Discurso no Senado Federal

REFERENCIAS AO PRONUNCIAMENTO DO SENADOR SEBASTIÃO ROCHA, MOSTRANDO O CARATER POLITICO DO MOVIMENTO DOS SEM-TERRA. INVASÕES DESCABIDAS E IRRESPONSAVEIS DE SEDES DO INCRA. IMPASSE EM TORNO DA QUESTÃO DA REELEIÇÃO. REITERANDO O APOIO AO MOVIMENTO PELO PLEBISCITO OU REFERENDO, RELATIVAMENTE A REELEIÇÃO.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • REFERENCIAS AO PRONUNCIAMENTO DO SENADOR SEBASTIÃO ROCHA, MOSTRANDO O CARATER POLITICO DO MOVIMENTO DOS SEM-TERRA. INVASÕES DESCABIDAS E IRRESPONSAVEIS DE SEDES DO INCRA. IMPASSE EM TORNO DA QUESTÃO DA REELEIÇÃO. REITERANDO O APOIO AO MOVIMENTO PELO PLEBISCITO OU REFERENDO, RELATIVAMENTE A REELEIÇÃO.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Josaphat Marinho, Sebastião Bala Rocha.
Publicação
Publicação no DSF de 25/01/1997 - Página 3092
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA. REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • DISCUSSÃO, ANALISE, SEBASTIÃO ROCHA, SENADOR, POSIÇÃO, POLITICA, MOVIMENTO TRABALHISTA, SEM-TERRA, OPINIÃO, ORADOR, PREJUIZO, ESTABILIDADE, GOVERNO.
  • APOIO, PROPOSTA, PLEBISCITO, DEFINIÇÃO, REELEIÇÃO, DEFESA, DEMOCRACIA, CONSULTA, POPULAÇÃO.
  • ANALISE, TRANSFERENCIA, CONGRESSO NACIONAL, DECISÃO, REELEIÇÃO, POVO.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de me reportar ao assunto que me trouxe à tribuna, não posso deixar de fazer menção ao discurso do Senador Sebastião Rocha.

Senador Sebastião Rocha, V. Exª não é ingênuo e não tem o direito de pensar que os outros Senadores o são. Vamos separar as coisas? Existe um movimento social, um problema social grave, que é a má distribuição da propriedade fundiária no Brasil. O Governo está dando passos no sentido de resolver o problema da reforma agrária, muito complexo e muito oneroso, assim como o Congresso, com a aprovação, recentemente, de várias leis. O problema está sendo encaminhado.

Porém, vamos separar as coisas: há os trabalhadores sem terra, de um lado, e o Movimento dos Sem-Terra de outro, que, inequívoca e inegavelmente, de forma transparente, é um movimento político radical de esquerda, que, a esta altura, é contra a privatização da Vale, é contra o neoliberalismo e é contra a reeleição de Fernando Henrique Cardoso. Não é um movimento social, não; é um movimento político-ideológico, que sonha, utopicamente, com a instauração de um Estado marxista-leninista no País.

É isto que ocorre tranqüilamente, não sejamos ingênuos. Sou honesto, mas não sou tolo!

O Sr. Sebastião Rocha - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo-lhe um aparte, com prazer.

O Sr. Sebastião Rocha - Esse é um tema muito polêmico, Senador Jefferson Péres.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Não, não é polêmico não; o movimento é mesmo político! Não há polêmica, não há dúvida quanto a isso.

O Sr. Sebastião Rocha - Sabemos que o povo, em geral, precisa de líderes, e o Movimento dos Sem-Terra consegue aglutinar os líderes para coordenar aqueles que não têm terra, que não têm emprego, que não têm estudo, que não têm saúde, que não têm nada. Estes, se não forem liderados por alguém, jamais lutarão pelos seus direitos. Daí a importância dessa coordenação, que tem sim a sua conotação política, mas necessária, para conduzir aqueles que nada têm - nem informação, nem educação, nem saúde, nem terra, nem emprego, nem nada! Por isso, continuo garantindo que, sob o meu ponto de vista, o Movimento dos Sem-Terra é importante e tem uma amplitude social muito grande para o nosso País.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ai do Governo se se acovardar diante da chantagem dessas lideranças, que não querem solução nenhuma!

O Sr. Eduardo Suplicy - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Senador Suplicy, concedo-lhe um aparte com todo prazer, mas peço a V. Exª que seja breve, porque pretendo tratar de outro assunto.

O Sr. Eduardo Suplicy - V. Exª introduziu com tal força esse tema, que é tão interessante, que me sinto na obrigação de partilhar da sua reflexão.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Fico indignado quando me tomam por ingênuo, Senador Suplicy, e eu não o sou!

O Sr. Eduardo Suplicy - V. Exª não é absolutamente ingênuo; ao contrário, sabe muito bem das coisas e exercita, com extraordinária acuidade, seriedade, ganhando o respeito de todos, o seu mandato de Senador. V. Exª demonstra uma formação que compreende o mais largo espectro político. E, pelo que aqui pude conhecer até hoje, certamente V. Exª leu Marx, Lênin e conhece Che Guevara.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Minha origem é de esquerda, Senador.

O Sr. Eduardo Suplicy - V. Exª hoje está num partido socialdemocrata e trata de todos os aspectos de luta pela democracia, pela cidadania. V. Exª, como um Senador, representante do povo, sabe como é importante tratar dos mais variados assuntos sobre a questão da terra ou do que hoje tanto incomoda e chama a atenção das energias da Presidência da República, que é a reeleição. Senador Jefferson Péres, avalia V. Exª que os trabalhadores que pertencem ao Movimento dos Sem-Terras só podem tratar da questão da terra ou são eles cidadãos brasileiros, que podem se incomodar, assim como V. Exª, com a questão da democracia ou da reeleição?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ingressem em partidos políticos para isso! Existem Casas Legislativas e partidos políticos para essa finalidade.

O Sr. Eduardo Suplicy - Mas por que eles não podem opinar como cidadãos?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Não são os cidadãos, é o movimento. Não são os trabalhadores sem-terra. Esses são cidadãos e podem opinar.

Trata-se de um movimento político, caracterizadamente político, cujo objetivo é desestabilizar o Governo. O Governo não pode ceder à chantagem de invasão de prédios públicos.

Nunca iremos concordar com isso. Gosto muito de concordar com V. Exª, mas, neste ponto, nunca chegaremos a um acordo!

O Sr. Eduardo Suplicy - Senador Jefferson Péres, saudavelmente, não me importo em divergir de V. Exª. Creio que isso é importante. Porém, eu gostaria de ponderar em relação àqueles que estão dizendo que o Movimento dos Sem-Terra não pode tratar de outro assunto que não seja a questão da terra. Imagine um movimento que tem a finalidades de organizar os trabalhadores sobre a questão da terra estar agora opinando sobre outros assuntos, como se não fosse próprio de trabalhadores tratar de outros assuntos! Como se isso fosse privilégio apenas de quem ocupa a Presidência, uma senatoria ou a Câmara dos Deputados. Por que somente alguns cidadãos podem tratar desses assuntos e outros não? Não há nenhum dispositivo na Constituição brasileira que determine a filiação de um cidadão a um partido político para que ele possa manifestar-se sobre reeleição ou sobre a Vale do Rio Doce. Não há obrigação, Senador Jefferson Péres, não há proibição constitucional a qualquer cidadão pelo fato de pertencer a um movimento. Pode ser qualquer um: sindicato, igreja ou Assembléia de Deus. E será que essa pessoa, por pertencer a essa ou àquela igreja, não poderia estar refletindo sobre a conveniência da privatização da Vale do Rio Doce ou da reeleição? Essa é a ponderação que faço com o maior respeito e amizade a V. Exª.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Senador Eduardo Suplicy, se o Movimento dos Sem-Terra fosse dirigido por correligionários meus, do PSDB, e quisessem fazer um movimento pró-reeleição, eu seria o primeiro a pedir: "Não misturem as coisas, tratem da terra e deixem a reeleição para outros segmentos sociais".

Sr. Presidente, Srs. Senadores, infelizmente, em política, as versões e interpretações tendem a ter mais impacto do que os fatos e as boas intenções. E, hoje, o impasse nas negociações em torno da reeleição suscita na opinião pública a suspeita de que as grandes decisões nacionais venham a ser adiadas, descaracterizadas e apequenadas pela sanha de interesses subalternos e de projetos pessoais.

A meu ver, esse clima adverso à credibilidade das instituições e dos atores políticos já está provocando uma saudável reação dos homens públicos, cientes das responsabilidades e dos riscos da hora presente. Assim, em muitos partidos políticos, inclusive de Oposição, cresce a idéia da consulta popular, sob a forma de plebiscito ou referendo, como alternativa capaz de desatar o nó da reeleição. Liderado por figuras das mais expressivas, como o Deputado e ex-Senador, ex-Ministro e ex-Governador Franco Montoro, um dos quadros políticos mais respeitados deste País, esse movimento, como disse, não pára de receber adesões de parlamentares de todos os partidos na Câmara e no Senado.

Como já fiz antes, reitero o meu apoio a essa proposta, e, como exige o senso de responsabilidade política e honestidade intelectual, convido os Srs. Senadores a uma serena reflexão sobre as objeções comumente levantadas contra a consulta popular direta no caso da reeleição.

A primeira dessas objeções, de ordem institucional, enfatiza os perigos de a prática plebiscitária se tornar rotineira, solapando os próprios fundamentos da democracia representativa. A isso eu responderia com judiciosos argumentos de Norberto Bobbio, hoje uma das mais cintilantes estrelas do mundo acadêmico no campo da Ciência Política. Segundo Bobbio, o avanço da consciência democrática contemporânea é caracterizada pela articulação cada vez mais íntima e harmoniosa entre os institutos da democracia representativa e da chamada democracia direta. Na verdade, a onipresença, a rapidez e sofisticação dos meios de comunicação tendem, cada vez mais, a anular o diferencial de conhecimento e informação que antes justificava a delegação de todas as decisões importantes da comunidade a uma reduzida camada de representantes eleitos. Esse, aliás, é o "mote" de um interessante estudo na edição de Natal e Ano Novo do semanário The Economist, de Londres, cuja leitura eu recomendaria a todos os meus Colegas de Senado.

Cumpre acrescentar que a nossa Constituição de 1988 reconhece a legitimidade de mecanismos como a iniciativa popular, o plebiscito e o referendo em questões de magno interesse nacional, a exemplo da consulta que tivemos em 1993 sobre forma e sistema de governo. Diante do impasse atual que ameaça paralisar o processo decisório, com graves riscos para os interesses nacionais, penso que deve caber ao povo a palavra final sobre a reeleição.

A segunda objeção de natureza política é freqüentemente agitada por aliados do Governo Fernando Henrique, temerosos de que as campanhas de mobilização e esclarecimento, prévias à realização da consulta, forneçam um palanque eletrônico diário aos adversários do seu Governo. A oposição, de acordo com esse raciocínio, ocuparia o horário gratuito no rádio e na TV para sublinhar deficiências e insucessos na condução das políticas públicas da Administração Federal e o sucesso do Plano Real seria empanado por essa avalanche de críticas e denúncias.

Sinceramente, não posso concordar com essa posição que, além de oportunística, me parece também infundada. O Plano Real tem mais de dois anos e, durante esse tempo, sondagens de opinião conduzidas nacionalmente por institutos idôneos confirmaram a linha ascendente da popularidade do Presidente da República e de sua administração. A população que o elegeu foi capaz de aprender com os erros do passado recente e sabe que o Presidente não é santo milagreiro e que ninguém, sozinho e em pouco tempo, dará solução integral e definitiva a distorções e injustiças que se acumulam, em muitos casos, há séculos. Importante mesmo é o apoio que confere legitimidade a uma diretriz geral de Governo e a um processo de reforma dividido em várias etapas. E esse apoio o Presidente Fernando Henrique parece ter de sobra. Daí, justamente, as manifestações de muitos de seus opositores.

E mais: estou convencido de que os debates públicos com a oposição darão ao Presidente - professor, conferencista e tribuno de reconhecida habilidade - a chance de esclarecer o povo quanto aos aspectos essenciais das propostas de reforma tributária, previdenciária e administrativa ainda hoje mal compreendidos e assimilados, o que pode até mesmo explicar as resistências, incertezas e hesitações que têm emperrado sua tramitação no Legislativa.

Por último, quero rebater as objeções de ordem econômica ao desencadeamento de um debate nacional com vistas à consulta popular. Autoridades, técnicos do Governo e líderes empresariais temem que isso venha a paralisar o País, inibindo investimentos domésticos e externos, provocando incertezas no mercado financeiro e desviando as atenções e energias dos policy-makers, dos homens de negócios e dos trabalhadores, de suas obrigações e deveres para uma estéril discussão política.

A experiência dos anos recentes já deveria ter ensinado a todos que nada é pior para os negócios do que o prolongamento indefinido dos impasses políticos. Os consultores em administração de empresa não se cansam de repetir em seus livros e palestras que o enfrentamento destemido das crises é o caminho para o sucesso.

De mais a mais, os variados indicadores de retomada do crescimento, a criatividade comprovada de nossos pequenos, grandes e microempresários, a inventividade do trabalhador brasileiro e as imensas potencialidades da economia são garantias mais do que suficientes de que o Brasil seguirá em frente qualquer que seja o desfecho da consulta que defendemos.

A proposta de plebiscito ou referendo surge precisamente para minimizar os custos econômicos, políticos, sociais e éticos da decisão nacional sobre um tema que, independentemente da vontade e dos desejos deste ou daquele, capturou a agenda das discussões públicas e dela não sairá até que receba uma solução condizente com a vontade popular.

Sr. Presidente, para mim tanto faz que a fórmula seja a do plebiscito ou a do referendo. Objeta-se, quanto ao plebiscito, a idéia, a meu ver esdrúxula, de que não teria força mandatória.

O eminente Deputado Almino Affonso, meu correligionário e conterrâneo do Amazonas - ora integra a representação de São Paulo - é autor de um excelente projeto que dispõe sobre a regulamentação da consulta popular. Num impresso recém-editado, contesta esse temor de que o plebiscito não teria força mandatória com o seguinte argumento, a meu ver, de uma força que não admite contestações. Diz S. Exª :

      "Não faltam os que, de maneira apressada, considerem o plebiscito uma desnecessidade, tendo em vista que - segundo pensam - sua decisão não obrigaria o Congresso Nacional a cumpri-lo. Quando muito, valeria como um indicador político da vontade popular, que os parlamentares acatariam ou não. O absurdo é evidente. De fato, se fosse assim, bastaria uma pesquisa de opinião pública, seguramente menos dispendiosa e menos frustrante para o povo. Na verdade, plebiscito e referendo - na doutrina e no Direito Comparado - são institutos cujos alcances variam de país a país, na simples conceituação e na normatização jurídica.

      Seguindo essa linha de pensamento, sustento que o plebiscito é a consulta que se formula ao povo, em casos de relevância nacional, sobre matéria legislativa, constitucional ou administrativa, antes que as medidas respectivas sejam adotadas, cuja resposta dada nas urnas tem força decisória."

Do contrário, não faria nenhum sentido que o Congresso Nacional - e só o Congresso pode fazê-lo - convocasse um plebiscito, atribuindo-se a faculdade de cumprir ou não a decisão do povo. Evidentemente, o Congresso, ao convocar a população para se manifestar, previamente estaria assumindo o compromisso de cumprir essa vontade.

O Sr. Josaphat Marinho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo-lhe o aparte com muito prazer, Senador Josaphat Marinho.

O Sr. Josaphat Marinho - Nobre Senador Jefferson Péres, em primeiro lugar, quero declarar que estou de acordo com V.Exª no que diz respeito à conveniência da consulta ao povo. Mas, diversamente do seu pensamento, distingo a oportunidade ou a conveniência entre o plebiscito e o referendo. Tenho a impressão de que o plebiscito limita a competência do Congresso, por assim dizer, subverte-a. Temos, pela Constituição, o poder de emendá-la para dar ou não dar a reeleição. Essa é uma competência do Congresso. O Congresso deve exercê-la. Se ao invés de exercê-la o Congresso previamente apela para o plebiscito, primeiro está fugindo à responsabilidade de decidir; em segundo lugar, está criando uma restrição à sua competência. Se a Constituição permite também o referendo, parece-me que o correto será esse caminho. O Poder Legislativo decide, isto é, assume a responsabilidade de opinar, cumpre a competência que a Constituição lhe dá e pede ao povo que diga se está ou não de acordo. Essa fórmula parece muito mais lógica, muito mais compatível com o mecanismo do regime. Ninguém abdica de competência e ninguém deixa de auscultar a opinião coletiva, sobretudo porque não há pressa, urgência, na decisão da matéria, já que a eleição só se dará no fim do ano de 1998. Muito obrigado a V.Exª.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Ilustre Senador, pediria a benevolência de V. Exª, já que a sessão está vazia e o tempo não é premente.

O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - A Mesa dará a V. Exª mais cinco minutos para concluir o seu pronunciamento.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Senador Josaphat Marinho, em grande parte concordo com V.Exª. Não há dúvida de que o Congresso tem poder legal e legitimidade para aprovar ou não a reeleição, mas consideremos os seguintes aspectos, Senador: a questão é altamente polêmica, em primeiro lugar; segundo, será a quebra de uma tradição republicana - não é cláusula pétrea, mas é uma tradição republicana, porque nunca houve reeleição, salvo em casos excepcionais, como no Rio Grande do Sul, de Borges Medeiros, e vimos no que deu -, e, terceiro, tem um componente de casuísmo se valer para os atuais mandatários. Creio que o Congresso aprovar a reeleição e já assegurar aos atuais detentores do Poder Executivo o direito de se candidatarem tem um inegável componente casuístico.

Nesse caso, por que não transferir a decisão para a fonte única de poder, da qual derivamos, para decidir sobre isso? Creio que o pecado original do casuísmo estaria lavado pelas águas lustrais da manifestação popular.

O Sr. Josaphat Marinho - Aquiesço das suas ponderações, em princípio, mas me permita dizer-lhe que, primeiro, o Congresso pode, originariamente, recusar a decisão. Em segundo lugar, o Congresso pode votar a reeleição, proibindo-a para os atuais ocupantes do Poder, e o casuísmo não prevaleceria.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Sim, mas, nesse caso, por que o Congresso, então, não usa a Emenda Miro Teixeira? No caso de se aprovar a reeleição, submeter o direito de concorrer dos atuais ocupantes, isto sim, à consulta popular?

Por que negar isso, nobre Senador Josaphat Marinho, aos atuais ocupantes do Poder? E repito o que já disse aqui, estou legislando contra mim mesmo, porque, caso seja candidato ao Governo do Amazonas, irei enfrentar o atual Governador. Se me movesse por interesse pessoal, casuisticamente, seria contra a reeleição, porque no caso do Amazonas ela me prejudica.

Considero um casuísmo o Congresso Nacional aprovar a reeleição para os atuais ocupantes do Poder, mas por que negar a eles, nobre Senador?

O Sr. Josaphat Marinho - Não quero perturbá-lo, pois seu tempo é curto. Em primeiro lugar, não aprecio a emenda que se discute na Câmara e nem as variantes em torno dela. Em segundo lugar, poderia negar a reeleição, porque é como V. Exª disse: permiti-la aos atuais ocupantes é casuísmo.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Mas, se o povo se manifestar a favor, por que negaríamos aos ocupantes esse direito, respaldados pela manifestação popular, nobre Senador Josaphat Marinho? Sejamos democratas.

O Sr. Josaphat Marinho - É tão cintilante a sua presença na tribuna, que me animo, ainda, a interrompê-lo. O problema é que o povo não está devidamente informado para discutir, em forma originária, esse problema. Temos que examinar isso tendo em vista as peculiaridades do Brasil. O conjunto do povo ainda não está devidamente politizado. Só nos grandes centros isso se opera, mas ao longo do interior do País isso não se verifica. Então, devemos primeiro decidir, para que depois, então, o povo, esclarecido quanto possível pelas próprias discussões em torno da matéria, possa opinar.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Olhe que esse seu raciocínio é perigoso. Acabará como o Pelé: "O povo não sabe votar".

O Sr. Josaphat Marinho - Não estou dizendo que o povo não sabe votar, estou apenas acentuando que o povo não está devidamente esclarecido para a apreciação desses problemas políticos que envolvem matéria de Sociologia e de caráter técnico.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Mas haveria uma campanha de um mês, na televisão, com tempos iguais para os dois lados.

O Sr. Josaphat Marinho - Eminente colega, quem vai usar a televisão, quem vai fazer dela privilégio é o Governo.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Não. Na campanha para o plebiscito seriam tempos iguais para os favoráveis e os contrários à reeleição.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V.Exª um aparte, nobre Senador Jefferson Péres?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Cedo-lhe o aparte, nobre Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Senador Jefferson Péres, quero, neste aparte, dizer que estou de pleno acordo com V.Exª. Avalio que as suas ponderações e recomendações são corretas. A consulta popular seria a maneira de dirimir dúvidas sobre essa questão e faria com que o povo pudesse ser inteiramente esclarecido, inclusive sobre os procedimentos que hoje estão a desgastar o Palácio do Governo, em função deste só estar pensando nisso, coordenando esforços, procurando beneficiar este ou aquele interesse de Parlamentares ou de Partidos políticos, para conseguir a meta da aprovação da reeleição, por métodos que acabarão sendo, inclusive, objeto do esclarecimento de debate político por ocasião da campanha do referendo, se for esse o caminho a ser adotado. Avalio que, uma vez que a Constituição prevê tanto o referendo quanto o plebiscito, ambos são igualmente legítimos. Poderá haver vantagens de um e desvantagens de outro. Pessoalmente, tenho preferência pelo plebiscito, porque estaria a campanha de esclarecimento se realizando de forma diferente do que a que estamos vendo atualmente, quase que de forma unilateral, com os Institutos do PSDB e do PFL a realizar campanhas caras, com o ponto de vista a favor da reeleição e sem que haja o debate com igualdade de condições para ambos os lados. Ou o plebiscito, ou o referendo. Também apóio a idéia do referendo, não com o sentido tal como o Deputado Miro Teixeira tentou convencer a alguns, de que votássemos a favor desde que pudesse haver o referendo. Nós, do Partido dos Trabalhadores, estamos convencidos de que não é saudável para a democracia a introdução do princípio da reeleição, mas admitimos e consideramos que só a consulta popular é que poderá dar legitimidade a essa questão, inclusive se convém ou não o direito de reeleição; se convém ou não o direito de reeleição para cada um dos níveis - prefeitos, governadores e presidente -; se convém ou não a desincompatibilização de mandato de quem esteja no Poder ou para os atuais mandantes de governo. Nesse caso, apóio inteiramente a reflexão de V. Exª.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Não há discrepância, neste particular, entre nós, Senador Eduardo Suplicy.

Encerro o meu pronunciamento, Sr. Presidente. Obrigado pela tolerância que teve para comigo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/01/1997 - Página 3092