Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM A ABERTURA DA SEMANA NACIONAL DO JOVEM, CRIADA PELA LEI 8.680, DE 13 DE JULHO DE 1993, E AO INSTITUTO INTERNACIONAL DA JUVENTUDE PARA O DESENVOLVIMENTO.

Autor
Sebastião Bala Rocha (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AP)
Nome completo: Sebastião Ferreira da Rocha
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM A ABERTURA DA SEMANA NACIONAL DO JOVEM, CRIADA PELA LEI 8.680, DE 13 DE JULHO DE 1993, E AO INSTITUTO INTERNACIONAL DA JUVENTUDE PARA O DESENVOLVIMENTO.
Publicação
Publicação no DSF de 24/09/1997 - Página 19764
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ABERTURA, SEMANA, JUVENTUDE.
  • ANALISE, SITUAÇÃO, FUTURO, JUVENTUDE, PAIS.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA (PDT-AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, juventude presente, estudantes, há determinados eventos e datas comemorativas que nos ensejam fazer uma pausa em nosso atribulado cotidiano para empreendermos uma reflexão sobre aspectos da realidade que nos passam despercebidos na faina diária. É o que faço neste momento, Sr. Presidente, e convido meus Colegas a fazerem comigo: vamos suspender nossas preocupações costumeiras e rotineiras por alguns minutos e ocupar nossas mentes com uma reflexão sobre a juventude, motivada pelo Dia Mundial da Juventude, que se comemorou no dia 22 de setembro.

Não há nada mais verdadeiro e real para nossos sentidos do que a inexorável sucessão do tempo, medida, em nossa cultura, pela passagem dos dias e noites, meses e estações, anos, décadas, séculos e milênios. Nesse fluxo contínuo do tempo, vamos assistindo aos filhos sucederem aos pais, os jovens sucederem aos idosos, no porvir ininterrupto das gerações. E chega o momento em que nos perguntamos: que geração temos sido para os que nos sucederão? Que obra estamos legando aos nossos descendentes? Que valores queremos ver preservados e perpetuados por eles? Que temos feito para que os nossos jovens participem das decisões que, tomadas hoje, lhes restarão como legado amanhã? É para fomentar uma reflexão sobre temas como esses que ocupo agora a tribuna desta Casa.

Forçados a abandonar precocemente os estudos, muitos dos nossos jovens buscam no trabalho a garantia da própria sobrevivência. Têm sorte se conseguem uma colocação, por mais humilde que seja, no concorrido e escasso mercado de emprego. Com sua imaturidade e insegurança, são presas fáceis das redes gananciosas das drogas, da prostituição e da criminalidade.

Segundo o censo demográfico de 1991, os jovens na faixa dos 15 aos 24 anos representam 20% do total da população brasileira. Em números absolutos, o percentual engloba um contingente de cerca de 30 milhões de pessoas. Sabe-se que entre eles, especialmente na população mais pobre, a principal causa de mortalidade se encontra na violência. Para se ter uma idéia, no ano passado, na Capital de São Paulo, das 3.432 mortes ocorridas entre jovens dos 15 aos 24 anos, 1.824 - isto é, mais da metade - foram homicídios. Em segundo lugar, figuram os acidentes de trânsito nas ruas da capital paulista, que responderam por quase 12% das mortes dos seus jovens. Em terceiro lugar, vem a Aids, responsável por 5% das mortes.

Vivendo um momento de extrema complexidade em suas vidas, os jovens vêem desdobrar-se à sua frente rotas de incerteza e insegurança: precisam definir-se profissionalmente, devem buscar colocação no mercado de trabalho, começam a desligar-se de suas famílias. Muitos já estão constituindo sua própria família, outros deixam seus lugares de origem, enfim, enfrentam o ponto de inflexão talvez mais agudo de suas vidas.

Além dos problemas característicos da idade, os jovens de hoje estão vivendo num mundo em que as transformações sociais levam mais facilmente do que no passado à desagregação familiar, à ausência de valores morais, à falta de modelos válidos e significativos. Hoje, no Brasil, de cada quatro grupos familiares, um é chefiado por mulheres. A gravidez precoce está crescendo. Os liames familiares estão se diluindo. Crianças e jovens estão deixando de receber a verdadeira educação, aquela que faz emergir no educando o homem dotado de valores humanos, éticos, morais, cívicos, religiosos e espirituais.

Ao lado disso, o jovem tem de enfrentar um dos maiores problemas atuais e do futuro: o desemprego. As sociedades modernas embarcaram em modelos econômicos e sociais nos quais não cabem os jovens. Limitaram-se à busca desenfreada da estabilidade econômica. O capitalismo avançado do fim de século depende do desemprego crônico. Talvez sejam esses modelos os reais criadores da exclusão e da delinqüência juvenil. Sequer há ouvidos nesses modelos para receber a participação dos jovens e escutar o que eles têm a dizer. Talvez nosso maior erro, no presente, seja não ouvir nossos jovens, que serão os responsáveis no amanhã pelo mundo que lhes estamos legando hoje.

Imbuída da importância das gerações futuras no processo de desenvolvimento, a Agenda 21 - elaborada durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em 1992 no Rio de Janeiro - dedica todo um capítulo às crianças e jovens, ressaltando seu papel no desenvolvimento econômico e social. Reproduzo a seguir uma passagem do Capítulo 25 da Agenda 21:

      É imperativo que os jovens de todas as partes do mundo participem em todos os níveis pertinentes ao processo de tomada de decisão, porque isso afeta suas vidas e tem implicações no futuro. Além de sua contribuição intelectual e de sua capacidade de mobilizar apoio, eles trazem perspectivas únicas que necessitam ser levadas em consideração.

A participação dos jovens nos processos de tomada de decisão deve ser ampliada tanto em questões de âmbito global, nacional e regional quanto nos níveis locais, dado ser a juventude o repositório dos líderes de amanhã e a herdeira dos atos e decisões que tomarmos hoje.

Não é verdade que a juventude deste tempo está alienada e desinteressada dos problemas que cercam nossa existência. Um levantamento feito com mais de 100 mil participantes de todo o mundo, sob inspiração da Federação Internacional dos Editores de Jornais - Fiej, mostrou que os jovens, em sua esmagadora maioria, estão conscientes dos problemas da Terra. Para ouvir jovens de todos os cantos do mundo, cerca de 300 jornais dos mais diferentes países abriram espaço em suas páginas para solicitar aos jovens que expressassem suas inquietações, escrevendo o que mais queriam ver mudado em sua vida e no mundo. Pois bem: os jovens demonstraram ter consciência de que habitam um mundo marcado por guerras, violência, pelo abuso dos mais fortes sobre os mais fracos, pela poluição acelerada do meio ambiente. Diante desse quadro, reconhecem que o futuro é assustador, mas, mesmo assim, acreditam que têm muito com que contribuir para melhorar a vida no planeta.

E disseram mais: temem que questões como a fome e o desemprego venham a se agravar no futuro de forma avassaladora. E o que disseram sobre isso? Que esses problemas poderiam ser resolvidos de uma melhor forma se os adultos se dispusessem a ouvi-los mais.

Talvez seja essa última mensagem dos jovens do mundo inteiro a que deva ressoar com mais impacto em nossas mentes, neste momento em que nos estamos dedicando a refletir sobre alguns temas, motivados pelo Dia Mundial da Juventude.

Gostaria agora de falar um pouco sobre a participação político-institucional da juventude brasileira na História de nosso País, desde os primórdios até o momento atual.

A participação da juventude brasileira não pode ser considerada como recente, mas deve ser vista como importante e representativa na construção de nossa história.

Hoje, quando se comemora o Dia Nacional da Juventude, gostaria de relembrar sua extensa colaboração desde o período colonial, quando ocorreu a primeira manifestação da juventude, ocasionada pela invasão da França, no Estado do Rio de Janeiro. Jovens vitoriosos marcaram o período nacional difícil. Mesmo os mais críticos seriam incapazes de desmentir a imensa coragem por eles demonstrada.

Por não haver universidade no Brasil, os jovens eram mandados para o exterior de onde retornavam, cheios de novos ideais; ideais esses que influenciaram na participação da juventude em importantes lutas, como a libertação do domínio português sobre o nosso País e também pela abolição da escravatura.

O apagar das luzes imperiais trouxe, também, uma nova esperança: a República. Essa que seria, mais tarde, palco de muitas lutas, simbolizadas pela presença da juventude na Revolta de Canudos, nos manifestos lançados em todas as partes do País em apoio a tão importante fato.

Paralelamente a isso, podemos relembrar a revolta dos jovens militares, representados pela coragem de alguns em demonstrar a estrutura arcaica do militarismo a uma nação despreparada.

Os estudantes voltam à cena, com a fundação da União Nacional dos Estudantes - Une, que viria a ser um dos eixos políticos na busca de uma nova sociedade. E foi essa que emplacou a luta pelo combate ao Eixo e ao Estado Novo e que, entre 1947 e 1950, levantou a bandeira da criação da Petrobrás e da proteção das riquezas minerais brasileiras.

No dia 1º de abril de 1964, o Golpe Militar pega de surpresa toda a nação, mas as forças populares não se calariam. E a juventude, mais um vez, com ousadia própria, assumiria para si mais essa árdua tarefa, sob o comando da Une.

E como resposta por tamanha demonstração de patriotismo, a Une teve queimada sua sede na praia do Flamengo e foi perseguida por militares. A partir de então, iria para a clandestinidade, de onde, mesmo assim, continuaria a organizar o movimento estudantil.

Muitos se entregaram a essa luta, entre os quais gostaria de citar o nosso saudoso Betinho que, perseguido como tantos outros, buscou exílio fora do Brasil.

Gostaria ainda de ressaltar o mês de setembro de 66, como um dos meses mais ativos e até heróicos do movimento estudantil. A partir desse ano, o dia 22 de setembro seria considerado o Dia Nacional de Lutas contra a Ditadura, que seria marcado em sua escolha com o massacre da Praia Vermelha.

Um outro marco chegaria na forma de um jovem nortista, buscando na Cidade Maravilhosa, uma vida melhor. Edson Luís, de apenas 18 anos, pagou com sua vida o fato de ser jovem e destemido. E partir daquele instante, o dia 28 de março de 1968 seria considerado um símbolo de luta e coragem na história política de nossa juventude. Edson Luís não foi a primeira vítima da ditadura, mas coube à sua morte desencadear no Brasil o processo de liberação que em outros países da América Latina já estava em andamento, representada pela maior passeata de toda história do movimento estudantil, conhecida como a Passeata dos Cem Mil, com a seguinte bandeira de luta "Neste luto, começa a luta".

A volta dos estudantes às ruas se daria em março de 1977, reforçando a luta contra a ditadura. Porém, somente a partir de 1978, a Une romperia barreiras sendo a primeira entidade nacional de massa a reestruturar-se com a revogação dos arts. 38 e 39 da Lei 5.540 de 28 de novembro de 1968. A seguir, os estudantes secundaristas emplacariam a luta pela liberação de seus grêmios livres e pela reconstrução de sua entidade maior de representação: a Ubes, desarticulada desde 1968.

Durante os anos seguintes, a Une e a Ubes levantaram importantes bandeiras, como anistia aos presos políticos da ditadura, eleição direta para Presidente da República e uma inovadora proposta: o voto aos 16 anos, conquistado a partir da nova Constituição de 1988.

Após as manifestações dos Anos 80, os estudantes retornaram às ruas, em agosto de 92, para exigir o impeachment ao novo algoz da Nação: o Presidente Collor. Não houve Capital brasileira que não tenha visto sua juventude mobilizada pedindo: Fora Collor!

A unidade dos setores populares da sociedade garantiu mais uma vitória, simbolizada pela derrubada do Presidente da República em outubro de 1992 - primeiro impeachment da História do Brasil.

Hoje a juventude se faz presente e ativa contra esse avanço do neoliberalismo e contra a estrutura política dessa nova ordem mundial, assumindo importantes bandeiras, como a defesa de nossas estatais entregues ao capital estrangeiro; exigindo maiores investimentos na educação e repudiando atitudes arbitrárias de um Governo descompromissado com a sociedade brasileira, que a todo custo tenta rasgar nossa Constituição e acabar com os direitos trabalhistas, tão arduamente conquistados.

Enfim, a História demonstra-nos, em fatos, o quão nossa juventude é valorosa, não se deixando iludir com falsos discursos sobre "representar o futuro", mas sobretudo por estarem presentes na construção desse novo amanhã.

Aproveito a oportunidade para homenagear todos os jovens do nosso País e dizer do nosso respeito e admiração pela luta dos jovens. Mando também um abraço e congratulo-me com os jovens do meu Estado, Amapá, que também estão organizados e sempre participaram dessas lutas.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/09/1997 - Página 19764