Discurso no Senado Federal

REFLEXÕES SUSCITADAS PELO TRANSCURSO, ONTEM, DO 'DIA MUNDIAL DOS DIREITOS HUMANOS'.

Autor
Emília Fernandes (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • REFLEXÕES SUSCITADAS PELO TRANSCURSO, ONTEM, DO 'DIA MUNDIAL DOS DIREITOS HUMANOS'.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/1996 - Página 20268
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, DIREITOS HUMANOS, OPORTUNIDADE, SAUDAÇÃO, INICIATIVA, ATUAÇÃO, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), COMBATE, EXECUÇÃO, ABUSO, CRIME, HOMEM.

A SRª EMILIA FERNANDES (PTB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria de ter abordado, ontem, o assunto de que vou tratar agora, porque ontem foi o dia dedicado aos direitos humanos.

Mas entendo que este é um tema que não tem data, não tem momento, e em todas as ocasiões é altamente importante relembrá-lo, relembrar que existe uma Declaração Universal dos Direitos Humanos, com seus 30 artigos, que dizem perfeitamente que todas as pessoas nascem livres, com direitos iguais de liberdade de expressão, de propriedade, de opinião e, principalmente, que num espírito de solidariedade e de fraternidade devem buscar o respeito, a remuneração condigna, a educação, enfim, todos aqueles direitos que as pessoas expressamente já conhecem.

Por isso, também gostaríamos de nos associar à reflexão que o Dia Mundial dos Direitos Humanos, transcorrido ontem, suscita em cada um, para dar a nossa contribuição.

Em primeiro lugar, gostaria de saudar aqueles que, das mais variadas formas, e em todas as regiões do mundo, têm trabalhado para transformar a sociedade, buscando torná-la mais justa, mais igualitária e, conseqüentemente, mais humana.

Muito têm se destacado nesta luta, especialmente entidades, com destaque para a Ordem dos Advogados do Brasil e para a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, além de diversas organizações não-governamentais, que denunciam e exigem punição para os abusos e crimes contra os direitos humanos.

Mas, de forma especial, e simbolizando todos, destaco a figura incansável de Betinho, que, nestes últimos anos, tem sintetizado o compromisso mais amplo de todos os brasileiros em favor da vida, da cidadania plena e do amor à humanidade.

Até pouco tempo atrás, tratávamos este assunto, até mesmo por absoluta necessidade, quase que exclusivamente do ponto de vista dos direitos políticos, desrespeitados em um grande número de países, especialmente em nossa América Latina e no Brasil.

Incontáveis foram as vezes que, como professora, militante sindical e vereadora, em minha cidade, Sant´ana do Livramento, participei de atos, campanhas e mobilizações em defesa da anistia, das liberdades democráticas e do direito ao voto para todas as instâncias do poder político.

O Rio Grande do Sul tem uma história de resistência às injustiças, de espírito público e coletivo e de respeito à Pátria, características que, a meu ver, traduzem o compromisso maior dos indivíduos com os direitos humanos.

Hoje, resgatada a democracia formal, é preciso que cada um dos brasileiros se coloque a tarefa de avançar para assegurar a vigência plena dos direitos humanos, que, em sua verdadeira essência, deve ter um conteúdo social, político e econômico.

É hipocrisia falarmos em direitos humanos quando existe, atualmente, um bilhão de pessoas no mundo sem emprego, representando cerca de 30% da força de trabalho, segundo estudos divulgados recentemente pela OIT, Organização Internacional do Trabalho. 

Aliada a essa realidade, também segundo a OIT, cada vez mais sombria, está a tendência à desigualdade nos salários, que faz aumentar dramaticamente a concentração de renda mundial, item no qual o Brasil, de acordo com pesquisa da ONU, ostenta um vergonhoso primeiro lugar.

Sem direito a emprego e exploradas, essas pessoas, das quais um grande número se encontra no Brasil, em percentuais cada vez mais crescentes, não têm direito à alimentação, à moradia, à educação, à saúde, à cultura, estando, portanto, afastadas das mínimas condições humanas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é o que ainda verificamos em nosso País, onde, apesar dos resultados obtidos com a estabilização da moeda, a sociedade carece de atendimento digno à saúde, de acesso à educação, do direito à terra, de igualdade de gênero, de respeito à infância, de empregos e salários dignos.

É uma agressão aos direitos humanos, às vésperas do Século XXI, assistirmos a morte de recém-nascidos e de idosos em maternidades e clínicas, como se verificou nestes últimos meses, pela insensibilidade do poder público ou pela irresponsabilidade da iniciativa privada.

Os direitos humanos também estão sendo profundamente desrespeitados quando temos milhares de meninas sendo exploradas sexualmente; ou, ainda, quando cerca de 7 milhões de crianças, no Brasil, são submetidas a trabalho praticamente escravo e insalubre; e outro tanto não tem acesso à escola ou não consegue concluir os seus estudos satisfatoriamente.

Da mesma forma, é preciso superar a discriminação racial e de gênero, que impede um contingente enorme da população de contribuir para o desenvolvimento do País e de ter acesso a uma vida condizente com os direitos humanos em sua plenitude.

É ainda fundamental assegurar a garantia do direito de produzir, que inclui o acesso ao crédito, atualmente prejudicado pelas excludentes e extorsivas taxas de juros, que afastam vastos setores do processo de desenvolvimento e de melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.

A atual crença de que o desemprego e as mazelas decorrentes dele são uma conseqüência natural e inevitável das forças de mercado, apregoada pelo neoliberalismo internacional, é tão grave quanto foram graves as atrocidades cometidas pelas ditaduras no campo político.

Uma organização social, política e econômica nacional ou mundial que convive com essa situação ou que promove o seu recrudescimento é inteiramente contraditória com o desenvolvimento da humanidade e, portanto, com o respeito aos direitos humanos.

As autoridades, especialmente, precisam incorporar em suas decisões de Governo, além das questões políticas, os fatores sociais e econômicos, como parâmetros de vigência de plenos direitos humanos, sob pena de incorrerem nos mesmos erros do passado recente.

Além de impedir, ou pelo menos de punir, crimes como o assassinato de sem-terras, em Corumbiara e em Eldorado dos Carajás, por exemplo, é preciso dar respostas ao massacre diário de crianças, de idosos, de desempregados, de produtores, de homens e mulheres, desrespeitados em seus direitos, sob os mais variados aspectos.

É com esse sentimento, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que, pelo transcurso no dia de ontem, 10 de dezembro, do Dia Mundial dos Direitos Humanos, somamo-nos e reafirmamos nosso compromisso com os direitos humanos universais. Que o conjunto da Humanidade seja o centro do processo de desenvolvimento, e não apenas alguns detentores do poder econômico e político.

Era o que tínhamos a registrar, Sr. Presidente.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/1996 - Página 20268