu não pediria a essa pessoa outra coisa para essa nova criança que deve nascer dentro de cada um de nós a partir deste Natal. Não lhe dê um tratamento de criança, mas o mesmo tratamento que dispensa aos seus animais. Os animais têm recebido por parte de todos nós reciprocidade e solidariedade. Jamais deixamos com fome os nossos cachorrinhos, os nossos gatinhos. Aprendi na Bíblia que os cachorrinhos também comem as migalhas que sobram das mesas dos senhores. Será que daremos a pessoas como nós, de carne e osso, seres humanos, o que sobra de nossas mesas? Não. Temos em nossas mãos um grande desafio: fazer daqui dessa nossa manjedoura, onde nascemos e crescemos politicamente, o lugar de partida para essas transformações da sociedade.

O Sr. Ramez Tebet - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Com muito prazer, ouço o aparte de V. Exª.

O SR. Ramez Tebet - Senadora Benedita da Silva, sempre acompanho os pronunciamentos de V. Exª, todos eles brilhantes, todos eles contendo ensinamentos, todos eles condizentes com a personalidade, com o seu espírito de luta, com o ideal que anima o seu coração, que é o de contribuir para uma Pátria mais justa e mais feliz. Permita-me dizer-lhe que hoje V. Exª está encantando a todos com uma mensagem de Natal, que, além de fraterna, possui um profundo conteúdo social. Estou aqui, mais uma vez, a admirá-la e solicitei este aparte para congratular-me com V. Exª, pois é muito bom ouvir pronunciamentos inspirados em uma mensagem cristã de amor ao próximo dirigida a todo o Brasil. Em verdade, hoje mesmo, estava lendo alguém que escrevia sobre nosso colega, o Senador Darcy Ribeiro, dizendo que, se qualquer animal tem dono - um bezerro tem dono, um cachorro tem dono -, a criança também precisa ter, não um dono, mas alguém que a ampare, que não a deixe abandonada. Quero, assim, cumprimentá-la, de todo o meu coração, pelo brilhante pronunciamento que faz hoje na tribuna desta Casa.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Agradeço o aparte de V. Exª e digo que tenho certeza de que o sentimento natalino fará com que possamos trazer, em 1997, para esta Casa, não apenas o debate, mas resultados que evidentemente possam significar um avanço.

Jesus já nasceu. Para mim, que sou cristã, nasceu, morreu e ressuscitou. E, com a sua vida, deu-nos uma grande lição e nos disse que faríamos obras bem maiores que aquelas que Ele havia feito.

Nós, que cremos nisso, sabemos que podemos fazer coisas bem maiores e, se não as fazemos, é porque somos negligentes. É por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que o Natal deve chegar para nós como uma esperança.

Eu, que tenho netos, que tive a oportunidade de ver um Natal diferente, que tive a oportunidade de conhecer, quase que praticamente adolescente, a minha primeira boneca, que tive a oportunidade de conhecer o que é uma manjedoura, em uma calçada fria, ou de tábuas, ou em um barraco de zinco, ou de coisas como essas, sei viver perfeitamente numa casa de alvenaria, servir nas grandes mansões. Com isso aprendi que tudo que temos é emprestado, porque, ao partirmos desta vida, nada deixamos, a não ser a lembrança, a saudade e a esperança daquilo que conseguimos produzir enquanto estávamos vivos. Desse modo, Jesus nasceu para dar-nos esperança, para que o mundo seja melhor, para que eu, você, nós possamos verdadeiramente ter o espírito fraterno.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/12/1996 - Página 20703