Discurso no Senado Federal

POLEMICA MUNDIAL SOBRE O PAPEL DA IMPRENSA, A PROPOSITO DA TRAGICA MORTE DA PRINCESA DIANA, E POR OCASIÃO DO TRANSCURSO, HOJE, DO DIA DA IMPRENSA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA.:
  • POLEMICA MUNDIAL SOBRE O PAPEL DA IMPRENSA, A PROPOSITO DA TRAGICA MORTE DA PRINCESA DIANA, E POR OCASIÃO DO TRANSCURSO, HOJE, DO DIA DA IMPRENSA.
Publicação
Publicação no DSF de 11/09/1997 - Página 18563
Assunto
Outros > IMPRENSA.
Indexação
  • ANALISE, ETICA, JORNALISTA, LIMITAÇÃO, AREA, ATUAÇÃO, COMPETENCIA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, RESULTADO, MORTE, DIANA SPENCER, PARTICIPANTE, MONARQUIA, PAIS ESTRANGEIRO, INGLATERRA, OPORTUNIDADE, HOMENAGEM, DIA NACIONAL, IMPRENSA.

           O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a trágica morte da Princesa Diana de Gales, num acidente automobilístico em Paris, há dez dias, acendeu uma polêmica mundial sobre o papel da Imprensa, cuja data comemoramos, agora, no dia 10 de setembro. O desastre, por si só, tinha excepcional apelo para a mídia. Afinal, tratava-se da mulher mais fotografada do mundo, a jovem princesa britânica que estava vivendo um caso de amor com um playboy milionário. No entanto, o assunto ganhou nova dimensão quando foi denunciado que os fotógrafos -- que, em motocicletas, seguiam o carro do casal -- poderiam, de alguma forma, ter contribuído para o acidente.

           Logo a seguir as denúncias se agravaram. Segundo testemunhas, sete ou oito desses profissionais da Imprensa teriam atrapalhado ou até mesmo impedido o trabalho das equipes de resgate, que tentavam retirar a princesa agonizante dos destroços do veículo.

           Em seguida foi dito que esses fotógrafos -- mais conhecidos como paparazzi -- não fazem parte da Imprensa, que são como soldados da fortuna, sempre à cata de instantâneos de celebridades, que vendem para jornais sensacionalistas. Alegou-se que não têm vínculo com publicações sérias, e sim que negociam suas fotos com quem paga mais. Houve até mesmo quem tentasse jogar a culpa desse comércio de fotos nas pessoas que compram os jornais sensacionalistas, alegando que tais fotos só são feitas porque há jornais que pagam por elas. E leitores que adquirem tais jornais.

           Só com base nas informações iniciais -- já que o caso começa a ser investigado pela Justiça francesa --, existe material para suscitar o aprofundamento da discussão sobre o direito da Imprensa versus o direito à privacidade dos cidadãos. A partir desse desastre, nada mais será como antes. É possível que leis mais rigorosas contra os caçadores de fotos -- que às vezes conseguem verdadeiras fortunas com elas -- sejam criadas nos países onde o fenômeno se dá com maior intensidade.

           Se principio esse pronunciamento relativo ao Dia da Imprensa falando da morte de Lady Di é porque acredito que, hoje, o maior problema ético do jornalismo é estabelecer um limite entre o seu direito inalienável de buscar informações e de trazê-las a público e o direito à privacidade dos cidadãos.

           Aliás, o jornalismo é uma profissão que impõe reflexão permanente a todos que a exercem. Todo jornalista consciente, antes de escrever sua matéria ou de fazer uma reportagem de rádio ou televisão, se pergunta sobre as implicações do que está veiculando. Será que a matéria interessa mesmo a seus leitores ou ouvintes ou é apenas uma informação descartável, sensacional? Será que a fonte da informação é confiável? Será que a denúncia está bem apurada?

           A verdade -- como confessam com freqüência grandes jornalistas deste País -- é que a Imprensa moderna, cada vez mais competitiva, erra com freqüência. Às vezes, as denúncias apresentadas em manchetes garrafais não se confirmam. Mas os seus efeitos sobre a pessoa acusada são terríveis. Reputações construídas ao longo de uma vida podem ser destruídas por algumas linhas de jornal ou uns poucos minutos de tevê. O poder da Imprensa é devastador. O cidadão acusado fica encurralado, sem ter como se defender. A Imprensa -- dizem seus críticos -- julga e condena, sem ser Justiça.

           Eu diria que hoje em dia a Imprensa brasileira apresenta dois pontos altamente vulneráveis: erra com demasiada freqüência e resiste em conceder o direito de resposta aos injustamente ofendidos. Os erros vêm de notícias mal apuradas ou obtidas em fontes indignas de confiança. No que diz respeito ao direito de resposta, a verdade é que a Imprensa não o concede de imediato e na exata proporção do agravo.

           Quanto aos erros mais notórios, eu poderia arrolar aqui, por exemplo, o caso da Escola Base, de São Paulo, em que seus proprietários foram acusados injustamente de abusar sexualmente dos alunos. Posteriormente, foram inocentados, mas os danos psíquicos e materiais que sofreram foram imensos. Tivemos também o caso do cidadão que foi apontado como o autor de uma carta-bomba enviada ao Itamaraty, e depois inocentado. Houve também aquela maciça campanha contra o ex-Ministro da Saúde, Alceni Guerra, depois inocentado pela Justiça.

           Mas a Imprensa também acerta, e acerta muito.

           A Imprensa denuncia atos de corrupção, de abuso de poder e de violação dos direitos humanos. Por isso, julgo que o direito à liberdade de informação é o mais fundamental dos direitos. É sobre eles que se assentam os demais. Se não há liberdade de Imprensa, não há nenhuma liberdade.

           A Imprensa tem tremendas responsabilidades sociais e políticas. É ela quem dita os assuntos a serem discutidos prioritariamente no País. Impõe nossa pauta aqui no Parlamento. E, com suas reportagens, acaba determinando a ação dos administradores públicos. É assim que tem de ser, porque a Imprensa amplia a voz dos cidadãos.

           Atentas a esse aspecto, as empresas brasileiras de informação vêm abrindo canais para maior participação de seus clientes. Os jornais brasileiros, por exemplo, ampliam a seção de cartas de leitores, criam o cargo de ombudsman e contratam empresas que pesquisam diariamente a opinião dos leitores.

           Nos últimos anos, os veículos de comunicação do País passaram por grandes transformações. Investiram pesadamente nos seus parques gráficos, sistemas de informatização e novos meios de comunicação. E passaram a treinar mais e melhor seus recursos humanos.

           Após o Plano Real, as empresas jornalísticas foram obrigadas a se modernizar para enfrentar uma competição cada vez mais acirrada. Com um mercado estável, tiveram que partir para promoções que aumentassem sua circulação e penetração. Em suma, hoje em dia, os meios de comunicação brasileiros nada ficam a dever aos dos países mais desenvolvidos.

           A Constituição de 1988, embora tenha representado um retrocesso em certos aspectos econômicos e administrativos, significou um avanço sensível no que diz respeito à cidadania. Os brasileiros se tornaram mais conscientes dos seus direitos e deveres. Ora, esse novo cidadão cobra maior responsabilidade de todas as instituições. Entre elas, a Imprensa. O homem cônscio de seus direitos vigia a atuação dos políticos, mas também cobra idoneidade das empresas de comunicação social. Exige ser bem informado, quer notícias verdadeiras.

           Se vivemos hoje num País em que as instituições democráticas funcionam plenamente, em que os direitos da cidadania são cada vez mais acatados e em que a economia funciona sem amarras, podemos atribuir boa parte disso à Imprensa. Nenhuma instituição foi mais fundamental na luta contra a arbitrariedade do que a Imprensa. Mesmo censurada, sempre arranjou formas de denunciar as irregularidades. Durante quase duas décadas, os jornalistas brasileiros resistiram diariamente contra o autoritarismo e suas manobras casuísticas, dando inúmeras mostras de seu valor.

           Com este breve pronunciamento, no Dia da Imprensa, quis transmitir minha saudação aos jornalistas e aos veículos de comunicação deste País que desempenharam papel fundamental na luta para a implantação da democracia. E que exercem hoje, com dignidade e eficiência, papel de destaque na vida nacional. Mas não poderia deixar passar essa ocasião sem fazer um chamamento à reflexão. Temos que meditar muito sobre essa linha quase impercetível que separa, por um lado, a liberdade que os meios de comunicação devem ter para cumprir sua elevada missão, por outro lado, do sensacionalismo barato, que se nutre da invasão de privacidade.

           Quanto à falta, no Brasil, de um direito de resposta rápido e satisfatório, creio que a nova Lei de Imprensa brasileira - que em breve será votada no plenário da Câmara dos Deputados - poderá dar uma solução eficiente.

           Era o que tinha a dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/09/1997 - Página 18563