Discurso no Senado Federal

INTERPELAÇÃO AO MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, SR. NELSON JOBIM.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA MINERAL.:
  • INTERPELAÇÃO AO MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, SR. NELSON JOBIM.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/1996 - Página 20308
Assunto
Outros > POLITICA MINERAL.
Indexação
  • INTERPELAÇÃO, NELSON JOBIM, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), AVALIAÇÃO, ATUAÇÃO, GOVERNO, POSSIBILIDADE, GARANTIA, BRASILEIROS, DIREITOS, RIQUEZAS, PAIS.

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador José Sarney, Sr. Ministro da Justiça, Nelson Jobim, não conheço tão de perto quanto os Senadores do Pará o episódio ocorrido em Serra Leste, muito embora compreenda o sentimento de indignação e preocupação que levou, por exemplo, o Senador Ademir Andrade a argüir com tanta veemência, bem como o fato de os Senadores Coutinho Jorge e Jader Barbalho - este último foi quem apresentou o requerimento - terem requerido a presença de V. Exª, hoje, nesta Casa, para expor sobre as razões que levaram o Ministério da Justiça a decretar o despejo de garimpeiros.

Mas eu gostaria de aproveitar esta oportunidade, Ministro Nelson Jobim, para perguntar a V. Exª com respeito a uma questão maior que esse episódio e todos aqueles a que V. Exª mencionou: refiro-me à maneira de como os brasileiros devem ter o direito de usufruir mais eqüitativamente da riqueza de nossa Nação, de nossa terra. Ainda ontem, Dia Internacional dos Direitos Humanos, o Presidente Fernando Henrique Cardoso declarou que as únicas coisas que o Brasil não tolera mais é a miséria e a corrupção.

Passados dois anos do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, eu gostaria de registrar que me preocupa muito a pequena velocidade com que se trata da erradicação da miséria no presente Governo. Em cada episódio, como o do despejo de garimpeiros da Serra Leste, se pensa na questão dos mais destituídos.

Pelo que se pode notar do grande número de pessoas que acorrem a lugares como Serra Leste e Serra Pelada, garimpeiros são sobretudo pessoas que, muitas vezes, não alcançaram outra possibilidade de obter remuneração - obviamente, há aqueles que conseguiram se especializar e ter remuneração e progresso acentuado - e agora estão inteiramente destituídas, sentindo-se praticamente com os direitos obstruídos diante da força de uma Companhia Vale do Rio Doce ou de empresas de mineração. Então, Ministro Nelson Jobim, qual a reflexão que V. Exª, que está por completar a sua gestão, pelo que se anuncia, como Ministro da Justiça, nos deixaria, após dois anos de mandato, no sentido de poderem os brasileiros minimamente usufruir dos direitos sobre a riqueza deste País? A minha pergunta refere-se não apenas aos garimpeiros que V. Exª decretou deveriam ser afastados de Serra Leste; refere-se ao conjunto dos 160 milhões de brasileiros.

Se confirmada a indicação para o Supremo Tribunal Federal, V. Exª deixa o Ministério. V. Exª parece estar disputando com as mulheres a possível indicação, porque as mulheres brasileiras hoje estão a indicar ao Presidente da República que designe uma mulher para o Supremo Tribunal Federal, mas já se anuncia que o Presidente tem o compromisso de honrar um convite formulado a V. Exª.

Pergunto se V. Exª pensou em como assegurar a cada brasileiro o direito de usufruir minimamente da riqueza de nossa Pátria.

O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Concedo a palavra ao Ministro Nelson Jobim.

O SR. NELSON JOBIM (Ministro da Justiça) - Eminente Senador Eduardo Suplicy, em primeiro lugar, esclareço a V. Exª que o Ministro da Justiça não decretou o despejo dos garimpeiros, o Ministério da Justiça apenas deu cumprimento e apoio policial e militar ao Oficial de Justiça do Juiz de Curionópolis, que deu execução a um mandado de interdito proibitório. Não era um mandado de despejo. O mandado não visava retirar os garimpeiros do local. O mandado visava desobstruir as vias de acesso dos trabalhadores da Vale do Rio Doce aos trabalhos de pesquisa e prospecção que eram realizados pela empresa e que haviam sido obstruídos por um grupo de garimpeiros. Ou seja, os garimpeiros que moram em Serra Pelada não foram retirados, não foram despejados. A execução do mandado visava exclusivamente a não obstrução dos trabalhos de sondagem e determinava claramente, eminente Senador, a possibilidade de a Vale e as suas contratadas voltarem a trabalhar. Não houve nenhum despejo. Vamos repetir: o Ministro da Justiça não decretou nenhum despejo de garimpeiros e nem o fez o Juiz de Direito. O Juiz de Direito autorizou e determinou que se desobstruíssem os acessos à Serra Pelada para a Companhia Vale do Rio Doce e seus trabalhadores. Vários trabalhadores da Vale do Rio Doce - V. Exª se referiu a isso - foram presos em cárceres privados por esse conjunto de garimpeiros, em torno de trinta ou quarenta e não era um conjunto de trabalhadores, mas garimpeiros que participavam de um processo de liderança.

Vejam bem, não é despejo, foi desobstrução, interdito proibitório. De um lado, não foi o Ministério da Justiça que o decretou. Foi o Juiz de Direito. Por outro lado, demos execução ao mandado do Juiz de Direito e quem o executou foi o Oficial de Justiça.

Esclarecido isso, quero dizer a V. Exª, em primeiro lugar, que eu refutaria o verbo que usou em relação ao Supremo Tribunal Federal. Como diz o Ministro Paulo Brossard de Souza Pinto, o Supremo Tribunal Federal não é lugar que se dispute. Não há disputa em relação à questão do Supremo Tribunal Federal. Há, sim, uma determinação constitucional de que o Presidente da República indicará um nome para o Supremo Tribunal Federal e esse nome será sabatinado pelo Senado Federal. Então, não há nenhuma disputa, não há nenhuma concorrência, não há nenhuma corrida, não há absolutamente nada disso. Há uma decisão a ser tomada pelo Senhor Presidente da República, no momento oportuno, tendo em vista os interesses da Nação.

Quero dizer a V. Exª também que, não em função da minha saída do Ministério da Justiça, mas a avaliação que faço dos trabalhos desenvolvidos pelo Ministério e pelo Governo são extraordinários. Foi este Governo, Sr. Senador, que enfrentou um tema que os Governos anteriores não enfrentaram e tiveram imensa dificuldade de enfrentar: o tema de virar a página da história do Brasil em relação aos desaparecidos. O Ministério da Justiça o fez e V. Exª participou da votação da lei. Foi este Governo que conseguiu, inclusive no Ministério da Justiça, Sr. Senador, embora talvez não seja do conhecimento da Casa, resolver, nesses dois anos, vinte milhões de hectares de terras indígenas. Estamos trabalhando hoje em 37 milhões de hectares, que correspondem a 44% das terras indígenas no Brasil. Nunca se regularizou tanta terra indígena no País como nesses últimos dois anos.

Conseguimos, eminente Senador, uma mudança substancial do conceito da política penitenciária no Brasil; editamos o Programa Nacional de Direitos Humanos, que tem apoio internacional; há um extraordinário envolvimento do Ministério da Justiça em sérias ações; conseguimos agora intermediar - e o eminente Senador Ernandes Amorim o sabe - a solução do conflito Acre/Rondônia e vamos agora sentar à mesa com os dois Governadores e com os Srs. Senadores para acertar a transição, já que a Ponta do Abunã, ao final, ficou decidido pertencer ao Estado de Rondônia.

Ou seja, Sr. Senador, no que diz respeito aos dois anos de trabalho, eu diria que foram intensos, na área do Direito Econômico, na área dos direitos da criança, na área de direitos humanos, na área policial. Agora, inclusive, o Ministério da Justiça é réu de uma representação judicial oriunda do Estado do Acre, já que o Ministro da Justiça determinou a prisão dos dois fugitivos, que haviam sido condenados no crime Chico Mendes, na prisão da Papuda. Há uma ação contra o Ministério da Justiça por ter determinado o recolhimento dos Alves nessa prisão. Estamos trabalhando junto ao Superior Tribunal de Justiça para resolver.

Então, no que diz respeito ao desempenho do Ministério da Justiça, estamos extraordinariamente satisfeitos. No que diz respeito ao desenvolvimento do País, sim. Observem que o Plano Real e a estabilização econômica têm determinado um aumento substancial do poder aquisitivo da população brasileira. Sabemos que o País é injusto, mas não serão dois anos para conseguirmos resolver essas injustiças. Precisamos de um grande entendimento nacional e acertar as contas do País com o seu futuro.

É bom ter presente, Sr. Senador, que todas as transições políticas que se fizeram no País, desde a transição política que se estabeleceu com a alteração da Constituição de 1824, ou seja, depois da emancipação e da maioridade, todas elas sempre representaram uma retaliação com o passado. Acreditávamos, Sr. Senador, que conseguiríamos conquistar o futuro retaliando o passado e engessando o futuro nas retaliações com o passado.

Este Governo quer exatamente um grande acordo, um acerto de contas do País com o seu futuro e o está fazendo. Estamos trabalhando arduamente, com o auxílio do Congresso, nas reformas necessárias que temos que fazer. V. Exª participou, junto conosco, da elaboração da Constituição de 1988 e sabe exatamente como trabalhamos olhando para o retrovisor, sempre tendo em visto o que aconteceu no passado, para assegurar o futuro, pensando que assim asseguraríamos o desenvolvimento. E o que fizemos foi uma grande partilha do Estado brasileiro, com uma série de personagens e corporações.

Isso tudo temos que rever, mas com uma visão do futuro. O Governo está trabalhando arduamente nesse sentido, tanto é que temos um sucesso relativo no que diz respeito ao desenvolvimento deste País. O Governo caminha para o atendimento do social.

Hoje, inclusive, temos um problema gravíssimo, Sr. Senador, que tem de ser enfrentado pelo País, que são os acidentes de trânsito. O Governo vai enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei, que já foi assinado pelo Presidente da República, de autoria do Ministério da Justiça, proibindo a oferta de bebidas alcoólicas às margens das estradas federais. Ou seja, o Ministério da Justiça e o Governo visam a reduzir, dentro de um processo enorme de campanha em relação aos acidentes de trânsito, as mortes causadas no País. Tenho convicção absoluta de que estamos caminhando.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/1996 - Página 20308