Discurso no Senado Federal

REVOLUÇÃO QUE VEM OCORRENDO NOS LABORATORIOS DE TODO O MUNDO, NA AREA DA BIOTECNOLOGIA. APELO A MESA DO CONGRESSO NACIONAL PARA QUE DETERMINE O IMEDIATO EXAME DO VETO PRESIDENCIAL AO PROJETO DE LEI 114, DE 30 DE ABRIL DE 1991, DE AUTORIA DO EX-SENADOR MARCO MACIEL, QUE ESTABELECE NORMAS PARA O USO DAS TECNICAS DE ENGENHARIA GENETICA, PARA A CONSTRUÇÃO, MANIPULAÇÃO, CIRCULAÇÃO E LIBERAÇÃO DE MOLECULAS DE DNA-RECOMBINANTE E DE ORGANISMOS E VIRUS QUE OS CONTENHAM E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.

Autor
Joel de Hollanda (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Joel de Hollanda Cordeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • REVOLUÇÃO QUE VEM OCORRENDO NOS LABORATORIOS DE TODO O MUNDO, NA AREA DA BIOTECNOLOGIA. APELO A MESA DO CONGRESSO NACIONAL PARA QUE DETERMINE O IMEDIATO EXAME DO VETO PRESIDENCIAL AO PROJETO DE LEI 114, DE 30 DE ABRIL DE 1991, DE AUTORIA DO EX-SENADOR MARCO MACIEL, QUE ESTABELECE NORMAS PARA O USO DAS TECNICAS DE ENGENHARIA GENETICA, PARA A CONSTRUÇÃO, MANIPULAÇÃO, CIRCULAÇÃO E LIBERAÇÃO DE MOLECULAS DE DNA-RECOMBINANTE E DE ORGANISMOS E VIRUS QUE OS CONTENHAM E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.
Aparteantes
Bernardo Cabral.
Publicação
Publicação no DSF de 15/04/1997 - Página 7674
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • ANALISE, PROGRESSO, CIENCIAS BIOLOGICAS, MUNDO, ESPECIFICAÇÃO, BIOTECNOLOGIA, PROCESSO, DUPLICIDADE, RESERVA BIOLOGICA.
  • APREENSÃO, FALTA, JURISPRUDENCIA, CODIGO DE ETICA, REGULAMENTAÇÃO, CIENCIAS, AREA, CLONE.
  • JUSTIFICAÇÃO, SOLICITAÇÃO, URGENCIA, CONGRESSO NACIONAL, APRECIAÇÃO, VETO PARCIAL, PROJETO DE LEI, AUTORIA, MARCO MACIEL, EX SENADOR, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, ESTABELECIMENTO, NORMAS, UTILIZAÇÃO, EXPERIENCIA, ENGENHARIA, GENETICA.

O SR. JOEL DE HOLLANDA (PFL-PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores.

Recente reportagem de John Carey para o semanário norte-americano Business Week, há pouco transcrita pela Gazeta Mercantil, do Estado de São Paulo, refere-se à verdadeira revolução que vem ocorrendo nos laboratórios de todo o mundo, nos quais a experiência da clonagem seria apenas o aceno de resultados ainda mais impressionantes na área da biotecnologia.

Num breve retrospecto, o articulista julga que a tecnologia é, em parte substancial, responsável pela "grandiosa, tumultuada marcha da história humana", exemplificando:

      "A metalurgia e o aprimoramento da agricultura resgataram a civilização à Idade da Pedra. No século XIX, a Revolução Industrial deu lugar a máquinas possantes e a cidades de crescimento desordenado. No século XX, a física conquistou a hegemonia. Os físicos realizaram a fissão do átomo, exploraram os universos exóticos da relatividade e da teoria quântica e empregaram a energia de minúsculos chips de silício.

      Ao longo desse caminho, transformaram o mundo com a bomba atômica, os transistores, o laser o e microchip. Mas agora, como acreditam muitos especialistas, a humanidade tende a vivenciar uma nova explosão de conhecimento científico na vertiginosa corrida para o futuro."

Como proclamou o químico Robert F. Curl, ganhador do Prêmio Nobel de 1996, se "este foi o século da física e da química, está claro que o século que vem será o século da biologia."

De forma surpreendente, porém, esse futuro chegou antes, mais exatamente no dia 22 de fevereiro, "com a mansidão de um cordeiro". O embriologista Ian Wilmult, estarrecendo o mundo, anunciou a criação, nos laboratórios do Roslin Institute, da cidade de Edimburgo, de uma cópia exata, de um clone, a partir do DNA extraído de uma glândula de uma ovelha adulta.

Desde esse extraordinário feito, a comunidade científica vem considerando que, em princípio, a técnica nele utilizada poderia "funcionar em qualquer outro mamífero, inclusive nos seres humanos". Conquanto ainda falte confirmação à experiência do embriologista escocês, imagina-se que estão abertas perspectivas impressionantes nesse terreno.

Seria possível obter notável aprimoramento nas criações de ovelhas e de gado bovino. Também, "se a clonagem de seres humanos algum dia se tornar viável, pais desesperados poderão optar plausivelmente por clonar uma criança agonizante", enquanto "alguns indivíduos podem fazer uma investida desesperada em busca da imortalidade, tentando clonar a si mesmos."

Por certo, esses desdobramentos preocupam os cientistas, que não têm "a base jurídica e ética" para lidar com eles. Ao mesmo tempo, o Presidente dos Estados Unidos constituiu comissão nacional destinada a estudar as "inquietantes implicações da clonagem".

Havendo a compreensão de que "a ciência está às vésperas de uma explosão sem precedentes de sua capacidade de compreender e manipular a vida", inclusive permitindo a descoberta de grande quantidade de novos medicamentos e terapias, é também certo que remanescem sem deslinde os problemas do "século biológico", consigo trazendo "uma multiplicidade de enigmas morais e legais".

Nesse contexto, merece-nos especial referência o trabalho aqui realizado pelo então Senador Marco Maciel, hoje exercendo, com suas reconhecidas dedicação e competência, a Vice-Presidência da República. Demonstrando incomum visão de futuro, antevendo as conquistas científicas e prescrevendo-lhes fórmulas de utilização e de razoáveis controles, S. Exª ofereceu à apreciação desta Casa o Projeto de Lei nº 114, de 30 de abril de 1991, que "estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética, para a construção, manipulação, circulação e liberação de moléculas de DNA-recombinante e de organismos e vírus que os contenham e dá outras providências".*

O Sr. Bernardo Cabral - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador Joel de Hollanda?

O SR. JOEL DE HOLLANDA - Com muita satisfação, nobre Senador Bernardo Cabral.

O Sr. Bernardo Cabral - Estou acompanhando, desde o início, o pronunciamento de V. Exª porque vislumbrei a oportunidade do assunto. Quando tentava fazer um aparte, ia lembrá-lo exatamente do trabalho do Senador Marco Maciel, que V. Exª registra no momento em que o Plenário ouve seu discurso com devida atenção. Quero juntar um adminículo às suas palavras, lembrando que há um livro publicado recentemente, do professor Sérgio Ferraz, que aborda a matéria "Essa grande problemática dos seres vivos". Não quero continuar a importuná-lo, mas também não podia deixar de registrar que o aparte vale - se é que posso dizer assim - como um incentivo a pronunciamentos semelhantes. É bom que o Senado veja, de vez em quando, um de seus titulares, um de seus membros, ocupar a tribuna para tratar de um assunto que é tão importante quanto ético, tão moral quanto desgastante, mas que, ao final, sempre haverá alguém para apontar um caminho e indicar a solução - no caso, V. Exª.

O SR. JOEL DE HOLANDA - Recolho com muita alegria o aparte que acaba de fazer o nobre Senador Bernardo Cabral, a quem gostaria de dizer que jamais consideraria inoportuna qualquer uma de suas colocações nos temas aqui discutidos. Ao contrário, sou testemunha de que V. Exª freqüentemente enriquece os pronunciamentos que daqui da tribuna são feitos pelos integrantes desta Casa. No caso específico do modesto pronunciamento que faço nesta tarde, fico muito feliz em merecer a distinção de V. Exª, que traz elementos novos ao meu discurso.

Com acendrado esmero na sua elaboração, a iniciativa preocupa-se, procedentemente, em definir o material genético de que cuida; institui proibições quanto às práticas de manipulação; determina a criação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio -, delegando-lhe atribuições; exige a participação da Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN - nos casos de experiências que envolvam a utilização de material radioativo; e estabelece para a política nacional de biossegurança os respectivos níveis de pesquisa.

Os cuidados do autor chegam às minúcias de proibir "a intervenção no material genético humano in vitro", exceto quando destinada ao tratamento de defeitos; "a manipulação e o congelamento in vitro de embriões humanos", quando inexistir expressa manifestação de vontade dos doadores; "a intervenção em material genético de animais ou de plantas", quando determinar sofrimento e defeito orgânico às proles, no primeiro caso, e, no segundo, quando destinada à finalidade outra que não "o aprimoramento das suas qualidades."

Por fim, a proposição torna proibida "a produção de embriões humanos destinados a servirem como material biológico disponível" e a "intervenção no material genético de microorganismos", salvo, nessa última hipótese, quando tiver por destinação "novas fontes de energia menos nocivas, a melhoria na qualidade e na produção de imunobiológicos, medicamentos e produtos biológicos e a eliminação de agentes poluentes".

Como se vê, já naquela época o Senador Marco Maciel atestava "que a grande revolução do final do milênio se realizará através do turbilhão de possibilidades que a incipiente engenharia genética está a nos trazer". Os avanços da biotecnologia haviam possibilitado a obtenção da vacina contra a hepatite B, a fecundação in vitro e a produção da insulina humana, a partir da descoberta do DNA - ácido desoxirribonucléico-recombinante.

O seu projeto, portanto, viria superar "grave anemia" da legislação pátria, atendendo, ademais, à recomendação do Papa João Paulo II, segundo a qual cumpre aos homens de ciência "a responsabilidade de estimular a reflexão sobre o aspecto ético das investigações científicas, advertindo para os possíveis riscos morais que cada nova tecnologia desenvolvida pode criar".

Sendo certo que o País "não pode ficar alheio a este tempo de progresso e aperfeiçoamento tecnológico", a proposição, mesmo não acompanhando integralmente a velocidade do avanço científico, viria a reduzir o atraso excessivo da legislação específica, como fruto da inteligência de seu autor e do amplo debate dos Congressistas.

Aprovado o projeto em 24 de novembro de 1994, nos termos do Substitutivo da Câmara a ele oferecido, decidiu o Presidente da República, no uso de competência inscrita no parágrafo 1º do art. 66 da Constituição Federal, vetá-lo parcialmente, aguardando-se agora que, sobre essa decisão, opinem em reunião conjunta as duas Casas do Parlamento.

Assim, vamos concluir, Sr. Presidente, essas breves considerações, formulando apelo à Mesa Diretora dos trabalhos do Congresso Nacional para que determine o imediato exame dessa relevante iniciativa. Como já consignado na Câmara dos Deputados, justificando a urgência de se ver aprovada, em definitivo, a nova lei, "todos os países que trabalham com a engenharia genética no mundo, hoje, já possuem legislação sobre a questão de seres manipulados geneticamente".

Se o Brasil não a possuir, "passaríamos a ser um quintal de qualquer tipo de experimento, prejudicando nossa agricultura, atentando contra o nosso meio ambiente e contra a saúde da nossa população. E, ainda mais, deixando as empresas brasileiras sem nenhum rumo no sentido de investir nesse campo absolutamente promissor e da mais alta importância, que é a engenharia genética".

Era o que tínhamos a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/04/1997 - Página 7674