Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÕES DE S. EXA. COM O CRESCENTE DEFICIT NA BALANÇA COMERCIAL BRASILEIRA E A SUPERVALORIZAÇÃO DO REAL EM RELAÇÃO AO DOLAR.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • PREOCUPAÇÕES DE S. EXA. COM O CRESCENTE DEFICIT NA BALANÇA COMERCIAL BRASILEIRA E A SUPERVALORIZAÇÃO DO REAL EM RELAÇÃO AO DOLAR.
Publicação
Publicação no DSF de 03/04/1997 - Página 6907
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • NECESSIDADE, ADOÇÃO, GOVERNO, PROVIDENCIA, PROMOÇÃO, EXTINÇÃO, DESEQUILIBRIO, BALANÇO, PAGAMENTO, AUMENTO, EXPORTAÇÃO, COMBATE, CRESCIMENTO, DEFICIT, BALANÇA COMERCIAL, GARANTIA, MANUTENÇÃO, PLANO, ESTABILIZAÇÃO, ECONOMIA, CONTENÇÃO, INFLAÇÃO, PAIS.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o plano de estabilização da economia, que introduziu uma nova moeda, o Real, e resultou no arrefecimento do violento processo inflacionário em que vivia o Brasil, possui os mais diversos méritos. Proporcionou distribuição de renda, aumentou o consumo das classes menos favorecidas e permitiu aos brasileiros o milagre de cada um poder planejar a sua vida.

A economia nacional ficou parecida com a economia dos países de Primeiro Mundo, nesse aspecto. Os produtos passaram a ter um preço conhecido e os consumidores adquiriram a capacidade de pesquisar, negociar e pechinchar.

Vende mais aquele que colocar no mercado produto de alta qualidade, com menor preço. A concorrência se estabeleceu e os comerciantes foram obrigados a criar mais oportunidades para o consumidor.

Novas linhas de crédito ficaram disponíveis e hoje o brasileiro dispõe de enormes facilidades para adquirir bens. Os produtos alimentícios conheceram uma fase excepcionalmente favorável. O brasileiro mais pobre está, com toda certeza, comendo melhor. As conseqüências do Plano Real são favoráveis sob os mais diversos aspectos e as mais diferentes observações.

A dúvida que remanesce, de maneira insistente e intrigante, é se estamos todos diante de uma miragem ou de um projeto auto-sustentável.

Os economistas, quando em função de governo no Brasil, tendem a transformar o país num vasto laboratório. Fazem experiências, providenciam testes, mexem nas leis, nos indicadores, nos conceitos estabelecidos, e quando os resultados são desfavoráveis arranjam algum bode expiatório e assumem o cargo de consultores de grandes empresas.

Os testes são, usualmente, realizados no grande laboratório chamado Brasil. Entre 1980 e 1994, tivemos mais de cinco moedas, número semelhante ao dos planos econômicos, todos rigorosamente frustrados. Mudou-se o nome da moeda brasileira com a facilidade de quem troca de roupa.

Nada funcionou. Algumas variáveis, no entanto, persistiram. O sistema financeiro continuou a realizar grandes lucros e o aparelho de Estado não conseguiu reduzir suas despesas.

A situação atual do plano de estabilização financeira empregado no Brasil preocupa por causa dos grandes e sucessivos déficits existentes no balanço de pagamentos. Até as pedras das ruas sabem que o Real está sobrevalorizado em relação ao dólar. Os brasileiros enfrentam dificuldades para exportar e desfrutam de facilidades para importar.

O professor Álvaro Antônio Zini Júnior, em recente artigo na Folha de S. Paulo, aponta o problema e diz: "Tivemos um déficit em conta corrente de US$18 bilhões, em 1995, mais de US$23 bilhões, em 1996, e se projeta um déficit entre 26 e 29 bilhões em 1997". Entre três anos, o passivo externo do Brasil terá aumentado em quase R$70 bilhões!

A seguir nesse caminho, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil estará comprometendo o seu futuro.

As facilidades de hoje serão pagas amanhã, depois que se instalar aqui uma crise semelhante àquela que viveu o México. Os economistas do Governo possuem a faculdade de falar muito e dizer pouco. Até agora, não conseguiram explicar de maneira convincente a significativa queda nas exportações brasileiras.

Antes, mesmo diante de todos os problemas de tecnologia industrial, o Brasil conseguia realizar superávits nas suas transações com o exterior. Agora, com moeda nova, estabilidade e ambiente político tranqüilo, os brasileiros estão precisando se endividar, em níveis alarmantes para movimentar o seu comércio.

É evidente, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que algo está errado. As palavras dos técnicos não são suficientes para esconder essa realidade. O Plano Real, como salientei no início, trouxe diversas oportunidades novas para os brasileiros. Mas, se o País enfrentar uma crise semelhante àquela ocorrida no México, todas as vantagens de agora vão escorrer pelo ralo da história.

Nestes tempos de globalização, não faz sentido o Brasil, depois de tantas frustrações originárias da área econômica, experimentar um novo pesadelo na forma de inflação e recessão. Não é o que queremos.

É preciso enfrentar a situação e realizar as mudanças no momento certo. O Presidente da República tem obtido deste Congresso as reformas solicitadas. Deputados e Senadores entregaram ao Chefe do Governo tudo aquilo que ele demandou, inclusive, recentemente, a aprovação, na Câmara dos Deputados, da emenda constitucional que permite a reeleição.

A soma de responsabilidade do Governo Fernando Henrique é proporcional a seus ganhos. A atual administração teve e tem a seu dispor todos os mecanismos para lidar com as crises institucionais, políticas e econômicas.

A questão cambial é séria. Se não for tratada e solucionada no momento certo, asfixia o País, derruba governos, arrasa biografias, destrói reputações.

Nenhum país que passou por essa provação saiu ileso. Ninguém é igual no dia seguinte. Os números são eloqüentes. Eles dizem por si. Gritam. Mostram a enormidade do endividamento externo, na casa de US$70 bilhões, que o Brasil está contratando no curtíssimo período de três anos. A globalização, neste particular, está punindo a economia brasileira.

Há outro aspecto a que pretendo me referir, pela sua relevância. É o desemprego. Apenas na terceira semana do mês de janeiro de 1997, segundo dados da FIESP, foram dispensados 3.212 trabalhadores da indústria de São Paulo.

Naquele mês, foram demitidos 9.431 trabalhadores. E no ano, de janeiro de 1996 a janeiro de 1997, foram extintas 164.931 vagas de trabalho na indústria.

Há inclusive justificativa, Sr. Presidente, cada vez que importamos estamos gerando emprego no exterior e "matando" emprego no nosso País. Isso não quer dizer que não devamos importar, às vezes, a importação faz baratear o produto interno. Tanto isso é verdade que só os serviços continuam muito caros, o restante, vestuário, comida e objetos em geral já diminuíram pela fator da concorrência. Mas tudo tem de ser dentro de parâmetros controlados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é confortável fazer previsões catastróficas. Mas pior que fazer previsões é acertá-las.

Há nuvens negras se formando no horizonte da economia brasileira. Até os olhos menos sensíveis percebem a ameaça que lentamente vai se montando, cercando e envolvendo a economia nacional. Estamos todos vivendo uma séria crise de desemprego, causada pela automação, pela competição violenta, - fenômenos mundiais - e, sem dúvida, pela queda nas exportações.

É óbvio que todo país quer exportar. Infelizmente, nós não estamos tendo competência para exportar como deveríamos. Ainda ontem li - e isso será objeto de um futuro pronunciamento - a legislação de telecomunicações dos Estados Unidos. Ali estão as atribuições do Presidente da República, dizendo o que é que ele tem que fazer para aumentar as exportações e até para punir os países que não compram seus produtos na área de telecomunicações. No Brasil, estamos muito descansados.

Ao lado disso, os persistentes déficits nas transações com o exterior sugerem que, algum dia, esse estado de coisas vai colocar o Brasil numa situação semelhante a que ele já viveu em 1982.

Naquele ano, no mês de setembro, os chamados países credores decidiram parar de conceder empréstimos aos países que possuíam grande volume de endividamento externo. Ao mesmo tempo, decidiram reclamar o pagamento do que havia sido emprestado.

Por essa razão, aquele período ficou conhecido como "o setembro negro". A partir de então os economistas passaram a imaginar todas as fórmulas possíveis para contornar aquela situação de fato.

Naquela época, o Brasil caminhou para uma moratória internacional, pelos diversos planos econômicos, por várias moedas. Nada apresentou de resultados positivos nesse passado. "O setembro negro" provocou, dentro do Brasil, uma violentíssima inflação.

O período foi de uma recessão profunda e gerou o que os estudiosos chamam de década perdida. Nos anos 80, no Brasil, não foi gerada riqueza alguma. Ao contrário, sugaram o pouco do que havia sido acumulado.

Esse foi o período, também, em que os brasileiros começaram a deixar o Brasil. Antes, todos os países do mundo "exportavam" pessoas para o Brasil; todos queriam vir para o Brasil. Foi nessa década que mandamos um milhão e setecentos mil brasileiros para fora do País por falta de emprego e oportunidades. Hoje há grandes comunidades de brasileiros nos Estados Unidos, no Japão e em diversos pontos da Europa.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os riscos de um erro na condução da política econômica são imensos. Os brasileiros já sabem o que é recessão, inflação e experimentaram a combinação daqueles dois fenômenos perversos. Aqui houve recessão e inflação ao mesmo tempo.

O Brasil foi também o País que conseguiu um recorde pouco invejável: é a economia que sobreviveu a um processo inflacionário, com taxas elevadas, por mais longo tempo na história do mundo.

É preciso que o Presidente Fernando Henrique Cardoso seja alertado para a situação difícil que se aproxima. É preciso maior clareza dos nossos economistas; é preciso que o povo e o Congresso sejam mais esclarecidos.

As declarações de seus técnicos, com base teórica e nenhum fundamento prático, não solucionam crise nenhuma. Não adianta fingir que não está acontecendo nada. É mais produtivo apontar o problema e tentar solucioná-lo enquanto ainda há tempo. É melhor trabalhar com planejamento e bons níveis de segurança, do que correr depois para apagar um incêndio que poderá vir.

Esse é nosso alerta, Sr. Presidente, em relação à política cambial.

É preciso que nós exportemos mais; é preciso que estejamos mais atentos à balança de pagamento. E, pela quarta vez, volto a lembrar que R$4.300 milhões, em relação à conta turismo, é uma exorbitância.

É preciso cercear um pouco o crédito para que não tenhamos uma diferença tão grande na conta balanço de pagamentos em relação à conta turismo. Do restante, nem falar. Estamos acumulando, como bem dissemos, quase 30 bilhões de déficit. É dinheiro demais que, no futuro, será cobrado e, com certeza, nos dará dor de cabeça.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/04/1997 - Página 6907