Discurso no Senado Federal

COMENTANDO A CHEGADA DOS TRABALHADORES RURAIS A BRASILIA. DEFENDENDO A APROVAÇÃO DO PROJETO DE RESOLUÇÃO 104, DE 1996, DE SUA AUTORIA, QUE DISPÕE SOBRE A FISCALIZAÇÃO E O CONTROLE DOS ATOS DO PODER EXECUTIVO RELATIVOS A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE, E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.

Autor
Junia Marise (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MG)
Nome completo: Júnia Marise Azeredo Coutinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA AGRARIA. PRIVATIZAÇÃO.:
  • COMENTANDO A CHEGADA DOS TRABALHADORES RURAIS A BRASILIA. DEFENDENDO A APROVAÇÃO DO PROJETO DE RESOLUÇÃO 104, DE 1996, DE SUA AUTORIA, QUE DISPÕE SOBRE A FISCALIZAÇÃO E O CONTROLE DOS ATOS DO PODER EXECUTIVO RELATIVOS A PRIVATIZAÇÃO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE, E DA OUTRAS PROVIDENCIAS.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/1997 - Página 7725
Assunto
Outros > REFORMA AGRARIA. PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, CHEGADA, TRABALHADOR RURAL, SEM-TERRA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), CONVOCAÇÃO, SOCIEDADE, GOVERNO, CONGRESSO NACIONAL, EXECUÇÃO, REFORMA AGRARIA, PROMOÇÃO, JUSTIÇA SOCIAL, PAIS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, URGENCIA, GOVERNO, EFICACIA, IMPLANTAÇÃO, PROJETO DE REFORMA AGRARIA.
  • REITERAÇÃO, SOLICITAÇÃO, SENADOR, APROVAÇÃO, PROJETO DE RESOLUÇÃO, AUTORIA, ORADOR, OBRIGATORIEDADE, APRECIAÇÃO, SENADO, EDITAL, PRIVATIZAÇÃO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD).

A SRª JÚNIA MARISE (Bloco/PDT-MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Senador Geraldo Melo, Srs. Senadores, a Capital do País está recebendo os trabalhadores sem terra. Eles estão vindo de todas as partes do País em caravanas - estão há vários dias nessa grande mobilização -, para trazer a Brasília o seu grito de socorro e, mais do que isso, mostrar ao País a necessidade de se fazer uma reforma agrária para dar terra àqueles que querem plantar.

Estava ouvindo ontem um comentarista de televisão. Ele dizia que o Movimento dos Sem-Terra, a mobilização do homem do campo data de 500 anos. E por que isso, Sr. Presidente? Porque nesses 500 anos da história do nosso País, depois de vários episódios ocorridos na vida pública nacional, passando pelo Estado Novo e pela Revolução de 1964, os trabalhadores do campo permanecem de mãos estendidas aguardando que as autoridades governamentais lhes dêem a necessária condição para que efetivamente se possa fazer uma revolução social no campo.

Temos assistido à passagem da caravana dos sem-terra, durante mais de 30, 40 dias, percorrendo Minas Gerais, São Paulo, o Sul e o Norte do País para chegar a Brasília. Essa caravana integrada por homens e mulheres, jovens e crianças, todos eles, certamente, estão se transformando no símbolo desta perspectiva de se viabilizar concretamente a reforma agrária no nosso País.

Hoje a sociedade brasileira já percebeu claramente que este Governo faz de conta que quer fazer a reforma agrária. Salta aos olhos de todos os brasileiros a necessidade urgente e imperiosa de se assumir com responsabilidade o projeto de reforma agrária.

Sempre colocamos aqui, Sr. Presidente, que queremos que se faça a reforma agrária dentro da lei e por práticas pacíficas. Não queremos mais que episódios como os que vêm ocorrendo nesses últimos meses, a exemplo de Eldorado dos Carajás, transformem-se em símbolos de uma reforma agrária que não ocorreu, muito mais pela omissão do Governo do que pela vontade popular. Não queremos que esses sejam os símbolos da reforma agrária, mas, sim, um pedaço de chão em que os nossos trabalhadores, principalmente os trabalhadores do campo, possam trabalhar.

Outro dia ouvimos um pronunciamento do Presidente Fernando Henrique Cardoso feito para uma camada da elite dirigente do País e até do exterior. Estava lá o sociólogo Fernando Henrique Cardoso tratando de todas as questões econômicas e sociais. Chamou-me a atenção a expressão usada pelo sociólogo Fernando Henrique Cardoso, hoje Presidente da República. Sua Excelência dizia, enfaticamente, ao reconhecer o crescimento no desemprego do País: "Temos, seguramente, uma faixa considerável de inempregáveis neste País." O que certamente leva a sociedade a entender que a fala do Presidente, dita para um plenário representativo da elite dirigente do País, colocava milhares e milhares de trabalhadores debaixo dos viadutos das maiores cidades brasileiras.

É exatamente isto que dizia o Presidente: temos aí uma faixa considerável de homens e, quem sabe, de mulheres sem qualquer qualificação para bater à porta na tentativa de conseguir emprego. Penso eu, Sr. Presidente, que a afirmação do Presidente da República joga milhares e milhares de brasileiros no olho da rua para sobreviverem debaixo dos viadutos.

Hoje, assistimos às manifestações que se fazem por todo o País com relação às violências praticadas por policiais militares em Diadema/São Paulo e também no Rio de Janeiro. São vários segmentos que levantam suas vozes para mostrar os erros e descaminhos e apontar as soluções que precisam ser dadas de forma clara e responsável.

Quando a Comissão Representativa dos Direitos Humanos mostra ao Brasil e ao mundo os fatos que têm ocorrido de prática de agressões e violência contra cidadãos revela o Brasil entre aqueles países que hoje ferem os direitos humanos.

O Comitê da CNBB anuncia que estará recebendo os sem-terra em Brasília e lança um documento argüindo a responsabilidade do Congresso Nacional e do Governo, questionando a ética na política em processos e votações de grande importância como no caso da reeleição. Certamente, Sr. Presidente, a Igreja quer se manifestar em nome de uma sociedade cristã que não perdeu a fé nem a esperança, mas que está a cobrar dos políticos, do Governo, de todas as autoridades, que tenham o mínimo de ética na condução das questões que dizem respeito aos interesses da Nação.

Hoje a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania está votando o Projeto da Reeleição, em tramitação no Senado Federal. Vimos demonstração de força, o rolo compressor, a imposição de um Governo que, no meio do seu mandato, está legislando em causa própria e deseja parceria do Congresso Nacional, cuja maioria o apóia.

Ora, Sr. Presidente, nem tudo está passando despercebido pela sociedade. Vejo entidades como a CNBB, a OAB e outras com credibilidade no nosso País, assumirem o papel fiscalizador da condução política pelo Governo e pelo Congresso Nacional.

Por isso, reitero, mais uma vez, um apelo a esta Casa: no ano passado, apresentei um Projeto de Resolução para submeter o Edital de Privatização da Companhia Vale do Rio Doce à apreciação de todos os Srs. Senadores. Pois bem, Sr. Presidente, requerimento de urgência da matéria, apresentado há cerca de 20 dias, foi derrubado pelas lideranças do Governo. O Projeto não define nenhuma posição do Senado; com ele, a nossa expectativa é, exatamente, de analisar o assunto e podermos ter acesso a todas as informações, principalmente às informações sigilosas, principalmente àquelas informações que não são dadas ao conhecimento da opinião pública. Nós temos essa prerrogativa. A Constituição Federal, no seu art. 41, dá poderes, e, mais que isso, dá a responsabilidade ao Senado Federal e ao Congresso Nacional de fiscalizar os atos do Poder Executivo.

Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por que o Governo não quer que o Senado Federal examine toda aquela documentação, todas aquelas informações e, principalmente, os procedimentos, as práticas que foram adotadas para que a Consultora Merrill Lynch pudesse elaborar o edital de privatização da Companhia Vale do Rio Doce? Será que ela tão é soberana na sua competência e na sua inteligência que não pode ter ocorrido um erro, um deslize, uma má informação, uma avaliação que não condiga com o valor de um patrimônio como a Companhia Vale do Rio Doce?

Tenho certeza, Sr. Presidente, de que não são apenas o BNDES, os seus diretores, que estão instalados nos seus gabinetes, e a Consultora Merrill Lynch que são os donos da verdade neste País. Como é que podemos concordar, repito, que apenas uma consultora, contratada especialmente para tal fim, possa dizer ao Governo e ao próprio Presidente da República, ao Senado Federal e ao Congresso Nacional, o preço, R$10,3 bilhões, sem sabermos de que forma ela chegou a essa avaliação de um patrimônio que, ninguém desconhece, está muito acima do valor estipulado pelo BNDES?

Por isso, Sr. Presidente, insistimos nessa causa. Temos a responsabilidade de examinar documento por documento. A história certamente nos cobrará, e cobrará do Senado Federal, a omissão de não ter tido a preocupação e a responsabilidade de examinar todos os dados, e, mais do que isso, de ouvir aqueles que foram responsáveis pelo processo de privatização ou alienação da Companhia Vale do Rio Doce.

Estamos vendo aí entidades como a OAB, e tantas outras neste País, entidades como a ABI percorrendo o caminho do Supremo Tribunal Federal. Isso acontece porque eles sabem que o Senado Federal, que poderia, num prazo de trinta dias, examinar toda essa documentação, discutir com a sociedade e apresentar, de forma transparente, à opinião pública, todos os dados referentes ao processo ou ao edital de privatização da Vale do Rio Doce, não está fazendo isso.

É por isso que essas entidades estão buscando o caminho jurídico do Supremo Tribunal Federal. E é por isso, Sr. Presidente, que, mais uma vez, queremos aqui trazer a nossa preocupação diante dessa questão. Nós não estamos, através do projeto de resolução, decidindo nada, nem contra e nem a favor. O projeto apenas diz que o Senado Federal deve analisar e aprofundar as informações da proposta de privatização da Vale do Rio Doce. E que os resultados dessa avaliação devem ser examinados, também de forma transparente, por todos os Srs. Senadores.

Se as lideranças do Governo insistirem, Sr. Presidente, em não deixar esse projeto ser aprovado no Plenário, e a privatização da Vale do Rio Doce acontecer, certamente passaremos à História como aqueles que não quiseram sequer se informar ou examinar todos os dados que deram origem a um patrimônio como a Vale do Rio Doce.

E quero, mais uma vez, insistir que a marcha dos sem-terra representa, acima de tudo, um fato histórico que dura 500 anos, como disse o comentarista da televisão, e que chega, neste momento, para fazer uma demonstração para a sociedade brasileira e para convocar a todos, para convocar o Governo e o Congresso a fazerem uma reforma agrária que possa promover a justiça social no nosso País.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/1997 - Página 7725